Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado

Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado – Vol. 17 – Cap. 13 – Despedidas e Mudanças

 

No dia em que planejamos partir, um visitante veio à nossa mansão no início da manhã.

Era Ghislaine. E ela trouxe três espadas de madeira com ela. Não explicou o propósito de sua visita, mas também não precisava. Eris e eu pegamos uma espada de madeira, nos vestimos e saímos para os fundos.

O quintal da mansão era relativamente grande, mas também era cheio de canteiro de flores, o que fazia com que parecesse um pouco apertado. Ainda assim, tínhamos espaço suficiente para nosso propósito.

Eris e eu estávamos de frente para Ghislaine com nossas espadas em mãos. Sylphie ainda com remela nos olhos observava em uma cadeira a uma curta distância. As empregadas, que já estavam trabalhando duro, estavam trocando olhares confusos em nossa direção.

— Vamos começar a sessão de treinamento.

Com essas palavras de Ghislaine, Eris e eu levamos nossas espadas para o quadril e nos curvamos.

— Estamos prontos.

Ghislaine assentiu brevemente e levantou sua espada. Nós seguimos o exemplo.

— Tudo bem. Pratiquem o balanço da espada primeiro! Um! Dois!

Eris e eu balançamos nossas espadas junto dos gritos e movimentos de Ghislaine. No silêncio do início da manhã, era possível ouvir nossas lâminas de madeira cortando o ar.

Meus balanços eram mais lentos e menos precisos do que os de Eris ou Ghislaine. Mas Ghislaine não estava gritando críticas para mim. Antigamente, costumava gritar coisas como “Mantenha seus braços juntos!” ou “Olhe a ponta de sua espada!” toda vez que eu praticava com ela. Talvez não fosse se importar hoje.

— Rudeus! Mantenha o foco!

— Certo!

Aparentemente, tirei conclusões precipitadas.

Ainda assim, ela não estava dizendo nada sobre minha postura. Acho que eu tinha aperfeiçoado essa parte, pelo menos. Eu tenho praticado meus balanços e formas básicas regularmente há muitos anos, então acredito que melhorei de forma significativa.

— 198! 199! 200! Parem!

Depois de um tempo, Ghislaine nos interrompeu abruptamente. Havia suor brilhando em sua testa, o mesmo para Eris.

Duzentos não eram tantos balanços. Mas elas usaram toda sua força em cada um deles. Não era sobre os números. Mesmo assim, não estavam ofegantes nem nada do tipo.  Eu também não, aliás. Os balanços de treino eram apenas nosso exercício de aquecimento.

— Estilos a seguir! Vamos começar com Vento Ágil!

— Sim!

Eris e eu levantamos nossas espadas novamente e começamos a praticar os movimentos da forma Deus da Espada. Eu não hesitei; esses eram os movimentos fundamentais desse estilo, e eu os conhecia de cor. Até ensinei-os para Norn em Ranoa. Desde meu casamento com Eris, eu também praticava com ela quase todo dia.

— Tudo bem! Parem!

Quando trabalhamos por todas as formas básicas usadas no treinamento, Ghislaine nos chamou novamente.

— Emparelhar!

Com essas palavras, Eris e eu ficamos de frente um para o outro. Este era o comando para começar a praticar com um de seus colegas. Na maioria dos casos, isso envolvia um dos alunos atacar repetidamente o outro de uma forma específica.

No kendo, pelo menos, o parceiro menos habilidoso era o que assumia o papel de atacante; mas aqui era Eris que sempre me atacava. Era assim que fazíamos quando crianças, e continuamos com isso depois do nosso casamento. Só parecia mais natural deste jeito.

— Comecem!

— Raaaah!

Assim que Ghislaine deu o sinal, Eris partiu para a ofensiva. Ela estava se mantendo nas formas de prática padrão, então seus movimentos não eram rápidos demais. Sua espada se movia lento o suficiente para me permitir responder. E ela parava seus movimentos no último momento quando fosse me atingir.

Claro, o estilo do Deus da Espada não te ensina como fazer isso. Quando éramos crianças, ela estava constantemente me batendo quando praticávamos. Mas as coisas eram diferentes agora. Ela aprendeu muito desde então.

— Alternem!

Quando trocamos de papéis, meus ataques eram totalmente ineficientes. Não tive que me preocupar em parar minha espada; Eris tomava conta dessa parte por mim numa boa. A diferença em nosso nível de habilidade era óbvia. Eu podia lutar um pouco melhor usando meu Olho da Previsão, mas não o ativei. Não tinha ganho esse poder quando estávamos em Fittoa, por isso não iria usá-lo. Não dessa vez.

— Tudo bem! Parem!

Com a ordem de Ghislaine, Eris e eu abaixamos nossas espadas.

Normalmente, a próxima fase seria sessões de duelo em forma livre. Colocar-me contra Eris sem minha magia ou meu Olho Demoníaco não seria uma luta empolgante, é claro…

Para minha surpresa, Ghislaine se virou para mim e sacudiu a cabeça.

— Rudeus, se afaste e observe!

Quando saí do caminho, ela avançou onde eu estava. Recuei mais cinco passos e ajoelhei na grama.

Enfrentando sua aluna, Ghislaine puxou sua espada do quadril.

— Essa será a última vez, Eris

— Certo…

Concordando, Eris ergueu sua própria espada acima de sua cabeça. Era uma postura que ela nunca usava quando praticava comigo. Ghislaine estaria “sacando” e atacando com um único movimento, e Eris deveria balançar para baixo com toda sua força. Era um bom contraste.

O mundo pareceu parar de se mover completamente, e o tempo rastejava devagar. Suor frio escorria pelas minhas costas. Não conseguia me livrar do sentimento delas estarem segurando espadas reais em suas mãos.

Aquele momento pareceu durar uma eternidade. Mas então houve um pequeno sopro de vento.

Desta vez, não houve sinal formal.

Uma batida alta ressoou pelo ar.

Elas se moveram rápido demais para meus olhos acompanharem. Tudo que eu pude ver era o resultado final.

Eris e Ghislaine estavam paradas com suas espadas esticadas uma contra a outra. A única diferença real era que a lâmina de Ghislaine tinha se quebrado na base.

A espada de Eris foi curvada levemente, mas estava pressionada contra o pescoço de sua mestra.

— …

— …

As duas continuaram naquela posição por um momento, então lentamente puxaram suas armas de volta. Por algum motivo, Eris tinha uma pequena careta em seu rosto.

Com uma expressão solene, Ghislaine acenou para sua aluna.

— Isso conclui nossa sessão de treinamento.

— Muito obrigado! — gritei, me curvando de minha posição sentada.

Quando olhei para cima novamente, Eris ainda mantinha a cabeça baixa. Estava mordendo seu lábio, sua testa estava enrugada… e suas bochechas tremiam.

— Bom, Senhora Eris… adeus.

— P-Por favor, se cuide, Mestra! — Eris olhou para cima com lágrimas nos olhos, então abaixou sua cabeça uma segunda vez.

Ghislaine não disse mais nada. Ela me deu um último olhar significativo, então foi embora sem outra palavra.

Com aquele olhar, ela me pediu para cuidar da Eris por ela. Eu tinha certeza disso.

Ficando de pé, me curvei para Ghislaine uma última vez, dobrando até a cintura. Ela era a mulher que me ensinou os caminhos da espada, e a mulher que manteve Eris segura por muitos anos. Não podia agradecê-la o suficiente por isso. Eu realmente não podia.

No instante em que Ghislaine sumiu de vista, Eris caiu em prantos. Ela chorou tão alto que acho que todos no quarteirão podiam ouvi-la.

 

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Mais tarde naquela manhã, quando era hora de partirmos, um grande número de visitantes passaram para se despedir de Sylphie.

Muitos deles eram nobres da facção de Ariel que conheciam Sylphie como Fitz Silencioso. Eles nem sabiam que ela era uma mulher, e pareciam bem surpresos em saber que ela estava casada comigo. No entanto, isso não mudou a atitude respeitosa que a tratavam. Um por um, expressaram brevemente sua gratidão e então desejaram uma boa viagem. Sylphie manteve um sorriso no rosto o tempo todo, mas eu conseguia reconhecer que ela só estava sendo educada. Quando finalmente acabou, soltou um longo e sofrido suspiro e murmurou:

— Esse tipo de coisa sempre me esgota.

Porém, quando as duas assistentes de Ariel apareceram, seu rosto acendeu em felicidade genuína. Eu não conhecia Ellemoi Bluewolf e Cleane Elron muito bem, mas eram amigas próximas de Sylphie. Sua despedida foi longa e melosa, e envolvia muitas promessas de se encontrar novamente algum dia.

Nosso último visitante foi Luke.

Ele parou por mais ou menos uns quinze minutos. Agora que era a mão direita de Ariel e suserano de uma região inteira, o cronograma do homem estava ficando cada dia mais cheio. Mas ele conseguiu tirar um tempo para se esgueirar e dizer adeus.

— Sylphie… se cuide, está bem?

— Sim. Eu vou.

No entanto, ele estava tendo dificuldades em olhar Sylphie nos olhos a princípio. Acho que ainda se sentia um pouco culpado.

— Me desculpe pelo… o jeito que te testei, no final. Depois de todos esses anos.

— Está tudo bem, Luke. Eu sei o quão preocupado você estava. Ainda não tenho certeza do que teria feito se realmente tentasse machucar a Princesa Ariel, também.

— Certo… bem, obrigado.

— Por nada. Não tenho certeza do porquê, na verdade.

— Hmmm. Você tem um ponto.

Os dois riram muito com isso.

Depois das risadas cessarem, o sorriso de Luke ficou um pouco estranho, e ele tirou um momento para pensar nas próximas palavras. Acabou que eram uma bomba.

— Uhhh… Olha, Syplhie. Se você algum dia decidir que não pode ficar mais com o Rudeus, venha me encontrar.

Eu enrijeci igual uma tábua. Ele acabou de propô-la em casamento? Para minha esposa? Enquanto eu estava do lado dela?

— Do que você está falando? — disse Sylphie. — Eu nunca vou deixar o Rudy, e não é como se eu fosse me casar com você se o fizesse.

— Não estou falando de casamento. O que eu quero dizer é… se você não tiver um lugar para ir, Elle, Clea e eu sempre estaremos aqui por você.

A voz de Luke soou firme e sincera. Aquela primeira frase pareceu uma proposta romântica, mas talvez ele queria dizer de forma platônica. Ainda assim, algumas gotas suspeitas de suor se formaram em sua testa. Será que Luke carregava alguma paixão por Sylphie esse tempo todo? O que aconteceu com gostar apenas de mulheres de seios fartos?

Bom… talvez essa era a forma dele de me avisar para tratá-la bem também. Eu precisava trabalhar nisso.

— Eu não acho que isso vá acontecer — disse Sylphie. — Mas eu definitivamente vou visitar vocês, pelo menos.

— Mas é claro. Sempre será bem-vinda aqui.

— Obrigada, Luke. Cuide-se também.

Comparada com a despedida de Eris e Ghislaine, essa parecia bem mais discreta. Mas não é como se nunca mais fosse se ver, certo? Eu tinha que imaginar que continuariam a manter contato ao mínimo, pelo menos.

— Rudeus.

Por alguma razão, Luke agora voltou sua atenção para mim. Do que se tratava? Ele queria outro duelo ou algo do tipo?

— Desculpe por ter desconfiado tanto de você durante nossa jornada.

Oh. Bem, eu não estava esperando por isso.

— Está tudo bem, Luke. Eu sei que meu comportamento foi um pouco obscuro às vezes.

É verdade que Luke tinha sido enganado pelo Deus-Homem. Mas também agi de maneira genuinamente suspeita, embora soubesse que tinha uma boa chance do Luke ser um apóstolo. Eu tive que compartilhar um pouco da culpa pelo jeito que as coisas aconteceram.

— De qualquer forma, é seu trabalho ser um pouco paranóico, certo?

— Fico feliz que você veja dessa forma. — Coçando a bochecha, Luke me ofereceu um sorriso envergonhado. — Minha oferta se estende para você também, Rudeus. Se essa garota vareta perder a graça para você, venha me fazer uma visita. Temos várias empregadas com curvas nos lugares certos.

— Luke!

Recuando diante da raiva na voz de Sylphie, Luke soltou um pequeno riso.

— Só brincando…

E com isso, ele se dirigiu ao cavalo que montava. O homem realmente sabia como subir em um corcel branco puro, tive que dar esse crédito a ele. Ele nasceu para interpretar o Príncipe Encantado.

— Rudeus, cuide da Sylphie por nós. Sylphie, se cuide.

Com essas palavras finais, Luke cavalgou para longe como se houvesse donzelas para serem resgatadas.

Na primeira vez que nos encontramos, pensei que o cara era um completo babaca. Mas se Paul tivesse se comportado, e tivéssemos crescido juntos na família Notos… talvez Luke e eu poderíamos ter sido bons amigos.

Sylphie e eu o assistimos até que desaparecesse ao dobrar uma curva.

Despedimos do pessoal, agora era finalmente a hora de ir para casa.

Nos levou um bom mês para chegar aqui… mas felizmente, Perugius irá tornar nossa jornada de volta bem mais breve. Em algum momento dos últimos dez dias, ele criou um novo círculo de teletransporte no palácio real. Isso nos levaria à sua fortaleza flutuante, onde poderíamos teleportar para as ruínas nos arredores de Sharia. De lá, seria apenas meio-dia de jornada até nossa porta da frente.

Comparada com nossa longa e agitada jornada, essa seria como uma brisa agradável. De agora em diante, poderíamos usar a mesma rota para chegar em Asura em um único dia se quiséssemos.

Quando expliquei isso a Eris, descobri que ela esperava que nossa jornada de volta também levasse mais de um mês.

— Mas que merda?! — foi a resposta dela. — Eu chorei igual uma idiota por nada! — Então ela me socou.

Pessoalmente, senti que foi algo bom ela ter feito sua grande despedida com Ghislaine. Geograficamente, elas poderiam até estar um mero dia de viagem longe uma da outra, mas ainda seguiram caminhos diferentes. No entanto, acho que essa linda memória tenha sido levemente arruinada. Eris não costumava chorar, então era uma pena pensar que suas lágrimas foram em vão.

Nesse ponto, acredito que Ghislaine provavelmente concluiu o mesmo que sua aluna. Aquelas duas eram bem parecidas em muitos aspectos, não eram? Um dia desses, teríamos que aparecer do nada e surpreendê-la.

 Claro, Perugius provavelmente se irritaria se começássemos a passear pelo castelo sem um motivo válido, então provavelmente seria melhor usarmos aquela rota quando tivermos algum trabalho real para fazer.

Parando para pensar sobre isso, na verdade, pode ser útil ter algumas opções de viagens de emergências próprias. Orsted provavelmente sabe como desenhar círculos de teletransporte, certo? Talvez pudéssemos criar rotas mais diretas para Asura e outros países importantes. Sem contar o fator da conveniência, o Deus-Homem não seria capaz de destruir os círculos se ninguém soubesse que eles existem. Fiz uma nota mental de vender esse projeto para o chefe.

Já que o uso de magia de teletransporte foi oficialmente proibido, fizemos um show de sair da cidade antes de nos esgueirar de volta em sentido ao palácio. Quando chegamos lá, o sol já estava se pondo; decidimos passar a noite na fortaleza flutuante.

Eris, Sylphie e eu compartilhamos um único quarto no castelo de Perugius. Éramos um grupo de oito quando partimos para Asura, mas apenas nós três retornamos. Isso me colocou em um humor ligeiramente melancólico. Me vi observando a lareira com Eris e Sylphie deitadas na cama atrás de mim.

Normalmente, todos nós ficávamos em quartos separados, mas por algum motivo ambas quiseram dormir comigo esta noite. Talvez estavam no clima para algum contato físico? Mas as coisas não correram desse jeito… Eris costumava ficar com vergonha e hesitante quando não éramos apenas nós dois. Em qualquer caso, tomamos um dos maiores quartos de hóspedes e nos abraçamos na cama, mas eu estava com dificuldades para cair no sono e acabei por escorregar para fora da cama. Com nada em particular para fazer, decidi apenas me sentar e deixar os pensamentos vagarem por um tempo.

Era uma noite muito tranquila. O estalar das chamas era o único som que eu podia ouvir.

Enquanto eu assistia a chama crepitar, me encontrei refletindo nos eventos das últimas semanas.

Eu venci essa batalha. Sobrepujei o Deus-Homem. Era justo chamar isso de uma vitória completa, na verdade, ninguém do nosso grupo morreu, lidamos com todos os discípulos e Ariel garantiu o trono de Asura. Ainda assim, não me senti especialmente feliz ou tranquilo. Tudo o que realmente fiz foi seguir um caminho que Orsted definiu para mim. E por mais crucial que tenha sido essa batalha, era apenas o primeiro round de uma longa guerra. Eu iria continuar lutando batalhas como essas daqui em diante, estressantes e duvidosas batalhas onde a vitória não trazia um alívio verdadeiro.

O que eu tinha realmente conquistado dessa vez? Ariel resolveu metade dos meus problemas por mim. Eu quase matei Eris. E precisei da ajuda de Orsted para cuidar de Reida. Não estava vendo muito o chão para otimismo lá…

— Rudy?

Enquanto passava tudo isso pela minha mente, Sylphie se esticou e sentou na cama.

— Ainda está acordado?

— Sim.

— Estamos no meio da noite, sabe.

Seu olhar se voltou para a janela. Estava completamente escuro lá fora. Algumas horas devem ter se passado desde que ela e Eris caíram no sono.

— Ufa…

Mas ao invés de voltar a dormir, ela escorregou da cama e tomou um lugar ao meu lado, se aconchegando em mim, encostando sua cabeça no meu ombro.  Coloquei meu braço em volta dela em troca.

Nenhum de nós disse nada por um tempo. O corpo de Sylphie era agradável e quente. Quente mesmo. Quase me fez pensar que ela poderia estar com uma febre ou algo do tipo.

Enquanto eu olhava sua nuca, ela levantou a cabeça levemente para encontrar meu olhar. Seus olhos brilhavam sob a luz da lareira.

Todo esse cenário parece com a parte onde eu deveria beijá-la, então apertei seus ombros um pouco mais firme…

— Sabe…

E então ela começou a falar.

— Quando desisti do meu trabalho como guarda-costas de Ariel, era como se todo meu ar tivesse escapado.

Recuando do meu beijo, eu acenei com a cabeça e esperei Sylphie continuar.

— Tudo que eu podia fazer era sentar e pensar: Uau. Realmente acabou, huh?

Algo como alívio apareceu em seu rosto quando essas palavras saíram. Sylphie tinha sido guardiã da Princesa Ariel por oito anos – dos dez aos dezoito anos. Ela passou sua adolescência inteira com Luke e Ariel. Eu tive de imaginar que sentia um tipo de nostalgia agora.

Não tinha certeza se poderia preencher esse vazio para ela. Mas talvez esse não fosse o meu papel, em primeiro lugar. Eu era o marido de Sylphie, não era amiga dela e não podia substituir suas amigas.

— Mas sabe, Rudy, eu tinha pensado nisso com antecedência. — Sylphie disse depois de um momento. — Até agora, eu estava tão ocupada com a Princesa Ariel que quase não passei tempo cuidando da Lucie. Então eu gostaria de ficar em casa com ela a partir de agora.

Eu olhei para ela. Sua expressão estava mais confiante do que eu esperava.

— Nosso bebê está ficando maior a cada dia, sabe? Tenho certeza que ela vai precisar de mais atenção em breve.

Sylphie parou por um momento para achegar sua cabeça contra meu ombro. Eu estendi a mão e acariciei seu cabelo de forma afetuosa. Sua cabeça parecia um pouco mais quente que o normal, no entanto eu podia estar imaginando coisas.

— Então, acho que vou me concentrar em cuidar dela — Sylphie continuou. — Eu quero ser uma boa mãe, para variar.

Nunca pensei em Sylphie como uma mãe ruim. Mas pelos padrões deste mundo, acho que poderia chamá-la de negligente. Os únicos que deixam as empregadas cuidarem das crianças são os nobres, e nós somos apenas uma família comum.

Ainda assim, eu não sou originalmente desse mundo. No lugar de onde venho, um casamento com duas rendas não era incomum.

— Sabe… se tiver alguma outra coisa que você queira fazer, eu também estou bem com isso.

Sylphie tinha apenas dezoito anos. Ela era considerada uma adulta completamente madura nesse mundo, mas ainda era muito jovem. Ainda tinha muito tempo para encontrar novos objetivos ou seguir seus sonhos. Não é como se eu quisesse que ela ignorasse nossa filha ou passasse o tempo todo farreando, mas acho que conseguiria conciliar a tarefa de cuidar de Lucie e perseguir outra coisa.

Mas, bem, pode ser que eu não esteja levando nossas responsabilidades com nossa filha muito a sério. Eu não era exatamente o melhor pai do mundo.

— Hmmm, no entanto, não tenho certeza do que isso seria. — Sylphie inclinou sua cabeça para o lado e me olhou pensativa. — Eu queria ser mais como a Eris por um tempo, eu acho.

— Sério?

O que Eris tinha que Sylphie queria? As primeiras palavras que me vieram à mente foram peitos grandes. Eu gostava da Sylphie do jeito que era, honestamente. Mas se ela realmente quisesse trabalhar nisso, eu sempre poderia fazer uma massagem diária para estimular…

Vamos lá, Rudeus. Vamos tentar levar isso a sério.

— Sim. Digo, ela é basicamente igual a você, certo? — disse Sylphie. — Vocês lutam juntos. Ela cuida da sua retaguarda e você cuida da dela. Isso sempre me deixou com um pouco de inveja. — Ela fez uma pausa. — Mas depois daquela batalha com o Orsted… e como as coisas correram dessa vez… acho que finalmente deixei isso de lado. Eu nunca serei páreo para Eris. Ou para você.

Eu não podia concordar com isso. Sylphie era uma maga muito talentosa da sua própria maneira. É claro que ela não estava no nível de combate de Eris. Mas o que esperava? Eris dedicou sua vida inteira ao treino de espada. E Sylphie tinha muitas habilidades que Eris não tinha.

— Então decidi desistir de ficar mais forte, e encontrar uma forma diferente de te ajudar.

Oh. Agora eu estava começando a entender. Sylphie queria cuidar de mim de uma maneira que Eris não podia.

— E isso te levou à ideia de ficar em casa?

— Sim. Parece que Roxy quer continuar dando aulas da universidade, então eu vou cuidar de todas as crianças da nossa família. Vou garantir que sejam educadas, vou ensinar o que eu sei, e ajudá-las a crescerem fortes e seguros.

Meus sentimentos sobre sua proposta eram uma mistura de culpa e gratidão. Pensando um pouco sobre, eu não seria capaz de passar muito tempo cuidando das crianças. Nossa batalha contra o Deus-Homem não tinha acabado ainda. Isso significava que Orsted continuaria me mandando para essas missões, me despachando para lugares distantes para lutar com seus inimigos.

— Você está bem em deixar isso comigo, Rudy?

Por outro lado… Sylphie tinha decidido isso como seu novo objetivo. Ela encontrou um cargo para ocupar, e estava pronta para prosseguir ao próximo passo em sua vida.

— É claro. Eu sei que você vai fazer um ótimo trabalho.

Senti-me dominado por uma súbita afeição por minha esposa. Sylphie sempre foi fofa, mas agora parecia ainda mais adorável que o normal. Incapaz de me controlar por mais tempo, me inclinei e a beijei nos lábios. Ela não tentou me afastar, então minha mão escorregou de seu ombro para sua bunda.

Os olhos de Sylphie arregalaram de surpresa, e ela pareceu um pouco incerta por um momento. Mas então levantou sua cintura um pouco…

… e eu congelei como um guerreiro que encontrou com o olhar da Medusa. Eu podia sentir alguém me assistindo, mas da onde?

Oh. A cama.

Eris estava acordada, e nos olhando com o olhar brilhante. Não estou falando de uma faísca, um brilho feliz. Era mais como um olhar de tigre feroz.

Por que ela sempre apenas assistia silenciosamente quando me pegava com as outras garotas? Era um pouco assustador.

— Desculpe. Acho que deveríamos ir para a cama hoje.

— Huh? Oh… Sim, acho que você está certo.

Sylphie e eu voltamos para o lado de Eris na cama. Haveria tempo suficiente para romance quando chegássemos em casa. Perugius poderia estar nos espionando também.

— Vamos lá, Eris. Não estraga o clima desse jeito

— D-Desculpa… mas você estava sendo todo sorrateiro.

— Não, eu não estava. Você é sempre bem-vinda para se juntar a nós, sabe? Quer tentar?

— Você não p-pode estar falando sério. Isso é tão vergonhoso…

Hmmm. Acho que seria mais vergonhoso para mim do que para qualquer outra pessoa. Eris costumava me colocar no limite das posições humilhantes…

Quando fechei meus olhos e ouvi minhas esposas sussurrando uma para outra, senti um sentimento de satisfação cair sobre mim.

Sylphie deu um grande passo adiante nesses últimos dias. Ela encerrou um capítulo de sua vida, e encontrou uma maneira de mudar a si mesma. Eu precisava aprender com seu exemplo. Com ela cuidando da minha retaguarda, talvez eu pudesse encontrar uma forma de ser menos medroso no futuro.

Esse foi o último pensamento que veio à minha mente quando caí no sono.

 


 

Tradução: Vinyell

Revisão: Guilherme

 

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