O Caçador Imortal de Classe SSS

O Caçador Imortal de Classe SSS – Cap. 33 – A Espada Escarlate (3)

 

Chovia.

Quando um inferno tentava queimar uma planície inteira, começava com um punhado de faíscas. Um dilúvio que podia afogar o mundo começava com algumas gotas d’água. Eu não podia dizer que era um inferno ou um dilúvio, mas tinha um punhado de faíscas e uma xícara de água em mim.

Um senhor idoso estava ousadamente sob a chuva. Ele inclinou a cabeça para mim. 

— Vamos lutar juntos, jovem.

O Espada do Luar, o Caçador Rank 1 e Comandante dos Cavaleiros Imperiais, agora estava ao meu lado.

Alguém chapinhava pelas poças – a única coisa que o laser do Rei Demônio deixou em seu caminho – trazendo risadas consigo.

— …Hahahaha! Desculpe o atraso! Teria vindo um pouco antes, mas não é fácil mover um exército!

Os reflexos nas poças me mostraram que a risada pertencia a um sacerdote de um braço só.

— Obrigado, Sr. Kim. Você nos deu tempo. Agora é minha vez. — O Inquisidor ajustou o chapéu com sua única mão.

Estava enevoado atrás dele, mas eu podia ouvir passos na chuva. Milhares de soldados do Império desviavam dos escombros e pulavam sobre buracos e poças.

Pessoas que não eram soldados também estavam com eles. Algumas nem usavam armadura. Muitas nem tinham elmos. Basicamente, não usavam nada para se proteger, mas marchavam mesmo assim.

— Todos, eu ordeno como Grande General… — O Inquisidor sorriu. Milhares de soldados e dezenas de milhares de cidadãos rugiram em resposta. — Abatam esses filhos da puta que ousaram mostrar os dentes contra o Império!

O Inquisidor, o Caçador Rank 4 e líder do Panteão, entrou na batalha.

— Pelo Império!

Chovia, as gotas se juntando num rio. As ondas intermináveis de monstros do Rei Demônio pararam. A maré alta veio e se foi, e as águas começaram a se afastar das ruínas dos portões. A maré da batalha virou.

— A Deusa está com a gente!

Chovia.

— Glória ao Império Aegim!

E chovia.

Ah.

Não sabia quando acabei correndo na frente. Eu era a primeira gota desse tsunami.

À minha esquerda, estava um refugiado de um país pequeno e remoto, empunhando uma lança. À minha direita, um fazendeiro, que outrora trabalhava nas terras de uma vila destruída no Império, balançando uma picareta. Quando olhei para trás, uma Caçadora brandia uma espada, seu equipamento não era melhor que o meu.

Todos continuavam falando, mas eu não conseguia entender. Talvez fosse a chuva. Ou os gritos das pessoas. Poderiam ser os urros dos monstros? Talvez porque meu tempo estava desacelerado. Ou porque eu estava brandindo minha espada? Podia ser porque eu, uma gota d’água, estava fluindo com eles.

Mais e mais longe. Eu tinha que ir mais longe até que o inferno queimasse tudo pela terra e o dilúvio alcançasse cada canto.

— …Ei.

Entre dezenas de milhares de vozes e centenas de milhões de gotas, uma tocou meu ombro e falou comigo. Ele usava um tapa-olho.

— Bom trabalho. Desculpe o atraso. Deveria ter vindo antes. Tsc! Tive que trazer os membros da minha guilda com a Guarda Imperial. Mas não se preocupe, vou te mostrar por que ela é chamada de Seita ODP…

O homem parou de falar. Por que parou? Ele só me olhou com seu único olho.

— Você não está escutando. É transe? Haha. Você é realmente diferente, né? Gosto de você, garoto. — Ele riu baixo. — Ei, meu nome é Rao Fan. Provavelmente não está me ouvindo, mas não importa… Você salvou minha vida antes na câmara de audiência. Como líder da Seita ODP, não posso deixar minha dívida sem pagar. Continue indo em frente. Não olhe para trás, vou cuidar dos inimigos à sua esquerda.

Ele pegou uma espada.

— Lembre, isso é serviço premium. Ninguém que ficou ao meu lado direito morreu.

Chovia e chovia.

— Vá, Estrela Ascendente. Estou te cobrindo.

Minha espada cavalgava a maré crescente.

— Desculpe o atraso! Estava ocupada procurando o Imperador. Encontrei ele, mas já havia se matado com veneno. Acho que usá-lo para reunir um exército não é uma opção. Desculpe mesmo. Não tenho desculpa.

— Tudo bem. Não vamos precisar de mais mão de obra. Você pode só se juntar a nós e lutar, Srta. Paladina.

— Claro. Hmm? O que está acontecendo com o Sr. Kim Gong-Ja…?

— Não o interrompa. Ele está curtindo um momento de ouro.

A chuva continuava.

— Ó miseráveis. Só porque vocês têm tempo, acham mesmo que ele pertence a vocês? Sim, a Deusa tem cuidado de vocês, mas o poder dela diminui. Não há mais deus no Império. No que vão confiar então? Em vocês mesmos? Conseguem provar isso?

O escárnio do Rei Demônio se misturava com a chuva.

— Tudo bem. Me mostrem.

Vi uma luz vermelha, mas muitas coisas estavam no meu caminho.

— Ei, Bruxa! Levante seus espelhos!

— Eu sei. Errei da primeira vez, mas não vou deixar acontecer de novo!

— Velho! Quando ela espalhar o feixe de laser, vamos cortá-lo!

— Posso fazer isso sozinho.

— Está vindo, pessoal!

A chuva continuava.

— …Dispersar.

Seis espelhos brilharam quando o feixe vermelho os atingiu. O primeiro, segundo e terceiro espelhos foram destruídos. No entanto, o quarto espelho resistiu e desviou todo o feixe de laser vermelho.

—  Espada do Luar! Viper!

Ouvi um suspiro e uma expiração. Entre eles, tanto o céu quanto o feixe de laser vermelho foram divididos como Moisés separando o Mar Vermelho.

Cinco vozes distintas continuavam a conversar.

— Viu? Viu! Meu auge está longe de acabar!

— Você podia colocar um pouco mais de peso nisso em vez de brincar.

— Agora é a chance de vocês! — Uma delas sussurrou no meu ouvido. — Vou te teleportar direto para o Rei Demônio. Todos, segurem em mim!

— Rápido! Tudo isso é em vão se o Rei Demônio invocar mais monstros de novo!

As cinco vozes se sobrepuseram e viraram uma. Alguém estendeu a mão para mim.

— Caçador Kim Gong-Ja.

A chuva escorria pelo rosto dela.

— Pega!

— Não temos muito tempo. Vamos!

A eternidade chegou ao fim. Eu podia ver as pessoas fazendo barulho. Onde eu estava, por que estava aqui… Cada memória voltou para mim.

Eu estava no centro de um campo de batalha. Os soldados e cidadãos do Império estavam empurrando a linha de monstros para trás. Mais Caçadores saíam da brecha, eles finalmente entenderam o que estava acontecendo no décimo segundo andar.

— Caçador Kim Gong-Ja.

Os Altos Rankers e eu estávamos na linha de frente, diante de uma massa inumerável de humanos. O feixe de laser vermelho do Rei Demônio também obliterou monstros, então era uma estrada vazia de onde estávamos até ele. Mais bestas viriam para encher o caminho, mas ainda não estavam lá.

— Vamos!

Os Altos Rankers estavam todos reunidos no mesmo lugar. Era meio ridículo, de certa forma. O Inquisidor estava nas costas do Viper, que segurava o braço do Espada do Luar com uma careta. O velho colocou a mão no ombro da Paladina com uma expressão ainda mais feia. A Paladina, indiferente, segurava a mão esquerda da Bruxa Negra.

…Se eu tirasse uma foto e postasse online, viralizaria na hora, pensei, assim que vi. Certamente não era algo que se via todo dia.

Enquanto eu me perdia num pensamento idiota, a Bruxa Negra gritou: 

— Vou te deixar aqui sozinho se não pegar minha mão agora!

Ela estava estendendo a mão direita.

Ahh.

Percebi que o que eu estava vendo ia desaparecer logo.

Quando o Espada do Luar e eu tivemos uma discussão acalorada, ele embainhou a espada só depois da persuasão sincera da Paladina. Ele se curvou para mim para se desculpar, mas o Inquisidor assassinou brutalmente três Caçadores depois.

Nós lutamos uns contra os outros, paramos de lutar e agora estávamos lutando juntos.

Tudo vai desaparecer.

Todos eles iam desvanecer como a chuva.

Eles não vão lembrar de nada.

No entanto, tudo bem.

— O que tá fazendo, parceiro? Temos que ir derrubar o chefão.

Mesmo que eles não lembrassem de nada do que aconteceu, isso não significava que fosse sem sentido. Eu tinha minha espada. E, neste andar, havia um homem que morreu no primeiro andar e outro que morreu no nonagésimo nono. Ninguém lembrava de suas mortes, mas estávamos aqui mesmo assim.

— …Certo.

Quando eu regredisse, todos os problemas estariam sem solução. O Espada do Luar ia desconfiar de mim. Quando chegasse a hora de escolher as recompensas, os Caçadores se voltariam uns contra os outros de novo.

— Vamos.

No entanto, eu estava um pouco mais forte. Não ia deixar pessoas inocentes morrerem. Nem ia deixar a Condessa ser morta e cortar a conexão da Torre com o mundo exterior. Agora eu tinha uma ideia de quem era o traidor, então estava confiante de que podia fazer um pouco melhor.

— Bom! — A Bruxa Negra segurou minha mão com força. — Teleporte!

Atravessamos o campo de batalha e mergulhamos pelo ar. Cinco de nós aterrissamos simultaneamente na frente do Rei Demônio, que estava orgulhoso com uma espada na mão.

— Que divertido. Os heróis da Deusa estão aqui.

O Rei Demônio era escuro. Era como uma sombra tomando a forma de um humano. Tinha uma cabeça, mas não um rosto, braços e pernas, mas não mãos e pés. Ele não parecia estar de pé no chão – parecia precariamente plantado, como se estivesse desmoronando onde estava.

O Rei Demônio estava realmente desmoronando, sua pele pingava como aquele lodo de esgoto. No entanto, novo lodo surgia de dentro dele enquanto pingava.

O mestre dos pesadelos. A sombra em movimento e eternamente apodrecendo. Esse era o Rei Demônio.

— Heróis, vocês sabem que têm um traidor entre vocês? Tenho certeza que sim. Mesmo assim, tentam tecer sua confiança despedaçada e transformá-la em armadura. Acham mesmo que vai funcionar?

Eu realmente não via motivo para ouví-lo. Segurei minha espada e saltei para frente.

— Sr. Kim! — gritou a Paladina, chocada. — Não! Espere! Você não pode ir sozinho! Precisamos trabalhar juntos…

Desculpe. Te vejo na próxima vida. Você não vai lembrar do que aconteceu hoje.

— Você está aqui para me matar, herói? — O Rei Demônio me viu avançar sozinho e riu.

Sua risada era bizarra. Como não tinha olhos ou boca, ela parecia vir de sua pele. Sempre que uma faixa de sombra pingava de sua massa, uma explosão de risada surgia.

— Você é um tolo. — O Rei Demônio brandiu sua espada.

Era impossível para mim bloquear o ataque no meu nível atual, então nem me dei ao trabalho de erguer minha espada sagrada e fingir que ia bloquear. Em vez disso, levantei educadamente o dedo do meio bem antes que a lâmina cortasse meu pescoço.

— Não, vim aqui para ser morto por você, seu filho da puta. Te vejo na próxima vida também.

Foi breve, mas não perdi a risada do Rei Demônio parando abruptamente.

— …! Wa…!

Logo, não conseguia ouvir nada. Minha visão, a dor… meus sentidos começaram a desvanecer enquanto eu perdia a consciência. No entanto, podia sentir a chuva pingando no meu rosto até o fim.

[Você morreu.]

[Foi determinado que sua morte atendeu ao requisito para ativação da Habilidade.]

[Duplicando as Habilidades do Monstro: Rei Demônio da Chuva de Outono aleatoriamente.]

[Criando Cartas de Habilidade.] 

Era hora do segundo round.

 


 

Tradução: Rlc

Revisão: Pride

 

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Rlc

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