O Caçador Imortal de Classe SSS – Cap. 169 – Entre um Mestre e um Amigo (2)

 

Olhei para o Inquisidor em completo silêncio. Ficava claro, apenas pelo seu sorriso, que ele não usava a palavra “mestre” como uma simples metáfora ou símbolo. Esse homem, que às vezes era tão imaturo quanto uma criança, não sabia fazer piadas.

Ainda assim, não pude evitar de perguntar: 

— Só para esclarecer, senhor Inquisidor, quando você diz que vai me servir, quer dizer…

— Vou obedecer suas ordens incondicionalmente — respondeu o Inquisidor imediatamente. — Vou matar o inimigo que você me mandar matar e salvar o inimigo que me pedir para salvar! Como eu disse, colocarei seu julgamento acima do meu e agirei de acordo.

O Inquisidor levantou a mão direita e a colocou sobre o peito com uma atitude disciplinada, como se estivesse imitando um mordomo.

— Sou uma ferramenta bastante útil! A beleza de uma boa ferramenta é seu desempenho consistente. Não estou me gabando, mas provavelmente não há ferramenta mais útil do que eu quando se trata de eliminar senhores da guerra e manter nossos Caçadores unidos! Senhor Rei da Morte, você pode sempre confiar nas minhas habilidades quando me der ordens!

Em outras palavras, o Inquisidor estava dizendo que nunca mudaria. Ele sorriu radiante para mim.

— Por favor, me use! 

Ver sua confiança em sua própria imutabilidade fez meu coração formigar por algum motivo. Eu sabia como o Inquisidor poderia ser se mudasse.

“Com emoções, parece que me tornei um pouco brincalhão!”

“É assim que estou viciado em sentir emoções.”

“Vocês sempre vivem com tantas emoções assim?”

Eu sozinho lembrava de um lado dele que nem o próprio Inquisidor chegou a vivenciar.

Sob a magnólia branca, o Inquisidor havia murmurado baixinho: 

“Fico pensando no que teria mudado se eu tivesse feito algo diferente naquela época. Vocês todos ficam vagando nesses tipos de pensamentos enquanto vivem? É por isso que todos vocês são tão bonitos e adoráveis. Se eu fosse como vocês…”

O Inquisidor não conseguiu terminar sua frase naquela ocasião, mas eu podia adivinhar as palavras que ele engoliu.

“Se eu fosse como vocês e pudesse sentir emoções como vocês, será que eu teria vivido uma vida um pouco diferente?”

Eu sabia disso porque conheci muitos psicopatas. A diferença entre psicopatas e uma pessoa normal poderia ser resumida em cinco palavras.

Se eu fosse como vocês.

A partir do momento em que ele pronunciou essas palavras, o Inquisidor deixou de ser apenas um psicopata para mim. Ele era apenas um homem normal que, de alguma forma, acabou vivendo a vida de um psicopata hoje.

— Seu nome. — Eu disse.

— Perdão?

— O nome verdadeiro do senhor Espada do Luar é Marcus Carlenbery, e o do senhor Viper é Rao Fan.

E o nome verdadeiro da Condessa era Nisha. A Paladina uma vez chamou a Condessa pelo seu nome verdadeiro. No entanto, como a Condessa nunca me contou isso diretamente, fingi não saber. Os únicos colegas que me contaram seus nomes verdadeiros foram o Espada do Luar e Viper.

— Senhor Inquisidor, gostaria de saber seu nome.

O Inquisidor piscou. 

— Haha. Isso é uma ordem?

— Se isso for apenas um pedido, significa que você não pode me contar seu nome?

— Mais ou menos!

— Por quê?

— Eu – não nós fizemos uma promessa com a Mestra do Dragão Negro há muito tempo. “Abandonamos nossas nacionalidades, riquezas, relacionamentos e tudo mais no Mar Morto. Então, vamos apagar os rótulos que o mundo exterior colocou em nós e usar apenas os nomes que recebemos da Torre ao nos chamarmos.”

Entendi. Não sabia que havia tal promessa entre eles.

Fui lembrado mais uma vez de que não era um membro inicial da Torre.

— A Mestra do Dragão Negro tem sentimentos mistos sobre o mundo exterior! Embora ela o despreze, anseia por reconhecimento dele. Hahaha. Ela provavelmente é a pessoa mais emocional entre nós!

O Inquisidor piscou.

— De qualquer forma, o Espada do Luar se retirou da nossa união, então ele não precisa estar vinculado à promessa! Além disso, Viper não é o tipo de pessoa que se deixa prender por uma promessa dessas em primeiro lugar. No entanto, eu valorizo promessas. Senhor Rei da Morte, se você realmente quer saber o nome que eu tinha no mundo exterior… — O Inquisidor fechou os olhos. — Por favor, me ordene. Se você fizer isso, eu direi.

Eu podia perceber que isso não era apenas uma questão de me contar seu nome. Significava que ele priorizaria minhas ordens acima da promessa que compartilhava com os membros iniciais da Torre. Era sua maneira de jurar lealdade a mim.

Serei capaz de assumir a responsabilidade por ele? Posso ajudá-lo a viver uma vida diferente? Posso assumir a responsabilidade por um psicopata que é muito mais do que apenas um psicopata? Quero que ele viva de maneira diferente, então estou disposto a tentar, mas eu tenho o que é preciso?

Olhei para o Inquisidor, que aguardava minha decisão.

Na História da Academia Sormwin, houve uma oportunidade para reformá-lo, mas falhei porque perdi minha chance. Eu estava fazendo tudo o que podia para ajudar Raviel, então não tinha tempo para cuidar dele também.

Me perguntei se poderia proporcionar uma vida diferente para o Inquisidor se me fosse dada apenas mais uma chance.

Eu posso fazer isso.

Eu tinha minha resposta.

Quero fazer isso por ele.

A segunda chance ainda não havia chegado. Até que outra oportunidade surgisse, eu assumiria a responsabilidade pelo homem à minha frente.

— Por favor, me diga seu nome — disse com um aceno de cabeça.

O Inquisidor sorriu e então riu levemente. 

— Meu nome verdadeiro é Bambolina. Estritamente falando, é difícil dizer que é meu nome verdadeiro porque é mais um apelido. Uma família mafiosa me criou quando eu era criança. Eles frequentemente me chamavam de “bebê boneca”, e isso ficou como meu nome. Ah, “bambolina” significa boneca! Também fui chamado de “Kukla”.¹O raw é кукла (Kukla), que significa “boneca” em russo.

Após uma breve pausa, o Inquisidor continuou: 

— A família mafiosa que me prendeu tinha sua sede na Bulgária, com sua organização tendo conexões com muitos campos diferentes. Fui treinado para ser usado em seus muitos negócios.

— Você está usando o passado para falar da organização porque…

— Porque ela não existe mais! — O Inquisidor sorriu brilhantemente e tirou um cadeado, girando como se fosse uma caneta. — Fui preso por onze anos. Após meu treinamento habitual, deitei na cama apenas para me deparar com uma pergunta. Eu podia forçar a fechadura daquela porta, então havia algum motivo para não fazer isso?

Click.

O cadeado na mão do Inquisidor abriu.

— Pensei sobre isso e percebi que não tinha nenhum!

Foi por isso que ele escapou.

— Não parecia haver motivo para não matar meu vigia. Também não havia motivo para não matar meu chefe!

Havia pessoas que não faziam coisas sem motivo, mas algumas cometiam atos porque não tinham motivo para não prosseguir e fazê-los. O Inquisidor era definitivamente o último.

— Semeei discórdia entre dois capos principais e quatro menores. Manipulei alguns caras aqui e ali, o suficiente para que começassem a suspeitar uns dos outros. Após meio ano, a família começou a suspeitar de mim, mas, naquela altura, metade dela já estava destruída! Haha!

Depois disso, a bebê boneca da máfia entrou na Torre com passos tranquilos. Foi assim que a Torre ganhou uma fera terrivelmente capaz.

— De todas as pessoas, por que você me quer como seu mestre?

— Primeiro, você é obviamente mais capaz do que eu. — O Inquisidor fez uma pausa antes de adicionar: — O segundo motivo é… que eu hesitei.

— Você hesitou?

O Inquisidor franziu as sobrancelhas como se estivesse sem palavras, o que era incomum para ele. 

— Uhm, sim… Como devo explicar para você entender? Após concluir A História da Academia Sormwinme me senti um pouco… estranho. Mesmo que tentasse executar terroristas como de costume, não conseguia fazer isso tão rápido quanto antes. Para os outros, a diferença era de apenas um segundo, mas esse segundo é estranho para mim…

O Inquisidor estava imerso em pensamentos. 

— Nesse curto período, lembrei do tempo que passei na Academia Sormwin com você, senhor Rei da Morte. Estranho, não é?

Não, não era estranho de forma alguma. Na verdade, eu estava surpreso.

Deixou um efeito nele.

A linha do tempo em que o Inquisidor havia se imerso completamente como Taça Dourada desapareceu. No entanto, mesmo na história oficial que comecei de novo, ele sentiu as emoções de Taça Dourada, mesmo que o nível de imersão fosse inferior a 10% – não, mesmo quando era apenas 1%.

A bebê boneca havia experimentado emoções.

— Senhor Rei da Morte, você é minha hesitação — disse o Inquisidor. — Por um segundo da minha vida, experimentei emoções. Talvez você me ajude a alcançá-las uma segunda vez. Talvez, um dia, eu consiga experimentar emoções por um minuto, ou até mesmo por uma hora inteira!

Seu sorriso brilhante ainda não havia desaparecido.

— Isso é provavelmente o que chamamos de esperança para a humanidade. Talvez as pessoas estejam sempre esperando que outra pessoa se torne parte de suas vidas. Nesse sentido, você é minha esperança! Acredito que não sou mais fraco apenas porque ofereço meu tempo a você. Sim, posso ter certeza disso.

O Inquisidor me entregou um cadeado velho e enferrujado. 

— Seu ritmo e suas letras serão adicionados à minha canção monótona e zumbida. Embora eu esteja tentando entender tudo isso por meio de metáforas. Por sua causa, até uma pessoa como eu pode se tornar música, senhor Rei da Morte. Posso fazer de você minha esperança?

Essas palavras carregavam um peso enorme. Havia uma ligeira diferença entre peso e medo, então havia a possibilidade de eu acabar temendo carregar a vida do Inquisidor. Peguei o cadeado de suas mãos.

Pensei na vida de Preta, depois nas vidas dos seguidores do Culto do Demônio Celestial, Sylvia Evanail e o Assassino de Constelações. Meus pensamentos alcançaram os Terras. Quando cheguei lá, pensei que poderia adicionar mais uma vida.

— Sim, serei sua esperança — respondi.

O Inquisidor era meu colega. Não importava que ele fosse como uma fera. Por natureza, os humanos eram feras que buscavam humanidade. O homem à minha frente e eu estávamos no caminho para nos tornarmos humanos.

Comecei a listar ordens. 

— Não mate ninguém sem minha permissão.

— Certo!

— Não torture ninguém sem minha permissão.

— Entendido!

— Por favor, não prenda ninguém sem minha permissão.

— Tudo bem!

— Por favor, me diga quando algo te preocupar. Não vou te desprezar ou achar estranho, apenas me diga o que está em sua mente. Vou me colocar no seu lugar, Bambolina, então, por favor, pense em mim como alguém que se assemelha a você.

O Inquisidor juntou as mãos. Pela primeira vez, senti que ele estava genuinamente orando. O Inquisidor – o Mestre do Panteão, o Caçador Rank 4, a bebê boneca – jurou sua lealdade a mim.

— Sim, Mais Capaz. Agora que você é minha esperança, farei o meu melhor por você. Fui eliminado neste cenário, então não posso te seguir até o trigésimo terceiro andar. Este momento, também, é nada mais do que um arranjo temporário que fiz ao pedir à Princesa Caminhante de Miragens. Vou partir em breve. Quando voltar para Babilônia, terei suas ordens em mente!

Acariciei a cabeça do Inquisidor. 

— Sim, por favor, proteja nosso lar, senhor Líder do Culto.

— Hahaha. Sim, senhor Gong-Ja! 

Rindo, o Inquisidor desapareceu lentamente.

[O Inquisidor falhou em completar a missão.]

[O Inquisidor foi eliminado do cenário!]

No momento seguinte, meus outros colegas apareceram ao meu redor – Espada do Luar, Bruxa Negra, Condessa, Viper e Paladina. Agora, apenas seis de nós restavam para concluir os cenários.

Eles se entreolharam confusos.

— Por algum motivo, acabamos esperando um pouco mesmo depois de dizer que concluímos o cenário — disse a Bruxa Negra. — Rei da Morte, você foi o primeiro a concluí-lo. Onde esteve?

Eu sorri. 

— Estava apenas me despedindo do Inquisidor.

O caminho que trilhamos nunca foi sem sentido. Mesmo que não soubéssemos, havia pessoas lá fora no mundo que influenciamos sem saber.

Apertei o cadeado com força. 

— Bom trabalho, todos. Vamos para o próximo cenário.