A Mandíbula Inferior do Wyrm Vermelho era uma ravina com um caminho que cortava diretamente pelas montanhas. A estrada não era tão reta quanto a Estrada da Espada Sagrada, mas também não se dividia ou bifurcava. Era um território entre as fronteiras de países que ninguém reivindicou. Assim que passássemos por isso, estaríamos no Reino Asura.
Estávamos animados, pressentindo o fim de nossa longa jornada. Também estávamos um pouco preocupados porque não sabíamos o quanto nossa casa havia mudado, mas também começamos a ter uma sensação de dever cumprido. Seria possível até que estivéssemos baixando a guarda.
Foi também por esse caminho que eles vieram, caminhando firmemente na direção oposta. Não estavam em um cavalo, nem sentados em uma carruagem; estavam apenas caminhando. Havia um homem com cabelos prateados e olhos dourados que não usava uma armadura de verdade, só um casaco branco despretensiosamente feito de algum tipo de couro. Minha impressão era simplesmente de que o homem tinha um olhar perigoso nos olhos, e isso foi tudo. Suas íris eram pequenas o suficiente para que se pudesse ver toda a parte branca ao seu redor.
Meus olhos estavam mais atraídos para a outra pessoa, uma jovem com cabelo preto que o seguia. Olhando mais de perto, seu cabelo era, na verdade, castanho com um tom bem escuro, possuindo uma cor ligeiramente acinzentada. Normalmente não me lembrava das pessoas pela cor do cabelo, mas não deveria ser difícil lembrar de alguém com o cabelo totalmente preto. O problema era que eu não conseguia lembrar de ninguém assim.
Havia outra razão pela qual essa garota chamou minha atenção. Ela estava usando uma máscara de rosto inteiro. Era toda branca, sem nenhum desenho, era uma máscara sem qualquer decoração. Não havia nada de particularmente memorável nisso e, ainda assim, se a visse uma vez, jamais esqueceria. Se fosse para compará-la com qualquer coisa, seria com uma das máscaras faciais que vi no mundo da minha outra vida. Já que se destacava tanto, duvido que fosse algo da moda.
E como fui cativado pela aparência da garota – bem, não tão cativado – não notei Ruijerd, sentado no banco do cocheiro, ficando com o rosto pálido. Eris estava na mesma situação. A cada passo que o homem dava, ficando mais perto, mais o rosto dela ficava rígido e mais forte ficava o aperto de seu punho em sua espada, deixando suas mãos até mesmo brancas.
Quando o homem nos notou, inclinou a cabeça, curioso.
— Hm…? Você… poderia ser um Superd?
A dúvida se estabeleceu quando vi seus olhos, com suas pequenas íris, entreabertos. Ruijerd havia raspado todo o cabelo e a joia em sua testa estava escondida. Como o homem descobriu? Será que Ruijerd estava exalando algum tipo de cheiro que o denunciava? Enquanto considerava a possibilidade, me virei para olhar para ele.
— É um conhe… cido…? — Minha pergunta foi interrompida pela expressão no rosto de Ruijerd. Sua pele branca estava ainda mais pálida do que o normal, com gotas de suor frio escorrendo. Sua mão tremia enquanto ele agarrava sua lança. Essa expressão… eu a conhecia.
Medo.
— Rudeus, faça o que fizer, não se mova. Eris, você também. — A voz de Ruijerd estava tremendo.
Eu ainda não tinha ideia do que estava acontecendo, mas balancei a cabeça, sem palavras. O rosto de Eris ficou vermelho brilhante e ela parecia ser capaz de saltar para frente a qualquer momento. Seus braços e pernas tremiam. Será que tinham conhecido o homem em algum momento, e eu não fiquei ciente disso?
— Hm? Essa voz… Você é Ruijerd Superdia? Eu não te reconheci, já que está sem cabelo. O que está fazendo aqui?
O homem casualmente se aproximou de nós. Ruijerd preparou a lança em sua mão. Por capricho, decidi usar meu olho demoníaco.
O corpo do homem se fragmenta em várias imagens.
Havia tantos deles que eu não conseguia ver o contorno exato de seu corpo. O que diabos estava acontecendo?
— Hm? Esse cabelo ruivo… Eris Boreas Greyrat, hein? E o outro… quem é você? Não conheço o seu rosto… Ah, bem. Já entendi o que está havendo, Ruijerd Superdia. Você ama crianças, então esses dois devem ser os que foram teletransportados para o Continente Demônio durante o incidente. Você os trouxe até aqui. — Ele tinha um olhar de sabe-tudo no rosto enquanto balançava a cabeça.
Eris ficou chocada e gritou de volta:
— C-como você sabe meu nome?!
Fiquei ainda mais confuso com suas palavras. Então era a primeira vez que estavam se encontrando? Digo, era de Eris que estávamos falando, então não seria grande surpresa se ela tivesse esquecido. Mas esse homem não era exatamente esquecível, com seu cabelo prateado e a forma como o branco de seus olhos aparecia ao redor de sua íris. Depois, havia a questão da reação anormal que ele provocou em Eris e Ruijerd. Se ela tivesse o visto antes, não teria como esquecer.
— Quem diabos é você?! E por que sabe o meu nome?! — Ruijerd empurrou sua lança em direção ao homem. Pelo visto, ele também não conhecia esse cara. O que diabos estava havendo…?
Ruijerd era famoso. Ele não era muito conhecido no Continente Central, mas se fosse para o Continente Demônio, havia muitos que sabiam seu nome e conheciam seu rosto. Não era preciso mencionar Eris, mas qualquer um que ouvisse falar sobre uma espadachim ruiva poderia adivinhar quem ela era.
Não havia nada de demais nessa estranheza. Era só a atitude do homem… ou melhor, a discrepância entre suas atitudes e reações. Ele parecia amigável. Sua voz estava fraca, mas – e eu não sabia de onde isso vinha – havia uma qualidade nela que o fazia soar feliz, como se tivesse se reunido com velhos amigos.
O comportamento de Ruijerd era o completo oposto, agindo como se fosse atacar a qualquer momento. A única coisa é que ele ainda não tinha feito isso. Ele estava tratando este homem como um inimigo, mas não havia lançado um ataque. Mesmo Eris, que sempre era a primeira a atacar, não se moveu. E não foi só porque Ruijerd disse para que não fizesse isso.
— Este é um lugar curioso para nos encontrarmos… mas você parece bem. Que bom. — O homem olhou para Ruijerd, que ainda estava com a lança apontada para ele. Então riu de uma forma autodepreciativa e deu um passo para trás.
Vendo isso, a garota com a máscara murmurou:
— Tem certeza?
— Se já chegou a isso, é inevitável.
Foi uma conversa que não consegui entender, já que não tinha nenhum contexto do que estavam falando. E assim que acabou…
— Ficarei fora de seu caminho. — O homem caminhou lentamente para o lado. A mulher de cabelo preto o seguiu.
Ruijerd manteve seus olhos fixos no sujeito. E Eris, claro, também.
— Você eventualmente saberá… quem eu sou — disse o homem, suas palavras soaram comedidas e cheias de importância.
Intuitivamente, senti que ele sabia de alguma coisa. Senti uma vibração emanando do homem, uma semelhante à do Deus Homem. Precisava fazer que ele me dissesse o que era isso.
— Por favor, espere! — Antes que eu percebesse, pedi para o homem esperar.
Ele olhou para trás com surpresa evidente em seu rosto. Ruijerd e Eris também olharam para mim com o choque claro em seus rostos.
— O que foi? O que você quer?
— Ah, saudações. Meu nome é Rudeus Greyrat.
— Nunca ouvi falar de você.
Bem, era nosso primeiro encontro, afinal.
— Espere, Greyrat, não é? Qual o nome dos seus pais?
— Antes disso, uh, qual é o seu nome? — perguntei.
— Hm… Tudo bem, eu vou te dizer. Sou Orsted.
Orsted? Não era um nome com o qual eu estava familiarizado. O único personagem com um nome semelhante que eu conhecia era aquele que morreu e ficava dando desculpas do outro lado. Olhei para Ruijerd e percebi que ele também não parecia reconhecer o nome.
— Vocês dois se conhecem?
— Não — respondeu Orsted. — Ainda não.
— Ainda não? Como assim?
— Você não precisa saber. Agora, quem são seus pais? — Ele friamente ignorou o que eu queria saber.
O sujeito nem mesmo respondeu às minhas perguntas, mas queria que eu respondesse às dele? Bem, tanto faz. Eu não ia ficar chateado com algo tão irrisório.
— Paul Greyrat — falei, por fim.
— Hm…? Paul não deveria ter um filho. Ele deveria ter apenas duas filhas.
Bem, isso foi rude. Eu estava bem ali, e parecia igualzinho ao meu pai. O filho idiota que foi até o Continente Demônio para fazer dinheiro.
— Hm… — Como se tivesse percebido algo, Orsted inclinou a cabeça.
Ele lentamente se aproximou de mim.
— Não chegue mais perto! — Ruijerd o ameaçou.
— Sim, eu sei. — Ele parou, mantendo sua distância, mas olhou direto para o meu rosto. Encarei seu olhar. — Você não desvia os olhos, hein?
— Mas eu gostaria de desviar, já que você parece tão assustador — falei.
— Hm, então isso significa que você não sente nenhum medo? — Ele franziu as sobrancelhas. — Hmm. Que estranho. Não tenho memórias de ter te conhecido.
Nem eu. Este foi nosso primeiro encontro. Não conhecia o nome Orsted, nem reconheci seu rosto.
— Então, o que você quer? — perguntou o homem.
— Um, bem, eu só pensei que talvez você soubesse algo sobre o Incidente de Deslocamento.
— Não sei. — Ele não balançou a cabeça, mas rejeitou a possibilidade na mesma hora.
Hã. Algo em sua atitude em minha relação parecia meio estranho. Era como se ele estivesse mantendo a cautela comigo. Como se estivesse mantendo mais distância de mim do que de Ruijerd e Eris. Bem, ninguém gostaria de ser rudemente interrompido por alguém só para ser questionado sobre isso ou aquilo. Mesmo se o sujeito soubesse de algo, eu provavelmente não conseguiria fazer com que me contasse.
— Então tá bom, sinto muito por ter te parado…
Foi exatamente então, quando eu estava curvando minha cabeça em um pedido de desculpas, que ele disse:
— Você. Você já se familiarizou com o “Deus Homem”?
Ele, finalmente, mencionou algo que eu pude entender.
Parte do problema era que eu baixei a guarda, pensando que nossa conversa já tinha acabado. Outra parte foi que eu propositadamente evitei dizer qualquer coisa sobre o Deus Homem para quem quer que fosse, e agora de repente alguém havia tocado no nome dele, e foi uma pessoa que me confundiu por completo. Então, naturalmente, pensando que esse era um conhecimento que nós dois compartilhávamos e que daria continuidade à conversa, reagi sem pensar.
Respondi muito casualmente:
— Sim. Ele apareceu no meu sonho…
De repente, minha visão mudou.
A mão de Orsted vai atravessar meu peito como uma lança.
Foi tão rápido, parecia até que ele tinha se teletransportado. Eu não pude evitar. Um segundo era muito pouco tempo.
— Rudeus!
A visão desapareceu de repente e Ruijerd se posicionou na minha frente. Ele bloqueou o ataque de Orsted e eu fui jogado para trás. Orsted olhou por cima do ombro de Ruijerd, direto para mim. Seus olhos estavam frios.
— Então é isso. Você é um dos apóstolos do Deus Homem.
No mesmo instante em que me peguei pensando que Orsted estava fazendo uma acusação falsa, Ruijerd gritou para mim:
— Rudeus! Corra!
— Você está no caminho, Ruijerd Superdia! — Ruijerd balançou sua lança.
Eu não podia me mover. Não era como se não estivesse tentando fugir, só não tive a chance para tentar. Ruijerd foi eliminado em questão de segundos. Tudo o que pude fazer foi assistir Orsted facilmente o abater, assim como um humano espantando uma mosca.
Ruijerd era forte. Ao menos era o que se supunha. Mesmo Eris não conseguiu derrotá-lo durante a nossa viagem. Ele tinha quinhentos anos de experiência em batalha, o que deveria tê-lo tornado praticamente invencível. O Superd devia ser mais forte do que um espadachim de nível Rei. E, ainda, com meu olho demoníaco, o vi perdendo. Pelo olho, observei tudo do começo ao fim. Em termos de tempo, isso provavelmente levou apenas dez segundos.
Não havia como Orsted ser mais rápido do que Ruijerd. Só aconteceu que, a cada movimento que o Superd fazia, ficava em uma ligeira desvantagem. No intervalo de um segundo, isso se repetiu umas três ou quatro vezes. Cada vez que ele se movia, cavava ainda mais fundo a sua cova. Pouco a pouco, foi ficando encurralado. Cada vez que tentava atacar, seu equilíbrio diminuía um pouco e cada ataque que tentava lançar era interrompido.
Diferença de habilidade – essa era a única forma de se descrever o que estava havendo. As habilidades de Orsted eram esmagadoramente superiores às de Ruijerd. Era o suficiente para que eu pudesse vê-la claramente com meus olhos.
Orsted estava claramente atraindo Ruijerd para uma armadilha. Ele estava se movendo o mínimo possível, mas na velocidade mais rápida possível, deixando Ruijerd impotente. Se uma estratégia de combate perfeita se tornasse realidade, provavelmente seria assim. Orsted escolheu os intervalos perfeitos para avançar, colocando-se na distância certa para que a lança de Ruijerd o alcançasse com eficácia. Era como se Orsted estivesse zombando do Superd, propositalmente colocando-se em posição atrativa para consecutivos ataques poderosos, apenas para desequilibrá-lo, fazê-lo cambalear, criar aberturas em sua defesa e forçar o homem a se proteger dos contra-ataques pesados.
Não havia nada que Ruijerd pudesse fazer quanto a isso. Não havia mais nenhum método sobrando. Ele levou um soco no plexo solar, e pouco depois um golpe passou roçando a ponta de seu queixo. O terceiro, que tirou sua consciência, foi um soco que acertou sua têmpora. Ruijerd rolou duas vezes pelo chão antes de parar de se mover. Orsted provavelmente poderia ter matado o Superd no terceiro soco se quisesse, mas não o fez. Mesmo com alguém tão notável como Ruijerd sendo seu oponente, o homem conseguiu se conter.
— E então.
— Hyaaaah!
Quem estava gritando não era eu. Era Eris. Ela saltou na minha frente e brandiu sua lâmina em direção a Orsted, rápida como um arco de luz.
— Técnica Secreta: Fluxo. — Orsted não perdeu tempo com Eris. Tudo o que fez foi gentilmente parar a espada dela com a palma da mão. Ou ao menos foi o que parecia. E, ainda, isso foi o suficiente para enviá-la girando pelo ar. Ela voou como se tivesse sido atingida pela técnica suprema de um Santo.
Eris ficou fora de sua linha de visão. Assim que Ruijerd terminou, ela lançou seu ataque de seu ponto cego. Foi uma ofensiva incrivelmente hábil, pelo que eu poderia dizer – ela não perdeu tempo pensando em se defender, só pulou para atacar com tudo que tinha. Em troca, Orsted havia usado apenas uma técnica própria para incapacitá-la.
Espera. Eu já tinha visto algo semelhante antes. Paul tinha me mostrado algo parecido. Era uma técnica ao Estilo Deus da Água, embora a execução de Orsted fosse ainda mais polida do que a de Paul.
— Aaah…!
Eris caiu na borda de um penhasco. As pedras se desintegraram com o impacto e ela caiu com um baque surdo. A garota era incrivelmente durona, então não pensei que estivesse morta, mas poderia ter quebrado algum osso.
— Eris Boreas Greyrat, você aperfeiçoou suas habilidades muito bem. Acredito que você tem potencial, mas… ainda não está pronta.
— Ugh… uurgh… — Eris soltou um gemido e tentou se levantar.
Normalmente, em um momento assim, eu a curaria na mesma hora. Porém, não tive oportunidade para tentar. Afinal, os olhos de Orsted estavam fixos em mim.
Meus companheiros foram derrotados em poucos instantes. O tempo todo, mantive meu olho demoníaco ativado, mas tudo que eu podia ver, um segundo no futuro, era desespero. Vi que não importa o que eu fizesse, ele me mataria. Observei como meu futuro eu, dentro de apenas um segundo, teria seus pontos vitais destruídos. Minha cabeça, minha garganta, meu coração, meus pulmões… Observei como cada um deles era esmagado e, ao mesmo tempo, tive uma visão do homem apenas parado ali, imóvel. Eu não entendia o que estava acontecendo. Se essa visão fosse verdadeira, em um segundo, passariam a existir cinco dele.
Eu não podia me mover. Sabia que não importa o que fizesse, seria inútil. Aquele segundo inteiro passou sem que eu pudesse fazer nada. Ele deslizou para frente, como se desafiasse as leis da física, e em um instante ficou bem diante de mim. Foi muito repentino, igual uma animação feita com poucos frames.
Um instante após ele aparecer diante de mim, já tinha terminado seu ataque. Há muito tempo eu já havia visto movimentos parecidos em algum videogame. Foi em um jogo pós-apocalíptico onde cada personagem tinha um combo infinito ou um KO Fatal.
Seis de minhas costelas foram fraturadas ao mesmo tempo. Houve um impacto, mas foi diferente do tipo que faria sair voando. No mesmo instante, senti a pressão de outro ataque me atingindo por trás. E o dano se acumulou dentro do meu corpo. Meus pulmões foram esmagados.
— Uughhh! — Em uma fração de segundo, o sangue jorrou pela minha garganta e eu comecei a vomitar algo vermelho.
— Quando se luta contra um mago, o melhor a fazer é destruir os pulmões dele — disse ele, indiferente enquanto eu caía de joelhos.
Em algum lugar dentro de mim, experienciei um “aha!” em um momento de aceitação enquanto observava minha poça de sangue no chão abaixo. Esmagar os pulmões de um mago era o melhor curso de ação, porque assim eles não poderiam recitar feitiços. Isso significava que perdi minha habilidade de usar magia de cura. E, claro, com meus pulmões destruídos, não conseguiria ficar vivo.
— Quando você morrer, certifique-se de entregar uma mensagem ao Deus Homem para mim. Diga a ele que o Deus Dragão Orsted será aquele que o matará. — O Deus Dragão. Número dois na lista dos Sete Grandes Poderes.
Orsted me deu uma olhada enquanto eu rolava no chão, com as mãos no peito, e se virou para sair. Percebi que ele baixou a guarda. Eu já havia recebido um ferimento fatal, não fui simplesmente derrotado – já estava nas portas da morte. Não sabia por que, mesmo naquele estado, ainda estava pensando em tentar revidar. Talvez fosse porque, no limite da minha visão, pude ver Eris tentando se levantar. Mais provavelmente, era porque pensei que este homem tinha certeza de que eu iria morrer, e por isso ele também iria acabar com os outros dois.
Mesmo assim, lancei um Canhão de Pedra na direção dele. Por que não usei uma magia mais poderosa? Afinal, possuía magias de nível Avançado que poderia usar como quisesse. Mesmo assim, nunca descobri a resposta. Naquele momento, eu provavelmente só estava usando a magia com a qual estava mais familiarizado.
Lancei a pedra mais dura que pude, na velocidade mais rápida com o giro mais rápido. Aquele Canhão de Pedra foi tão poderoso que até eu fiquei surpreso. A rocha começou a pegar fogo enquanto voava a curta distância entre nós dois.
Orsted vai olhar para trás e destruir meu Canhão de Pedra com o punho.
E foi o que ele fez. Com o som de metal tilintando, aquilo se desfez e caiu no chão, em pedaços.
Orsted olhou para o punho.
— Aquilo de agora foi um Canhão de Pedra, não foi? Teve um poder incrível. Ser capaz de me ferir com uma magia dessas é um feito impressionante. — A pele de seu punho ficou ligeiramente arranhada. Eu mal o arranhei.
Não foi bom o bastante. Não poderia o ferir com meu Canhão de Pedra.
— Tenho certeza de que esmaguei seus pulmões, então você sabe usar magia não verbal? É um poder que ganhou do Deus Homem? O que mais ele te deu? — Orsted olhou para mim. Ele poderia ter simplesmente acabado comigo, mas, em vez disso, estava me olhando como se eu fosse um gafanhoto que teve as pernas arrancadas.
— Ugh…! — Conjurei magia do vento para forçar o ar a entrar em meus pulmões. Com isso, engasguei violentamente. Eu sabia que não adiantava, mas mesmo assim forcei o ar, enchendo meus pulmões, antes de parar de respirar.
— Que uso divertido para a magia. Mas agora, de que serve isso? Por que não usa a magia não verbal para curar seus pulmões? — Orsted levou a mão ao queixo, olhando-me como se gostasse de me ver sofrendo.
Mesmo quando minha consciência esmaeceu, formei uma Bola de Fogo na minha mão direita. Com a magia de fogo, quanto mais mana fosse usada, mais forte seria o calor e maior ela ficaria. Se a velocidade e a dureza do meu Canhão de Pedra não foram suficientes, então eu tentaria usar o calor e o poder explosivo.
— Já chega. Atrapalhar Magia!
Minhas débeis intenções de resistir foram facilmente varridas. No momento em que Orsted apontou sua mão direita para mim, a mana que estava começando a tomar forma na ponta da minha mão foi dispersada. Não importa o quanto eu tentei canalizar mana para minha mão, ela não tomava forma e se dissipava. Mesmo estando semiconsciente, eu entendi. Houve alguma interferência com a mana em minha mão, algo que interrompeu e tornou minha magia ineficaz.
Ele selou minha mão direita, mas eu ainda tinha a esquerda. Então a levantei e conjurei uma magia no espaço entre nós dois, desencadeando uma onda de choque. Um boom explosivo ressoou enquanto Orsted voava para trás. Eu também fui jogado para longe pela explosão.
— Hmph… você anulou meu Atrapalhar Magia? Não, não foi isso… Você está usando várias escolas de magia ao mesmo tempo. Para ser capaz de fazer isso sem pronunciar nada, demonstra que é bastante habilidoso. Assim, não é? — O homem estalou os dedos da mão esquerda. Quando o fez, uma pequena janela quadrada com cinquenta centímetros de lado se formou no ar. Era uma bela janela, adornada com lindos ornamentos em forma de dragão. — Hm. É mais difícil do que eu imaginei.
Ignorei a janela e me concentrei em lançar o ataque de fogo mais feroz que poderia usar. O que imaginei em minha mente foi uma chama enorme. Uma nuvem em forma de cogumelo. Uma explosão nuclear. Canalizei minha magia da maneira mais simples e direta possível, como se estivesse me preparando para dar um soco. Nem mesmo pensei no fato de que Eris e Ruijerd poderiam ser envolvidos pelo alcance disso. Já tinha perdido a capacidade de pensar.
— Abra, Portal-Wyrm de Vanguarda! — Enquanto Orsted cuspia essas palavras, a janela se abriu.
No mesmo instante, a mana se agrupando em minha mão esquerda foi engolida. A moldura da janela rachou e se estilhaçou. Ao mesmo tempo, uma explosão foi desencadeada bem perto de Orsted. Foi muito menos poderosa do que eu esperava, e ele a evitou facilmente.
— Que incrível capacidade de mana. Um Portal-Wyrm de Vanguarda deste tamanho não pôde contê-la. É quase como se você estivesse no mesmo nível de Laplace… Bem, você é o apóstolo de Deus Homem, afinal. Por que ainda não curou os seus pulmões? Está tentando me fazer baixar a guarda?
Isso foi logo antes de eu perder a consciência por completo. Eu não tinha mais a capacidade de discernir o que estava acontecendo.
O homem ainda estava me observando. Nossos olhos se encontraram.
— Só isso? — Em uma fração de segundo, ele se aproximou de mim. Não havia nada que eu pudesse fazer. — Você não pode fazer nada além de magia?
Minha magia foi selada e minhas pernas estavam congeladas, então eu não conseguia me mover. Fiquei desamparado diante de sua intenção assassina esmagadora. No limite da minha visão, podia ver a janela se dissipando, mas não havia nada que eu pudesse fazer.
— Guhugh! — Tentei usar o rugido que aprendi no Vilarejo Doldia, aquele que não se parecia nem um pouco com o deles. Orsted se preparou, mas, claro, tudo que consegui fazer foi cuspir sangue e não criar nenhum efeito.
— Só mana…? O que você está tentando fazer?
Já não havia mais nada que eu pudesse fazer. Minha magia foi selada e não havia nenhuma indicação de que eu poderia derrotar Orsted com ataques físicos. A única coisa que me restava a fazer era me prostrar. Mas o Deus Dragão não permitiu nem mesmo isso.
— Bem, não importa. Morra.
— Aagh…!
Sua mão atravessou meu corpo em uma super velocidade. Direto pelo meu coração. Uma ferida completamente fatal. Uma na qual minha magia de cura jamais seria eficaz.
— Que decepção, Deus Homem. Agora você está usando peões que não podem nem revestir-se de uma Aura de Batalha? O que você está planejando? — Sua mão estava toda banhada pelo meu sangue quando ele a removeu. Tentei me levantar, mas meu corpo não me obedeceu. Ele me traiu e desmoronou no chão. No limite da minha visão, pude ver Eris levantando a cabeça, pude ver o olhar atordoado em seu rosto enquanto olhava para mim. Nossos olhos se encontraram.
— A-aah… R-Rudeu… Rudeus…!
Ah, que merda. Eu não quero morrer. Ainda não cumpri a minha promessa com Eris. Só mais dois anos, eu só queria aguentar mais dois anos. Se pudesse fazer isso, poderia morrer sem arrependimentos.
Só preciso reunir minha mana. É só um ferimento. Vou curar isso, disse a mim mesmo. Eu não conseguia entoar as palavras porque havia um buraco em meus pulmões. Ainda assim, poderia fazer isso. Só precisar focar a mana lentamente. Isso iria curar. Isso iria curar. Eu ainda não podia morrer.
— Waaaaaaaaaaaaah! — Eris soltou um lamento.
— Ele era importante para você? Sinto muito, Eris Boreas Greyrat. Um dia você vai entender. Vamos, Nanahoshi.
— S-sim…
Orsted se afastou lentamente enquanto a garota o seguia.
Eris não pôde suportar, fosse pelo dano que sofreu, fosse pelo medo. Ou talvez pelo choque. Tudo que ela podia fazer era gritar. A garota não tinha mais uma espada, então usou sua voz.
— Ruijerd! Ghislaine! Avô! Pai! Mãe! Theresa! Paul! Eu não me importo com quem for, apenas salvem ele! Rudeus vai morrer!
Merda, minha consciência estava se esvaindo ainda mais. Sério? Isso seria mesmo o fim?
Mas eu não… queria… morrer…
— Ei, Orsted, só há uma coisa que está pesando sobre mim. Aquele garoto… Não seria melhor deixar ele vivo?
Pouco antes de eu perder toda a consciência, senti como se tivesse ouvido alguém dizendo essas palavras.
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