Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado

Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado – Vol. 09 – Cap. 03 – O Noivo Insensível – Parte 01

 

Passou meio ano desde que me matriculei na Universidade de Magia de Ranoa. Era outono – a época da colheita. Nos Territórios Nortenhos o outono nunca durava muito, mas era uma época muito importante do ano, quando os alimentos eram preparados, colhidos e armazenados para o doloroso inverno que chegaria. Existiam alguns festivais que eram realizados em diferentes aldeias e cidades.

Para o povo-fera, também era a época de acasalamento… um evento cultural demorado e que chegava com um complicado conjunto de regras e rituais. Todos eles estavam visivelmente inquietos conforme a estação se aproximava, homens e mulheres.

Falando de forma relativa, não havia muitos de sua espécie matriculados na Universidade. Talvez representassem 5% do corpo discente, que tinha um total que chegava a cerca de 10.000 indivíduos. Isso colocava seus números em 500 ou mais – em certo sentido, um grande grupo, mas não tão impressionante, dado o tamanho do campus. Ainda assim, quando o outono começou, pareciam estar por todos os cantos, travando duelos de um contra um que normalmente envolviam um homem e uma mulher. Por vários meses após o duelo, o casal ficaria coladinho. E, eventualmente, se casariam. Quem ganhasse o duelo inicial assumiria o papel de chefe do novo “bando” que formariam.

Essas regras não estavam gravadas em pedra nem nada assim. Era só uma tradição antiga que era mais respeitada por alguns do que pelos outros. Ainda assim, alguns do povo-fera realmente viajaram de terras distantes para desafiar os alunos para um desses duelos românticos.

Em outras palavras, havia um monte de estranhos vagando pelo campus. Isso era algo que a administração costumava tentar evitar, mas a temporada de acasalamento era um assunto muito delicado, devido à importância disso na cultura do povo-fera. Qualquer tentativa de banir suas tradições deveria resultar em verdadeiros distúrbios. Como medida paliativa, a escola permitia que não-estudantes do povo-fera entrassem em seu terreno sob o pretexto de “aulas de auditoria”, desde que solicitassem a permissão com antecedência.

Enfim… isso levava a Linia e Pursena.

As duas eram basicamente inalcançáveis para um cara comum do povo-fera. Por um lado, deviam ser as duas lutadoras mais fortes de toda a escola. E tão importante quanto isso, eram princesas Doldia. Se propusessem a uma delas, lutassem e vencessem, se tornariam candidatos a líder de toda a tribo. Não receberia o poder de imediato, é claro. Mas quando chegasse a hora de escolher o próximo líder, não havia dúvida de que seria bem considerado para o papel.

Claro, Linia e Pursena tinham partido para esta terra distante para estudar, não para encontrar um marido. Não podiam escolher um parceiro sem antes consultar a família e, portanto, rejeitavam categoricamente todas as propostas com as quais foram bombardeadas após completar quinze anos.

Entretanto, apesar de seu desinteresse público pelo casamento, no ano seguinte apareceram ainda mais pretendentes. As duas eram muito populares. Pelo visto, alguns homens-fera tinham até mesmo lançado alguns ataques furtivos sobre elas, tentando ganhar a sua obediência à força. As duas derrotaram esses agressores com bastante facilidade… mas quando o outono deste ano chegou, decidiram se trancar no dormitório. Não era como se o dormitório feminino fosse uma fortaleza impenetrável, mas qualquer homem que tentasse entrar seria atacado por todas as residentes. Linia e Pursena então permaneceram em seus quartos, até mesmo matando as aulas.

Creio que, de certa forma, era uma licença médica. Afinal, provavelmente deviam estar no cio. A ideia delas se contorcendo em seus quartos enquanto miavam e latiam cheias de paixão era excitante. Não que isso me deixasse afim de acasalar ou coisa assim.

As duas tinham me enviado uma carta, cujo conteúdo dizia: “Desculpe pelo incômodo, Chefe, mas por enquanto vamos deixar as coisas com você.” Entretanto, eu não fazia ideia de como deveria ajudar. Talvez só quisessem que eu respondesse por elas quando o professor fizesse a chamada ou algo do tipo.

De qualquer forma, não eram apenas os do povo-fera que estavam “no cio” durante a época do ano. O outono coincidia com um aumento nos casos de violência sexual no campus, já que algumas pessoas tiravam proveito de todo o caos. As regras rígidas sobre quem poderia entrar em qualquer dormitório começaram a fazer um pouco mais de sentido.

Quando eram duas pessoas do povo-fera no cio, poderia descartar as agressões, considerando como fenômeno natural ou cultural… mas, pelo visto, algumas das vítimas eram humanos do primeiro ano que nem faziam ideia do que estava acontecendo.

Claro, as regras da escola proibiam este tipo de coisa. Para manter as coisas sob controle, a administração colocava guardas de segurança para patrulhar o campus. Duelos consensuais eram permitidos, mas não era permitido simplesmente atacar alguém que se recusasse a lutar. Esse era o limite traçado. O professor de nossa turma até nos deu um aviso explícito sobre a situação, dizendo para não levarmos nenhum duelo nesta época do ano como casualidade. Ele também incentivou aqueles que não eram confiantes em suas habilidades de autodefesa a andar o tempo todo em grupos.

Na verdade, o Mestre Fitz também me disse para tomar cuidado. Parecia pensar que algumas garotas poderiam me desafiar para um duelo com falsos pretextos, alegando que elas só queriam duelar com um mago poderoso. Seu conselho foi de recusar categoricamente, ignorando suas tentativas de me provocar e deixando a área o quanto antes, sem baixar minha guarda em qualquer momento.

Garotas no cio, hein…?

Nos velhos tempos, eu poderia ficar tentado a duelar com cada uma delas e formar um harém. Mas na minha atual condição, eu estaria só esfregando sal nas minhas feridas. A temporada de acasalamento era um evento do qual eu não participaria tão cedo.

Vou deixar isso para aqueles jovens ali. Está vendo? O garoto humano e sua namorada elfa, que estão “estudando” enquanto ela senta no colo dele? Aquela mulher fica o ano todo no cio.

Sério, aqueles dois nunca descansam. Eu podia praticamente ver os corações flutuando sobre as suas cabeças. Mesmo assim… Cliff era um cara muito mais novo, mas me parecia que Elinalise estava o tratando da mesma maneira que tratava todos os seus outros amantes. Eu não ia dizer nada, é claro, mas essa coisa toda ainda me parecia uma farsa. Os dois iriam mesmo dar certo?

Em algum momento, enquanto eu observava Cliff e Elinalise se divertindo, Zanoba se aproximou da minha mesa.

— Mestre, você não acha que está na hora de iniciar uma nova criação?

— Uma nova criação, hein…? — Até alguns dias atrás, eu estava trabalhando em uma estatueta de escala 1:8 de Eris, um tipo de exercício terapêutico, mas acabei chorando tanto que tive que parar no meio do serviço. Desde então, não consegui me motivar a fazer nada. Eu tinha entrado em uma pequena crise sem nem perceber. — Aham, acho que você tem razão. Alguma ideia?

— Fazer algum tipo de animal ou monstro talvez seja uma boa mudança.

—  Hmm, claro. Acho que um Wyrm Vermelho pode ser legal.

— Ah! De fato! Aquele monstro que você uma vez derrotou sozinho, sim?

— Aham. A propósito, não foi fácil. Pensei que com certeza morreria.

— Hahaha. Você é tão modesto.

— Mestre Zanoba, do que você está falando?

Julie parecia um pouco curiosa, então a contei toda a história da minha batalha contra um Wyrm Vermelho errante durante os meus dias de aventureiro. Em pouco tempo, seus olhos começaram a brilhar e seu rosto ficou corado de excitação. As crianças deste mundo pareciam adorar esse tipo de história. Isso era algo fácil de esquecer, mas ela ainda tinha só seis anos.

— Hm, então tá. Por que não faço uma estatueta do Wyrm Vermelho para você, hein Julie?

— O quê…? M-Mestre, e quanto a mim? Você não vai fazer nada para mim?!

— Zanoba, você deveria ser meu aluno, certo? Que tal se você me ajudar a fazer isso?

— Ah! Claro, Mestre! Vou ajudar de todas as maneiras que eu puder.

Sério, esta vida não era ruim. Ultimamente eu não estava nas melhores das minhas condições, mas pelo menos estabeleci uma rotina decente. Minhas aulas de magia Divina e de Barreira de nível Iniciante terminariam em breve, e eu tinha que decidir o que fazer depois. Talvez Desintoxicação de nível Intermediário? Até o momento eu tinha me saído bem com os feitiços de nível Iniciante. Não parecia haver necessidade de aprender qualquer coisa mais avançada do que isso.

Eu sempre poderia optar pela Cura Avançada. Mas, mais uma vez, me senti relativamente satisfeito com meu atual nível de especialização nisso. Os feitiços Intermediários eram o suficiente para lidar com a maioria das situações.

E também havia os Encantamentos, com os quais eu nunca tinha lidado antes. Era tecnicamente uma forma de magia de Invocação, então talvez fosse algo mais relevante para a minha pesquisa. Pelo que ouvi, porém, envolvia principalmente aprender como criar vários implementos mágicos. Eu ainda não tinha certeza do que isso tinha a ver com Invocação… mas pelos menos seria alguma novidade.

Claro, eu estava livre para não ir para nenhum tipo de aula nova. No lugar disso, poderia só passar mais tempo na biblioteca. Comecei a sentir que havia chegado a um gargalo ao pesquisar o Incidente de Deslocamento, mas poderia ser interessante tentar aprender mais idiomas. Se eu seguisse por esse caminho, poderia tentar pedir para o Cliff me ensinar magia Divina enquanto… Mas, nos últimos tempos, ele passava o tempo todo com Elinalise. Provavelmente seria melhor deixá-los sozinhos por algum tempo. Eu não queria me tornar um estorvo.

Talvez pudesse tentar ir em uma direção completamente oposta e aprender algo não relacionado a magia. Andar a cavalo, para começar, poderia ser divertido…

Os dias passaram pacificamente enquanto eu tentava me decidir.

 

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E então, de repente, as coisas não estavam mais tão pacíficas.

— Acho que você é o Rudeus Atoleiro, o aventureiro de rank A que matou um Wyrm errante sozinho! Eu o desafio para um duelo matrimonial, senhor!

No meu caminho para a biblioteca, me encontrei recebendo um desafio.

Virei e me deparei com uma linda garota. Sua pele era bronzeada e seu sedoso cabelo azul-escuro estava preso em um rabo de cavalo bem cuidado. Ela parecia ter 17 ou 18 anos. Tinha um rosto forte e digno, e seus lábios estavam franzidos com força, poderia dizer à primeira vista que fazia o tipo de “lady guerreira”. Em vez de um uniforme escolar, ela usara uma roupa leve de espadachim, com um impressionante tom azul-profundo.

Seu busto era bem modesto, mas seus músculos eram impressionantes. Não parecia uma fisiculturista nem nada assim, mas era óbvio que estava em muito boa forma. Em sua cintura estava uma espada longa e curvada – o tipo mais usado pelos espadachins do Estilo Deus da Espada.

A garota estava olhando na minha direção.

Para ser mais preciso, estava encarando, surpresa, a pessoa bem na minha frente – o grande e peludo homem-fera que acabara de me desafiar para um duelo.

Aham. Esqueci de mencionar o homem-fera do tipo canino, um dos musculosos, mas foi ele quem gritou. Não parecia nem um pouco com um mago. A garota com a espada provavelmente só estava passando. Dada a época do ano, podia ter pensado que ele estava falando com ela.

— Uhm…

Bem, enfim. Por enquanto vamos esquecer a garota bonita.

Havia um problema bem mais básico. Eu era um cara, e esse cara também era um cara, e o cara tinha acabado de desafiar outro cara para um duelo entre caras. Isso foi um pouco estranho.

— Um duelo matrimonial? Tipo… uma daquelas coisas em que depois você se casa?

— De fato!

Gaah…

— Sinto muito… Não sei se existe algum rumor ou coisa do tipo, mas vou ser sincero. Não estou nada interessado nesse tipo de experiência. Terei que recusar a sua oferta.

O homem-fera contraiu as orelhas.

— Você parece não entender a situação.

— Ah não, já é tarde demais? Sabe, na verdade, hoje eu tenho aula de piano. Vou ter que sair, sinto muito…

Após recusar a oferta, me virei e comecei a me afastar, ignorando a sua tentativa de continuar com a conversa. Em outras palavras, segui o conselho de Fitz ao pé da letra.

— Espere aí!

Mas, para a minha surpresa, meu novo amigo peludo deu um pulo, subiu vários metros acima da minha cabeça e pousou bem à minha frente com um baque poderoso. O cara saltou igual um mecha de Junta Reversa. Ele poderia ser como um Dragoon bem sólido.

— Você não tem o direito de recusar. Meu nome é Brook Adoldia! Vim duelar pela mão da Senhorita Pursena em casamento, para que um dia possa me tornar o líder da minha tribo!

— Uh, a Pursena vai ficar descansando no dormitório até que essa coisa toda de temporada de acasalamento acabe. Será que você não poderia esperar?

— Mandei uma carta com antecedência à Senhorita Pursena, informando as minhas intenções! Ela explicou que agora você é o chefe da matilha dela. Fiquei sabendo sobre a sua destreza como guerreiro por Sir Gyes, e ouvi dizer que até mesmo matou um dragão errante sozinho. É claramente o homem mais forte desta Universidade. Você deveria ser um oponente digno para mim!

Certo, eu não tenho nada a ver com isso… Sou um mago, não um espadachim…

— O que acontece se eu recusar?

— Como líder da matilha, você é obrigado a lutar comigo! — Precisei de um momento para tentar juntar as peças.

Depois que consegui derrotar Linia e Pursena em uma briga há algum tempo, elas começaram a me chamar de chefe. Pelo visto, era necessário derrotar o chefe de uma “matilha” se quisesse se casar com alguém que pertencesse a ela. Então se esse cara me vencesse em uma luta… seria capaz de reivindicar Pursena como o prêmio?

Eu não tinha a menor intenção de ser o chefe de qualquer matilha, mas senti que o cara não se importaria com isso. Isso era algo primitivo do reino animal. Se eu perdesse a luta, perderia minha posição de chefe e Pursena se casaria com esse cara peludo aleatório.

— Então… à batalha!

Brook não esperou por nenhuma resposta minha. Uivando com ferocidade, avançou contra mim.

— Atoleiro.

Como ele estava seguindo na minha direção em linha reta, correu direto para o meu pântano…

— Canhão de Pedra.

E um projétil de pedra bem mandado o nocauteou.

Bem anticlimático. Parecia que latia mais do que mordia. Basicamente o derrotei por reflexo ao invés de pensar no assunto, mas, parando para pensar, não era como se eu tivesse muitos motivos para deixar que vencesse. Para começar, Pursena não parecia estar interessada em se casar com ninguém no atual momento.

Bem, isso ao menos explicava aquela carta que elas me enviaram. Eu não estava muito feliz com as duas jogando isso nos meus ombros, mas poderia lidar com alguns desses caras sem qualquer problema. Provavelmente não seria grande coisa.

Meus sentimentos a respeito do assunto mudaram nos minutos seguintes, quando fui atacado em cinco ocasiões no meu caminho para a biblioteca.

Parecia que metade da tribo Doldia estava esperando ansiosamente por esse dia. Linia e Pursena estavam em  alta demanda. Afinal, o que havia de tão atraente naquelas duas? Seus corpos, talvez? Mas isso não fazia muito sentido. Muitos desses homens provavelmente nunca tinham as visto em pessoa. Devia ser essa coisa toda de “princesa”. Afinal, o primeiro cara mencionou algo sobre se tornar o líder da tribo.

Ser o número um era tão importante assim para eles? O que era isso, uma tribo cheia de Starscreams?

Pelo jeito das coisas, tinham até elaborado uma ordem para me desafiar. Um cara tentou entrar no meio do caminho e gritaram com ele por “cortar a fila”. Talvez fosse mais uma daquelas tradições do povo-fera ou coisa do tipo.

Por sorte, não chegaram a me perseguir biblioteca adentro. Acho que a administração deixou claro que não tinham permissão para invadir qualquer uma das instalações da escola… ou o povo-fera também teria alguma regra antiga a respeito disso.

De qualquer forma, isso não me importava. Eu pelo menos poderia conseguir me refugiar por algum tempo.

 

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Algumas horas depois, na caída da noite, Fitz também apareceu na biblioteca. Seu olhar era um pouco reprovador.

— Essa é uma cena e tanto, Rudeus. O que você fez para chatear aquelas pessoas todas?

— Nada. Só querem me derrotar para se casar com a Linia ou Pursena.

— Espera, o quê?

Enquanto Fitz piscava, confuso, comecei a explicar todos os detalhes desagradáveis sobre a minha condição de “chefe” e a maneira como as tradições do povo fera pareciam funcionar. Quando terminei, Fitz estava carrancudo.

— Isso não faz sentido algum. Você não é o líder da tribo Doldia nem nada. Quem se importa se uma vez você as derrotou em uma luta? Isso não significa que tem o direito de entregá-las como prêmios para algum estranho qualquer.

Verdade. Se eu tivesse tanto poder sobre elas, não me arranhariam no rosto toda vez que eu tocasse as suas pernas.

— Você está certo. Mas como faço para convencer as pessoas lá fora?

Fitz colocou a mão no queixo e balançou a cabeça lentamente.

— Você tem todo o direito de apenas ignorá-los, sério… mas pode ser mais difícil do que derrotá-los em uma luta. Assim devem desistir e voltar para casa.

— Então, no final das contas, vou ter que duelar com eles…?

— Isso provavelmente seria o melhor.

Fácil para ele dizer. Eu não estava certo de quantas pessoas estavam me esperando do lado de fora, mas, pelo som, estavam na casa das dezenas. E, claro, era uma multidão de machões grandes e fedorentos que queriam mandar na própria tribo. Eu teria que deixar todos eles inconscientes.

— Realmente prefiro não adotar a violência como uma rotina diária, sabe.

— Eu sei disso, Rudeus. Mas, a menos que você faça algo a respeito, ficará preso aqui para sempre. Ah, e eles também podem perder a paciência e invadir. Não queremos que baguncem a biblioteca, queremos?

— Aham, acho que você tem razão. Ugh… exatamente o que eu precisava, um torneio de luta contra uma horda de homens peludos e suados… — Eu não conseguia encontrar nenhuma outra opção, não importa o quanto tentasse. Isso soava como um pé no saco.

— Uhm, na verdade, não são homens. Vi uma garota lá no meio.

— Isso é sério? Ela é bonita?

— Rudeus… Por favor, não me diga que você vai aceitar esse duelo.

— Não, não. Claro que não. Uh…

Balancei a minha cabeça, principalmente para que Fitz parasse de me encarar. Mesmo assim, fiquei um pouco intrigado. Eu queria ao menos saber como ela era. E onde tinha ouvido falar sobre mim.

— Só fiquei curioso, isso é tudo.

Quando alguém expressa interesse, é perfeitamente natural que a pessoa também fique um pouco intrigada. Não era como se as coisas pudessem ir muito longe até que minha condição fosse curada, é claro.

— Eh? Você ficou curioso, hein? Hmm. — Por algum motivo, Fitz parecia insatisfeito comigo. Ele tinha me feito um discurso sobre aceitar duelos com outras garotas no outro dia, então…

Ah, talvez o Luke tivesse se metido em problemas parecidos em algum momento, não? Aham, isso fazia sentido. Fitz devia ter sido forçado a resolver as coisas, então ficou irritado ao me ver tratando a situação de forma tão casual.

— Bem, isso não importa — falei. — Parece que todos os anos isso causa bastante caos, hein? O conselho estudantil não pode fazer nada?

— Não intervimos em nada relacionado à temporada de acasalamento. Se tentássemos proibir, as coisas provavelmente só iriam piorar.

Pelo que Fitz me disse, o conselho estudantil já ficava de mãos cheias nesta época do ano. Durante esta época caótica, concentravam a maior parte de suas energias na proteção dos alunos menos proficientes em combate, fazendo coisas como patrulha do campus em grupos pequenos e impedir qualquer conduta inadequada que encontrassem antes que as coisas saíssem do controle. Na verdade, Fitz estava escalado para participar de uma dessas patrulhas naquela mesma noite.

— Então você está tentando proteger a paz, certo? Então poderia me ajudar muito!

— Ah, por favor. Por que você não cuida disso sozinho, Rudeus? Não acho que você precisa da nossa ajuda.

A voz de Fitz, por algum motivo, não estava muito amigável. Falei algo que o aborreceu? Espera… ele talvez estivesse pensando no que aconteceu durante o meu exame de entrada. Alegou que a minha vitória não o incomodava, mas se eu começasse a fugir de lutas como essas, as pessoas poderiam pensar que ele perdeu para um covarde. Isso não seria nada bom para a sua reputação.

Fitz, recentemente, tinha me ajudado muito. Eu ainda não estava lá muito entusiasmado com isso tudo, mas lhe devia algum esforço.

— Então tá bom. Pelo bem do seu bom nome, Mestre Fitz, irei massacrar todos eles.

— O quê?! Não os mate , Rudeus!

— Foi só uma piada. Sinto muito.

As pessoas levavam esses duelos a sério, mas havia uma regra tácita de que ninguém deveria morrer neles. Ainda assim, podia haver um ou outro lutador poderoso esperando por mim no meio da multidão. Eu não poderia ser descuidado.

Por fim resignado com o meu destino, saí da biblioteca pela primeira vez em várias horas.

— Que merda é essa…?

Fui recebido por uma cena um tanto surpreendente. Dezenas de corpos jaziam espalhados pelo chão, moles e imóveis. Parecia que eu tinha entrado em um campo de guerra ou coisa do tipo.

Eram todos homens-fera de várias raças, formas e tamanhos.

Alguns usavam uniforme escolar, mas a maioria não.

Ah, espera. Também tem uma garota.

Era a espadachim que eu tinha visto antes. Ela tinha sido pego no meio da confusão? Ou talveeeeeeez… estava o tempo todo caidinha por mim?

Enquanto eu refletia sobre essa questão de extrema importância, uma explosão de risadas cortou o ar.

— Bwahahahaha!

Um homem ergueu-se entre os caídos, segurando o último de seus inimigos com uma das mãos.

— Dou crédito a vocês por me desafiarem, meus jovens amigos! Foi uma decisão realmente ruim de sua parte, sim, mas uma decisão corajosa! Os alunos desta “Universidade de Magia” com certeza têm alguma coragem!

Fitz e eu ficamos congelados no lugar, boquiabertos graças ao espanto. Após alguns segundos, finalmente consegui tentar soltar um “Uhm…”

Jogando o último oponente de lado, o homem se virou para nós.

— Ohoh! Esses jovens disseram para derrotá-los se eu não quisesse esperar a minha vez, então fiz isso! E agora você veio ao meu encontro, conforme o cronograma! Excelente, excelente! Gosto de homens que cumprem com a palavra!

Logo à primeira vista ficava óbvio que este homem era um demônio. Sua pele era negra como obsidiana e tinha seis braços. Os de cima estavam dobrados, os do meio apontados para nós e os de baixo descansavam em seus quadris. Seus longos cabelos, que iam até a cintura, eram de um interessante tom de roxo.

— Sou o Rei Demônio imortal, Badigadi!

Ele acabou de se chamar de Rei Demônio? Estávamos pensando sobre o mesmo tipo de Rei Demônio? Tipo, o cara que sai sequestrando jovens garotas das aldeias mais próximas para satisfazer seus desejos perversos? O cara que pode fazer o que bem entender, contanto que enfrente o “herói” que às vezes pode aparecer para matá-lo?

Sim, provavelmente não.

A questão mais importante no momento era: o que diabos um Rei Demônio estava fazendo ali?

 

 

 

— Vejo que você tem o Olho da Previsão, garoto! Então você deve ser Rudeus Greyrat! Ouvi minha noiva falar sobre você, a Imperatriz Demônio Kishirika!

Bem, no momento ele estava marchando em minha direção…

— Te desafio a um duelo!

Certo. Bem, ele ao menos sabia como ir direto ao ponto. Infelizmente, eu ainda não fazia ideia do que diabos estava acontecendo. Será que iria me deixar em paz se eu oferecesse duas jovens donzelas ligeiramente peludas como sacrifício…?

 


 

Tradução: Pimpolho

Revisão: PcWolf

 

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