O Santuário da Espada, localizado no extremo oeste dos Territórios Nortenhos, em uma terra onde ocorreram inúmeras batalhas famosas. No momento, era o lar do estilo Deus da Espada, mas houve um tempo em que o estilo Deus da Água o dominava.
Apenas um século atrás, os líderes dos dois estilos duelaram neste local, e o Deus da Água ganhou o Santuário de seu dono. Aquele Deus da Água foi mais tarde derrotado por um Deus da Espada diferente e, por sua vez, perdeu o Santuário; mas, desde então, este local pertence ao único espadachim mais forte de cada geração sucessiva, que ganhou o direito de ensinar os de sua escola as suas técnicas.
Os alunos que conseguiam uma vaga no Santuário eram ensinados pelo melhor professor possível e tinham a chance de suplantar-se como os mais fortes. Este era um fato que atraia muitos jovens espadachins ambiciosos a este lugar frio e isolado, apenas para vê-lo com seus próprios olhos.
No momento, porém, dois visitantes de um tipo mais incomum estavam se aproximando de seu salão principal.
Uma era uma mulher idosa, talvez com sessenta e poucos anos. A expressão em seu rosto sugeria que era meio mesquinha; senão, era a imagem de uma senhora gentil e inofensiva. No momento estava vestida para viajar, mas era fácil imaginá-la com roupas mais casuais, recostada em uma poltrona enquanto tricotava algo de lã.
Apenas um detalhe parecia incongruente: A velha usava uma espada ligeiramente curta no quadril. Vendo isso, um espadachim habilidoso poderia ter visto que sua postura relaxada era apenas uma fachada, e que mesmo seus ataques mais rápidos não conseguiriam tocá-la.
Mas chega de rodeios. O nome da mulher era Reida Lia, e era a Deusa da Água reinante. Ela aperfeiçoou a técnica definitiva de seu estilo, a Lâmina da Privação, e se classificou entre os guerreiros mais fortes da geração.
Acompanhando Reida estava uma mulher jovem, talvez com 20 anos de idade, cujo rosto tinha certa semelhança com o dela. Também estava vestida para viajar e também carregava uma espada no quadril.
— Este é o Santuário, Mestra Reida?
— É, minha querida. Dê uma boa olhada, este é o covil de bestas que você esteve tão ansiosa para visitar por todos esses anos.
— Oh, agora estou ficando nervosa…
— Tenha um pouco de confiança em suas habilidades. A menos que elas a coloquem contra o Deus da Espada, você se sairá bem.
— Obrigada, Mestra Reida.
Falando baixinho uma com a outra, as duas colocaram os pés no Santuário da Espada.
À primeira vista, esse lugar “sagrado” parecia uma cidade comum. Havia uma pousada, uma loja de armas e uma guilda de aventureiros. Nas ruas estavam os aventureiros e mercadores habituais, apressando-se em suas tarefas particulares.
No entanto, havia uma coisa incomum nesta cidade. Praticamente todos os que residiam aqui eram membros treinados no Estilo Deus da Espada. Neste lugar, uma esguia garota da aldeia, às vezes, era mais forte do que o mais corpulento dos aventureiros.
— Devemos reservar um quarto na pousada primeiro?
— Não será necessário. Vamos ficar na casa de Gall.
Reida avançou com dificuldade, fazendo um caminho mais curto para o outro lado da cidade.
Depois de certo ponto, os aventureiros e mercadores tornaram-se menos comuns e começaram a passar por mais pessoas em uniformes de artes marciais que carregavam espadas de madeira. Ao mesmo tempo, as lojas deram lugar a salas de treinamento.
A jovem companheira de Reida olhou em volta para tudo isso com óbvia curiosidade. Parecia particularmente intrigada com os uniformes finos que muitos usavam, apesar do frio cortante.
— Mestra Reida… todos estão vestidos com roupas leves, mesmo estando tão frio.
— Bem, o pessoal do estilo Deus da Espada tem que correr em combate, ou se tornam alvos fáceis. Eles não gostam de usar nada que os retarde, não importa o quão frio esteja.
— Isso é exatamente o oposto de nós! Nós nos agasalhamos mesmo quando está quente, não é? Que curioso!
— Se me perguntar, não vejo nada de curioso nisso.
Sem ao menos lançar um olhar para as várias salas de treinamento, Reida seguiu em frente.
Em pouco tempo, as casas, salas de treinamento e noviços uniformizados desapareceram por completo.
A única coisa à frente delas agora era uma vasta planície de neve com uma única estrada correndo por ela como um vale. No final da estrada havia um único edifício de tamanho considerável cercado por um muro.
Este era o núcleo do Santuário da Espada e a sede do Estilo Deus da Espada – o grande salão onde o próprio Deus da Espada mantinha sua corte.
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Assim que Reida e sua jovem companheira chegaram à entrada do complexo, uma jovem surgiu por acaso lá de dentro.
A mulher tinha um rosto forte e digno, e seus longos cabelos azul-escuros estavam presos em um rabo de cavalo. A julgar pelo balde em sua mão, estava saindo para tirar água de um poço.
Ao ver Reida, no entanto, imediatamente jogou o balde de lado e estendeu a mão para o punho de sua espada.
— Você tem algum negócio com o nosso salão, senhora? — perguntou, seu tom abertamente cauteloso.
Reida estudou o rosto da jovem de perto. E depois de um momento, a expressão mal-humorada em seu rosto suavizou significativamente.
— Nossa. É você, Nina? Veja como você ficou grande.
A jovem apenas olhou para ela em dúvida, mantendo a mão onde estava.
— Ah, você não se lembra de mim, lembra? Bem, eu acho que não. Você era muito pequena da última vez que estive aqui…
Havia uma luz nostálgica nos olhos de Reida, mas a jovem, Nina Falion, não tinha nenhuma memória dela. A única coisa de que tinha certeza era que esta velhinha era uma terrível ameaça.
A garota ao seu lado também não era desleixada. Nina percebeu que ela estava pelo menos no mesmo nível que o seu.
— Bem, estou aqui porque seu chefe me chamou, querida. Importa-se de me levar até ele?
— Meu chefe?
— Sim. Gall Falion.
Nina hesitou com essas palavras.
Muitos vieram a este lugar procurando encontrar Gall Falion. Mas a maioria eram tolos presunçosos que se convenceram de que poderiam tirar o título dele. Afastar essas pessoas era uma das responsabilidades atribuídas a Nina e para seus colegas de treinamento.
— Primeiro, poderia fazer a gentileza de me dizer seu nome?
— Me chamo Reida. Reida Lia. Não acho que preciso dizer mais, não é?
— M-Minhas desculpas. Por favor, venha por aqui.
No instante em que ouviu o nome da velha, Nina curvou-se respeitosamente e a convidou para entrar no complexo.
Apenas uma pessoa no mundo poderia se apresentar como Reida Lia. Era um nome reservado para a líder do Estilo Deus da Água. Ninguém mais tinha permissão para reivindicá-lo.
Por um breve momento, Nina considerou a possibilidade de que esta mulher fosse uma impostora. Mas ela sentiu, em um nível instintivo, que a superfície plácida da velha senhora escondia profundezas insondáveis, então afastou o pensamento de sua mente. Mesmo que a mulher não fosse quem afirma ser, era, sem dúvida, uma força a ser reconhecida.
Reida e sua companheira seguiram Nina para dentro do complexo do Estilo Deus da Espada. Nina os conduziu direto para o corredor principal, onde tiveram que subir para entrar – uma característica comum à maioria dos edifícios desta região nevada.
Na entrada, pararam para limpar a neve de suas roupas, em seguida, seguiram ao longo do corredor de madeira que rangia.
Observando Nina por trás enquanto ela caminhava, Reida falou com uma voz pensativa:
— Devo dizer, querida, você é bastante inteligente para a sua idade. E educada, por falar nisso! Você já chegou ao nível Rei da Espada?
— Não, ainda tenho um longo caminho a percorrer, infelizmente.
— Sabe? Tenho certeza que você é a mais forte dos jovens, pelo menos. Não precisa ser muito modesta.
— Bem, eu posso ser a mais rápida, suponho, mas não a mais forte.
— Oho! Essa é uma boa atitude que você tem aí, querida. É uma pena que os outros jovens do seu estilo não sejam mais parecidos com você.
Enquanto falavam, as três chegaram ao Salão Efêmero.
Um único homem estava sentado lá. Seus olhos estavam fechados, como se estivesse meditando. A mera visão dele, no entanto, fez Reida sentir como se uma lâmina nua estivesse em sua garganta.
Reida era a Deusa da Água e a líder de um Grande Estilo – uma das três únicas pessoas desse tipo no mundo. Apesar de sua idade avançada, não se sentia menos poderosa do que no seu apogeu. Ela poderia virar qualquer espada de lado sem qualquer esforço.
Mas este homem era a única exceção à regra. Seu nome era Gall Falion, e ele era o Deus da Espada reinante.
— Mestre, trouxe Reida Lia aqui para vê-lo.
— Ah. Você está aqui. — Abrindo um pouco os olhos, Gall Falion estudou o rosto de Reida. Ele também olhou brevemente para a garota ao lado dela, mas pareceu perder o interesse nela rapidamente. — Obrigado por marchar até aqui, Reida. Não deve ter sido fácil com esses seus ossos cansados, tenho certeza.
— Certamente não foi. Mesmo assim, não é todo dia que você me pede um favor, certo? Você despertou minha curiosidade, suponho. Uff…
Reida se aproximou do Deus da Espada e sentou-se à sua frente. Apesar do indigno uff que ela emitiu ao fazê-lo, seus movimentos eram tão claros e naturais quanto o fluxo de névoa de uma montanha.
Nina, assim como a companheira de viagem de Reida, sentaram-se um pouco mais para trás em um gesto de humildade.
— Então, para quem eu vou ensinar, e o quê? Você quer que eu ensine àquela garota as técnicas secretas do Deus da Água ou algo assim? — Ao falar essas palavras, Reida puxou o queixo para trás para indicar Nina Falion. — Parece uma criança que sabe ouvir. Ela pode ser um tipo natural de Deus da Espada, mas tenho certeza de que também poderia colocar algumas habilidades do Deus da Água em sua cabeça.
A carta que trouxe Reida a esta terra foi breve.
Em essência, dizia apenas: Quero que você venha treinar um de meus alunos.
Reida quase rasgou a coisa em pedaços no momento em que leu essas palavras. E, no entanto, achou intrigante que Gall Falion tivesse se dado ao trabalho de escrever para ela uma carta de qualquer tipo. O homem odiava pedir qualquer coisa a alguém.
Essa não foi a única razão pela qual veio, entretanto. Mera curiosidade não teria sido suficiente para fazê-la ir da capital do Reino Asura até tal lugar.
— Em qualquer caso, tenho uma condição.
— O que é?
— Você quer que eu ensine algumas coisas a um de seus alunos, certo? Bem, eu quero que você mostre a um dos meus o estilo Deus da Espada. Mas não há necessidade de ensiná-la.
Reida vinha se preocupando há algum tempo que sua aluna estrela tivesse ficado muito satisfeita consigo mesma. O estilo Deus da Água era o estilo oficial ensinado no Reino Asura, o que significa que contava com muitos alunos. Mas era raro para eles refinarem seus talentos além de um certo ponto.
A garota que Reida trouxe era uma das exceções, mas ela não tinha outros alunos com habilidades comparáveis para se testar, assim sua confiança se tornou excessiva. Ela manteve seu treinamento com dedicação suficiente, mas sem um verdadeiro rival para levá-la adiante, falhou em fazer um progresso real no último ano.
Reida a levou a este lugar para lhe dar um gostinho de derrota, convencida de que isso a beneficiaria enormemente a longo prazo. Mesmo que os jovens do estilo Deus da Espada provassem ser inadequados para a tarefa, se ela tivesse a chance de treinar com o próprio Gall Falion, a experiência ainda seria profundamente valiosa. A natureza do Estilo Deus da Água era tal que quanto mais forte seu oponente, mais você melhoraria treinando com ele.
Reida achou provável que Gall Falion tivesse a chamado aqui pelo mesmo motivo – para ela esmagar algum aluno arrogante com os contra-ataques mais violentos do Estilo Deus da Água, motivando-os a melhorar ainda mais.
— Oh, isso é tudo? Claro.
— Heh heh. Sabe, nós poderíamos até mesmo ter minha pupila contra a sua, se você quiser.
Esta não foi uma proposta espontânea, é claro. Reida esperava que Nina desse uma lição de humildade à sua aluna. Jogá-la direto contra o Deus da Espada era uma ideia, mas ela percebeu que seria mais humilhante perder para uma garota de sua idade.
— Por que não? Nina, vá buscar Eris para mim.
— Sim, Mestre.
Com essas palavras, Reida inclinou a cabeça curiosamente. Desde o momento em que conheceu a garota na entrada do complexo, assumiu que Nina era a aluna que foi ali para ensinar.
— Hm, Mestre… — disse Nina.
— O que é? Apresse-se, garota.
— Eu estava… esperando que você me desse a oportunidade de treinar com nossa visitante também. Estou muito interessada em ver o que o Estilo Deus da Água pode fazer.
— Huh? Isso sempre fez parte do plano.
— O-Oh! Obrigada! Vou buscar Eris de uma vez!
Uma expressão feliz e aliviada passou brevemente pelo rosto de Nina antes que ela saísse correndo pelo corredor.
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No instante em que viu a garota, Reida sentiu arrepios nas costas. Parecia que ela tinha acabado de encontrar um monstro selvagem na beira da estrada. Ela quase alcançou sua espada por puro reflexo. A única razão pela qual evitou esse constrangimento em particular foi que sua pupila foi mais rápida do que ela…
Os praticantes do Estilo Deus da Água deveriam permanecer calmos e serenos durante o tempo todo. Ficar muito nervoso é um fracasso por si só.
— Ei, você aí, Eris. Essa velha senhora é quem vai te ensinar tudo sobre o Estilo Deus da Água.
— Prazer em conhecê-la…
Eris não fez nenhum esforço para esconder a carranca em seu rosto, mas ainda assim baixou a cabeça.
Minha nossa, a garota é algum tipo de gato selvagem…
Emoção intensa ardia profundamente no fundo dos olhos de Eris. Ela tinha todo espírito e fúria de um animal faminto. O Estilo Deus da Água era uma abordagem passiva e flexível para o combate. Mesmo o melhor dos professores não poderia esperar ensinar uma garota com olhos assim. Para começar, ninguém assim jamais procurou aprender seu estilo.
— Odeio te desapontar, Gall, mas essa garota não foi feita para o Estilo Deus da Água. Tentar com ela seria perda de tempo.
— Você acha que não sei disso? — disse Gall Falion com um aceno enfático.
— Então o que eu devo ensinar a ela?
— Você não tem que ensinar nada a ela. Apenas a treine usando seu estilo.
— Hmm…
Essa breve conversa foi suficiente para Reida discernir as intenções do Deus da Espada. Ele queria que essa garota, Eris, aprendesse a lutar contra o Estilo Deus da Água da maneira mais prática possível. Reida não entendeu o porquê, no entanto. Não faria mal para a garota obter um pouco de experiência contra um estilo diferente, mas chamar Reida aqui para isso era simplesmente um exagero.
Um estudante talentoso e experiente do estilo Deus da Espada poderia lançar um ataque rápido demais para que um praticante comum do Estilo Deus da Água desviasse. Comparado a aprender as complexidades do estilo de Reida, a garota ficaria melhor simplesmente dominando o seu próprio.
Ao contrário do Estilo Deus da Água, que exigia até mesmo de um oponente para praticar, o Estilo Deus da Espada tratava de acertar o primeiro golpe com velocidade e poder esmagadores. Não havia necessidade de conhecer seu inimigo se o abatesse antes que pudesse reagir.
Do jeito que Reida via, a única razão de Falion querer que a garota ganhasse experiência contra o Estilo Deus da Água, especificamente, era se ele esperava que ela enfrentasse um praticante verdadeiramente poderoso do estilo – alguém habilidoso demais para ser dominado apenas pela velocidade.
E houve apenas um desses praticantes que surgiu à mente.
— Estou um pouco confusa aqui, Gall. Você está planejando que esta pequena besta me assassine, ou o quê?
— Ah, por favor! Você já está com um pé na cova. Por que eu ainda me incomodaria?
— Bem, me esclareça, então. Por que você precisa que eu a ensine como funciona o Estilo Deus da Água? Em quem você está planejando jogá-la?
Um sorriso feroz se espalhou pelo rosto de Gall Falion.
— Nossa garota Eris aqui quer derrotar o Deus Dragão.
— O quê? Está falando de Orsted…?
Reida ficou genuinamente abalada com o simples pensamento. Ela também estava muito familiarizada com Orsted dos Grandes Poderes. Ela sabia de sua força – e que ele usava o Estilo Deus da Água livremente.
— O Deus Dragão, não é? Ora, ora… alguém com certeza tem, é…, ambição. Você acha que ela pode fazer isso?
— Sim. E Eris também.
— Ah, bem, isso é bom. Que bom que você está confiante.
Era difícil dizer se isso era verdade. O Deus Dragão ficava em segundo lugar entre os Sete Grandes Poderes. A ideia de tentar derrotá-lo pareceu a Reida totalmente ridícula. E, ainda assim, havia confiança no rosto do Deus da Espada, e a garota Eris parecia não ter nenhuma dúvida. Isso era estranhamente atraente.
Reida se pegou pensando que isso poderia ser divertido, pelo menos – supondo que estivessem sérios.
— Mas é o seguinte, Gall. Não estou interessada em perder tempo com alguém sem talento. Vamos começar com ela contra minha pupila aqui, certo? Vou brincar com ela assim que ela dominar a criança. E se ela se mantiver firme comigo, então vou pensar em ensiná-la algumas coisas.
Era um plano do tipo “três pássaros, uma pedra”.
O orgulho de sua pupila estrela sofreria um golpe, mas ela também teria bastante prática contra o Estilo Deus da Espada. E Reida iria participar de algo muito… interessante.
Pela primeira vez em muito tempo, ela podia sentir seu coração dançando de excitação. Ela era uma mestra do Estilo Deus da Água, sim, mas também era uma espadachim comum no coração.
— Você ouviu isso, Isolde? Vá em frente e lute contra essas duas.
Ao som de seu nome, a discípula de Reida se levantou.
— Acredito que entendo a situação. Meu nome é Isolde Cluel e sou uma Rei da Água. Prazer em conhecê-las.
— Sou Nina Falion, uma Santa da Espada. Prazer em conhecê-la.
— Sou Eris Greyrat…
Com essas breves apresentações concluídas, as três jovens caminharam silenciosamente para o canto da sala onde as espadas de madeira estavam localizadas.
Enquanto pegavam as armas, Isolde levou a mão à boca e sussurrou para que apenas Eris e Nina pudessem ouvir:
— Vou pegar duro, já que minha mestra me pediu… mas se você for apenas de nível Santo, temo que isso não vai ser uma grande luta.
— Talvez não. Acho que teremos que ver o que acontece.
— Hmph…
Foi uma tentativa de provocação barata, claro… mas não demorou muito para incendiar as jovens prodígios do Estilo Deus da Espada.
Uma hora depois, Eris estava deitada de costas no meio do corredor.
— Haa… haa…
Seus olhos estavam abertos e ela estava ofegando ruidosamente por mais ar.
Isolde a derrotou por completo. Sua espada não tinha sequer raspado sua oponente.
No momento, a lâmina de Eris estava entre as dez mais rápidas em todo o salão. Seus golpes, aprimorados por anos de balanços de prática solitária, ostentavam velocidade e poder se aproximando dos de Ghislaine, e o ritmo peculiar de seus ataques os tornavam particularmente difíceis de evitar. Ela também usou alguns truques do Estilo Deus do Norte, tornando-a ainda mais imprevisível. Ao todo, tinha se tornado muito mais temível do que a média dos Santos da Espada.
No entanto, Isolde evitou tudo que Eris usou contra ela, e respondeu a eles com contra-ataques afiados. Durante a luta, que durou menos de trinta minutos, Eris “morreu” quase cem vezes.
— …
E, ainda assim, Isolde também estava deitada no chão, bem ao lado dela.
Seu prazer em esmagar Eris durou pouco. Nina Falion a derrotou.
Isolde sempre acreditou que o Estilo Deus da Espada nada mais era do que uma confiança bruta e impensada na velocidade e no impulso. Ela pensava que não representava uma ameaça real para um especialista nas técnicas refinadas do Deus da Água.
Nina expôs esses pensamentos pelo absurdo arrogante que eles eram. Isolde foi incapaz de reagir ao primeiro ataque que atingiu a lateral de sua cabeça com força suficiente para deixá-la inconsciente.
A luta terminou antes mesmo de começar.
— Bem, isso não é um resultado interessante! — disse Gall Falion, sentado no lugar de honra do salão.
Sem responder, Nina curvou-se profundamente ao Deus da Espada.
A palavra que ele usou era interessante. Isso sugeria que não esperava que Nina fosse a última de pé. Ela sentiu um pouco de decepção, mas isso foi superado por seu prazer em demonstrar a seu mestre o progresso que havia feito. Ela vivia pela emoção da vitória, não menos do que qualquer outro neste salão.
— Não posso dizer que concordo, Gall — disse Reida em um tom de voz indiferente.
Ela havia antecipado esse mesmo resultado desde o início. Uma fera furiosa, incapaz de esconder suas emoções era a presa mais fácil possível para um especialista no Estilo Deus da Água.
Eris era forte, com certeza, e tinha um enorme potencial de crescimento. Mas a força não foi suficiente. Uma bola de pura fúria não tinha chance alguma contra a abordagem do Deus da Água.
Reida também esperava a vitória de Nina, com não menos certeza. A garota era profundamente habilidosa para sua idade, mas não tinha deixado isso subir à sua cabeça. Muito provavelmente, a presença desta criança, Eris, manteve seu orgulho sob controle. Nina, em sua humildade, dedicou-se ao treinamento. E Isolde, em seu orgulho, havia negligenciado o dela. Foi por isso que perdeu a luta.
Os ataques de Nina não foram particularmente rápidos em comparação com os de Eris. Na verdade, eram um pouco mais lentos. E a força por trás dos balanços de Eris foram muito maiores.
No entanto, não havia emoção nos ataques de Nina. Não havia ódio em seus olhos, nenhuma hostilidade em seu rosto, nem mesmo um reflexo em suas bochechas. Para Isolde, foi como um raio vindo do nada. Ela provavelmente acabou inconsciente antes mesmo de sentir que a garota estava indo em sua direção.
— Ainda assim, parece um começo favorável. O que você diz, querida? Quer aprender alguns truques do Deus da Água comigo?
Nina considerou a oferta por um momento, mas acabou balançando a cabeça.
— Não. Quero manter meu foco em dominar o Estilo Deus da Espada.
— Bom, bom. Você está certa — disse Reida com um sorriso satisfeito. — Tudo bem então, Gall. Que tal fazermos essas três treinarem em grupo por um tempo? Isso deve aguçá-las um pouco.
— Sim, parece bom. Não adianta perder seu tempo se Eris não consegue lidar com gente como uma Rei da Água.
— Sim. Também deve fazer maravilhas para a motivação da minha aluna. A garota está precisando de alguém para treinar.
O Deus da Espada e a Deusa da Água discutiram o assunto um pouco mais e chegaram a um acordo: Eris seria incumbida de derrotar Isolde, e Isolde de derrotar Nina.
Até que isso acontecesse, as três treinariam juntas como iguais, apontando as deficiências uma da outra. Em teoria, seria benéfico para todas.
— Você está bem com isso, Nina…?
Nina concordou facilmente com a proposta de seu mestre.
— Não me importo.
Para ter certeza, ela entrou nesta sessão por nada mais do que curiosidade. Ainda assim, a oportunidade de praticar extensivamente com uma talentosa aluna do Estilo Deus da Água parecia de fato valiosa. Nina derrotou Isolde de forma decisiva. Mas ela não pensava nela, ou Eris, como abaixo de seu nível. E aprendeu com a experiência em primeira mão o valor de competir de perto com seus colegas.
Se não fosse pela presença de Eris no Santuário da Espada, Nina tinha certeza de que teria ficado parecida com Isolde.
— Tudo bem. Então vamos com isso. Você trabalhará com seus professores habituais pela manhã, mas à tarde vocês três podem se agrupar e treinar umas com as outras.
Nina assentiu baixinho. E Eris também respondeu do chão.
— Sim, Mestre.
— Entendi…
Isolde ainda estava inconsciente, mas Reida não tinha intenção de permitir que ela recusasse.
Daquele dia em diante, Eris começou suas aulas de luta contra o Estilo Deus da Água.
Um mês depois, as três haviam se estabelecido em um peculiar impasse de três vias. Eris vencia Nina de forma consistente. Nina vencia Isolde. E Isolde vencia Eris.
As três mantiveram suas programações de treinamento individuais, é claro, mas também reservavam um tempo para várias partidas de treino todos os dias e trocavam suas opiniões depois.
Não demorou muito para Isolde identificar as fraquezas de Eris.
— Eris, você irradia hostilidade. Os praticantes do meu estilo são muito bons em captar esse tipo de coisa. Isso denuncia exatamente quando você vai atacar, o que torna fácil de reagir.
— Tá, certo. Mas o que devo fazer sobre isso?
Para a surpresa de Isolde, Eris aceitou prontamente suas críticas. A maioria das pessoas parecia pensar na garota como uma maníaca violenta e obstinada, mas ela estava genuinamente faminta por maneiras de melhorar.
— Vejamos… Nina, você não mostra muita coisa antes de atacar. Como você controla sua hostilidade tão bem?
— Não tenho certeza do que te dizer. Um duelo é apenas uma questão de mover sua espada mais rápido que seu oponente, certo? Não consigo ver o que hostilidade tem a ver com isso.
Com toda a honestidade, Nina sempre achou estranho que o humor padrão de Eris fosse “furiosa”. Fazia sentido ficar constantemente agitada, mesmo quando não tinha nenhum inimigo real com quem lutar? Relaxar quando tinha a chance parecia ser a jogada mais inteligente.
— Bem, eu também não sei — resmungou Eris.
— Certo. Por que você não tenta mudar sua rotina diária, para começar? Tome um banho demorado, coma uma boa refeição, deite-se em uma cama quentinha e pense naquele seu amado namorado até cair no sono.
— Com licença? O que Rudeus tem a ver com isso?
— Ah, qual é… essa parte foi só uma piada. Mas tente o resto, sério. Para ser honesta, não parece que você cuida bem de si mesma. Isso pode ser meio alarmante.
— Tudo bem…
Eris teria preferido manter seu estado atual de tensão constante. Havia uma razão para isso: quanto mais ela treinava, mais conseguia entender o quão incrivelmente poderoso o Deus Dragão Orsted era.
Ele tinha usado as mesmas técnicas de Isolde, mas as dele eram muito mais precisas e habilmente executadas. E ela era uma Rei da Água, enquanto ele nem era membro da escola.
Nina deixou escapar um suspiro exagerado.
— Honestamente, por que nunca consigo vencer essa garota ridícula? Isso está começando a prejudicar minha autoconfiança…
Ela passou todos os dias seguindo um sistema eficiente e lógico de treinamento desenvolvido pelo próprio Deus da Espada. Ela fortalecia seu corpo da maneira mais proveitosa possível, comia refeições cuidadosamente balanceadas e mantinha uma programação bem organizada.
E, ainda assim, não podia vencer Eris – cuja rotina era decididamente não racional.
— É porque estou fazendo você se mover depois de mim…
— Huh?!
Nina não esperava que a garota realmente respondesse sua pergunta. A Eris que ela conhecia era a definição de egoísmo. Ela nunca tinha mostrado nenhum interesse em ajudar ninguém além de si mesma a melhorar.
— Ruijerd me ensinou isso. Você pode usar coisas como contato visual para fazer as pessoas se moverem primeiro ou hesitar um pouco.
— Ruijerd…? Quem é esse?
— Meu professor.
Nina ficou intrigada principalmente com as palavras de Eris. Ela não entendia do que a garota estava falando, mas a técnica era, na verdade, uma habilidade altamente avançada que Eris aprendeu com Ruijerd. Foi desenvolvida pelos guerreiros do povo Demoníaco como uma aplicação consciente de certas ações sutis que espadachins verdadeiramente experientes executavam por reflexo.
Claro, isso significava que Eris não poderia começar a explicar como funcionava.
— Em outras palavras, Eris, você está deliberadamente guiando as ações de seus oponentes?
— Isso mesmo.
— …
O esclarecimento de Isolde ajudou Nina a entender o conceito básico. Ela agora entendia a ideia, mas isso só tornava mais difícil de acreditar. Ela se encontrou olhando para Eris duvidosamente. Ao que tudo indicava, a garota tinha sido criada por uma matilha de lobos na floresta. Nina nunca teria suspeitado que ela era capaz de usar uma habilidade tão sofisticada.
Isolde, por outro lado, achou a ideia muito mais compreensível. O Estilo Deus da Água era focado principalmente no contra-ataque, então tinha seu próprio conjunto de técnicas destinadas a encorajar o oponente a atacar primeiro.
— Entendo. E você tem usado as mesmas técnicas quando me enfrenta?
— Bem, sim, mas você nunca se move.
— Sim, fui treinada para isso. Da próxima vez que nos enfrentarmos, talvez você deva parar de se preocupar com isso e deve se concentrar em suprimir sua hostilidade. Isso pode mudar um pouco as coisas.
Eris franziu a testa, mas acenou com a cabeça.
— Vou tentar.
Ela estava disposta o suficiente para tentar isso, mas ainda não sabia como “suprimir” sua hostilidade. Controlar seus sentimentos não era algo que realmente tinha feito antes.
Claro, ela tinha ouvido comentários como este muitas vezes. No entanto, Ruijerd a encorajou a fazer uso de sua agressão natural, e seus métodos de treinamento levaram isso em consideração. Como resultado, ela nunca sentiu a necessidade de mudar.
Embora sua hostilidade pudesse normalmente ser uma desvantagem, ela tinha mais disso do que a maioria das pessoas. Ela preferiu usá-la como um recurso, em vez de fingir que isso não estava lá.
— Então me pergunto o que devo tentar — murmurou Nina. — Isolde, como você lida com ela?
— Deixe-me ver. No Estilo Deus da Água, treinamos para esse tipo de coisa cobrindo nossos olhos e aprendendo a sentir quando um ataque está realmente chegando, mas… acredito que a técnica de Eris é bastante comum entre os guerreiros Demoníacos, então imagino que o Estilo Deus da Espada tenha sua própria maneira de lidar com isso. Por que você não pergunta ao seu mestre sobre isso?
Isolde era talentosa e profundamente inteligente. O Estilo Deus da Água tendia a atrair tipos pacientes e estudiosos como ela.
— Vou tentar. Isso às vezes é frustrante… Oh. Parece que o sol está se pondo.
Com essas palavras de Nina, a sessão de revisão do dia chegou ao fim.
— Acho que então vejo vocês duas amanhã — disse Isolde com um sorriso. — Sabe, tenho me divertido muito recentemente. Esta é a primeira vez que tenho a chance de conversar sobre essas coisas com alguém que tenha mais ou menos a minha idade.
— O sentimento é mútuo, Isolde — respondeu Nina.
Ela também queria dizer isso. Agora que Eris estava realmente falando com ela, Nina percebeu que a garota tinha um conhecimento vasto e variado de combate. Além de sua experiência prática, ela evidentemente tinha um conhecimento superficial das técnicas do Deus do Norte e do povo Demoníaco à sua disposição.
Era difícil se livrar de sua impressão geral de Eris como um cão selvagem em roupas humanas, mas ela ganhou um respeito relutante por suas habilidades. A garota não estava recorrendo a “truques baratos”, estava simplesmente usando habilidades de outras escolas de combate.
— Hmph…
A atitude de Eris não mudou muito. Normalmente, ela não teria sequer dado suas opiniões em um grupo como este, mesmo quando forçada a comparecer. Mas esta noite, se lembrou do período em que estava aprendendo a espada com Rudeus quando criança. Os dois sempre conversavam sobre seu progresso e descobriam novas maneiras de melhorar, assim como Nina e Isolde estavam fazendo.
Não pode ser uma má ideia se Rudeus costumava fazer isso.
A lógica era muito simples, quase infantil. Mas para Eris, foi poderosa o suficiente para convencê-la a realmente se comunicar pela primeira vez.
— Bem, então já vou embora. Tenho mais treinamento com meu mestre esta noite.
— Obrigada por sua ajuda hoje, Isolde.
— Não me agradeça, Nina. Você também está me ajudando. Posso sentir que estou melhorando a cada dia.
Enquanto as três se aproximavam do ponto em que o caminho para os quartos de hóspedes divergia daquele que levava à pousada, Isolde e Nina pararam para algumas gentilezas finais.
Eris, por outro lado, continuou descendo o caminho que levava à pousada.
— Obrigada também, Eris — falou Isolde.
— Amanhã vou te acertar uma vez…
— Fico ansiosa por isso.
— Hmph.
Sem nem mesmo se virar, Eris marchou para frente. Com um aceno final para Isolde, Nina correu atrás dela.
— Eris? Presumo que você continuará treinando por um tempo, mas assim que terminar, lembre-se de pelo menos se enxaguar.
Normalmente, essas palavras teriam passado por um dos ouvidos de Eris e saído pelo outro. Nina não esperava que ela ouvisse, mas dizia isso quase todos os dias, independentemente. Afinal, a garota ficava terrivelmente fedida.
Desta vez, entretanto, Eris não apenas a ignorou. Em vez disso, se virou para encarar Nina com uma expressão ligeiramente irritada no rosto.
— O que você disse antes é realmente verdade…?
— Hm? Do que você está falando?
— Você disse que eu poderia esconder minha hostilidade se eu tomasse um banho demorado, comesse uma boa refeição e pensasse em Rudeus na cama todos os dias.
— Uh…
Nina ficou sem palavras. Com toda a honestidade, ela disse isso principalmente em uma tentativa de enganar Eris para agir de forma um pouco mais civilizada. Mas, em teoria, a capacidade de relaxar era uma parte crucial do controle de suas emoções. E então, ela decidiu seguir com isso.
— S-Sim, isso mesmo! E por outro lado, aquele seu namorado não ficará interessado em você por muito tempo se estiver constantemente fedorenta.
— Isso não será um problema. Eu costumava pegar Rudeus abraçando minhas camisas velhas e suadas o tempo todo.
— Uh, o quê…?
Lembrando-se do jovem que conheceu brevemente antes, Nina tentou imaginá-lo enterrando o rosto nas roupas fedorentas dessa garota estranha. Era uma imagem mental terrível. No entanto, ela viu que Eris estava ficando cada vez mais irritada com sua reação, e sabiamente optou por não comentar mais.
— Olha, esquece. Tudo o que sei é que os homens não gostam de mulheres sujas, certo?
— Hmm… Bem, acho que Rudeus era meio exigente em manter as coisas limpas…
— Ai está! E é por isso que você deve prestar mais atenção à sua higiene.
Eris parou para pensar por um momento. Memórias de Rudeus inundaram sua mente. Ela geralmente fazia um esforço consciente para não relembrar o passado… mas quando baixava a guarda, sempre acabava pensando nele. E quando pensava nele, seus lábios se curvavam em um sorriso por conta própria.
Enquanto ela considerava isso, Eris percebeu algo interessante.
Provavelmente não estou emitindo nenhuma hostilidade agora, estou?
— Então tá. Acho que vou me lavar.
— Sim, não esperava nada melhor de você. Não se preocupe, quase desisti disso… Espere. O que você acabou de dizer?
Eris caminhou em direção a seu quarto sem responder à pergunta.
E Nina apenas a observou partir com um olhar de descrença congelado em seu rosto.
Demorou mais um ano para Eris chegar a uma posição de igualdade com a Rei da Água Isolde.
Tradução: Nero
Revisão: Guilherme
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