POV TESSIA ERALITH
Levantando minha mão, me alegrei com a resposta da mana. As partículas vermelhas estavam pulando e dançando cheias de energia. As amarelas estavam perto do chão, rolando como se fossem pequenas pedras. A mana azul invadiu-me como uma maré e agarrou-se à minha pele como orvalho. As verdes eram minhas favoritas, no entanto. Elas possuíam aspecto cortante, como uma lâmina afiada, chicoteando e estalando como o vento que representavam, mas também possuíam algo fresco e limpo. A mana de vento era forte e suave ao mesmo tempo.
Estava em um platô sem nome, no alto das montanhas das Garras do Basilisco. Não muito longe de Taegrin Caelum. Não havia nada ao redor por quilômetros que eu pudesse destruir acidentalmente… mas não estava aqui porque Agrona temia que eu pudesse perder o controle. Em vez disso, conhecia a extensão do meu poder e queria que eu o liberasse.
Estendendo a mão para o céu, concentrei-me na mana, puxando-a para um ponto específico no alto. Água e vento se condensaram, colidindo um com o outro para formar uma enorme nuvem negra de tempestade que escureceu as montanhas por quilômetros ao nosso redor.
Minha pequena audiência assistia em silêncio. Nico estava lá, é claro, junto com outras três Foices. Draneeve, o assistente de Nico e algumas outras figuras da fortaleza também tinham vindo. Agrona não estava, mas nunca o vi sair do castelo antes.
A mana de fogo subia das pedras aquecidas pelo sol e se fundia em raios brancos e quentes que caíam de volta, quebrando pedras e lançando estilhaços em meu campo de treinamento. A água condensou-se em gelo, que começou a cair como pedras lançadas por catapultas, formando crateras no solo duro da montanha.
Mesmo no auge da minha força na Terra, nunca fui capaz de fazer algo assim com o ki.
Minhas memórias têm estado muito mais estáveis nessas semanas, desde que Agrona prometeu que eu poderia deixar sua fortaleza. Disse que eu começaria a me sentir mais eu mesma quanto mais tempo estivesse neste corpo. As runas que cobriam minha carne me ajudaram a manter a lucidez, manter a outra voz em silêncio.
A mana de vento se aglutinou em amplas e cortantes correntes que serpenteava ao meu redor como um dragão, me separando dos outros. Vento, ao mesmo tempo suave e forte…
Minha vida, minha vida anterior, exigiu que eu me endurecesse para suportar o treinamento constante e torturante que recebi. Mas sempre houve um pedaço de mim que guardei no meu coração, aquele pedaço onde senti um calor afetuoso pela primeira vez na minha vida, e foi esse calor que me manteve até…
Me concentrei na mana, recuando dos resquícios despedaçados dessas memórias. Ainda não conseguia me lembrar da minha morte, e Nico só disse que eu saberia sobre isso com o passar do tempo.
Nico…
Olhei para onde ele estava, me observando lançar feitiços, seu cabelo escuro chicoteando seu rosto. Não pude deixar de notar como ele ficou bem longe dos outros. Pobre Nico, um excluído até mesmo aqui.
Draneeve bateu palmas e gritou contra o vento, sua máscara dando à sua voz uma qualidade áspera que achei desconfortável de ouvir. Nico acenou para que Draneeve fizesse silêncio, e o mascarado parou de gritar, embora continuasse com um aplauso lento e inconsistente.
Estendendo a mão, puxei os cantos da enorme tempestade até que ela pairou um pouco acima de mim, quase do tamanho de uma macieira. A criação, momentos atrás, uma manifestação mortal de poder bruto, agora era algo totalmente diferente. Minúsculas criaturas aladas feitas de ar giravam dentro das nuvens, enquanto pequenos golfinhos aquáticos saltavam e espirravam abaixo delas.
Foi bonito. A mana era linda. Ki era energia, capaz de ser reunida e liberada, mas nunca realmente tomando forma, não da mesma forma que a mana poderia tomar. Esta foi a verdadeira magia.
Minha atenção se desviou para os três que se destacavam do resto: as Foices. Tecnicamente, Nico era um deles, mas eles o mantinham à parte, ou ele mantinha distância. Ou ambos.
Seus tons variados de pele cinza, chifres pretos e olhos vermelhos serviam para defini-los como algo diferente. Seus olhares continham curiosidade e inquietação, como uma plateia assistindo a um domador de leões em um circo. Isso me fez acreditar no que Nico vivia me dizendo: eles sabiam que eu seria mais forte do que eles eventualmente.
— Muito, muito bem feito!
Draneeve saltou com sua voz propositalmente áspera.
— Você cresceu muito mais rápido do que Lorde Nico. Apenas semanas no corpo da garota elfa magrinha e você está…
Houve um estalo alto.
Draneeve endireitou a máscara, uma coisa branca simples com pequenos buracos no lugar dos olhos e um sorriso grosseiramente desenhado, e esfregou o lado da cabeça onde Nico o havia acertado com as costas da mão. Fiz uma careta para Nico, que teve a boa graça de pelo menos parecer envergonhado. Ele odiava Draneeve, sabia, mas não me disse o porquê.
Cadell e Dragoth estavam observando Nico.
Dragoth era enorme, maior que qualquer homem que eu já vi, mas fora isso, era de um tipo familiar. Quando estava subindo na classificação no torneio da Coroa do Rei, havia muitos como ele. Guerreiros arrogantes e egocêntricos. Rápidos para rir de suas próprias piadas e rápidos para lutar contra qualquer insulto recebido.
Cadell era o mais estranho e assustador. Tinha um rosto frio e cruel, como o lado afiado de um machado, mas era profissional em suas maneiras. Não gostava dele.
Mas foi a terceira Foice que achei mais interessante. Só a encontrei uma vez antes, e foi breve. Embora parecesse jovem, vinte no máximo, havia uma sabedoria profunda e curiosa em seus olhos e uma inteligência mundana. Senti como se ela estivesse me dissecando com seus olhos escuros, tanto naquela época quanto agora. Ao contrário de suas contrapartes, ainda estava me observando. Não o meu feitiço, com suas gaivotas de vento idiotas e golfinhos aquáticos, mas eu.
Olhando em seus olhos, era quase como se eu pudesse ver as engrenagens atrás deles girando, tentando me entender. Ela me via como uma ameaça? Uma ferramenta? Não tinha certeza.
— Nico.
Cadell disse, seu tom cheio de gelo e fogo.
Seja legal com seu animal de estimação. Afinal, foi Draneeve quem o trouxe de volta daquele continente horrível. Draneeve ficou inquieto, sua atitude ilegível por trás de sua máscara feia.
— Ele seria um general agora, talvez até um retentor, se não tivesse se retirado de Dicathen para salvar sua pele ingrata.
Meu feitiço desapareceu, a nuvem se dissolvendo em névoa e depois em nada enquanto esperava a resposta de Nico. Cerrou os punhos e deu um passo para longe de Draneeve.
— Não fale comigo como se eu fosse inferior, Cadell. Eu também sou uma Foice, lembra?
Dragoth sorriu, seus dentes brilhando brancos como o luar através de sua barba.
— Você está certo, pequeno Nico. Você é uma Foice. E o nome Foice passou a ter um pouco menos de significado a partir do dia em que o consideramos parte do nosso grupo.
Riu alto de sua própria piada, mas não parou por aí.
— Talvez Bivrae devesse ser uma Foice, ou mesmo Draneeve!
Disse, praticamente gritando, seu sorriso se tornando ameaçador.
Nico zombou.
— E onde estava o poderoso Dragoth durante a guerra? Diga-me, Titã de Vechor, por que seu servo foi para Dicathen e morreu enquanto você estava seguro e…
— Cuidado com suas próximas palavras.
Dragoth rosnou, seu sorriso caindo rapidamente. Deu um passo em direção a Nico, inchando seus enormes músculos.
O solo se avolumou quando uma trepadeira coberta de espinhos surgiu entre os dois, rapidamente se expandindo em uma cerca de espinhos. Não tive a intenção de lançar um feitiço, mas estava agitada com a luta deles. Meu instinto defensivo sempre pendia para a magia das plantas, mesmo quando outros elementos fariam mais sentido.
Dragoth se inclinou para frente, apoiando os dois braços nas vinhas cobertas de espinhos.
— Você é jovem e pequeno, mas já está no auge de seu poder, reencarnado.
A cabeça de Nico se inclinou para o lado. Seus olhos estavam frios como carvão morto.
— Todos que podem ter esperança de me desafiar já estão aqui.
Disse suavemente antes de se virar para mim.
— Está claro que você já está pronta para ir. Já esperamos o suficiente, por insistência de Lorde Agrona, é claro, acrescentou rapidamente, lançando um olhar azedo para Cadell.
— Sua capacidade de moldar a mana é impressionante.
Disse Foice Seris, seu olhar afiado me cortando aos poucos.
— Mas não se confunda com o que está diante de você. Mantenha os olhos e os ouvidos abertos e não vá além do seu alcance.
— Ela é o Legado.
Nico respondeu sombriamente.
— As próprias estrelas não estão além de seu alcance.
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Minha primeira experiência neste mundo foi a terra natal do povo élfico na floresta. Não reparei na sua estranheza. Estava muito confusa e surpresa com minha própria reencarnação para prestar muita atenção na floresta encantada. Mesmo a aparência do gigante de três olhos, um asura, me lembrei, não foi o suficiente pra estabelecer o quão sobrenatural era minha nova casa.
Foi em Taegrin Caelum quando comecei a entender como esse lugar realmente era diferente da Terra. Mas lá, tudo que aprendi era filtrado pelo Agrona. Só foi depois que Nico me levou para as Relictombs que apreciei toda a dimensão das estranhas e maravilhosas diferenças entre os dois mundos.
O portal privado de Agrona poderia se conectar a qualquer outro em Alacrya, permitindo que nos teletransportássemos pra muito perto de nosso destino. Teria gostado de explorar, de passar um tempo absorvendo tudo enquanto vagávamos pelo segundo nível das Relictombs. O céu em si quase me tirou o fôlego quando olhei para a vasta extensão azul. Pensei que minha tempestade tinha sido uma demonstração impressionante de magia, mas isso…
Sabia logicamente que o próprio céu era uma construção mágica, mas não conseguia entender. Parecia incompreensível que alguém pudesse criar tal coisa. Quando comentei isso com Nico, me ignorou, focando em intimidar a multidão para nos abrir um caminho entre os homens e mulheres com armaduras ao nosso redor.
— Você é totalmente imune às maravilhas deste mundo?
Perguntei, mantendo o ritmo ao lado dele.
— Você pode ter se acostumado com tudo isso, mas eu só cheguei aqui recentemente.
— Nós temos um lugar para ir.
Retrucou. Ele deve ter me visto franzir a testa com o canto do olho, porque diminuiu um pouco a velocidade.
— Sinto muito, Cecil. Estou… um pouco agitado. Lorde Agrona deu a entender que o que encontraremos aqui pode ser importante para mim, mas deixou de fora qualquer tipo de detalhe e…
Parou, estremecendo.
— Sinto muito, não é sua culpa. Estou impaciente para falar com esses juízes.
— Não, me desculpe.
Disse, me sentindo imediatamente culpada por minha escolha de palavras. Ele me contou longamente sobre suas vidas, como foi para ele depois de minha indução involuntária ao torneio da Coroa do Rei e sua vida dividida aqui.
— Não tive a intenção de fazer pouco caso do que você passou.
— Eu sei
Foi tudo o que ele disse.
Seguia em silêncio enquanto Nico nos guiava direto como uma flecha, em direção a uma grande e intimidante construção de pedra escura e espinhos negros. Parecia um pouco com um porco-espinho enorme com um exército de gárgulas agarrado às suas costas.
Uma mulher com cabelos vermelhos como uma tocha estava esperando por nós na frente do prédio. Ela estava envolta em um manto escuro bordado com uma espada dourada e escamas. Seus olhos permaneceram olhando seus sapatos enquanto nos aproximávamos e, mesmo quando começou a falar, não ergueu os olhos.
— É uma grande honra receber um representante do Alto Soberano.
Seu tom era autoritário, mesmo quando tentava ser subserviente.
— Embora, devo admitir, esperávamos que você chegasse antes.
Nico passou por ela, que se virou para segui-lo, mantendo-se um pouco mais longe dele do que eu.
— O Alto Soberano tem pouco tempo para coisas insignificantes como alguns juízes corruptos. Ainda não tenho certeza de porquê uma Foice é necessária
Nico disse rapidamente.
Eu queria olhar ao redor, mas estávamos andando rápido demais para eu realmente apreciar o lugar. Quase ri quando vi um afresco gigante de um homem que presumi ser Agrona. Parecia que os artistas nunca o tinham visto, mas percebi rapidamente que era uma possibilidade. E rapidamente passamos pelo afresco, sem Nico nem a mulher ruiva darem atenção.
Nico parou em frente a uma porta de ferro preto, batendo os dedos impacientemente enquanto esperava que a juíza a abrisse. Acenando com a mão envolta em mana na frente da porta, nos indicou uma escada mal iluminada feita de pedra escura e ladrilhos cinza. Nico assumiu a liderança novamente, descendo as escadas rapidamente. Quando chegamos ao fundo, estava marchando a uma velocidade desconfortável, forçando a juíza e eu a praticamente correr para acompanhá-lo.
Um labirinto de túneis estreitos se abria pra esquerda e direita, ladeados por portas de celas gradeadas. Na cela mais próxima da escada, uma mulher esfarrapada se inclinou para frente sob a luz da tocha, viu Nico, e imediatamente se escondeu nas sombras, seu rosto se contorcendo como se ela tivesse acabado de ver um demônio.
Nico ignorou os túneis ramificados enquanto nos conduzia direto pelo caminho do meio.
Então, a ficha caiu.
Seu distanciamento, a maneira como estava praticamente me ignorando depois de passar as últimas três semanas trabalhando incansavelmente para provar a Agrona que eu estava pronta, seu mau humor… Nico estava ansioso com esse interrogatório.
Não era exagero dizer que meu antigo noivo estava sempre ansioso, mas tinha ficado rígido, cada movimento rijo e desajeitado, e ele nem olhava para mim. Não estava apenas ansioso; estava temendo o que estava por vir.
O corredor terminava em um par de portas largas de ferro, pretas como a noite e inteiramente cobertas por runas prateadas. Elas pareciam que poderiam segurar um rinoceronte furioso do lado de dentro. Apesar de seu tamanho, se abriram sozinhas quando a juíza se aproximou, revelando uma grande sala circular do outro lado.
Meu estômago embrulhou.
— O que essas pessoas fizeram para merecer isso?
Perguntei, desviando meus olhos.
Dentro da cela, cinco figuras estavam como águias abertas, penduradas no teto pelos pulsos e tornozelos. Faixas de bronze cobriam suas bocas. Embora houvesse mana nas correntes e mordaças, não pude sentir nada dos prisioneiros. Ou sua mana estava sendo suprimida ou, engoli em seco, seus núcleos de mana foram destruídos.
— Eles conspiraram com uma casa nobre para condenar um homem inocente por um crime que não cometeu.
Disse a juíza com firmeza.
— Diante do flagrante de abuso de autoridade para seu próprio ganho pessoal, merecem isso e pior.
Dei um passo em direção à cela, apesar de não ter certeza se queria, mas Nico me impediu. Ele estendeu a mão para tocar meu braço, mas parou.
— Acho que seria melhor se você esperasse aqui.
Fiquei quase aliviada. Dando um passo para trás, acenei com a cabeça. Assim que ele e a suprema juíza entraram, as portas começaram a se fechar. No último momento, quando seus olhos se desviaram dos meus, seu rosto mudou, endurecendo como se fosse esculpido em mármore branco. Então se foi e observei as partículas amarelas de mana correrem pelas ranhuras entre as portas, teto e o chão.
Havia um banquinho de madeira próximo às portas, então me sentei. Minha mente não parava de voltar às figuras sem mana na sala. Tive meu próprio núcleo de mana por um período tão curto de tempo, mas ainda assim a ideia de perdê-lo me amedrontada e sem palavras. Descobrir que a mana existe, aprender como reestruturar o mundo físico com um pensamento, apenas para perder esse poder…
Os Alacryanos não conseguiriam entender. Até Agrona, até mesmo Nico…
Na Terra, aprendi desde cedo que, embora eu tivesse um centro do ki relativamente grande, esse poder nunca seria meu para exercer. Eu era a arma. Isso é o que eles pensaram que o Legado era.
Agrona não é diferente.
Pressionei a palma da mão na órbita do olho, afastando o pensamento irritante. Talvez fosse verdade que Agrona esperava que eu usasse minha força para ele, mas tinha me reencarnado sabendo que seria meu poder. Ele sabia o que eu realmente era. E queria me mostrar do que eu era capaz.
Eles estão constantemente escondendo coisas. Como agora mesmo. O que Nico está fazendo que ele não quer que você veja?
Depois que esse pensamento invadiu meu cérebro, não pude escapar. Estava tão curiosa para saber o que estava acontecendo dentro daquela sala quanto hesitante em entrar nela. Escutava atentamente, mas havia uma camada de mana de vento criando uma barreira de som ao redor da cela.
Ao me concentrar na mana, ela ondulou e o som de uma conversa abafada chegou aos meus ouvidos. Lembrei-me de ter nadado na academia, aprendido a focar meu ki em diferentes ambientes e como a água distorcia a voz de quem estava fora da piscina. Soou exatamente assim. Nadei perto da superfície metafórica e a voz ficou ainda mais clara. Atravessei a barreira do som e de repente podia ouvir Nico como se estivesse parado ao meu lado.
— …conte-me cada coisa que você lembra sobre ele. Não deixe de lado o menor detalhe.
A voz de Nico era profunda e oca, como se estivesse falando do fundo de um desfiladeiro.
Um coro de vozes grasnadas respondeu, cada uma mais desesperada para ser ouvida do que a outra.
— …cruel inteligência em seus olhos enquanto ele—
— …sentou como uma estátua, como se nunca temesse por um—
— …pode ser um sem adornos, porque nunca sentimos sua mana ou—
— …exercia uma pressão tão terrível—
— Parem. Parem!
Nico gritou. A cela ficou em silêncio.
— Se vocês continuarem gritando uns com os outros, vou queimar suas línguas para que apenas um possa falar. Recuei de sua ameaça horrível, mas disse a mim mesma que ele estava apenas fazendo o que tinha que fazer.
— Você, diga-me como este ascendente chamou sua atenção.
Houve alguns gemidos e gargantas limpas antes de uma voz fina e nasal responder.
— Um servo do Sangue Granbehl nos trouxe uma história estranha… de um ascendente sem laços de sangue, que parecia inexplicavelmente poderoso, e que não projetava nenhuma assinatura de mana.
O orador fez uma pausa, respirando pesadamente.
— Eles suspeitaram que o Ascendente Grey havia contrabandeado uma relíquia—
A voz sufocou quando pedra e ossos racharam. Podia sentir o peso da raiva de Nico através das portas protegidas.
Quando Nico falou novamente, sua voz estava tensa.
— Por que não fui informado do nome deste ascendente?
— E-estava no relatório que enviamos para Taegrin Caelum.
Disse a suprema juíza rapidamente, com a voz trêmula.
— Não faz nenhum sentido.
Nico falou baixinho, e ouvi passos suaves quando começou a andar.
De pé, me movi timidamente em direção às portas. Os ferrolhos de aço se retraíram quando me aproximei e as portas se abriram. Lá dentro, a suprema juíza encolheu-se contra a parede curva, mantendo a cabeça baixa. Nico andava de um lado para o outro na frente dos quatro prisioneiros restantes. O quinto, um homem com cavanhaque, foi empalado por três pontas pretas. Seu sangue corria em jatos escuros pelas pontas antes de se infiltrar nas rachaduras do chão.
— Ele está morto.
Disse Nico com firmeza. Girou sobre os calcanhares, recuando na direção oposta.
— Mas ele é como uma maldita barata. Se alguém pudesse sobreviver…
Girou novamente.
— Mesmo se ele tivesse sobrevivido, não poderia ter vindo para Alacrya sem que víssemos.
— Nico, o que—
Ele estalou os dedos e apontou para mim antes de continuar a falar consigo mesmo.
— Ele poderia ter encontrado um portal antigo, ainda ativo… mas mesmo ele não seria egocêntrico o suficiente para usar esse nome… como acender um sinal de fogo no escuro…
— Este é o homem que você ama?
Tremi quando a vertigem subiu pelo meu corpo, começando atrás dos meus olhos, então sacudindo em minhas entranhas. Agarrei seu pulso com uma mão trêmula.
— Nico, o que você fez?
Ele arrancou o braço do meu aperto, mostrando os dentes para mim como um animal.
— Cale-se!
Um monstro rugiu dentro de mim. A vontade da besta guardiã estava toda distorcida em uma fúria fervente. Era a besta engaiolada, gritando contra as correntes que a prendiam, mas também era a grama, as vinhas e as árvores que ocupariam o mundo quando os humanos o abandonassem. Isso me assustou, essa coisa selvagem dormindo dentro de mim. Era muito parecido com o meu ki na minha última vida: incontrolável, explosivo, implacável…
Tinha aprendido a tocar em todo tipo de mana. Mesmo os chamados desviantes, o uso dos quais parecia simples como bolas de neve no inverno…, mas Agrona havia me alertado para ficar longe da vontade da besta. Talvez um dia eu consiga domá-la, mas por enquanto…
A luz na sala assumiu o verde salpicado da floresta sob uma copa espessa, e uma única videira esmeralda enrolada em volta do meu braço alcançou Nico.
A fúria derreteu em seu rosto, deixando-o pálido e com um tom esverdeado. Ele tirou seu braço de mim como se tivesse se queimado.
— Cecil, você está bem? Sinto muito, estou…
Se afastando, passou as mãos pelo cabelo flácido.
A gavinha recuou e a luz voltou ao normal. Mas ainda podia sentir a vontade da besta vibrando de raiva.
— Estou bem.
Nico pigarreou e encarou os quatro prisioneiros. A velha desmaiou e o gordo vomitou no chão. Eles foram pegos desprotegidos entre a súbita onda de força de Nico e eu.
— Ele vai te machucar.
Isso não importa. O espírito de Nico foi despedaçado. Ele não era ele mesmo. Mas isso não significa que não poderia ser curado com o tempo.
— Como era esse ascendente?
Perguntou Nico, dirigindo-se ao prisioneiro central, um velho frágil.
— Cabelo loiro claro…
O velho disse asperamente.
— Olhos dourados, mais felinos do que humanos. Vinte anos de idade, talvez, com traços marcantes e orgulhosos…
Nico franziu a testa, seus olhos perdendo o foco enquanto tentava imaginar o misterioso ascendente.
— E régio
Acrescentou o velho.
— Ele se portava como a realeza… como um rei.
Nico zombou, um som vicioso que arranhou o ar.
— Como um rei, você disse?
O corpo de Nico entrou em erupção, sua raiva repentina não mais capaz de ser contida por mera carne e osso. Chamas negras o envolveram, saltando de seu corpo como cinzas quentes.
— Quem é um rei! — gritou.
— Temos apenas Soberanos aqui!
Podia ver a mana, enegrecida pela influência decadente dos basiliscos, agitando-se em um frenesi dentro da carne dos prisioneiros. Todos eles estavam queimando por dentro. Do lado de fora, eles se contorciam em tormento silencioso, a dor muito grande para até gritar.
Nico estava ofegando pesadamente e, a cada expiração, o ar ao seu redor parecia distorcer. A suprema juíza já havia recuado para fora da cela para evitar o fogo negro. Ela só podia assistir, incapaz de falar em defesa da justiça que afirmava representar.
— Velhos idiotas inúteis!
Nico gritou, sua voz falhando. A carne do velho começou a formar bolhas e rachar, e pequenas chamas negras saltaram das feridas enquanto o fogo da alma os devorava.
Não demorou muito.
— Isso não era necessário.
Disse, suave, mas firme. Eu não queria atrair a fúria de Nico, mas também não estava com medo.
— Eles não mereciam ser queimados por seu medo e raiva.
Nico fechou os olhos. Sua respiração desacelerou, e as chamas delineando-o como um halo mortal recuaram em sua carne e desapareceram.
— Eles não são ninguém. Eles são totalmente insignificantes.
Sua voz estava totalmente desprovida de emoção.
— Grey novamente…
Disse, minha voz quase um sussurro.
— Por que esse homem tem tanto poder sobre você que o mero nome dele pode causar uma reação tão forte? Quem é Grey?
Nico, de costas para mim, parecia encolher sobre si mesmo.
— Ele era nosso amigo…
Ele se virou e, por um momento, não vi o rosto do estranho que Nico exibia. Só vi seus olhos, avermelhados e brilhando com lágrimas. Conhecia a tristeza neles. Ele estava olhando para mim agora da mesma maneira que costumava olhar para mim, indefeso. Desesperado.
— E foi ele que assassinou você, Cecilia.
Tradução: Reapers Scans
Revisão: Reapers Scans
QC: Bravo
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