Passou uma semana desde que tomamos Nanahoshi sob a nossa proteção, e o pior parecia ter ficado para trás. Ela estava comendo, mesmo que pouco. Se fosse solicitado, tomaria banho – e voltaria sem tentar se afogar.
A ambição que eu havia anteriormente sentido nela se fora. Era como se as cordas que a seguravam tivessem sido cortadas. De repente, ficou tão frágil quanto porcelana e indefesa, como aquelas mulheres em vídeos adultos que eram enganadas pela yakuza e obrigadas a vender os seus corpos.
Não poderia deixá-la assim, sozinha. Também precisava tomar cuidado para não deixar que acabasse esbarrando em alguém como Luke. A única coisa que eu sentia emanando dela no momento era um sentimento de resignação. O fracasso com a experiência foi um verdadeiro choque.
Eu nunca tinha provado um revés dessa magnitude. O mais próximo foi quando passei vários anos sem viver para ficar em um jogo online, apenas para que meus dados fossem apagados. No momento em que vi que meu login deu inválido e recebi o e-mail notificando que minha conta foi banida, meu coração começou a bater violentamente. Passei o dia inteiro sem conseguir processar nada. Levei minhas objeções à direção e protestei veementemente, mas no final fui dormir chorando. No mês seguinte, não senti motivação para fazer nada. Então, jurei que nunca mais voltaria a investir em outro jogo online.
O experimento de Nanahoshi não era o mesmo que um jogo. Seu objetivo era retornar ao seu mundo. Se ela desistisse disso, eu temia que não poderia continuar vivendo. Tentei o meu melhor para encorajá-la, mas ela estava o tempo todo em torpor. Eu não sabia nem se estava ouvindo o que eu falava.
Mas assim que comecei a duvidar disso…
— Pensei que tinha feito tudo — murmurou ela de repente.
Em vez de responder, apenas ouvi.
— Um círculo mágico é basicamente o que chamamos de placa de circuito no nosso mundo. Você cria uma única função combinando vários padrões de circuito. No entanto, uma parte não conectava, não importa o que eu fizesse. Não importa como eu alterasse a fiação, uma parte não se conectava com o resto. Tentei forçar isso, mas então apareceu um defeito em outro lugar.
Para conectar este circuito não conectável, ela teve que quase dobrar o seu tamanho. Então, para compensar a distorção, corrigiu com outro circuito. Porém, ainda assim, aquele defeito em seu circulo mágico não sumiu. Por mais que tentasse, ela não conseguia descobrir o que havia de errado – havia apenas uma seção que não conectava.
— Isso é fisicamente impossível. Ou seja, não tenho como voltar para casa.
Embora parecesse perfeito, o círculo mágico era algo que ela montou após anos de trabalho meticuloso. À primeira vista, parecia um problema que poderia ser resolvido em última instância, embora tremendamente complicado. Mas o defeito misterioso sugeria o contrário.
— Não há esperança — disse Nanahoshi enquanto se jogava de bruços na cama.
Fui para a sala de pesquisa dela para recuperar o diagrama de seu círculo. Seu discurso despertou algo em minha memória, mas eu não queria animá-la sem ter certeza. Em primeiro lugar, gostaria de confirmar se havia algo que poderia ser feito.
No dia seguinte, chamei Cliff e Zanoba à sala de pesquisa. As pessoas diziam que três cabeças eram melhores do que uma, então eu usaria o poder dos cérebros de três gênios. Desde que invoquei Cliff, Elinalise naturalmente apareceu junto. Ela parecia sempre aparecer na sala de pesquisas dele, mas e quanto às aulas dela? Nesse ritmo, tinha sorte por não ter sido expulsa.
— É difícil de acreditar que alguém como a Silente está naquele tipo de estado. Ela parecia ser muito mais resistente do que as pessoas normais — refletiu Elinalise.
— Pessoas verdadeiramente fortes não se fecham para o mundo e tentam carregar todos os fardos sozinhas.
— Bem, suponho que isso seja verdade. — Elinalise encolheu os ombros. Apesar de sua prolífica vida social, ela não interagia muito com Nanahoshi. E, embora não parecesse, era hábil em lidar com mulheres mais jovens. Pedir sua ajuda para fazer Nanahoshi se animar poderia ser uma boa ideia.
— Pois bem, vocês dois. Primeiro, deem uma olhada nisso.
Quando mostrei o diagrama a eles, Cliff logo fez uma careta.
— Esse é um círculo confuso.
Confuso? Essa era uma maneira interessante de abordar o assunto.
— Existem círculos confusos e organizados? — perguntei.
— Claro que sim. Você deve manter seus círculos organizados e pequenos ao criar implementos mágicos. Eu desenharia isso de uma forma muito mais organizada. Se você, por exemplo, conectar esta parte aqui a esta, pode tornar tudo muito mais limpo.
— Uhum — falei. Criticar o trabalho alheio era fácil. Se fizéssemos como ele propôs, provavelmente só iríamos criar outros defeitos no círculo.
— Ah, mas a ideia é incrível. Eu nunca pensaria em fazer um loop assim nesta parte aqui. Ah, entendo. A razão para esta parte ser tão complexa é por causa disso… — Cliff olhou para o círculo e começou a resmungar para si mesmo. — Isto aqui, aquilo ali… Acho que eu poderia entender melhor se tivesse prestado mais atenção à minha teoria…
— Então, Mestre, que tipo de círculo mágico é esse? — perguntou Zanoba.
— É isso que a Silente estava estudando; círculos de invocação. Mas ela acabou sem saber o que fazer, então quero a opinião de vocês para ajudá-la.
Zanoba inclinou a cabeça.
— Mas magia de invocação está fora do nosso domínio de especialização, não está?
— Bem, se não pudermos resolver o problema, que assim seja.
Achei que poderíamos, em grupo, fazer algo que Nanahoshi não tinha conseguido. Na verdade, era precisamente por sermos todos especialistas em áreas tão diferentes que talvez pudéssemos encontrar uma abordagem alternativa.
— De qualquer forma, por favor, olhem para esta seção. Parece que foi aqui que o círculo quebrou. Veem? — Apontei para o rasgo que apareceu no papel durante o experimento.
— Hein? Ah. É aí que está desconectando? Eu nem percebi. Então este círculo está incompleto, hein? Hmm, então a parte que deve se conectar a essa ali é… esta?
Cliff ficou surpreso. Apesar de ser um autoproclamado gênio, ele parecia não ter percebido isso de imediato. Bem, é assim que as coisas são, pensei.
— Você tem alguma ideia de como conectar este circuito?
Cliff cruzou os braços e começou a pensar. Ele começou a murmurar “aqui” e “ali” para si mesmo. Então tirou um bloco de notas do bolso da camisa e começou a rabiscar algumas coisas.
— Este é um problema desafiador. Se você redesenhar tudo, talvez, não, mas aí… Isso é impossível.
— E se usasse uma estrutura multinível? — interrompeu Zanoba.
Cliff parecia ter lá as suas dúvidas.
— Uma estrutura multinível? Do que você está falando?
— No boneco que estou pesquisando, existem várias camadas de círculos mágicos combinados para produzir um único efeito. Mesmo assim, estou apenas começando a minha pesquisa, então nem mesmo consegui desenhar um círculo adequado ainda, mas…
— Espere, boneco? Está falando daquele de antes? Deixe-me ver.
— Mestre, está tudo bem para você? — perguntou Zanoba.
— Sim, é claro.
Zanoba nos trouxe um pedaço do braço do boneco. Cliff estudou com muito interesse, até que declarou:
— A pessoa que criou isso era um gênio!
Ver alguém presunçoso como Cliff dizendo isso era algo notável.
— Nunca vi um círculo mágico assim — continuou ele. — Grr, não faço nem ideia de qual é a mecânica por trás disso. São esses dois círculos mágicos, um em cima do outro? Não, não é só isso, há mais ainda. Essa coisa não poderia se mover direito sem todos eles juntos. Mas continuou capaz de se mover, mesmo com isso quebrado. Por quê? Droga, o que diabos é esse círculo?! — Cliff cerrou os dentes, frustrado. Era quase como Vegeta testemunhando o nível de poder de Goku; é mais de 8.000!
— Ainda não sei todos os detalhes, mas, de acordo com o livro, esse círculo parece controlar o movimento do cotovelo. — Zanoba respondeu à pergunta de Cliff com tanta naturalidade que este último parecia prestes a desatar a chorar.
Elinalise correu e colocou a cabeça dele entre seus seios, acariciando o seu cabelo.
— Pronto, pronto, você também é um gênio, Cliff. Você também saberia disso se estivesse pesquisando a mesma coisa.
— E-Eu sei disso! — Seu rosto ficou vermelho enquanto ele recuperava a compostura.
Perfeito, Elinalise. Eu sabia que podia contar com você. Mas pode deixar as carícias para depois? Estamos meio ocupados.
— Mestre Cliff. Se usássemos a mesma técnica que foi usada no boneco, acha que isso resolveria o problema do círculo de Silente?
— Não sei. Mas vale a pena tentar, não?
Ao menos tínhamos encontrado uma pista. Nanahoshi sempre desenhou os seus círculos em uma superfície plana. Talvez nunca tivesse pensado em criar camadas ou dobrá-los. Então, mais uma vez, talvez houvesse uma razão para ela ainda não ter tentado isso. Rezei para que fosse a primeira opção, e que isso fosse o suficiente para voltar a motivá-la.
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No dia seguinte, levei ela comigo para a sua sala de pesquisas. Passei o dia anterior todo arrumando aquela sala toda bagunçada, e era nessas instalações, limpas, mas ainda de alguma forma desorganizadas, que Zanoba e Cliff nos esperavam. Os dois estavam examinando os dados que Nanhoshi coletou ao longo de sua pesquisa.
Ao vê-los, ela apenas bufou de modo zombeteiro.
— O que é isso? Você me trouxe aqui para que pudesse me violar?
Sério? Quão longe ela já tinha chegado no caminho da autodestruição? Tudo porque falhou uma vez? Bem, acho que um único fracasso era o suficiente para perturbar a vida toda de uma pessoa.
— Como ousa?! Sou um seguidor de Millis! — Cliff ficou indignado. Os princípios da crença Millis em relação à castidade eram semelhantes aos do Cristianismo. Monogamia, sem adultério, etc e tal. Muito austero.
— Se você diz. — Nanahoshi apenas continuou andando instavelmente e se sentou. Ela recostou-se na cadeira.
— Mestre Cliff, Zanoba, vamos apenas conversar sobre o que descobrimos ontem.
Nanahoshi ouviu com desinteresse enquanto eu mostrava uma versão de seu círculo que Cliff corrigiu com uma caneta vermelha. Em seguida, partimos para a proposta de Zanoba de estruturas multinível com base em sua pesquisa. E, finalmente, a ideia que eu tive: círculos tridimensionais. Ela ouviu tudo sem um pingo de emoção no rosto, sentando-se perfeitamente imóvel, parecia estar até mesmo congelada.
Então nossos olhares se encontraram. Não era como se ela estivesse desinteressada. Só estava sem expressão devido à concentração.
— Ah. — Ela de repente falou. — Isso pode funcionar — murmurou. Então deu um salto de seu assento. — Então é isso, é isso. Não havia razão para eu ficar tão envolvida com as estruturas em uma superfície plana. Isso faz sentido, é claro. Colocar isso no papel proporcionará profundidade. Se eu colocar os papéis em camadas, posso fazer um círculo mágico do tamanho que eu quiser. Por que não consegui pensar em algo tão simples assim?!
Ela andou ansiosamente pela sala, por uma três ou quatro vezes. Então pegou papel e caneta em sua mesa e começou a desenhar. A garota estava escrevendo algo que parecia com uma fórmula, mas sempre apagava e começava de novo.
— Urgh, não! Não é isso!
— Ei, não é isso que você quer dizer? — Lá foi Cliff, felizmente inconsciente, metendo o nariz na gaiola de um urso enjaulado. Ele pegou uma caneta vermelha e fez uma anotação no memorando dela. Esse é o nosso Cliff, pensei sarcasticamente. O clima na sala mudou para melhor e ele, claro, não conseguiu perceber.
— Ah, então é isso. Você é muito inteligente — elogiou ela.
— Claro que sou. Sou um gênio.
— E quanto a isso? O que devo fazer? Já faz um tempo que estou em dúvida a respeito dessa parte.
— Uh, espere um momento.
Cliff e Nanahoshi… estavam trabalhando muito bem juntos. Ficaram ombro a ombro, anotando várias coisas em uma folha de papel. Olhei para o trabalho dos dois, mas ao meu ver não parecia nada mais do que os rabiscos de uma criança.
— Zanoba, você entende o que eles estão fazendo?
— Estão muito além da minha compreensão.
Nós dois fomos deixados de fora e sob o sereno. Ainda assim, Cliff era incrível. Não fazia muito tempo desde que ele, sozinho, começou a pesquisar círculos mágicos. Bem, tanto faz. Nanahoshi parecia estar de bom humor. Mesmo se ela não conseguisse o sucesso desta vez, pelo menos tinha mais uma vez algum ponto de apoio e motivos para manter a esperança.
— Desculpa, Zanoba, mas vou ter que pedir para você ficar e cuidar desses dois.
— Onde você está indo, Mestre?
— Vou buscar Elinalise. Ela não gostaria que seu homem ficasse tão confortável com outra mulher enquanto ela não está por perto.
Quando saí da sala de pesquisa, conseguia ouvir a emoção na voz de Nanahoshi. Foi a primeira vez que vi essa emoção nela.
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Uma semana depois, seu círculo mágico estava completo. Ela consultou Zanoba e Cliff para corrigir os problemas da versão anterior e, com a contribuição deles, recriou o mecanismo subjacente. Em uma magnífica demonstração de intensa concentração, ela terminou o círculo em questão de dias. Nanahoshi colou cinco camadas de papel, criando um círculo mágico que parecia feito de papelão.
— Pois bem, vamos começar.
Enquanto Cliff e Zanoba olhavam, comecei a despejar minha mana no círculo.
O círculo começou a emitir uma luz vibrante que iluminou a sala, fazendo parecer que era o sol do meio-dia. Conforme a minha mana fluía, algo gradualmente começou a tomar uma forma bem no meio. Assim que a luz se dissipou, pudemos ver o objeto do outro mundo que havíamos invocado com sucesso.
Era uma garrafa de plástico. Uma sem tampa nem rótulo. Uma simples garrafa de plástico.
— Ooh, que impressionante.
— O que diabos é isso? Vidro? Não, isso é mais macio do que vidro.
Zanoba e Cliff não conseguiram esconder sua empolgação ao ver uma garrafa de plástico de 500ml pela primeira vez. Elinalise e Julie também olharam para aquilo com intenso interesse. Nanahoshi olhou para o que ela invocou, cerrou os punhos e soltou um quase inaudível: “Sim, consegui.”
Uma garrafa de plástico. Era insignificante e ao mesmo tempo significante. Naquele breve momento, nosso mundo anterior ficou inegavelmente conectado a este. Trouxemos um objeto inanimado, e ainda por cima incompleto, mas, ainda assim… trouxemos algo para este mundo, algo que não existia anteriormente.
— Você conseguiu — falei para Nanahoshi.
Ela assentiu com firmeza, parecendo realmente satisfeita consigo mesma.
— Sim, consegui. Agora posso finalmente passar para a próxima etapa! Conforme eu for mais a fundo com os círculos mágicos em camadas, devo ser capaz de invocar quase qualquer coisa. Se eu puder organizar o círculo melhor, então apenas mudando duas ou três das camadas, provavelmente posso…
Nanahoshi de repente voltou à realidade. Ela desviou os olhos, parecendo um pouco estranha.
— Desculpa. P-Por causar tantos problemas.
— É dar e receber, certo? Da próxima vez que eu estiver em apuros, me dê uma mão, combinado?
— E-eu já planejava fazer isso.
De repente, percebi Elinalise me encarando.
— Vocês dois com certeza são próximos, hein?
— Você é sempre rápida em assumir que seja um caso de amor, Senhorita Elinalise — respondi.
— Bem, você é um homem e ela uma mulher, mas isso não é muito apropriado. — Seus olhos pareciam os de uma sogra reprovadora.
Eu não tinha intenção de trair. Além disso, Sylphie sabia o que estávamos fazendo.
Nanahoshi voluntariamente criou alguma distância entre nós.
— Isso mesmo, você é recém-casado. Não seria bom se sua esposa entendesse mal.
Elinalise riu alegremente, envolvendo os braços em volta dos ombros de Nanahoshi.
— Heh heh, você não precisa se preocupar com isso. Ah, já sei! Vamos passar no bar! Será por sua conta, é claro!
Nanahoshi sorriu ironicamente para a proposta de Elinalise.
— Acho que não tenho escolha. Mas isso nos deixa quites.
— Parece maravilhoso, não concorda, Cliff?
Cliff, que estava amassando a garrafa de plástico com as mãos, olhou para nós.
— Hein? Sim, claro! Isso nos deixa quites. Mas você é muito excepcional, então não me importaria se me ajudasse com minha própria pesquisa na próxima vez!
Elinalise soltou uma risadinha.
E então o nosso grupo foi para o bar naquela noite. Por algum motivo, Linia e Pursena se juntaram a nós enquanto caminhávamos pelo prédio da escola, dizendo coisas como “Não queremos ficar de fora” e “Leve-nos também, mew”. Como diabos conseguiram nos farejar?
Enquanto nossa pequena congregação se enfileirava do lado de fora, Ariel parou para perguntar o que estávamos fazendo. Quando expliquei a situação, ela disse: “Então eu deveria mandar alguém para acompanhá-lo”, e enviou Sylphie junto. “Acompanhar” era, claramente, uma desculpa dela para ser atenciosa. No momento em que conseguimos passar pelo portão da escola, percebi que Badigadi se juntou a nós e estava seguindo bem na parte de trás do nosso grupo. Não, sério, quando ele se juntou ao grupo?
No caminho, paramos na Guilda dos Magos, onde Nanahoshi foi retirar algum dinheiro. Ela aparentemente estava usando o lugar como um banco e tinha uma quantia impressionante por lá.
O bar que escolhemos era um dos favoritos de Badigadi. Apesar de ainda ser o início da tarde, havia também a presença de outros clientes. Nanahoshi, entretanto, não ligou para isso. Ela foi até o balcão e bateu sua bolsa cheia de ouro nele.
— Reserve-nos o lugar todo — disse.
— Hein? Isso é sério?
Vendo o barman parecendo perturbado, Badigadi interrompeu.
— Espera aí. — Ele pegou um saco de ouro do seu próprio bolso e também o bateu no balcão. Agora era o dobro da quantia. — Hoje é um dia de celebração! Que todos os que vierem possam desfrutar de álcool gratuito! — declarou ele. O homem com certeza possuía uma presença digna. Exatamente como seria de se esperar de um rei.
Ele é meu ídolo! Quero ser ele!, pensei comigo mesmo, imitando as falas de um certo par que idolatrava um vampiro loiro imortal e infame de uma série popular de mangás.
Agindo como se fosse a coisa mais natural do mundo, Badigadi se plantou na maior mesa do bar. Lá, ele exigiu:
— Traga toda a comida que você tiver em seu cardápio!
Algum dia eu também queria tentar dizer isso. Já que não era eu quem estaria pagando, ele podia pedir o que quisesse, mas será que nós doze realmente conseguiríamos comer tanta coisa? Ah, bom. Eu tinha certeza de que daria tudo certo.
Quando a primeira comida chegou, o Rei Demônio se levantou e disse:
— Pois bem, o que estamos celebrando?
— O sucesso da pesquisa da Silente — Elinalise cortou prestativamente.
— Muito bem. Muito bem, Silente, levante-se. Você deve fazer um discurso inicial.
Persuadida a se levantar, Nanahoshi se levantou. Ela parecia relutante.
— Obrigada por hoje.
— Certo, agora saúde!
— Saúde!
E assim a celebração começou, não muito diferente da celebração do casamento que havíamos realizado há não muito tempo.
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Foi uma festa divertida. Quando coisas boas aconteciam, as pessoas se divertiam e bebiam. Na minha vida anterior, nunca participei de uma reunião como esta, nem mesmo uma vez. Mesmo neste mundo, eu só fiz isso algumas vezes. Quando era aventureiro, ocasionalmente bebia com os grupos com os quais trabalhava, mas sempre mantinha um senso de cinismo a respeito disso. Eu achava que só os tolos ficavam bêbados, barulhentos e selvagens. Eu faria protestos internos a respeito da falta de consideração que demonstravam pelas pessoas ao redor. Mas agora até eu estava no meio da confusão, finalmente entendendo como aquelas pessoas se sentiam. Às vezes, pensei, você só precisava se soltar e se divertir.
Minha crença nisso parecia especialmente justificada quando olhei para Nanahoshi, que estava acariciando as orelhas de Linia enquanto cantava canções tema de animes em japonês. Se as pessoas não se soltassem de vez em quando e esquecessem dos problemas, não seriam capazes de continuar. Afinal, a vida era cheia de dor. Se não tentassem encontrar o bem onde quer que pudessem, as pessoas desmoronariam. Elinalise e Badigadi provavelmente sabiam disso melhor do que qualquer um de nós, dado o tempo que viveram.
Sylphie e eu beberíamos o quanto quiséssemos. Nunca bebíamos em casa, simplesmente não era algo a que qualquer um de nós estava acostumado. E – embora não tivesse nada a ver com o porquê de não bebermos em casa – eu finalmente entendi o quão ruim uma Sylphie bêbada era.
Não, não era que ela ficasse má. Ela não era nada má. Era apenas o tipo de bêbado pegajoso.
— Ei, Rudy, acaricie a minha cabeça.
— Tá bom, tá bom. Boa garota.
— Você também pode mordiscar as minhas orelhas se quiser, sabe?
— Não irei me recusar a isso.
— Ha ha, isso faz cócegas.
Quando bêbada, ela se transformava em uma criatura incrivelmente adorável. Isso era fenomenal. Eu teria que conversar com ela a respeito de beber com mais frequência. Ah, mas o comportamento dela me fez ficar preocupado com a hipótese de beber sozinha. Talvez devesse dizer para não beber fora de casa, mas então me perguntei se isso não seria muito controlador da minha parte.
Não, isso não importa, decidi. Ela era minha. O que havia de errado em fazer o que eu queria com algo que me pertencia?
— Rudy, me abraça?
— Sim, sim, vou abraçar seus quadris com força.
— Hee hee. Estou tão feliz.
O jeito que ela riu soou de alguma forma travesso. Ahh, só de pensar em ir para casa e fazer amor com ela me fez sentir que eu entendia porque o mundo estava tão cheio de canções de amor.
— Rudy, hm, sabe, ultimamente, bem, tenho sentido ciúmes.
— O quê, sério? De quem? Não vou mais me aproximar dessa pessoa. Vou cortar todos os laços.
— Na verdade, é do Senhor Ruijerd. Você me contou sobre ele há algum tempo, lembra? Quando você fala sobre ele, você parece tão… sabe?
— Sim, mas eu realmente o admiro. Por favor, tente não deixar isso te afetar.
— Não gosto disso. Quero que você preste atenção apenas em mim!
Não foi isso que ela disse quando contei sobre Ruijerd. Devia ser essa a forma como realmente se sentia. Sempre achei assustador como Sylphie parecia aceitar tudo com tanta equanimidade, mas talvez só parecesse ser assim porque ela trabalhava duro para que isso acontecesse.
Assim que puxei Sylphie para o meu colo e nós dois começamos a brincar, Nanahoshi se aproximou. Ela estava bêbada e tentando arranjar uma briga.
— Tão doce que eu poderia vomitar. Parem já com isso. Sabe há quantos anos estou sem o meu namorado?
Ela já tinha parado de cantar? Eu ficaria feliz em cantar um dueto com ela. Contanto que escolhesse uma música bastante popular, eu provavelmente estaria familiarizado com o som. Então, parando para pensar, aquela lacuna geracional poderia aparecer de novo.
— Se quer dar uns amassos, pelo menos vá para algum lugar mais escondido.
— Vamos lá, não seja assim. Eles têm álcool aqui. Vamos nos divertir juntos.
— Além do mais, há algum tempo estou querendo dizer isso para você. Mesmo de dentro do meu quarto… smack smack, pow pow. O que diabos é o casamento, afinal? Hein? O que? Digo, tá bom, tanto faz. Mas que caralho? Lá estava eu, totalmente deprimida, e vocês dois transando. Eu podia até ouvir os seus gritos a noite toda, pelo amor… eek!
Badigadi de repente ergueu Nanahoshi em seus braços.
— Bwahaha! Venha! Hoje você vai cantar suas canções bizarras para mim!
— Elas não são “bizarras”; são populares no meu mundo!
— Mas que interessante! Não sei de que mundo você vem, mas cante-as para mim! Vá em frente, cante o máximo que puder!
— Espera, primeiro preciso falar umas coisas para o Rudeus!
— Bwahaha! Se não tiver nada de bom a dizer ao homem que te ajudou, é melhor que cante! Agora, cante!
— Eu ainda estava só começando a falar o que queria! — rebateu Nanahoshi em protesto.
Ela provavelmente queria expressar a sua gratidão. Mesmo assim, só fiz o que qualquer pessoa faria por um amigo em apuros. Ela não precisava me agradecer. Além disso, ela devia ter um alto status social, já que estava sendo praticamente sequestrada por um Rei Demônio. Era quase como se fosse a princesa de algum reino. Isto é, se a dita princesa tivesse sido carregada para um bar em vez de para uma cela. E sempre havia um palco em um bar.
Depois de um tempo, Nanahoshi começou a cantar. Um pouco depois, um acompanhamento se juntou a ela. A princípio, pensei que podia haver um trovador presente, mas acabou por ser Badigadi tocando um instrumento. Eu não sabia que ele podia tocar. Além disso, ele pediu para ela cantar para ele e ainda assim estava se apresentando ao lado dela? Eu definitivamente não o entendia.
Deixando isso tudo de lado, era uma música familiar. Eu não conseguia lembrar de onde era… ah, é mesmo. “Gandhara”, o tema de encerramento da série Monkey. Isso definitivamente não era algo que eu esperava que a sua geração soubesse. Mas, relembrando, isso era bem famoso.
Dito isso, ela era péssima. Horrível. Terrível. Talvez fosse porque não estava sincronizada ao acompanhamento. Nah, os dois eram horríveis e era por isso que não conseguiam nem mesmo sincronizar um com o outro.
Ainda assim, pareciam estar se divertindo. Além disso, Nanahoshi estava sendo a estrela do nosso grupo. Tudo bem se ela fosse terrível. Mesmo que a sua música fosse horrorosa, ainda transmitia os seus sentimentos.
Ela queria mesmo voltar para casa, tanto assim? Isso era algo que eu não conseguia entender. Meu país do amor estava neste lugar.
Bem, a festa foi divertida. A gente devia fazer isso mais vezes.
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A comemoração chegou ao fim quando a sua estrela mais brilhante, Nanahoshi, ficou completamente caída. Linia e Pursena a carregaram para o dormitório, onde aparentemente teriam uma festa do pijama. O resto se dividiu em grupos. Quem gostava de beber iria para outro bar e seguiria com a segunda rodada.
Sylphie e eu optamos por voltar para casa. Em seu estado de embriaguez, ela riu e se agarrou ao meu braço. Suas pernas estavam um pouco instáveis, então mantive um braço em volta de sua cintura para apoiá-la, de repente ganhando uma visão de como os playboys se sentiam quando saíam em encontros em grupo e sabiam que iriam fazer um gol.
Claro, eu não tinha pensamentos impuros – embora isso pudesse mudar quando chegássemos em casa.
— Rudy, não está meio barulhento? — disse ela de repente.
— Hm? — Assim que ela mencionou…
Apurei os meus ouvidos. Pude ouvir o som de alguém batendo em alguma coisa e vozes discutindo. Soou quase como uma briga entre gatos de rua. Ao nos aproximarmos da nossa casa, vimos um grupo parado à porta, ruidosamente batendo nela. De longe, tudo o que eu podia ver eram as suas silhuetas. Alguns pirralhos da vizinhança, talvez, ou algum tipo de ladrão.
Minha mente ainda estava confusa pelo álcool, mas ativei o meu olho demoníaco, só por segurança. Sylphie deu um tapa nas bochechas e, embora ainda instável, ficou em pé sem ajuda.
— Rudy, vou nos desintoxicar.
— Certo.
Sylphie lançou um feitiço de desintoxicação em mim, e pude sentir o álcool dentro de mim sumindo. Não fiquei completamente sóbrio, mas minha cabeça pareceu ficar mais clara. Tomando cuidado para ter certeza de que os supostos ladrões não nos localizariam, me arrastei em silêncio em direção deles. Foi então que ouvi as suas vozes.
— O motivo para chegarmos tão tarde foi porque você fez a gente se perder, Norn!
— O mesmo vale para você, Aisha. Foi você quem disse que era definitivamente por aquele caminho.
— Além disso, nem sabemos se este é mesmo o lugar ou não! O que você fará agora? Todas as pousadas já estão fechadas! Agora vamos ter que acampar do lado de fora, no frio!
— Eu também não gosto disso, mas foi você quem disse que ficaríamos na casa dele, então não precisávamos de um quarto para hoje. Eu não queria ficar na casa dele, mas você me forçou a vir junto…
— Isso porque dissemos para a Ginger que ficaria tudo bem! Locar um quarto depois daquilo seria estupidez!
— Você fica sempre assim, sempre agindo como se fosse melhor.
Vozes estridentes. Vozes infantis, mas que soavam um pouco familiares. E no meio disso tudo, ouvi nomes que conhecia. Então finalmente…
— Vocês duas, acalmem-se. Este é definitivamente o lugar. Há uma presença familiar por aqui. — A voz composta de um homem. No instante em que escutei, um redemoinho de emoções indescritíveis surgiu dentro de mim.
Soltei um suspiro de alívio e parei na frente deles.
— Ah!
— Irmãozão!
Minhas duas irmãzinhas, que tinham crescido bastante, vestiam roupas árticas de cores diferentes e combinando, como os personagens do Ice Climber. Norn Greyrat e Aisha Greyrat. Aquela com uma expressão complexa no rosto provavelmente era Norn e aquela com um olhar de determinação feroz devia ser Aisha.
— Irmãozão, senti saudades! — Aisha veio voando para mim, envolvendo os braços e as pernas em volta do meu torso, igual uma macaquinha. Ela esfregou sua bochecha contra a minha. Sua pele estava fria, embora eu pudesse estar quente, graças ao álcool. — Ooh, você está tão quente! E você fede a álcool!
— E você está me deixando com frio. Por favor, solte. — Enquanto eu tirava Aisha de cima de mim, olhei para Norn, que estava com os lábios firmemente franzidos. Ela baixou o queixo em saudação.
— Você tomou álcool? — perguntou ela.
— Sim, tivemos uma pequena celebração.
Ela parecia perturbada, e eu não acho que era só porque era tímida. Paul mencionou que a garota não era a maior das minhas fãs…
Então, atrás de Norn estava…
— Já faz um tempo, Rudeus — disse o careca com uma cicatriz no rosto. Um guerreiro orgulhoso empunhando uma lança. Não parecia diferente de quando tinha o visto da última vez, três anos atrás.
— Já faz um tempo, Senhor Ruijerd.
Fui atingido por uma onda de nostalgia, lembrando dos dias em que viajamos juntos, só nós três. Como nos conhecemos, como nos separamos. O que deveria dizer? Enquanto procurava as palavras, Ruijerd de repente olhou para trás.
— Na Guilda dos Aventureiros disseram que você se casou, mas… não vejo onde está a Eris.
A pessoa para quem ele estava olhando era Sylphie. A expressão dela se tornou de surpresa, mas ela rapidamente se curvou.
— Hm, Rudy, por enquanto, por que não os convidamos para entrar?
— Ah, sim, isso mesmo. Entrem. — Destranquei a porta e gesticulei para que entrassem.
Fazia apenas um mês desde a chegada da carta. Chegaram muito, muito mais cedo do que eu esperava.
Tradução: Taipan
Revisão: PcWolf
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