Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado

Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado – Vol. 11 – Cap. 02.5 – Interlúdio – Relações Mestre/Servo

 

Vamos voltar um pouco no tempo. Antes de contarmos o resto desta história, quero mencionar algo que aconteceu há cerca de uma semana antes do colapso de Nanahoshi.

Naquele dia, assim que coloquei os pés no laboratório de Zanoba, ele chamou por mim, trotando com uma caixa nos braços. Seu rosto brilhava de orgulho.

Colocando a caixa sobre a mesa, Zanoba tirou seu conteúdo – um objeto longo e esguio coberto com um pano. Desembrulhando-o, revelou um braço artificial em questão. Ele o cortou em pedaços, igual a uma cenoura.

— Mestre! Dê uma olhada nisso!

— O que é isso?

— É o braço daquele boneco que estamos estudando.

— Quando olhei perto dos lugares onde a tinta descascou, percebi o que pareciam ser costuras na superfície. Tentei cortá-las, só para ver o que poderia acontecer… e foi isso que descobri.

Pegando uma das fatias, Zanoba girou para que eu pudesse ver o corte transversal. Vi um padrão como se fosse um código QR escrito compactamente ali. Devia ser algum tipo de círculo mágico, mas era peculiar, totalmente diferente dos desenhos que Nanahoshi faz.

Não era só naquele corte transversal. Padrões semelhantes estavam presentes em cada seção do braço, tanto na superfície frontal quanto na posterior, e todos eram ligeiramente diferentes uns dos outros. Embora fizessem parte da mesma articulação, não eram iguais.

— Uau. Certo. Eu não esperava que os braços tivessem tantos círculos mágicos, sério… É interessante o fato de serem tão diferentes uns dos outros…

Olhar para eles por um tempo realmente me deixou enojado. Parecia quase como se estivéssemos estudando o sistema nervoso de um corpo humano dissecado ou algo assim.

— Eu não fazia ideia de que havia costuras nisso. Devem ser bem sutis.

— Bem, estavam quase escondidas pela tinta — disse Zanoba com orgulho. — Seria impossível notar sem primeiro descascar.

— Entendo…

Foi o primeiro grande avanço de Zanoba em sua pesquisa, e ele ficou muito animado com isso. Eu não estava tão animado assim, já que desde o começo assumi que deveria haver algum tipo de tecnologia mágica complexa animando a coisa.

— Os movimentos eram bem suaves e coordenados, agora que penso nisso. Acho que para tornar isso possível são necessários muitos círculos mágicos — considerei.

— Oh? Pode dizer que função esses padrões desempenham, Mestre?

— Não. Nunca vi nada assim antes.

Isso tudo era necessário só para mover o braço? Será que é necessário uma cadeia de círculos mágicos por todo o corpo para controlar e coordenar os movimentos? Ou é algo mais? Era impossível definir isso sem mais pesquisas.

Até encontrarmos a coisa, ela vagava pela casa todas as noites, limpando e atacando qualquer ameaça que encontrasse. Uma vez que a rotina de limpeza terminava, voltava à sua base para recarregar. Pensando nisso, esses eram alguns padrões comportamentais bem complexos. Era mais inteligente do que um aspirador de pó robótico… e significativamente mais violento.

Não era algo que pudesse criar ao gravar meros círculos mágicos na cabeça ou no torso, imaginei.

Meu objetivo não era criar um simples Roomba1Marca famosa de aspiradores de pó inteligentes. mágico. Eu quero fazer bonecos capazes de se mover. Queria um para mim e também queria vender outros, visando algum lucro. Definitivamente alcançariam um alto preço no mercado.

Eu não estou procurando me tornar um milionário ou coisa do tipo. Só quero alguma segurança financeira. Se acabasse ganhando uma fortuna, provavelmente ficaria descuidado e desperdiçaria tudo.

E também havia aquela coisa de melhorar a reputação dos Superds, mas esse era outro tipo de problema.

De qualquer forma, isso tudo, no momento, não passava de um devaneio. Mas, talvez, em algum dia terei a empregada robô dos meus sonhos.

— Suponho que os círculos mágicos diretamente responsáveis pelos movimentos devem estar na cabeça ou no torso, Zanoba. Tome cuidado se for cortar nesses locais.

— Claro, mestre! — respondeu Zanoba com um aceno de cabeça alegre enquanto recolhia os pedaços de braço do boneco colocando-o de volta na caixa.

 

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Pensando nos acontecimentos passados, esse tipo de descoberta foi a razão pela qual Zanoba foi capaz de apresentar uma sugestão útil depois, quando Nanahoshi passou por um colapso. E, graças àquela sugestão, Nanahoshi teve sucesso na criação de seus próprios círculos mágicos de várias camadas. Ela até mesmo alcançou seu objetivo de convocar coisas de outro mundo, objetivo esse que quase abandonou.

Um dia, com certeza realizarei meu sonho de criar a empregada robô perfeita. E esse momento está cada vez mais perto de acontecer.

Quando esse pensamento me ocorre, fico motivado.

Hoje, como qualquer outro dia, fui ao laboratório de Zanoba.

— Zanoba, estou entrando!

Bati uma vez na porta e entrei em seu laboratório. Deparei-me cara a cara com uma mulher que estava na entrada, como se estivesse de guarda. Ela não era uma supermodelo, mas tinha um rosto bom.

— Ah! Ei, Ginger! É bom te ver de novo.

A mulher, por um momento, me olhou com desconfiança. Mas quando a cumprimentei, ela baixou a cabeça com uma expressão séria..

— Olá, Sir Rudeus. Há quanto tempo.

Seu nome era Ginger York, ela é uma ex-cavaleira de Shirone e leal guarda-costas do Terceiro Príncipe Zanoba. Voltar a vê-la despertou certa nostalgia.

— Pensei em cumprimentá-lo — continuou Ginger —, mas as coisas têm estado um pouco agitadas…

— Não precisa se preocupar. Eu fui o errado dessa história. Você acompanhou minhas irmãs até aqui sem nenhuma compensação, e nem apareci para agradecer.

— Sou eu quem deveria agradecer. A Senhorita Aisha acelerou muito a nossa jornada. Essa é minha compensação.

Ginger, sorrindo, acenou para que eu entrasse no laboratório de Zanoba.

Zanoba e Julie estavam, como sempre, dando duro em seus próprios projetos. Ele estava desenhando diagramas dos círculos mágicos que encontrou no boneco, e ela esculpindo uma estatueta com um pequeno cinzel. Esse projeto parecia perto de ser concluído, então fui dar uma olhada.

— Como está indo, Julie?

— Acho que… deve ficar pronto em breve, Grão-Mestre. O que acha?

— Isso não está ruim. Mas não acha que está atraente demais para ser o Zanoba?

—  Ei, isso não é verdade. O Mestre também é bonito.

Sua escultura ainda estava um pouco descuidada, mas a garota estava começando a entender os fundamentos. Eu poderia fazer algumas críticas a respeito dos detalhes, mas como a criança parecia ter um talento especial para isso, provavelmente seria melhor deixar que descobrisse as coisas sozinha.

Olhei em direção a Zanoba, mas ele parecia precisar de mais algum tempo para terminar. Foi nesse ponto que notei Ginger olhando para mim.

— O que houve, Ginger?

— Ah, não é nada. Eu só estava pensando… que você cresceu bastante, isso é tudo.

— Bem, é claro. Já se passaram o quê… uns quatro anos desde a última vez que nos vimos?

Recentemente, senti que muitas pessoas estavam comentando a respeito da minha aparência. Pode ser que meu apelo sexual estivesse fluindo. Se eu não tivesse me casado com Sylphie, será que teria um harém? A ideia tinha certo apelo, mas, se colocada em prática, seria provavelmente estressante. E, de qualquer forma, eu estava satisfeito com a condição da minha vida sexual.

— A propósito, Ginger, o que planeja fazer?

— Pretendo ficar aqui, ao lado do Príncipe Zanoba.

— Ah. Então está retomando suas funções como guarda-costas dele?

— Isso mesmo. Já completei minha outra missão, e minha família está segura em casa.

A lealdade dessa mulher era realmente impressionante. Ela protegeu Lilia e Aisha por anos, até finalmente deixá-las em segurança. Mas Zanoba mostrou algum tipo de apreciação? Ou ao menos agradeceu? Provavelmente não. Esse cara não era o mais atencioso dos empregadores.

— Ei, Zanoba. Não acha que deveria dar uma recompensa a Ginger por todo o trabalho duro dela?

— Sir Rudeus! Eu não teria a pretensão de…

— Hm, suponho que você esteja certo — disse Zanoba, ainda focado em seus círculos mágicos. — Há algo que você deseja, Ginger? Fale livremente.

O príncipe com certeza poderia parecer pomposo quando assim quisesse.

Ginger pareceu surpresa com esse acontecimento. Foi provavelmente a primeira vez que Zanoba lhe deu qualquer tipo de reconhecimento por seus esforços.

Depois de pensar por um bom tempo, ela se ajoelhou, abaixou a cabeça e disse:

— Bem, então, meu lorde… permita-me educar Julie. Entendo que ela é aprendiz de Sir Rudeus, mas seus modos não condizem com os da serva de um príncipe.

— Pois bem. Irei permitir.

— Obrigada, Príncipe Zanoba!

Isso realmente não era o que eu tinha em mente. Digo, a educação de Julie era para o bem de Zanoba, não de Ginger. Então, será que há alguma regra oculta de que escravos não devem receber educação demais?

A humanidade foi expulsa do Jardim do Éden porque comeu o fruto do conhecimento. Permaneça ignorante e poderá ficar perfeitamente feliz em passar o resto da vida dançando com uma folha de figueira sobre a virilha, cantando “Yatta2É isso.” o dia todo. É por isso que os reis preferiam que seus súditos fossem o mais ignorantes possível. Quanto menos educação eles têm, menos provável que ergam-se contra aquele no poder. Claro, com isso também está sabotando a capacidade deles de aprender novas habilidades e se tornarem mais úteis, mas é algo que muitos governantes estão dispostos a fazer.

De qualquer forma… Acho que seria complicado Zanoba conceder uma recompensa mais típica a Ginger, como terras ou fortunas, dada sua posição atual. Ela provavelmente percebeu isso e fez um pedido modesto por pura lealdade.

— Bem, então tá bom — falei. — De volta à rotina, eu acho. Quão longe você chegou?

— Estava planejando começar a trabalhar nas pernas, Mestre.

— Sim, estive pensando nisso, mas não seria melhor estudarmos todos os círculos nos braços primeiramente? Digo, depois de separar as partes, você não pode montá-las novamente, certo? Ir com calma pode ser melhor.

— Hmm, isso é verdade…

— Talvez possamos trazer Cliff e Nanahoshi para dar uma olhada. Eles podem notar algo que deixamos passar.

Zanoba e eu nos inclinamos sobre a mesa e discutimos nossos planos, antes de finalmente decidir começar a dissecar o segundo braço do boneco, buscando compará-lo com o primeiro. Porém, quando estávamos prestes a começar, notei Ginger parada ao meu lado. Ela parecia ter algo a dizer.

— Precisa de alguma coisa, Ginger?

— Sir Rudeus… mesmo que Zanoba possa estar confortável, ele ainda é da realeza real de Shirone. Sei que ele é seu pupilo na área artística, mas a maneira como você fala com ele ainda me parece… pouco respeitosa.

— Hm?

Assim que ela mencionou, percebi que estava falando com ele de forma mais casual que o normal. Eu geralmente adotava um discurso mais formal, mas depois daquele comentário que Aisha fez no outro dia, inconscientemente comecei a me soltar um pouco.

Eu podia entender porque uma criada leal ficaria aborrecida ao ouvir seu mestre sendo tratado indelicadamente. Eu só precisaria ser mais educado quando Ginger estivesse por perto.

— Suponho que você esteja certa. Sinto muito por isso. O Príncipe Zanoba tem sido um bom amigo para mim, então acho que…

Antes que eu pudesse terminar a minha frase, Zanoba ficou de pé e a fúria queimava em seus olhos.

— Gingeeeeer!

Saltando em direção a sua guarda-costas, ele a levantou pelo pescoço e a bateu contra a parede. Julie se encolheu diante do barulho alto e deixou o cinzel cair.

— Como ousa?! Mestre Rudeus estava finalmente se abrindo para mim, e agora você estragou tudo! Como pôde? Conserte isso! Peça desculpas agora mesmo!

— Guh… Guhh!

Ginger parecia estar sentindo muita dor. Ele estava mesmo a sufocando? Isso estava escalando em uma velocidade absurda!

— Zanoba! — gritei. — Já chega! Solte-a!

Ele instantaneamente soltou suas mãos e deixou Ginger cair. Seus dedos deixaram claras marcas vermelhas na pele dela. Ela tentou estender a mão para tocar o pescoço, mas parou no meio do caminho, fazendo uma careta de dor. Parecia ter quebrado um osso do ombro quando foi batida contra a parede.

Corri e rapidamente curei seus ferimentos com magia de cura. E assim que terminei, ela se ajoelhou diante de mim e abaixou a cabeça.

— Cof… cof… minhas mais sinceras desculpas, Sir Rudeus…

Ela estava realmente se desculpando comigo. Depois de Zanoba quase a matar.

Passei um momento sem palavras, devido à culpa. Ela não fez nada de errado. Por que estava pedindo desculpas para mim?

Por fim, me virei para Zanoba.

— Qual é o seu problema?!

— Mas, Mestre! Ela interrompeu sem pensar, sem qualquer consideração sobre nossa amizade…

— Então por que você simplesmente não disse isso para ela?!

Ginger lealmente o serviu por muitos anos. Ela protegeu minha família em uma longa e perigosa jornada por um território desconhecido. Não devia ter sido fácil, mas ela fez tudo isso por nada além de lealdade a seu mestre exilado.

E quando cometeu um único erro, a reação dele foi batê-la contra a parede e começar a sufocá-la? Isso era simplesmente horrível.

Estava óbvio que nossa amizade era muito importante para Zanoba. Era bom saber disso. Mas não significava que ele devesse maltratar sua guarda mais leal por algo assim.

— Sir Rudeus, por favor… Está tudo bem — disse Ginger suavemente, seu rosto calmo e composto. — Fico orgulhosa ao ver o Príncipe Zanoba defendendo um amigo. Ele claramente cresceu como pessoa desde a última vez que o vi.

O quê? Sério? O estranho aqui sou eu?

Eu talvez não tivesse a função de dizer nada, mas Ginger obviamente merecia um tratamento muito melhor do que esse.

—Zanoba…

— Sim, Mestre?

— Eu o considero um bom amigo.

Após essas palavras, o rosto de Zanoba começou a brilhar de felicidade. Parei por um momento para deixar que ele as saboreasse.

— Mas também devo muito a Ginger por ter protegido a minha família. Ela ficou com minha família pelo quê… quatro anos? Sou muito grato por isso, e eu apreciaria se você a tratasse com mais gentileza.

— Claro, Mestre — disse Zanoba com uma expressão séria no rosto. — Peço desculpas por minhas ações, Ginger.

— Não há necessidade para se desculpar, Príncipe Zanoba — contestou Ginger, levantando-se. — Fiz um juramento de lealdade absoluta a você, e morreria de boa vontade sob o seu comando. Minha observação foi impensada. Sinceramente lamento pelo que falei.

Essa parecia ser sua palavra final a respeito disso, e eu não via motivos para arrastar ainda mais o caso. Evidentemente, era assim que funcionava a relação mestre-serva entre eles. Mas, e se Zanoba cometesse um erro grave? Ginger conseguiria discordar dele?

Bem, tanto faz. Eu era basicamente um estranho. Não sabia como as coisas funcionavam em Shirone e, se continuasse me intrometendo, provavelmente só causaria ainda mais problemas.

Deixando esse incidente alarmante de lado, nossa pesquisa a respeito do boneco autônomo estava começando a fazer algum progresso real.

— Sei que sugeri por enquanto focar nos braços, mas a decisão é sua. Siga com o que achar que é melhor.

— Agradeço, mas concordo com sua sugestão, Mestre. Em vez de desmontá-lo e remontá-lo, seria mais seguro recriar o mesmo braço antes de passar para as demais partes.

Passamos o resto da sessão focados em desmontar e estudar os braços do boneco. Sugeri chamar Cliff ou Nanahoshi para ajudar, mas estava deixando essas decisões inteiramente à escolha de Zanoba. Existiam algumas coisas que eu queria tentar, mas parecia que até o momento ele estava progredindo bem, mesmo sozinho. Não senti necessidade de me intrometer.

— Acho que você pode deixar o resto comigo, Mestre. Parece que tenho algum talento para este tipo de trabalho.

— Huh. Sério mesmo?

— Sim. Também fiquei surpreendido, mas achei o trabalho envolvente. Estou me divertindo muito com essa pesquisa.

Ele passava o dia todo fazendo pesquisas que o atraíam, com uma dedicada artista do ofício das estatuetas trabalhando constantemente ao seu lado. Isso provavelmente era o seu dia a dia ideal. Ainda assim, o que acontecerá após ele se formar? Continuaria vagando pela cidade, brincando com seus bonecos?

Bem, não cabe a mim decidir. Não era problema meu… mesmo que uma das razões de Zanoba para fazer isso fosse, em parte, por minha causa.

— Bem, então tá. Continue assim, Zanoba! Nos vemos outra hora.

— Fico ansioso por isso, Mestre.

— Seja legal com a Ginger, certo?

— É claro!

Nesse ritmo, talvez em breve fizéssemos outra descoberta.

 


 

Tradução: Taipan

Revisão: Guilherme

 

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