Metade da vida de Juliette foi marcada pelo desespero. Ela nasceu de um casal de anões e literalmente recebeu o nome: “A filha de Bazar do Santo Aço e Lilitella da Bela Montanha de Neve”. No costume dos anões, as crianças não recebiam nomes até que atingissem sete anos de idade, então não havia nada de estranho em ela não ter um. Naquela época, os pais de Juliette se referiam a ela como “nosso bebê” ou “nossa amada garota”, e ela não achava nada estranho.
Mas chega disso. Vamos falar sobre Bazar e Lilitella. Eles eram um pouco diferentes dos outros anões. A maioria dos anões vivia no Continente Millis, na parte sul da Grande Floresta ao longo do sopé das montanhas. Eles gastavam seu tempo extraindo minério e usando-o para fabricar armas, que eram usadas para caçar ou vendidas para comprar comida. Eram uma raça bastante simples nesse aspecto.
Os pais de Julie, no entanto, fizeram o seu caminho viajando pelo mundo e fabricando armas e adornos em cada região que visitaram, usando qualquer material que encontraram. Julie não sabia a razão pela qual decidiram deixar sua terra natal para se tornarem nômades. Talvez tivessem uma boa razão, ou talvez fosse apenas uma indulgência juvenil que os levou a se aventurar longe de seu país de origem.
Qualquer que fosse o caso, uma coisa era evidente: a vida que escolheram não era fácil. Pior, já estavam à beira da falência quando Julie nasceu. Se endividaram ainda mais pagando os débitos que tinham, e por mais que trabalhassem, não estavam ganhando o suficiente para acompanhar os juros. Sua dívida só aumentou e aumentou.
Não faltava talento artesanal de seus pais, eles simplesmente não tinham perspicácia comercial ou a visão de fazer uso adequado de seus talentos. Pensaram que, se fizessem um produto de boa qualidade, as pessoas estariam dispostas a comprá-lo, e foi por isso que fizeram empréstimos para materiais de alta qualidade, muito além de seus meios, e tentaram vender os produtos. A questão era que pouquíssimas pessoas paravam em uma loja de beira de estrada para comprar algo tão exorbitante. Levou muito tempo para o casal vender seus produtos, e se afundaram cada vez mais no vermelho, graças aos juros sobre as dívidas. Quando tiveram sorte para desafogar, lembraram das despesas de subsistência, e então voltaram a ficar no vermelho.
Foi honestamente impressionante como os dois conseguiram viver assim por tantos anos. Só conseguiram porque descobriram como ser autossuficientes. Às vezes, até recorriam a meios astutos para se manterem por cima, como inadimplir dívidas menores, fugindo da cidade para o próximo país. Por vários anos, o casal estava desesperado para ganhar a vida juntos, e definitivamente não havia nada de agradável nisso para eles.
A lembrança mais antiga de Julie era dela deitada na cama e vendo seus pais curvados, de costas para ela enquanto trabalhavam na elaboração de algo. Suas testas estavam quase pressionadas enquanto mexiam com algo em suas mãos. Uma brisa fresca entrou por uma fresta no quarto e acariciou a bochecha de Julie. Ela chorou, e Lilitella sorriu relutantemente enquanto se apressava e embalava a filha nos braços, tentando confortá-la.
A aparência deles estava gravada na mente de Julie mesmo agora, as lágrimas ameaçando aparecer nos olhos de Lilitella, e o olhar sombrio e culpado no rosto de Bazar. Julie não conseguia se lembrar de tê-los visto sorrir, não de verdade.
Alguns anos depois, seus pais finalmente desmoronaram sob suas dívidas. Haviam deixado de pagar tantas dívidas que os agiotas começaram a colocá-los em listas negras, tornando impossível pedir mais dinheiro emprestado. Sem os meios para comprar os materiais de que precisavam, não tinham como ganhar a vida, pois era inverno nos Territórios Nortenhos naquele momento.
Suas únicas escolhas eram morrer como uma família ou encontrar uma maneira de viver como escravos. Sem outras opções melhores, escolheram a última.
Apesar das circunstâncias difíceis, Bazar e Lilitella provavelmente foram mais afortunados do que a maioria. Os anões possuem constituições fortes e, como Bazar era um ferreiro tão habilidoso, encontrou um comprador rapidamente. Lilitella não ficou muito tempo em espera; ela era habilidosa com as mãos, podia criar belos adornos e consertar vários objetos e roupas, e tinha experiência em cuidar de crianças. Nenhum deles morreria, mesmo que fossem separados um do outro. Ainda havia pessoas por aí que precisavam de suas habilidades.
Exceto Julie, claro, que era a mais infeliz de sua família. Ela era muito jovem para ser de muita utilidade. Mal conseguia falar. Não atendia as necessidades de ninguém e, portanto, não havia compradores para levá-la. Dia após dia, ficava em um canto do mercado de escravos, olhando para os pés. Até os traficantes de escravos estavam cada vez mais preocupados com o que fazer com ela. Os escravos ainda eram pessoas como qualquer outra, o que significava que tinham que alimentá-los, dar-lhes um lugar quente para dormir e garantir que permanecessem saudáveis.
A única coisa de sorte foi que Bazar e sua esposa conseguiram se vender ao escravista Febrito, que era um dos maiores do comércio. Ele tinha garantido para si um lugar de destaque no mercado, e tinha uma reputação de ter mercadoria de qualidade. Foi por isso que mantiveram Julie e cuidaram dela, mesmo que não tivesse conseguido atrair nenhum comprador, em vez de abandoná-la na beira de alguma estrada.
Mas foi aí que a sorte dela acabou. Mesmo Febrito não se dava ao luxo de se importar com o que considerava mercadoria defeituosa em seu armazém. Seu tratamento com Julie foi gradualmente ficando mais desleixado, até que desistiu de arrastá-la para a área de vendas.
Apesar de ser jovem, Julie sabia que ninguém precisava dela. E também sabia que seus pais a haviam abandonado. Pior, sabia que provavelmente sofreria com o frio e a fome naquela jaula até que o doce abraço da morte finalmente a tomasse.
Julie não estava particularmente incomodada com a ideia de sua vida acabar. Nenhuma de suas memórias era boa. Ela nasceu na pobreza e passou a vida toda na miséria. Suas refeições consistiam em sopas com erva amarga e carne velha à beira da podridão. Ela tentou ao máximo não atrapalhar os pais, vagando pelos cantos e se afastando o tempo todo. Cada dia era tão insípido e sem sentido quanto o anterior. A única memória boa que tinha, era de uma época em que seus pais conseguiram vender uma de suas obras por um valor decente. Seu pai a deixou tomar um gole de álcool na época. Era um grogue atroz, misturado com todos os tipos de coisas. Mas como uma anã provando licor pela primeira vez, Julie achou absolutamente delicioso.
Ela não tinha desejo de viver. Não sonhava em encontrar felicidade para si mesma. Não fazia ideia de como isso poderia acontecer. Foi por isso que, quando aqueles dois homens apareceram diante dela, não conseguia imaginar nada de bom vindo disso. Na verdade, estava certa de que algo novo e terrível estava por vir.
— Você não quer mais viver? — perguntou um dos homens.
Sim, é exatamente isso, ela pensou na época. Eu quero morrer.
— Se as coisas estão ruins assim, devo acabar com tudo para você?
Uma parte dela se sentiu aliviada. Finalmente, estará tudo acabado. Sem mais frio, sem mais fome. Sua vida sombria chegaria ao fim.
O homem que lhe fez essa pergunta estava inexpressivo. Ele era tão ilegível que ela teve a impressão de que ele realmente faria isso, que se ela assentisse, ele tiraria sua vida com a mesma facilidade e rapidez com que respirava. Seus olhos estavam sérios demais para ser uma piada. Mas quanto mais ela o estudava, mais algo estranho borbulhava dentro dela. Era quase como se ele estivesse na verdade tentando dizer: “Você ainda tem vida suficiente para tentar mais uma vez, não é?”
Claro, se ele realmente dissesse isso, ela provavelmente teria balançado a cabeça e insistido que não poderia continuar. Mas ele não disse uma palavra, olhando silenciosamente para ela.
Não era como se Julie não considerasse isso uma opção. As seguintes palavras simplesmente passaram por seus lábios sem qualquer convite.
— Eu não quero morrer.
Nada em suas memórias a fazia querer viver ativamente, mas não era como se realmente quisesse morrer.
Isso mesmo… Eu não quero morrer.
Depois que lavaram seu corpo de toda a sujeira, colocaram-na em roupas caras como nunca havia usado antes e alimentaram-na com a comida mais deliciosa que tinha comido em toda a sua vida, finalmente disseram…
— A partir de hoje, seu nome será Juliette.
Deram-lhe um nome. Ouvindo isso, ela sorriu. Julie nem sabia por que tinha feito isso, mas fez.
Foi só depois, após refletir sobre, que percebeu: naquele momento, ela finalmente sentiu que toda a miséria que experimentou em sua vida havia chegado ao fim. Seu sorriso então deve ter sido de alívio… ou assim pensou.
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A vida como escrava era muito diferente do que ela imaginava. Com certeza, sua imaginação era limitada devido à sua pouca experiência de vida, mas ela ouviu como os outros escravos na senzala lamentavam de tudo o que acontecia com eles. Ela naturalmente esperava que seu desespero continuasse.
Passou seus dias cuidando de Zanoba e aprendendo magia da terra para que pudesse conjurar e criar estatuetas. Havia tantas coisas que precisava se lembrar, tantas ordens choviam sobre ela, e se não cumprisse as regras e as promessas que fizera, ficariam com raiva dela. Era um trabalho duro para alguém tão jovem. E não ajudava o fato de ela ser uma escrava na universidade; os outros alunos a tratavam mal quando Zanoba não estava vendo.
Mesmo assim, ela experimentou coisas piores antes de ser vendida como escrava. A mantinham alimentada, a deixavam usar água morna para os banhos e davam um lugar aconchegante para dormir. Mais importante ainda, seu mestre, Zanoba, era incrivelmente gentil. Ele poderia ficar com raiva, mas nunca gritou com ela. Sempre foi extremamente paciente e se mostrou absolutamente claro ao se comunicar com ela, apesar de não compartilharem uma língua comum no início.
— Você não me pertence — dizia ele. — Você é escrava do meu mestre.
Essa foi uma frase que ele repetiu nos primeiros meses em que ela morou com ele. Honestamente, ele provavelmente acreditava. Para ele, Julie estava simplesmente sendo emprestada. Era por isso que era tão educado com ela, não como seria com um convidado, talvez, mas mais como seria com um servo ou criada. Julie, por ela mesma, era uma nada sem esperança e não podia fazer nada, mas Zanoba nunca a desprezou por isso; ensinou tudo o que ela sabia. Como limpar, como cuidar de estatuetas e bonecas, como lavar roupas, como manter as bonecas e estatuetas organizadas, como dobrar roupas, boas maneiras à mesa, como lavar estatuetas e bonecas. Zanoba era muito independente, apesar de ser da realeza. Graças a isso, Julie aprendeu a cuidar dele em pouco tempo.
Então teve que aprender a linguagem e as habilidades para seu ofício. Rudeus foi o principal responsável por ensiná-la isso, e nunca perdeu a paciência com ela. Mesmo quando ela lutava para reter o vocabulário ou a gramática e se encolhia com medo de sua reprovação, ele mantinha a voz calma e gentilmente tentava descobrir o que estava lhe causando dificuldade. Ele era rigoroso à sua maneira, no entanto, fazendo-a repetir a mesma coisa por dias até que finalmente ficasse boa.
Para ser franco, Julie não gostava muito de Rudeus no início. Em parte, porque ele se parecia com o vilão de um conto de fadas que seus pais lhe contaram quando era mais jovem, mas em parte porque suas palavras de quando se conheceram deixaram um impacto muito duradouro. Ela sabia que ele poderia acabar com tudo num piscar de olhos. Se lhe conviesse, poderia arrancá-la da vida com a qual ela se acostumou. Esse pensamento tornava difícil ela relaxar ao redor dele.
Felizmente, esse sentimento logo desapareceu. Rudeus não fez nada com ela, mesmo quando não conseguiu atender às expectativas dele. Na verdade, até mesmo mostrou grande consideração e sorriu para ela. Qualquer ansiedade que ela sentia gradualmente recuou até que estivesse totalmente confortável ao seu redor.
Zanoba também foi provavelmente responsável por isso. Ele sempre fazia refeições com ela, dormia por perto, e sempre que ela ficava doente, ferida ou mesmo se sentindo um pouco desconfortável, ele imediatamente corria para buscar Rudeus ou um curandeiro. Quando ela teve sua primeira menstruação outro dia, ele tentou o seu melhor para estar lá para ela, mesmo que não fizesse ideia do que estava fazendo. Em pânico e em aflição, completamente perdido, Zanoba até mesmo a tratou como se fosse sua irmãzinha.
Julie realmente não tinha ideia se ele tinha irmãos ou, se tinha, que tipo de pessoas eram. Zanoba nunca falou com ela sobre sua família. Por outro lado, falava diariamente sobre quaisquer estatuetas ou bonecas que tivesse visto no mercado, ou sobre aquelas que tinha em sua posse. E sempre parecia genuinamente feliz quando o fazia. Talvez nunca tivesse tido alguém com quem compartilhar seu hobby antes, mas também era natural que alguém gostasse de falar sobre suas paixões. Julie imaginou que a razão pela qual ele não falava de sua casa ou família era porque não era uma conversa agradável para ele. Ela sentia o mesmo; realmente não queria se lembrar de como era sua vida antes de se tornar uma escrava.
Zanoba passava todas as noites, e às vezes as tardes, tagarelando sobre bonecas e estatuetas. Ele tinha uma grande variedade de conhecimentos em uma variedade de campos, todos precisos. Graças a ele, ela gradualmente tornou-se mais instruída. Toda vez que ela exibia as habilidades ou conhecimentos que aprendera, Zanoba ficava satisfeito e a elogiava, o que a deixava ainda mais ansiosa para estudar.
Ginger era rigorosa com Julie quando ela chegou, particularmente quando se tratava de etiqueta, roupas e maneira de falar. A vida de Julie realmente não mudou muito, apesar disso, especialmente porque Ginger não a tratava como uma escrava; a considerava uma colega servindo Zanoba.
Com o passar dos dias, Julie encontrou algo precioso para si: fazer estatuetas. Certamente não era um trabalho que ela tinha desejado antes de sua escravização. Era apenas algo que havia começado porque, como escrava, seu mestre havia ordenado que o fizesse. Mas se fosse honesta consigo mesma, era muito divertido.
Zanoba era francamente terrível quando se tratava do aspecto artesanal das estatuetas, mas a ensinava tudo o que podia e fornecia ferramentas adequadas. Foi assim que ela lentamente desenvolveu seu conjunto de habilidades, uma nova técnica de cada vez. Quanto mais melhorava, melhor conseguia fazer as coisas, exatamente como imaginava em sua cabeça.
Zanoba ficava incrivelmente encantado sempre que ela completava um trabalho, mas em ocasiões em que ela se destacava, ele não a banhava com meros elogios, mas permitia que também bebesse álcool refinado. Como anã, o álcool era como o néctar da vida. Aquecia todo o seu corpo e fazia seu coração se sentir leve e arejado. Isso fez com que as memórias sombrias de sua primeira infância ficassem escuras o suficiente para que pudesse realmente aproveitar o quão agradável era o momento presente. Esses sentimentos se transformaram na energia que precisava para continuar trabalhando duro todos os dias e forneceram a motivação para começar uma nova estatueta.
Foi um grande prazer para Julie sentir suas habilidades melhorarem e ver suas criações trazerem tanta alegria para outra pessoa. Foi a primeira vez que experimentou tal coisa, e isso a ajudou a se dedicar à criação de estatuetas. Ela dedicou todo o seu esforço em fazer estatuetas para mostrar a Zanoba. Ele normalmente ficava muito feliz, embora às vezes oferecesse críticas rigorosas. Quando isso acontecia, ela fazia a próxima com maior cuidado, criando maneiras de melhorar com seus fracassos passados. Às vezes, o produto final seria um pouco melhor e às vezes seria um pouco pior.
Assim passaram os dias, repetidamente. A vida de Julie era pacífica e agradável, e ela estava grata a Rudeus e Zanoba por fornecerem isso. Rezou sinceramente para que pudesse continuar a estar com eles para sempre, fazendo suas estatuetas. Em algum momento, fazer aquelas estatuetas se transformou em sua própria identidade.
Em um dia comum entre os muitos felizes que passou em Sharia, Julie terminou uma estatueta como sempre fazia. No entanto, esta era um pouco diferente, nada dramático, é claro, apenas uma pequena diferença. Naturalmente, a fez usando as mesmas técnicas que usou nas outras. Ela conjurou a base da estatueta com magia da terra e esculpiu o excesso até que ficasse de um tamanho uniforme. Então usou sua faca para aperfeiçoar a forma, enquanto sua magia cuidava de polir o resto. Esse era o seu processo regular.
Desta vez, no entanto, notou que algo estava estranho quando terminou. Ou melhor, não havia nada de errado com a estatueta. Foi exatamente isso que a incomodou. A estatueta era praticamente perfeita. Suas habilidades ainda estavam apenas no nível intermediário, então normalmente erraria em algo no processo. Era natural; essas estatuetas não eram em tamanho real, mas miniaturas que não mantinham as proporções exatas ou a anatomia. E, no entanto, esta não tinha nenhuma dessas falhas esperadas. Estava bem equilibrada, os braços e as pernas tinham curvas naturais, a superfície estava limpa e bem polida, e até mesmo os detalhes mais intrincados foram cuidadosamente ajustados à perfeição.
O mais importante, poderia dizer com um único olhar superficial que a estatueta era linda. Julie não tinha ideia do que em particular causou isso, mas se lembrou dessa sensação peculiar. Quando Zanoba mostrou a ela as estatuetas que ele mantinha cuidadosamente guardadas no fundo de sua área de armazenamento do dormitório, ela sentiu algo semelhante. Simplificando, eram obras-primas.
Quando Julie percebeu o que estava sentindo, algo indescritível borbulhou do fundo do estômago: uma emoção à qual não conseguia nomear. Ela nunca sonhou que seria capaz de criar algo assim. Pensava que levaria muitos mais anos antes de criar algo equivalente a uma obra-prima. Não, sinceramente, não estava confiante de que conseguiria tal coisa. Para ela conseguir isso agora, do nada, era inacreditável.
Não era como se tivesse feito isso com algumas simples horas de trabalho. Ela dedicou uma quantidade considerável de tempo a isso. Deveria ter terminado mais rápido, já que usou toda a extensão de sua magia enquanto a fazia, mas demorou um mês inteiro. Usou cada pedaço de conhecimento e experiência que acumulou ao criar esta, mas ainda assim: nunca em um milhão de anos esperaria que isso acabasse tão bem. Ela não se achava capaz de tal coisa. Se alguém dissesse para fazer isso de novo, duvidava que conseguisse. Mas não havia engano: a estatueta em suas mãos era algo de sua própria criação.
A emoção tomou conta dela e, por um momento, um rosto apareceu em sua mente, um oval com óculos, pertencente a um garoto de aparência completamente simples: Zanoba.
Tenho que mostrar isso ao Mestre, pensou.
Sem dúvida, Zanoba gritaria a plenos pulmões e correria pelo quarto em felicidade. Ela também sabia que ele a encheria de elogios.
Tenho que deixá-lo ver isso imediatamente!
Com esse pensamento em mente, pegou a estatueta, pretendendo ir direto até Zanoba. O problema era que ele estava nos arredores de Sharia trabalhando para ajustar a Armadura Mágica de Rudeus no momento. Se ela corresse para lá, seria capaz de alcançá-lo antes que ele voltasse para casa. Isso garantiria que não sentiriam falta um do outro.
Julie parou na porta, os lábios apertados em pensamentos enquanto segurava a estatueta na mão. Era uma peça de alta qualidade. Disso ela tinha certeza. Cada célula de seu corpo gritava que isso era uma obra-prima. Mas poderia realmente mostrá-la a Zanoba assim? Ele ficaria encantado, com certeza, mas, pensando bem, as outras obras-primas que ele mostrou a ela foram cuidadosamente guardadas em caixas de madeira forradas com um belo tecido.
A cada poucos dias, Zanoba abria as caixas de suas estatuetas mais valiosas para checá-las. Ele sempre exibia um olhar de profunda expectativa ao soltar a renda que segurava a caixa. Seu rosto se iluminaria quando visse a estatueta dentro, seu toque sempre tão delicado quando a levantava e a colocava em sua mesa, admirando-a com um suspiro ofegante.
Sim, uma caixa. Um componente necessário para amplificar a qualidade de uma obra-prima.
Julie olhou ao redor de sua área de trabalho. Ela olhou para todas as ferramentas de trabalho e suprimentos que usava para fazer estatuetas, mas nada se assemelhava a uma caixa. Como sua magia fornecia todos os materiais necessários para seu ofício, de acordo com o estilo que Rudeus havia ensinado, ela não tinha suprimentos que pudesse usar para fazer uma caixa. No entanto, tinha um saco de linho branco. Algo tilintou quando o pegou. Não era muito pesado, mas tinha um peso respeitável. Escondidas dentro estavam algumas moedas asuranas de cobre e prata.
Zanoba pagava a Julie um salário por todo o seu trabalho. Ela não conseguia lembrar quando isso começou, mas ele insistiu que ela pegasse caso precisasse de algo repentinamente. Ultimamente, vinha pagando uma quantia particularmente generosa. Ginger não ficou muito satisfeita, insistindo: “Não vejo por que é necessário que ela tenha dinheiro”, mas Zanoba ignorou seus protestos. Sua insistência em pagá-la a fez suspeitar que o Grão-Mestre Rudeus havia dito algo a ele.
Julie ponderou isso profundamente. Este era precisamente o tipo de situação em que precisava de algo em pouco tempo.
Ela pegou o dinheiro e foi para o bairro dos artesãos. O lugar ao qual estava indo não era outro senão a loja de Belfried. Zanoba a arrastou para lá várias vezes antes, então ela sabia o quanto ele respeitava a qualidade do trabalho de Belfried. Foi por isso que decidiu comprar uma cama que se adequasse à sua estatueta para que pudesse apresentá-la a Zanoba.
Infelizmente, as coisas não saíram do jeito que havia antecipado. O preço era muito mais alto do que poderia pagar. Os produtos apresentados em sua loja estavam além de suas possibilidades com sua renda atual. Isso era natural, já que suas peças eram feitas para a nobreza. Chocada com o preço, ela se recusou a desistir e tentou negociar com Belfried.
Zanoba era um dos valiosos clientes dele. Ele não comprou nenhuma boneca, mas elogiou muito as “camas” que Belfried fazia. Ele traria suas próprias estatuetas e mandaria Belfried construir camas feitas especialmente para elas. Quanto melhor a qualidade do trabalho apresentado, mais barato Belfried estava disposto a ir com seus preços. Era por isso que ela esperava conseguir um acordo que pudesse pagar mostrando-lhe a estatueta que tinha.
As coisas também não correram como esperava desta vez. Bem, não, isso não estava totalmente correto: seu plano estava na verdade no ponto. No momento em que Belfried pôs os olhos em sua estatueta, sua excitação disparou. Ele gritou como uma criatura desumana e foi para as profundezas de sua loja, voltando com um enorme saco de moedas de ouro. E imediatamente o usou para implorar que ela vendesse para ele.
— Eu ficaria mais do que feliz em fazer uma cama para ela — disse ele. — Farei uma tão grandiosa que ela poderá dormir quentinha e confortável ao meu lado pelo resto de sua vida! Você não vai encontrar ninguém mais adequado para mantê-la do que eu, especialmente com minhas habilidades em fazer camas. Vou colocar essa linda garota para descansar e deixá-la dormir em paz em uma almofada única! Agora, por favor! Seja boazinha e aceite a minha oferta!
Seus olhos estavam anormalmente arregalados e baba escorria de sua boca enquanto ele a pressionava. Naturalmente, isso a assustou. Seu corpo inteiro tremia. Julie instintivamente o empurrou e fugiu para a porta. Belfried a perseguiu, mas o medo desgovernou suas perninhas. Ela bateu em uma prateleira a caminho da porta espalhando todo o conteúdo pelo chão, mas não olhou para trás enquanto escapava. Infelizmente para ela, Belfried também ignorou isso e continuou correndo atrás dela, gritando algo incompreensível enquanto o fazia.
De alguma forma, Julie conseguiu despistá-lo e voltou para o dormitório, bufando sem parar. Seu corpo continuou a tremer de medo por um tempo. Ela temia que ele pudesse arrombar a porta a qualquer momento e entrar atrás dela. Felizmente, isso não aconteceu, e Zanoba voltou mais tarde, o que a ajudou a recuperar a compostura.
Julie não podia mais voltar para aquela loja, não depois do que aconteceu. O que mais poderia fazer? Naquela noite, ficou intrigada com o assunto até que finalmente se lembrou de algo que Rudeus havia lhe dito “Se precisar de algo que ainda não tenha, então faça-o”. Ela não conseguia se lembrar quando ou porque ele disse isso, mas, independentemente disso, eles a compraram para esse propósito: fabricar coisas. E agora, ela tinha magia da terra e as ferramentas necessárias para moldar o que conjurasse e polir com perfeição.
No dia seguinte, Julie começou a usar seus suprimentos para fazer uma caixa. Ela conjurou a forma básica com sua magia da terra, então usou sua mana e ferramentas para moldá-la. Já tinha feito isso centenas de milhares de vezes antes. Não importava que fosse uma caixa em vez de uma estatueta, ao menos nas fases iniciais. No entanto, a conclusão do projeto foi difícil, uma vez que os detalhes mais complexos exigiam um processo e um conjunto de habilidades diferentes. Ela ainda não havia terminado depois de vários dias de trabalho: talvez cerca de setenta por cento. Foi um progresso impressionante, considerando que nunca tinha feito nada parecido antes.
Enquanto criava sua caixa, uma lembrança de seus anos mais jovens voltou à sua mente. Viu os rostos de seus pais, mal iluminados em sua casa sombria e apertada. Honestamente, ela não tinha muitas lembranças boas deles. Costumavam gritar um com o outro por dinheiro ou de outra forma pareciam desamparados. A única coisa boa que podia dizer sobre eles era que trabalhavam duro. Noite após noite, com apenas uma única vela para a luz, trabalhavam arduamente. Seu pai era normalmente barulhento durante o dia, mas quando a noite chegava, ficava mortalmente silencioso enquanto tecia metal em um produto final semelhante a uma corrente.
O que mais se destacava nas memórias de Julie eram os ornamentos de sua mãe, esculpidos em madeira. Ela podia transformar um bloco de madeira no lírio mais bonito. Julie não conseguia se lembrar do motivo pelo qual sua mãe fizera aqueles lírios, mas lembrava vividamente das flores. Com essas memórias como guia, esculpiu lírios em sua própria caixa. Vê-la gradualmente se aproximando da conclusão tornava cada dia mais agradável do que o anterior. Certamente Zanoba ficaria satisfeito, não ficaria? Ela imaginava como ele expressaria seu deleite. Gritaria alegremente da maneira que normalmente fazia? Ou apertaria os olhos com tanta força que seus olhos desapareceriam em suas bochechas, mostrando uma alegria mais silenciosa? Quanto mais ela imaginava, mais seu coração martelava de antecipação.
Como já foi escrito muitas vezes, Julie estava verdadeiramente grata a Zanoba e Rudeus. Também estava satisfeita com sua vida atual. Queria que as coisas continuassem assim. Esse era seu desejo.
— Julie… Você deseja deixar de ser minha escrava?
Essas palavras cortaram profundamente seu coração.
Ela teve um mau pressentimento no momento em que o viu entrar com Belfried a reboque. Afinal, os dois eram bons amigos, e ela empurrou Belfried e fugiu de sua loja. Quando derrubou uma de suas prateleiras no processo, também pode ter danificado algumas de suas mercadorias. Só agora percebeu o quão incrivelmente rude tinha sido. Ela esperava que Zanoba ficasse com raiva. Ele nunca gritou com ela, mas em algumas ocasiões ficava zangado. Ele era especialmente rigoroso quando ela fazia algo errado. Às vezes, até a punia, para ter certeza de que ela entendia que o que fazia era errado e para não cometer os mesmos erros da próxima vez.
Sempre que Zanoba ficava com raiva, Julie tentava freneticamente corrigir o erro. Normalmente isso era o suficiente para consertar as coisas. Na verdade, Zanoba e Rudeus sempre foram rápidos em perdoá-la. Por que, então, ela entrou em pânico? A resposta era simples. Oh, tão completamente simples.
Julie franziu os lábios e pensou a respeito. Ela estava convencida de que havia chateado Zanoba por causa do tratamento que deu ao Belfried. Se tivesse danificado sua bela mercadoria, é claro que Zanoba ficaria zangado com isso. Aqueles eram bens caros produzidos para a nobreza, o que significaria uma grande perda pessoal para Belfried se fossem quebrados. O custo provavelmente encobriria qualquer preço que ganhariam se a vendessem.
Isso era muito pior do que ela esperava. Até Rudeus estava envolvido agora, e estavam considerando vendê-la. Era esse o palpite dela.
Talvez fosse diferente se fosse só ela e Zanoba. Talvez não tivesse acabado assim se não fosse pelo encontro dela com Belfried. Talvez ela não tivesse sentido tanta pressão se Rudeus não estivesse presente. Talvez, desse modo, conseguisse ter considerado com calma o que ele estava dizendo e respondido sinceramente que não, que ainda queria estar ao seu lado.
Mas não foi esse o caso.
A visão de Julie ficou branca, sua mente girando em círculos enquanto tentava colocar o cérebro para funcionar em busca de uma resposta. O que deveria fazer nesta situação? Ela tinha que fazer alguma coisa, não tinha? Seus pensamentos vagaram para a maneira como Belfried agiu na loja e o preço que lhe ofereceu por sua estatueta.
Em uma tentativa desesperada de agarrar-se à sua esperança final de contornar as coisas, Julie correu de volta para o quarto. Parecia que o mundo estava a cercando. Suas pernas estavam instáveis enquanto a carregavam e suas mãos continuavam tremendo, mas ela de alguma forma conseguiu alcançar debaixo da cama e puxar a coisa que havia escondido ali: a estatueta, a própria obra-prima que ela mesma fizera. A coisa que Belfried queria desesperadamente.
Julie agarrou sua criação em suas mãos e correu de volta para Zanoba e os outros. Ela passou por ele e caiu de joelhos na frente de Belfried.
— Vou dar isso a você, então, por favor, por favor, me perdoe! — Lágrimas e ranho começaram a escorrer pelo seu rosto. A primeira coisa que ela tinha que fazer era subjugar a raiva dele, e foi por isso que trouxe sua estatueta e a ofereceu.
Rudeus e Zanoba ficaram boquiabertos com suas ações. O primeiro, em particular, nunca sonhou que ela teria uma reação tão exagerada à pergunta. Ele presumiu que deveriam abordar gentilmente o assunto com Julie, já que seria difícil para ela admitir que não queria mais ser escrava deles. É por isso que foi pego de surpresa quando Zanoba se aproximou dela e deixou escapar toda a pergunta.
E agora as coisas tinham chegado a isso. Claro que ele ficou totalmente chocado. A única pessoa presente que não se chocou era Belfried. Ele planejou negociar um preço com Julie depois que suas outras discussões fossem tratadas, mas quando o objeto de seus desejos foi repentinamente empurrado à sua frente, ele alegremente o alcançou.
— Hm? Oooh! Você vai me permitir ficar com ela? Ah, bem, se insiste! — Seus dedos se esticaram em direção à estatueta.
— Espere. — Alguém agarrou sua mão antes que ele pudesse pegar seu prêmio. — Qual é o significado disso?
Foi Rudeus quem o impediu. Todos os vestígios de confusão e surpresa desapareceram de seu rosto e, em vez disso, parecia zangado e em guarda.
— Por que Julie está chorando e implorando por perdão? — demandou ele.
— R-Receio não fazer a menor ideia — disse Belfried.
— Bem, nem eu, mas você realmente ficaria satisfeito em colocar as mãos em uma estatueta que deseja de graça? Não se iluda. Você sabe que isso é bom demais para ser verdade.
— Colocando as coisas assim, faz sentido — admitiu Belfried com um aceno relutante. — Eu poderia… hm? Hm, Mestre Rudeus? A força de seu aperto é… bastante dolorosa.
Graças à Manopla Zaliff, a força normal de Rudeus foi amplificada em um grau impressionante. Ele segurou Belfried com tanta força que este não poderia se afastar, mesmo que quisesse. Pior, o aperto de Rudeus estava aumentando lentamente. Suor frio escorria pela testa de Belfried.
— Não importa o quão íntimo seja de Zanoba, isso não é desculpa para roubar a estatueta de uma garotinha inocente. Entendeu? — Rudeus olhou para ele.
— Eu realmente falei a verdade, não faço a menor ideia do porquê ela está fazendo isso… Hm, Mestre Zanoba, você não vai me ajudar?
Ambos os homens olharam para Zanoba, este estava congelado no mesmo lugar há um minuto inteiro. Seus olhos estavam colados à estatueta nas mãos de Julie, ele não tinha se movido nem um centímetro. Pelo olhar no rosto de Rudeus, ele provavelmente estava pensando: Zanoba? Ah não, não me diga que você morreu de pé?! Ou algo nesse sentido.
Felizmente, Zanoba não estava morto. Como prova disso, seu corpo se moveu muito, muito lentamente, quase como se o próprio tempo estivesse correndo no ritmo de um caracol. Ele se virou para Julie e a olhou. Rudeus e Belfried ficaram sem palavras enquanto o observavam. Eles engoliram em seco enquanto esperavam que ele reagisse. A expressão de Zanoba era totalmente medonha. Aterrorizante, resumindo em uma única palavra. Até Julie notou a mudança em seu comportamento. Ela se virou para encará-lo e murmurou:
— Sinto muito.
Naquele instante, Zanoba se lançou para frente e caiu de joelhos na frente dela. Ele estendeu sua mão na direção das mãos dela, ou, mais precisamente, para a estatueta abrigada em suas mãos, e só se impediu de tocá-la por um fio de cabelo.
— Mestre — ofegou ela.
— É incrível — disse ele com um suspiro trêmulo. Seu louvor não parou por aí; era quase como se uma barragem tivesse se rompido. — É… absolutamente deslumbrante. Isso é… É… As palavras não conseguem expressar sua magnificência! Do topo da cabeça às pontas dos dedos dos pés, é de tirar o fôlego. Eu ficaria perdido em identificar seus pontos fortes com precisão, mas sua postura, as pontas dos dedos e as pequenas ondulações na roupa… Eleva a qualidade para um nível totalmente diferente! E tudo se encaixa perfeitamente! Oooh!
Pela maneira como ele estava falando sobre isso, provavelmente desejava pegar a estatueta em suas mãos e estudá-la de todos os ângulos, mas por qualquer motivo, seus dedos se recusaram a agarrá-la. Permaneceram suspensos no ar, tremendo. Ele queria tanto tocá-la, mas não podia. Era quase como se a estatueta fosse tão divina que temia tocá-la.
— Então, por que, Julie… — Suas palavras saíram estranguladas. — Por quê?!
— Huh? — ela ofegou em resposta a ele.
— Por que você tentou dar a Belfried sem sequer mostrá-la para mim primeiro? Eu fiz algo que te ofendeu? Não entendo, você sempre me mostrou todos os projetos que concluiu antes! — Zanoba começou a soluçar, lágrimas grandes e feias escorrendo por seu rosto.
Eram lágrimas de frustração por ele não poder ter essa estatueta em particular? Ou ficou triste com a traição de Julie? Rudeus rudemente suspeitou que era pelo menos sessenta por cento o primeiro, mas vamos ignorar seus pensamentos ofensivos por enquanto.
— Suponho que você realmente queria levantar dinheiro para comprar sua própria liberdade? Se esse é o caso, por que não falou comigo primeiro? Eu ficaria feliz em pagar trezentas moedas de ouro por esta estatueta! Não, talvez não consiga juntar os fundos imediatamente, mas juro que encontrarei uma maneira, se necessário! Aposto a minha honra nisso! E você já deve estar familiarizada comigo o suficiente para saber o quanto eu estaria disposto a pagar por isso!
— Hm, uh… Mestre, hm…
— Ou você teme que eu possa tentar usar minha influência sobre você para roubá-la? Devo admitir, em retrospecto, que você criou uma série de estatuetas para mim sem a devida compensação. Concluí que estava tudo bem, já que você é uma escrava e ainda era inexperiente na época, e mesmo que você tenha melhorado imensamente recentemente, ainda não lhe dei o salário que você merece!
Zanoba continuou a lamentar, segurando a cabeça nas mãos enquanto olhava para o teto.
— Sinto muito, muito mesmo, Julie. Permita-me pedir desculpas. Vou me desculpar quantas vezes for preciso. Posso não ser capaz de oferecer-lhe o mesmo preço que Belfried, mas em troca, como seu mestre, vou conceder qualquer desejo que você tenha! Assim, devo implorar, por favor… permita-me tê-la!
A maneira como ele implorou era semelhante à forma como Belfried se comportou antes, mas com Zanoba, ela não se sentia com medo. Isso porque sabia que ele estava mostrando consideração não pela estatueta, mas por ela. Ele certamente não estava com raiva dela, isso era claro. Ele não estava tentando vendê-la.
No momento em que ela entendeu isso, alguma outra emoção brotou dentro dela. Lágrimas encheram seus olhos e logo deixaram trilhas quentes em suas bochechas, mas desta vez não estava chorando por medo ou desespero.
— Sim, Mestre — disse Julie. Ela nunca teve a intenção de rejeitar seu pedido, para começar. Embora fungasse em meio às lágrimas, ela conseguiu sorrir para ele.
— Ooh, obrigado, Julie! — Zanoba sorriu de volta.
A atmosfera entre os dois era um pouco estranha, mas temperada pelo calor.
— Alguém pode me explicar como as coisas chegaram a isso? — perguntou Rudeus com um suspiro.
Zanoba e Julie trocaram olhares vazios.
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Eles conseguiram resolver o mal-entendido rapidamente. No final da conversa, Rudeus e Zanoba ficaram imensamente aliviados, e até Julie parecia mais relaxada. Belfried se desculpou profusamente e, apesar de seus olhares ansiosos para a estatueta, se despediu.
Felizmente, Rudeus era muito tolerante quando as pessoas cometiam erros baseados em mal-entendidos. Ele rapidamente perdoou Belfried, pediu desculpas por segurar seu braço com tanta força e ofereceu a Julie e Zanoba um sorriso aflito antes de partir para a sua própria casa.
Ginger voltou bem quando os outros dois estavam saindo. Quando ela ouviu sobre o que havia acontecido, repreendeu Zanoba, dizendo: “Você a trata tão bem e lhe deu uma educação tão boa, seria difícil acreditar que ela era realmente uma escrava. Simplesmente não há razão para ela tentar comprar sua liberdade sem dizer uma palavra a você primeiro. É descortês de sua parte duvidar de seus súditos assim, Vossa Alteza.”
Mas Zanoba sequer ouviu seu sermão. Ele estava muito ocupado estudando a estatueta que Julie lhe dera. Ele montou um pedestal no meio do quarto, colocou a estatueta nele e agora andava em círculos para examinar todos os ângulos. Às vezes sorria orgulhosamente, outras vezes suspirava, e então voltava a sorrir como um tolo. Ele estava tendo o melhor momento da sua vida. Ginger estava dando um sermão para ela mesma.
Quanto a Julie, ela continuou observando Zanoba. E sorriu aliviada, com as bochechas ligeiramente vermelhas.
— Julie — disse Zanoba depois de um tempo, virando-se para ela. — Esta é uma estatueta incrível. Você fez bem. Nunca sonhei que você tivesse esse nível de habilidade.
— Sim! É só uma coincidência eu ter conseguido. Duvido que consiga reproduzir esse nível de qualidade novamente.
Zanoba inclinou a cabeça.
— O que você está dizendo? Este artesanato magistral é um produto do seu trabalho árduo. Você fez cada centímetro com cuidado, lindamente. Talvez algumas partes só tenham ficado perfeitas por coincidência, mas pelo menos metade delas é um produto de suas próprias habilidades.
— … Obrigada. Vou continuar aprimorando minhas habilidades!
— Muito bom. — Zanoba assentiu, satisfeito. — E também, Julie, eu realmente quis dizer o que disse antes. Se há algo que você deseja, só precisa falar. Farei o que estiver ao meu alcance para conceder o seu desejo.
— Hm… Deixe-me pensar um pouco mais sobre isso — disse ela desajeitadamente, sentindo-se envergonhada por todos os elogios.
Ginger olhou para eles.
— Vossa Alteza, entendo o quanto você ama suas estatuetas, mas está quase na hora de comer. Julie, me ajude com os preparativos.
— Ah, é claro! — respondeu Julie. Ela pensou que o momento poderia continuar por toda a eternidade, mas a intervenção de Ginger a trouxe de volta à realidade. Talvez a outra mulher estivesse um pouco zangada por ter sido deixada de fora.
Julie fez o que lhe foi dito e começou a ajudar com a preparação da refeição, como de costume. Zanoba observou as duas, seus olhos se estreitaram. Sua vida agora era bastante simples, longe da opulência da vida no palácio. No entanto, poderia passar o dia inteiro mexendo em suas estatuetas e ninguém ficaria bravo com ele. Além disso, tinha alguém ao seu lado que poderia fazê-las para ele, o que lhe fornecia uma fonte constante de novas estatuetas. Nada poderia ser mais ideal.
Seria maravilhoso se eu pudesse continuar vivendo assim para sempre.
— Hm?
De repente, ele notou uma carta selada perto da porta. Julie devia ter recebido em seu nome enquanto ele estava fora. Casualmente se aproximou e a pegou, então verificou quem era o remetente.
— Ah…
A expressão feliz desapareceu de seu rosto. Ele abriu o envelope, puxou a carta e olhou para o conteúdo.
— …Suponho que não havia como isso durar — murmurou. O envelope escorregou por entre seus dedos e flutuou pelo ar antes de ir ao chão. O selo do Reino Shirone estava estampado nele.
Tradução: Taipan
Revisão: Guilherme
QC: Delongas
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