Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado

Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado – Vol. 16 – Cap. 05 – Trabalhando em Equipe

 

Quando cheguei à fortaleza flutuante, Ariel estava no jardim, dando uma festa do chá. Sylvaril estava servindo, mas Perugius não estava à vista. Em vez disso, Nanahoshi era aquela sentada em frente a Sua Alteza.

Ela não deve estar muito preocupada com sua situação, já que pode dar uma festa do chá, pensei, mas com a mesma rapidez percebi que estava enganado. Ariel tinha o rosto exausto como o de um assalariado sobrecarregado. Combina perfeitamente com a exaustão que vi no rosto do Luke.

Ariel se esforçava para colocar um sorriso elegante no rosto, mas não conseguia esconder as olheiras. Ela deve estar se sentindo encurralada. A maneira como olhava para Nanahoshi gritava: “Vamos, pergunte-me o que está errado. Pergunte!”

Nanahoshi a ignorava por completo. Na verdade, ela parecia desconfortável sentada ali. Não recusaria um convite para tomar chá, mas ao mesmo tempo, era claro que não queria ser arrastada para a situação confusa entre Ariel e Perugius.

Se alguma vez houvesse uma garota-propaganda para o arquétipo do protagonista preguiçoso, seria Nanahoshi.

A única razão pela qual ela não fugiu do local foi porque Ariel havia oferecido sua ajuda quando estava à beira da morte. Mesmo que Ariel só tenha nos emprestado o uso de seu implemento mágico, ainda era considerado ajuda.

— Oh, Rudeus. — A expressão de Nanahoshi relaxou no momento em que ela me viu. — Importa-se de vir aqui e sentar um pouco?

Sentei-me entre as duas garotas. Sylvaril aproveitou a oportunidade para me servir uma xícara de chá. A xícara estalou quando ela a bateu na minha frente, o que era incomumente violento para alguém tão refinado quanto ela. Olhei para ela e pude sentir a frieza emanando de trás de sua máscara. Talvez estivesse zangada com a minha invocação errada de Arumanfi.

Foi mal aí…

— Tudo bem, Rudeus, vá em frente — murmurou Sylphie enquanto se posicionava atrás de Ariel. A princesa parecia um pouco mais relaxada graças à sua presença.

Olhei em volta e notei Luke ao fundo. Eu tinha falado com ele antes da nossa chegada. Disse a ele que cooperaria com a princesa e ele ficou feliz demais, enchendo Sylphie de elogios por conseguir me persuadir.

— Ora, Lorde Rudeus — disse Ariel. — Já faz um bom tempo. Gostaria de parabenizá-lo por se tornar subordinado do Deus Dragão Orsted, mas devo perguntar… você tem certeza de que foi a escolha certa? — Suas palavras careciam de seu vigor habitual. Ela estava sendo vaga. Talvez Sylphie já tivesse falado mal de Orsted para ela.

— Obrigado. Estar a serviço de alguém poderoso proporciona uma certa paz de espírito. Isso vale para qualquer pessoa, não apenas para mim — respondi.

— Você também é muito poderoso. Suponho que pessoas de poder semelhante tendem a ser atraídas umas pelas outras. Alguém assim sequer me daria um minuto de seu tempo.

Ah, cara. Ela está se vendendo por pouco. Parece que as coisas estão indo em uma direção bastante sombria.

— Ei — sussurrou Nanahoshi, me cutucando de lado. — Orsted veio me ver ontem.

— É mesmo? E?

— Eu me desculpei, e ele me perdoou. Ele me disse que esperava continuar nosso relacionamento.

— É bom ouvir isso — eu disse.

Foi uma conversa curta, mas parecia que um peso havia sido tirado de seus ombros. As pessoas costumavam comentar que, se pedir desculpas fosse o suficiente para resolver os problemas, a polícia não precisaria existir, mas eu argumentaria que a maioria das coisas poderia ser resolvida por um pedido de desculpas sincero. Pessoalmente, eu não estaria disposto a perdoar alguém que me enganou, me levou a uma armadilha e quase me matou… Mas isso só demonstrava o quão generoso Orsted era.

— Eu também vi Lorde Orsted — disse Ariel, a voz tão agradável quanto um sino.

Havia algo estranhamente carismático na voz dela que fazia você querer ouvir o que ela dizia. Sem contar que ela também era linda. Seu cabelo loiro era mais radiante do que o de qualquer outra pessoa que eu já tinha visto. Ela era a personificação da própria beleza. Eu estava cercado por muitos homens e mulheres atraentes, mas se tivesse que classificá-los objetivamente, Ariel estaria no topo. Não era uma beleza comum; era como uma bela obra de arte. Como se tivesse saído de um quadro. Com certeza, agora ela não tinha sua energia habitual, mas isso só lhe dava o brilho efêmero de uma viúva exausta.

— Ele é um homem aterrorizante — continuou Ariel. — Eu só o vi de longe, mas isso foi o suficiente para todo o meu cabelo ficar em pé, gritando que era perigoso.

Ah, então ela já o viu.

Provavelmente não é uma boa ideia dizer a ela que eu estou operando sob suas ordens, então, mas talvez não importasse. Ela já sabia que eu era seu subordinado.

Ariel continuou:

— Isso foi ontem. Ele foi para casa depois de tomar um chá com Lady Nanahoshi. Parecia estar de mau humor o tempo todo, mas quando Lady Sylvaril derramou um pouco de chá nele, não ficou chateado com ela.

Sylvaril derramou chá em Orsted? Ela não poderia ter feito isso de propósito, certo? Não, deve ter ficado tão apavorada que sua mão escorregou.

— A atmosfera parecia incrivelmente tensa, mas Lady Nanahoshi tinha um sorriso tão caloroso em seu rosto, um que eu nunca tinha visto antes. Apesar da aparência e comportamento de Lorde Orsted, ele deve ser bastante magnânimo e de mente aberta.

Espera, sério? Estou surpreso em ouvi-la dizer isso. Talvez a maldição não seja tão eficaz nela como no resto do pessoal. Isso funciona a nosso favor, pelo menos. Ou poderia ser obra do Deus-Homem?

Na verdade, ele se beneficiaria mais com o controle das ações dela. Em vez de usar Luke para guiá-la, por que não puxar seus pauzinhos diretamente já que ela estava no comando de todo o show? Orsted nunca havia sugerido tal possibilidade, no entanto. Talvez ele tivesse uma boa razão para acreditar que o Deus-Homem não a tocaria.

— Aparentemente, ele é tão odiado por todos por causa de uma maldição que carrega — eu disse a ela.

— Oh, é mesmo? Nesse caso, talvez eu devesse ter dito olá. Ele era intimidante o suficiente que mesmo de longe minhas pernas tremiam. Se eu ouvisse a voz dele de perto, eu poderia me molhar. — Ela riu.

Uh, se molhar…?

— Entretanto seja muito bom se aliviar na frente das pessoas…

— Perdão?

— Lady Ariel. — repreendeu Sylphie.

Tenho certeza que ela estava se referindo a esportes aquáticos, mas vou fingir que não ouvi isso. A casta superior de Asura parecia estar cheia de pervertidos. Havia algo incrivelmente imoral em ouvir uma garota tão pitoresca falar sobre chuva dourada.

— Rudy! Tire esse sorriso depravado da cara! Você está diante da princesa — gritou Sylphie.

— Sim, senhora. — Cobri a boca com a mão. Meu rosto traiu meus pensamentos tão facilmente? Claro, eu era um pervertido, mas eu, na verdade, só estava interessado em ver as garotas que eu gostava fazendo coisas eróticas. Como Sylphie, por exemplo. Não que eu fosse pedir para ela fazer xixi na minha frente. Não queria que me odiasse.

— Ugh. — Nanahoshi franziu o nariz, claramente enojada, mas decidi ignorá-la.

— Ahem. — pigarreou Ariel. — De qualquer forma, Lorde Rudeus, fez todo o sentido para mim quando ouvi que você estava trabalhando para Lorde Orsted.

— Oh? Por quê?

— Porque acredito que seria preciso alguém tão poderoso quanto ele para ser capaz de controlar alguém como você.

Sério? Acho que não é preciso muito para me controlar. Tudo o que Sylphie tinha que fazer quando estávamos na cama à noite era dizer: “Ei, Rudy, tenho um favor a pedir”, e eu abanava o rabo como um cachorro, pronto para fazer o que fosse. Para ser claro, eu não estava esperando esse tipo de coisa de Ariel. Tudo o que eu precisava dela era dinheiro vivo. Afinal, eu era o tipo de homem que trabalhava por duas coisas: dinheiro e mulheres.

Enfim, já estava na hora de pararmos de ficar de enrolação. Eu estava aqui para falar sobre cooperação, não para conversar sobre Orsted.

— Quando você diz alguém poderoso, também não quer dizer alguém como você, Princesa Ariel? — perguntei, me fazendo de bobo.

Ariel colocou a mão sobre a boca e estreitou os olhos.

— Oh? Eu não sabia que você lisonjeava as pessoas assim.

Não era para ser simples lisonjeio. Mesmo que eu tenha me tornado insensível a esses títulos ultimamente, Ariel ainda era a princesa do Reino Asura. Nos termos da minha vida anterior, ela era um pouco semelhante ao príncipe herdeiro da Inglaterra em status. Pode-se ter um vislumbre dela em cerimônias oficiais, mas falar diretamente com ela estava fora de questão, muito menos ser capaz de se sentar com ela ao redor de uma mesa como esta. Este era o seu nível de importância.

Deixando seu status de lado, Ariel estava trabalhando duro para aumentar sua influência. Quase todas as pessoas em uma posição chave em Sharia tinham alguma conexão com ela. Havia o diretor e vice-diretor da academia, o alto escalão da Guilda dos Magos, o chefe da oficina de implementos mágicos, o principal administrador de uma empresa e o líder da filial da Guilda dos Aventureiros local. Essas eram as conexões que eu conhecia pessoalmente. Podia-se invocar o nome dela e esperar um tratamento favorável onde quer que fosse. Não era exagero dizer que sua influência podia ser sentida nos níveis mais altos das principais indústrias de Sharia.

Em suma, não lhe faltava conexões. Ela tinha muito poder.

— Cogitei a ideia de tê-lo como meu subordinado — disse Ariel.

— Oh, é mesmo?

— Mas logo desisti da ideia. Por uma série de razões, mas principalmente porque seu poder é demais para eu lidar. — Ela olhou para o lado. Além do jardim deslumbrante havia uma extensão de nuvens brancas e céu aberto, estendendo-se ao longe. Ela olhou naquela direção enquanto murmurava para si mesma: — Você tem poder além de si mesmo. Isso será o seu fim.

Por um momento, pensei que estava falando comigo, mas eu estava enganado.

Ariel voltou sua atenção para mim e explicou:

— Quando eu era mais jovem, vi uma peça no palácio. Essa foi uma frase da Grande Imperatriz Demônio Kishirika Kishirisu.

Eu tinha certeza que ela nunca tinha dito isso. Talvez fosse a frase que outra pessoa tenha inventado. A garotinha que conheci nunca seria capaz de dizer uma frase tão inteligente.

— Quando o Cavaleiro Dourado Aldebaran a derrotou, Kishirika o amaldiçoou com essas palavras enquanto ela estava morrendo — disse Ariel.

— Huh.

— Aldebaran tornou-se rei dos humanos depois disso, mas todos o temiam. No final, seus retentores o traíram e o mataram.

Essa peça que ela tinha visto certamente mostrava o lado mais sombrio da natureza humana, mas era bem diferente da história que eu conhecia.

— Essa peça é sempre realizada quando um membro da família real celebra um marco importante em sua vida.

Esses marcos eram o quinto, décimo e décimo quinto aniversários. No Reino Asura, essas ocasiões eram sempre celebradas com grandes festas. Pelo que parecia, a família real também realizava uma peça.

— Ela se desvia da história — Ariel reconheceu —, mas me disseram que destaca o estado de espírito que alguém da realeza deveria ter.

Então, não é historicamente preciso, como eu suspeitava. Isso não era surpreendente. Era bem diferente da história que eu conhecia. O Cavaleiro Dourado Aldebaran e Kishirika Kirisu derrubaram um ao outro na batalha. Espere, não, talvez eu estivesse pensando no confronto entre o Rei Dragão Demoníaco Laplace e o Deus Lutador.

Oh, bem, não é tão importante.

— Que estado de espírito é esse? — perguntei.

— Os princípios-chave sobre o que faz um rei: lutar, vencer e governar os súditos.

Franzi as sobrancelhas.

— No entanto, se isso é realmente tudo, por que o povo de Aldebaran o traiu e o matou? O rei que escreveu esta peça estava tentando amaldiçoar a geração que veio depois dele? Quando eu era mais jovem, não podia deixar de ter essas dúvidas. Foi só quando fiz quinze anos que de repente percebi. “Você tem poder além de si mesmo. Isso será o seu fim”. Essas palavras resumiam perfeitamente a mensagem central.

Ela fez uma pausa e olhou para longe novamente enquanto continuava:

— Muito poder levará alguém pelo caminho da destruição. Assim, deve-se apenas exercer o máximo de poder que seja possível controlar. Se alguém quer se tornar rei, deve ser capaz de dominar tudo o que tem à sua disposição. Mesmo agora, ainda acredito que isso seja verdade.

Ariel baixou a cabeça, seus longos cílios lançando sombras sobre as bochechas.

— Estou perfeitamente ciente de que você e Lorde Perugius são mais do que posso suportar. — Ela usava seu sorriso suave de sempre, mas parecia que estava à beira das lágrimas. — Vou pedir a ajuda de Lorde Perugius mais uma vez, mas se ele me recusar, acho que vou desistir de tentar convencê-lo.

— Vai desistir? — perguntei.

— Sim. Nem preciso dizer que não pretendo desistir de me tornar rainha, mas deixarei de lado meus esforços para obter o apoio dele. Embora seu poder possa estar além de mim, o trono asurano não está.

Eu não disse nada, mas quase senti vontade de suspirar. Ela estava muito preocupada sobre se alguém estava “além dela” ou não.

— Princesa Ariel — eu disse.

— Sim, pois não, Lorde Rudeus?

— Que parte de mim você acha que é tão poderosa?

Ariel disse que eu era poderoso e especial. Sempre sonhei em ser visto de tal maneira, mas, do jeito que as coisas estavam, eu definitivamente não pensava em mim mesmo como alguém extraordinário. Essa nem era uma visão tendenciosa, na minha opinião. Eu ainda não tinha atingido um nível que pudesse ser chamado de impressionante.

— Oh, se eu fosse citar todas as suas qualidades incríveis, a lista continuaria até não dar mais. Suponho que a maior seria sua impressionante reserva de mana.

— Minha reserva de mana, então?

Bem, é verdade que a minha reserva de mana supera a da maioria das pessoas. Ter o Aspecto de Laplace me abençoava com uma das boas. Talvez tanto que uma pessoa comum jamais se igualaria a mim apenas pelo esforço. Eu poderia também admitir que isso tinha se provado benéfico mais de uma vez no passado. Ainda assim, uma grande quantidade de mana não era solução para tudo. Todos os problemas que enfrentei exigiam outras soluções.

— Talvez se minha reserva de mana pudesse resolver todos os problemas que estou enfrentando, eu concordaria que sou uma pessoa poderosa — eu disse.

— Que problemas são esses?

— É difícil dar um exemplo concreto, pois são uma ocorrência diária. No momento, passo todos os dias me preocupando como vou explicar o que está acontecendo para minha família.

Eu estava apavorado com o Deus-Homem e com medo de Orsted também. Eu tinha ocultado os detalhes e alimentado mentiras para minha família, não tendo ideia de como explicar as coisas para eles. E Ariel disse que eu era poderoso? Não me faça rir.

— Não posso falar por Lorde Perugius — eu disse —, mas não sou poderoso, pelo menos. Sou simplesmente o marido de sua amiga íntima que por acaso tem uma reserva de mana maior do que a maioria das pessoas, e possuo um monte de conhecidos esquisitos. Mas sou apenas um mago comum, na verdade. Um que está constantemente preocupado com alguma coisa. — Esses eram meus sentimentos honestos, não importa o quão embaraçosamente clichê soasse.

Estendi a mão sobre a mesa e peguei a de Ariel. Sua pele era tão macia, e seus dedos eram tão delicados que eu quase temia que eles pudessem quebrar em meu aperto. Sylphie fez beicinho no canto, mas teria que lidar com isso por enquanto.

— Princesa Ariel, eu não vim aqui hoje para uma simples conversa.

— Você veio para tentar discutir algo? — Ariel manteve um sorriso gentil no rosto, nem um pouco perturbada por eu ter agarrado sua mão de repente. Senti um pouco de exaustão por trás disso, mas era um rosto impecavelmente inexpressivo.

— Se isso basta para tocar seu coração, pode ser algo apelativo… Mas, na realidade, foram Luke e Sylphie que me pediram para vir até aqui.

Em uma exibição incomum de agitação, a cabeça de Ariel sacudiu enquanto olhava para os dois. Sylphie ficou firme, enquanto Luke rapidamente abaixou a cabeça.

— Eles me imploraram para ajudá-la.

Seus dedos delicados apertaram os meus como uma morsa de bancada, exibindo muito mais força do que eu pensava ser possível, o suficiente para me fazer estremecer.

— Os dois disseram isso…? — murmurou ela.

— Não vim aqui para lhe menosprezar, zombando sobre como precisa da minha ajuda. Na realidade, é o oposto. — Eu me perguntava sobre como teria reagido a mim ao ter agarrado sua mão de repente e dizer tudo isso, caso ela estivesse em seu eu normal e confiante. — Poderia, por favor, me deixar trabalhar ao seu lado?

Uma lágrima caiu dos olhos de Ariel. Era lindo. No entanto, estranhamente, fiquei surpreso por ela chorar.

Por que será? Me perguntei.

Ariel rapidamente enxugou as lágrimas com a mão livre. Ela forçou um sorriso e disse:

— Esta é a primeira vez que ouço uma cantada que consegue me abalar profundamente. — Estava claro que ela não estava brincando; havia ajustado sua expressão, suas bochechas não estavam corando e ela também não estava mais chorando. Ela parecia uma princesa digna. — Devo admitir, ficaria grata pela ajuda — disse Ariel, acenando com a cabeça. — Ainda assim… — Ela abaixou o queixo e me estudou de perto, tentando descobrir minhas intenções. — Você é o subordinado de Lorde Orsted agora, certo? Ele realmente permitirá que você faça uma coisa dessas?

— Já conversei com ele sobre isso — assegurei-a.

— O que significa que você está agindo sob as ordens dele, então, sim?

Sua maldição não parecia completamente eficaz nela, então talvez não fosse um problema responder honestamente. Mas optei por seguir o plano e manter sua intenção em segredo.

— Não, de modo algum. — Balancei a cabeça. — Fui eu quem disse que queria ajudá-la, e ele me disse que eu estava livre para fazer o que quisesse.

Depois de uma breve pausa, Ariel disse:

— Tudo bem. Ótimo. Certifique-se de transmitir minha gratidão a ele então.

Sylphie franziu os lábios, infeliz com a maneira como eu lidei com as coisas, mas era assim que tinha que ser.

— Nesse caso, estou ansiosa para ter o seu apoio — disse Ariel.

— E mal posso esperar para trabalhar com você. — Reajustamos nossas mãos e apertamos.

Agora que resolvemos isso, é hora de passar para os detalhes.

— Se vamos fazer de você rainha, poderíamos pedir a ajuda de Lorde Orsted no assunto…, mas, francamente, ele não tem muita influência no Reino Asura. Eu não acho que ele seria de muita ajuda para você — eu disse, precedendo meu ponto principal. — Como tal, acho que a ajuda de Lorde Perugius será crucial.

— Concordo — disse Ariel, séria, sentando-se ereta em sua cadeira.

Talvez eu estivesse apenas imaginando, mas Sylphie e Luke pareciam mais sérios agora do que há alguns minutos.

Orsted também mencionou que convencer Perugius a apoiar Ariel era primordial, o que reforçava ainda mais a autoridade que ele tem em Asura. O problema era como persuadi-lo.

Perugius nos fez uma pergunta antes, que era…

— Qual é a qualidade mais importante que um rei deve ter? Se você puder me trazer essa resposta, então eu lhe darei meu apoio — eu disse, recitando o que lembrei de nossa conversa anterior com Perugius.

Os olhos de Ariel se contraíram. Ela tinha torturado seu cérebro repetidamente em busca da resposta para a pergunta.

— Que tipo de resposta ele quer… — eu disse.

Anteriormente, Ariel havia respondido: “Eles são sábios, ouvem seus ministros e não se esquecem de sua posição na sociedade”, mas Perugius descartou isso, dizendo estar incorreto. Ele então virou a pergunta para mim, e eu respondi: “Acho que prefiro um governante que possa se colocar no lugar do povo comum, em vez de alguém que confie em suas próprias habilidades.” Perugius chamou essa resposta de “preferível”, mas isso sugeriu que também não era a correta.

Se o que Orsted falou fosse verdade, Derrick Redbat deve ter encontrado a resposta correta para esse desafio quando foi questionado. Orsted também sugeriu que a resposta provavelmente tinha algo a ver com Gaunis Freean Asura. Claro, como a história havia sido alterada, não havia garantia de que Derrick tivesse respondido à mesma pergunta que enfrentamos agora, mas valia a pena investigar.

— Se não me falha a memória, Rei Gaunis era amigo íntimo de Lorde Perugius, certo? — perguntei.

Ariel assentiu.

— Sim, a história de sua amizade é famosa. Lorde Perugius também parece muito nostálgico quando ele aparece em uma conversa.

— Nesse caso, qualquer que seja essa qualidade, Rei Gaunis deve ter possuído. Certo?

— Talvez.

— Você pode pesquisar sobre ele, não é? Deve ter alguns registros.

Pensei que minha sugestão era infalível, mas sabe-se lá o motivo, Ariel e seus dois guarda-costas pareciam menos entusiasmados.

— Odeio dizer isso a você… — disse Ariel.

— O quê? Eu disse algo estranho?

— Não, mas já investigamos o Rei Gaunis. Não encontramos nada digno de nota nos arquivos desta fortaleza flutuante, nem na biblioteca de Ranoa.

Ah, então eles já tentaram essa rota. Fazia sentido. O relacionamento de Perugius com Gaunis era conhecido por toda parte. Seria mais estranho se não tivessem seguido essa pista.

— Se pudéssemos verificar a biblioteca nacional em Asura, pode haver algo que ele publicou que possa nos dar uma visão melhor, mas…

É verdade que o melhor lugar para encontrar informações sobre um rei asurano seria na biblioteca do reino. Mas, por razões óbvias, teríamos dificuldade em fazer uma visita ao lugar agora.

— Bem, isso é preocupante — eu disse. — Nesse caso…

Talvez fosse melhor perguntar sobre Derrick. Mas como eu faria tal indagação? Todos achariam estranho que eu soubesse sobre ele, para começar.

— Hum, antes de discutirmos mais isso… — Ariel olhou brevemente para Sylvaril. — Tem certeza de que está tudo bem? Lorde Perugius pode ouvir tudo o que estamos dizendo.

Inclinei a cabeça.

— E? Acredito que ele vá achar tudo divertido.

— Eu me preocupo que ele não permita que discutamos esse assunto como um grupo — explicou Ariel.

Ah, é isso que ela quer dizer. Ariel pensou que ele poderia querer que ela pensasse sobre isso e encontrasse uma resposta por conta própria. Eu, por outro lado, não tinha tanta certeza de que esse era o objetivo dele.

Olhei para Sylvaril. Ela agitou suas asas suavemente antes de dizer:

— Não importa para Lorde Perugius como você chega à sua resposta. Se for a correta, ele lhe dará seu apoio. — As palavras não foram ditas, mas seu tom insinuava: Isso é óbvio. Ele é, afinal, uma pessoa muito magnânima.

— Você quer dizer que eu deveria ter consultado os outros desde o início? — perguntou Ariel.

Sylvaril assentiu.

— Na verdade, Lorde Perugius estava profundamente intrigado com o motivo pelo qual você estava tentando resolvê-lo por conta própria.

Ariel sorriu amargamente.

— Eu me encurralei pensando demais, pelo que vejo. — murmurou ela para si mesma, depois se levantou, sua determinação renovada. Ela ergueu os braços, jogando o cabelo loiro para o alto. Ela caiu sobre os ombros enquanto se espreguiçava, com as mãos entrelaçadas no ar. Então estalou o pescoço e bateu nas bochechas.

Não é o tipo de comportamento que se esperaria de uma princesa.

Às vezes, as pessoas podiam se limitar pensando demais. Elas eram frequentemente sobrecarregadas pela crença de que as coisas tinham que ser de uma certa maneira e que não havia alternativas. Esses preconceitos e objeção muitas vezes levavam as pessoas para longe do caminho correto. Era só quando uma pessoa percebia que estava enganada, quando notava a existência de diversas maneiras de realizar a mesma coisa, que seu campo de visão se expandia e fazia com que se sentisse mais livre do que nunca. Eu tinha experimentado algo semelhante quando Roxy me arrastou para fora pela primeira vez.

— Tá bom! — declarou Ariel. — Sylphie, Luke, sentem-se.

— Como ordenar!

— Tudo bem.

Os dois se acomodaram alegremente à mesa, o que só fez Nanahoshi se sentir ainda mais estranha.

— Agora, então, vamos começar nossa reunião — disse Ariel, exalando a mesma confiança que eu tinha visto dela quando a conheci.

Devo começar a bater palmas? Não, é melhor não.

Em vez disso, levantei a mão e disse:

— Antes de começarmos, gostaria de ter certeza de que estamos todos em sintonia. Se importa?

— Sintonia? — repetiu Ariel.

— O que eu quero dizer é que eu realmente não sei muito sobre você, Sua Alteza.

— Suponho que não… Bem, o que gostaria de saber? — Suas bochechas coraram e Sylphie olhou significativamente para mim.

Ah, fala sério. Não estou pedindo as estatísticas vitais dela. Estou tentando ter uma conversa séria.

— Primeiro, se não se importar de compartilhar, eu gostaria de ouvir o motivo de você querer se tornar rainha.

Eu sabia que ela queria se tornar rainha, mas só tinha pegado partes sobre suas motivações. Ela mencionou algo sobre quantas pessoas morreram por ela. Presumi que Derrick fosse um deles.

— Tenho quase certeza de que já te disse quais são minhas motivações — disse Ariel.

— O quê? Disse?

— Sim, quando você e Sylphie se casaram.

— É mesmo…? — Cocei minha cabeça. — Bem, eu gostaria que você me lembrasse mesmo assim.

— Eu disse a você que não seria capaz de enfrentar as pessoas que acreditavam em mim e morreram por mim se eu não me tornasse rainha.

Concordei com a cabeça.

— Entendo. Então está fazendo isso pelas pessoas que sacrificaram suas vidas por você… Poderia me contar mais sobre essas pessoas?

Ela sorriu e inclinou a cabeça.

— Isso é de alguma forma relevante para o nosso problema atual?

Reconheço um olhar de rejeição quando vejo um. Ela não quer falar sobre isso.

— Não sei se tem alguma relevância ou não — confessei. — Mas do meu ponto de vista, parece que Lorde Perugius está testando você. Nesse caso, talvez se vasculharmos sua história e motivações, possamos encontrar pistas que nos levem à resposta que buscamos.

— Entendo o que você quer dizer.

Eu estava apenas dizendo isso como uma desculpa, mas na verdade faz sentido. Francamente, eu não tinha ideia do que fazia um verdadeiro rei, ou o que quer que Perugius quisesse chamá-lo. Eu não sabia nada sobre reis além do que tinha lido em um romance há muito tempo. Lembrei-me de uma frase que dizia algo como: “Um rei vive pelo seu povo. Não, é mais do que isso, ele existe para guiar o povo”. Minha ignorância sobre o assunto significava que espremer meu cérebro com a questão não seria muito produtivo.

— Pois bem, então. Devo avisá-lo que muitos morreram. Perdemos um número especialmente grande quando fugimos de Asura. Treze, para ser precisa. Os quatro cavaleiros eram Alasdair, Callum, Dominic e Cedric. Os três magos eram Kevin, Johan e Babette. Meus seis empregados eram Marcellin, Bernadette, Edwina, Florence e Corinne. Duvido que algum dia esquecerei seus nomes enquanto eu viver. Nossa jornada foi brutal. Lutamos juntos e superamos tantos obstáculos. Cada um deles desejava desesperadamente que eu me tornasse rainha e morresse tentando fazer isso acontecer.

Espera, o quê? Derrick nem está entre os nomes que ela listou. Que estranho…

Orsted havia mencionado que Derrick havia morrido, mas Ariel nem o mencionou. Talvez ele não fosse tão importante para ela? Talvez ele tivesse descoberto algo a partir dos treze que ela mencionara, caso estivesse vivo.

— Conte-me mais sobre cada um deles — eu disse.

— Pois bem. Levará algum tempo para fazer isso. Algum problema referente a isso?

Balancei a cabeça.

— Não me importo. Cada um deles deve ter sido importante, então eu odiaria pular um que fosse.

Assim que eu disse isso, a atmosfera ficou menos tensa. Ariel sorriu quando Luke ficou boquiaberto de surpresa. Seja qual fosse o motivo, Sylphie parecia estar sorrindo orgulhosamente. Nanahoshi era a única que parecia desconfortável.

— Tudo bem, nesse caso…

Ariel lentamente começou a se abrir sobre as treze pessoas que havia perdido. Ela me contou onde nasceram, como foram criados e como conheceu todas elas. Ela também entrou em seus gostos e desgostos, suas personalidades, do que mais se orgulhavam, quais conversas tiveram, o que as fazia rir, o que as deixava com raiva e o que as fazia chorar. Não poupou detalhes. Até me contou quem se dava bem com quem, quem gostava de quem e quem odiava quem. No fim, explicou como cada uma delas morreu. Cada pessoa tinha sua própria parcela de drama, mas todas eram gente de verdade, que viveu e morreu.

A conversa me disse tudo o que eu precisava saber sobre cada um dos treze. Sylphie e Luke também entraram aqui e ali com suas próprias lembranças dos falecidos. Todos os três tinham uma riqueza de informações que podiam compartilhar sobre o grupo que perderam, o tanto que se lembravam deles. Suspeitei que as outras duas garotas que serviam Ariel, que não estavam presentes no momento, pudessem fazer o mesmo.

Meu eu do futuro disse que Sylphie partiu para se juntar a Ariel porque se desencantou com ele, mas, pessoalmente, acho que ela teria ido de qualquer maneira. Os laços compartilhados pelo grupo deles eram tão fortes que eu não podia descartar essa possibilidade. Para ser honesto, estava sentindo um pouco de ciúmes. Deram suas vidas por Ariel, morreram protegendo-a. O peso disso era algo que eu conhecia muito bem. E eu achava que era uma coisa boa Sylphie saber disse, também.

— Isso é tudo — disse Ariel assim que terminou.

— Hm, interessante…

Infelizmente, nada do que ela havia dito parecia relacionado ao que era preciso para ser um “verdadeiro rei”. De certa forma, os laços que ela tinha com eles pareciam evidências suficientes de que ela estava apta para o papel. Afinal, a távola redonda do Rei Arthur também tinha treze assentos.

Sim, claro, se incluísse os sobreviventes, não chegava a treze, mas mesmo assim…

— Oh, minha nossa, esqueci de outra pessoa que era muito importante — disse Ariel.

Era isso que eu estava esperando. Tem que ser…

— Derrick Redbat.

Viu, eu sabia! Era isso que eu estava esperando.

Fiquei quieto, esperando que ela continuasse, mas Ariel apenas juntou as sobrancelhas enquanto seu rosto se franzia.

— O que aconteceu? — perguntei.

— Ah, é só… Para dizer a verdade, de repente percebi que realmente não o conhecia tão bem.

Ugh, ótimo. Então ele bateu as botas antes de ficar próximo dela.

Isso era um problema. Ela poderia ter mais a dizer sobre ele se, como na linha do tempo original, os dois tivessem lutado lado a lado e construído confiança enquanto ambos colocavam suas vidas em risco. Mas, infelizmente, ela não fez isso. Se os dois não tivessem construído memórias juntos, então ela não saberia que tipo de pessoa ele era, e eu não seria capaz de usar essa informação para descobrir como ele conseguiu influenciar Perugius.

— Você se lembra de alguma coisa sobre ele? — perguntei. — Não importa se parecer insignificante. Você disse que ele era alguém importante, então tinha que haver algo, certo?

Minha única opção era pressioná-la por respostas.

— Vejamos… Ele era uma pessoa muito séria e profissional.

Ariel continuou adicionando alguns detalhes, mas ele parecia muito…bem, normal para mim. Apenas um mago mediano e esperto. Era um intrometido irritante, do tipo que sempre suspirava de exasperação com as palhaçadas de seus amigos. Quando Ariel saía e fazia as coisas por conta própria, ele olhava para ela com um olhar crítico e a repreendia. O que ela me passou me fazia lembrar de Cliff. Ou talvez ele fosse mais como o Vice-Diretor Jenius. De qualquer forma, ele era basicamente o equivalente a um avô intrometido sempre se preocupando com o futuro de Ariel.

— Na época, meu comportamento não era digno de alguém que poderia se sentar no trono. Eu vivia um estilo de vida indolente. Nem sonhava em me tornar rainha… Foi quando aconteceu o Incidente de Deslocamento. Uma besta apareceu de repente, e Derrick morreu me protegendo. Seu último desejo era que eu me tornasse rainha. Foi por isso que passei a seguir esse caminho.

— Entendo.

Nada do que ela me descreveu me mostrava o que ele tinha em mente ou o que desejava, o que era uma pena, pois ela tinha me falado mais do que o suficiente sobre os treze que morreram durante sua jornada até aqui. Essa conversa também não deu nenhuma pista.

Tem que haver alguma coisa, pensei. Alguma maneira de extrair as informações de que preciso…

Enquanto eu estava murmurando para mim mesmo, contemplando uma solução, alguém de repente falou:

— Pensando bem, ele nunca duvidou que a Princesa Ariel seria a próxima rainha. Ele aproveitou todas as oportunidades que pôde para sugerir que ela assumisse o trono — disse Luke. Ele fez uma pose sensual, colocando a mão no queixo enquanto se lembrava do que sabia. — Talvez ele soubesse a resposta; sabia o que faz de alguém um verdadeiro rei. Isso explicaria o porquê dele estar tão confiante de que ela se tornaria rainha, porque sabia que ela possuía essa qualidade.

Bom trabalho, Luke!

Fazia sentido quando eu pensava nisso: Luke, como Ariel, tinha sido próximo de Derrick.

Mas tenho que ter cuidado com o que ele diz. É possível que ele só esteja compartilhando isso baseado no conselho que recebeu do Deus-Homem.

Era melhor presumir que qualquer coisa que Luke sugerisse poderia ser perigosa, mesmo que o próprio homem não quisesse fazer mal.

— Interessante. Isso certamente é possível — disse Ariel. Ela assentiu, como se as palavras que Derrick lhe dissera finalmente fizessem sentido com esse contexto adicional.

— Infelizmente, ele já não está mais conosco. — Luke a lembrou.

Todos ficaram quietos. Não tínhamos como saber o que Derrick estava pensando. Enquanto o silêncio se estendia, a atmosfera ficou mais pesada. Talvez tivéssemos passado muito tempo nos debruçando sobre aqueles que nos foram perdidos.

— Bem, de qualquer forma, vamos continuar pensando nisso e ver se podemos encontrar outras pistas — eu disse.

Minhas palavras não fizeram nada para aliviar o ar sombrio que se instalara sobre a mesa. No final, não encontramos opções construtivas naquele dia.

 


 

Tradução: Taiyo

Revisão: Guilherme

QC: Delongas

 

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