Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado

Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado – Vol. 04 – Cap. 10 – A Estrada da Espada Sagrada

 

Um dia antes de deixarmos o Vilarejo Doldia, Eris e Minitona brigaram. Nem seria necessário mencionar, tenho certeza, mas Eris ganhou facilmente. Claro que sim. Afinal, conseguiu suportar até mesmo o treinamento de Ruijerd. Com a outra pessoa sendo mais jovem e destreinada, dificilmente ofereceria algum desafio. Isso estava mais para algo como o forte intimidando o fraco.

Achei que deveria ao menos alertá-la sobre isso. Eu sabia que Eris era esse tipo de pessoa, mas ela logo faria quatorze anos. Embora tecnicamente ainda fosse uma criança, quatorze anos era idade suficiente para não poder simplesmente sair socando os outros sem motivos. Mas como eu iria fazer isso?

Nunca tinha interferido em nenhuma de suas lutas. Normalmente, deixava Ruijerd lidar com ela e suas brigas na Guilda dos Aventureiros. Então, o que eu poderia dizer neste momento? Deveria dizer que aventureiros e garotas dos vilarejos eram coisas diferentes?

— N-não, a culpa é de Tona — disse Tersena em protesto.

Segundo ela, como a estação das chuvas havia acabado, Eris disse que ia deixar a aldeia e Minitona tentou impedi-la. Eris ficou feliz com Minitona querendo que ela ficasse, mas explicou que teria que continuar sua jornada, apontando para o tanto que o pedido da garota era egoísta. Normalmente isso aconteceria ao contrário.

Mas, após isso, continuaram conversando por algum tempo. No início, as duas estavam calmas, mas a discussão logo azedou. Minitona começou a lançar insultos. Inclusive direcionados a Ghislaine e eu. Eris parecia irritada, mas suportou tudo e respondeu com calma.

No final, Minitona deu o primeiro soco. Foi ela quem tentou arranjar uma briga com Eris. Isso exigia bastante coragem. Dei até alguns créditos a isso. Definitivamente era algo que nem eu poderia fazer. Eris não recuou. Como esperado, bateu em Minitona sem qualquer piedade, até ela virar polpa.

— Eris.

— O quê?!

Parei para reconsiderar a situação. Em primeiro lugar, Minitona deveria saber que perderia a luta, mas ainda assim se irritou e começou a lançar insultos. Mesmo depois de ser pulverizada, ainda não recuou. O melhor dos adultos era facilmente destruído ao enfrentar Eris. Minitona devia ser muito obstinada.

— Você se conteve, não foi? — perguntei.

— Claro que sim — disse ela, virando-se. No passado, a garota nunca teria mostrado misericórdia a alguém que a mostrasse os dentes, nem mesmo se fosse uma criança. Eu sabia muito bem disso.

— Normalmente você seria mais cruel com essas coisas, não é?

— Sim, bem, ela é minha amiga.

Quando olhei para Eris, a garota parecia envergonhada, seus lábios até mesmo formaram um beicinho.

Hm. Parecia que estava ao menos um pouco arrependida por ter socado Minitona. Isso era algo que eu nunca tinha visto antes. Em três meses, talvez tivesse ficado um pouco mais adulta. Ela estava amadurecendo sem que eu percebesse. Nesse caso, havia apenas uma coisa a dizer.

— É melhor vocês se reconciliarem antes de partirmos amanhã.

— Não quero…

Continua uma criança, hein?

 

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Estávamos ocupados nos preparando para nossa partida no próximo dia, então não me encontrei com a Fera Sagrada. Em vez disso, recebi duas visitantes no meio da noite.

— Ah! — Um gritinho acompanhou um estrondo alto.

Os dois sons foram suficientes para me acordar. Eu me levantei, ciente do quanto havia baixado minha guarda ultimamente, e alcancei o cajado ao meu lado. A aura do intruso era patética demais para ser um assaltante. E, de qualquer forma, se fosse um, Ruijerd teria o notado muito antes. Isso tornou o silêncio do intruso ainda mais bizarro.

— Tersena, tente ficar um pouco mais quieta, mew!

Abaixei meu cajado. Então foi por isso que Ruijerd não disse nada.

— Desculpe, Tona, mas está escuro.

— Se você apertar os olhos direito, pode conseguir ver, mew… Ah!

E outro som agudo de algo batendo soou.

— Tona, você está bem?

— Owie, mew…

As duas talvez estivessem tentando sussurrar, mas suas vozes eram altas o suficiente para que eu pudesse as ouvir claramente. Qual era o objetivo delas? Dinheiro? Fama? Ou estavam mirando o meu corpo?

Brincadeirinha. Eu sabia que queriam Eris.

— Ah, aqui, mew?

— Sniff, sniff… Não, isso não parece ser ela.

— Não precisa se preocupar, mew. Provavelmente estão dormindo, mew.

As meninas pararam na frente da minha porta e ouvi um clique quando entraram. Cautelosamente, espiaram e olharam ao redor, apenas para travar os olhos em mim quando me sentei na cama.

— Mew…!

— Algo errado, Tona? Ah…!

Eram Minitona e Tersena. Cada uma delas usava um vestido de couro liso com uma abertura na parte traseira, onde suas caudas balançavam para fora. Essas roupas de dormir peculiares do povo-fera eram realmente adoráveis.

Falei o mais baixo que pude:

— O que vocês estão fazendo aqui tão tarde da noite? O quarto de Eris fica ao lado.

— D-desculpe, mew… — Tona se desculpou e começou a fechar a porta antes de parar de repente. — Ah é, eu ainda não te agradeci, mew.

Hã, T-Tona?

Minitona falou como se tivesse acabado de lembrar de algo e deslizou para dentro do quarto. Tersena a seguiu timidamente.

— Obrigada por nos salvar, mew. Disseram que eu poderia ter morrido se você não tivesse lançado sua cura em mim, mew.

Provavelmente era verdade. Suas feridas eram muito graves. Pelo menos graves o suficiente para que eu ficasse muito traumatizado se estivesse no lugar dela. Achei sua atitude destemida impressionante.

— Sem problemas — falei.

— Graças a você, também não tenho nenhuma cicatriz, mew. — Ela enrolou a bainha do vestido, revelando as pernas nuas. Estava escuro o suficiente para que eu não pudesse ver o que havia entre elas. Lady Kishirika, por que você não tinha olhos de demônio que pudessem ver no escuro?

— Tona, isso é impróprio…!

— Não é como se ele não tivesse visto antes, então está tudo bem, mew.

— Mas o Tio Gyes disse que os homens humanos têm uma longa temporada de acasalamento, então, se não os abordar com cautela, pode ser atacada.

Uma longa temporada de acasalamento? Isso era algo rude a se dizer. Mas não é como se fosse mentira.

— Além disso, se ele ficar excitado olhando para o meu corpo, então é uma boa maneira de eu agradecer… mew?! Que frio!

— Isso é porque você continua erguendo sua roupa!

Naquele ponto, eu nem estava focando nas pernas de Minitona. Um suor frio desceu pelas minhas costas enquanto eu enrolava meus dedos em torno do cajado que deveria estar deitado ao meu lado. Uma intenção cruel e assassina exalava do quarto vizinho.

— A-ahem. Vou aceitar sua gratidão. Eris está no quarto ao lado do meu, então sigam em frente.

Isso mesmo, não importava se ela era uma criança. Não deveria ter mostrado seu corpo com tanta falta de cuidado assim. Afinal, causaria sérios problemas se fosse agredida por algum velho doente tentando brincar de médico.

— Certo. Mas, sério, obrigada, mew.

— Obrigada — disse Tersena. As duas se curvaram e saíram do quarto.

Depois de alguns momentos, atravessei o cômodo na ponta dos pés e encostei o ouvido na parede. Eu podia ouvir a voz mal-humorada de Eris no quarto vizinho quando ela disse:

— O que vocês querem?

A imaginei em sua pose usual, com os braços cruzados sobre o peito. As vozes de Minitona e Tersena estavam um pouco difíceis de ouvir. Ou talvez a voz de Eris é que fosse muito alta. Escutei ansiosamente, mas sua voz foi ficando mais calma. Parecia que as coisas ficariam bem. Aliviado, voltei para a minha cama.

As três meninas passaram a noite inteira conversando. Quanto ao que conversaram, eu não fazia ideia. Minitona e Tersena estavam longe de ser mestras na língua humana. Eris tinha aprendido um pouco da língua do Deus Fera, mas não o suficiente para manter uma conversa. Me preocupei sobre realmente terem resolvido as coisas ou não, mas quando chegou a hora de se separar no dia seguinte, Eris segurou a mão de Minitona e tinha lágrimas nos olhos quando se abraçaram. Parecia que, no final, foram capazes de se reconciliar. Fiquei contente.

 

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A Estrada da Espada Sagrada era uma estrada que passava direto pela Grande Floresta. Feita há muito tempo pelo País Sagrado de Millis, estava repleta de mana. Mesmo com a área ao redor inundada, a estrada permanecia seca e intocada. Pelo visto, nenhum monstro seria capaz de colocar os pés nela. Nós três estaríamos usando a carruagem puxada por cavalos que recebemos da tribo Doldia para viajar por aquela estrada, rumo ao sul.

O povo-fera preparou tudo o que poderíamos precisar em nossa viagem. A carruagem, o cavalo, o dinheiro para viagens e suprimentos. Poderíamos ir direto para a capital de Millis sem nem retornar a Porto Zant.

Era hora de partir! Ou pelo menos deveria ser, quando por algum motivo um homem com cara de macaco se aproximou de nós.

— Ah, cara, este é o momento perfeito. Estava pensando em voltar para Millis. Deixa eu ir com vocês — disse Geese, puxando-se descaradamente para dentro.

— Ah, é você, Geese.

— Você também vai?

Os outros dois não pareciam tão irritados com sua presença quanto eu. Quando perguntei se o conheciam, a resposta deles mostrou que estavam gradualmente começando a gostar do sujeito sem que eu percebesse. Isso incluía se aproximar de Eris, Minitona e Tersena e contar piadinhas engraçadas. Ele também se juntou a Gustav e Ruijerd durante suas conversas, onde ajustou sua maneira para se adequar ao tom da conversa. O homem realmente tinha uma fala mole e era hábil na manipulação. Conseguiu se enturmar com os dois facilmente, sem que eu percebesse nada. E ambos o receberam de braços abertos. O quê, estavam me traindo com Geese?!

— Então tá bom, vamos indo! — declarou Ruijerd quando a carruagem começou a andar.

Acenamos um adeus ao povo-fera que se reuniu para ver nossa partida. Foi um pouco comovente ver Eris com lágrimas nos olhos enquanto observava Minitona e os outros.

Ainda assim, algo pesava em meu coração e era tudo culpa de Geese. Se ele queria ir junto, deveria ter me contado desde o começo. Não havia necessidade para agir de forma suspeita e se esgueirar pelas minhas costas. Eu não teria o recusado se me pedisse categoricamente. Depois que comemos a mesma comida e pegamos as pulgas um do outro, parecia que estávamos nos distanciando.

— Ei, ei, chefe. Não me olhe assim. Somos amigos, certo?

Geese devia ter notado a expressão de descontentamento que eu sem dúvidas mostrava quando estávamos sentados na carruagem, descendo a estrada a uma velocidade impressionante. Ele sorriu para mim e se inclinou perto do meu ouvido.

— Pode não parecer, mas tenho confiança em minhas habilidades como cozinheiro, basta você observar!

Ele tinha um rosto encantador e também não era um cara mau. Mesmo assim, desde o incidente com Gallus, tive a sensação de que havia algo mais sombrio por trás de tudo isso.

— Rudeus.

— Sim, Senhor Ruijerd?

— Quem se importa se ele vier junto? — disse.

— Mestre Ruijerd! — exclamou Geese. — Eu sabia que você entenderia! Ahh, isso só confirma o que eu pensava sobre você. Você realmente é um homem entre os homens!

— Tem certeza disso, Senhor Ruijerd? — perguntei. — Este homem é um daqueles criminosos que você tanto odeia.

— Ele não me parece tão ruim.

Eu não tinha ideia de qual era o método que Ruijerd adotava para medir esses casos. A companhia de Geese era até boa, mas os padrões indefinidos de Ruijerd eram um problema. Não, talvez tudo isso fosse resultado da conversa mole do sujeito. O macaco bastardo com certeza tinha feito um bom trabalho.

— Heh heh. Eu gosto de apostar, mas acho que nunca fiz nada verdadeiramente desprezível para os outros. Mestre Ruijerd, você tem um bom olho para as pessoas.

Francamente, eu tinha uma dívida com esse homem. Ele me deu seu colete quando eu estava com frio e também me ajudou durante a luta com Gallus. Eu não tinha certeza do que ele estava planejando, mas não tinha motivo para o afastar. Estava um pouco irritado com seus métodos indiretos, isso é tudo.

— Não me importo se você vier conosco, novato. Mas tem certeza de que não tem medo de um Superd? — Falei alto o suficiente para que Ruijerd pudesse ouvir. Eu ainda não tinha certeza se ele sabia que Ruijerd era um Superd, mas se participou de suas bebedeiras, podia muito bem ter ouvido sobre isso. Só não queria que descobrisse mais tarde e reclamasse sobre como era assustador estar com um Superd.

— É claro. Você achou que eu não teria? Afinal, sou um demônio. Tenho ouvido sobre como os Superds são assustadores desde quando era criança.

— Ah, sério? Sabe, Ruijerd pode não parecer, mas é um Superd.

Quando Geese ouviu isso, ele apertou os olhos.

— Isso é diferente. Ele salvou minha vida.

Curioso para saber o que isso significava, virei meu olhar para Ruijerd, mas ele apenas balançou a cabeça como se não tivesse ideia do que Geese estava falando. Era, no mínimo, algo que aconteceu bem antes dos últimos três meses.

— Acho que você não se lembra, hein? Bem, claro, foi há uns trinta anos.

Geese então iniciou sua explicação. Foi uma história épica que incluiu um encontro inicial, uma despedida, um clímax e uma cena de amor. Quando um herói incrivelmente bonito e durão disse que ia partir em uma jornada, centenas de mulheres imploraram para que ele não fosse. O sujeito saiu de sua cidade natal, apesar de seus apegos persistentes a ela e encontrou uma misteriosa beldade quando chegou ao seu destino.

Para resumir o que de outra forma seria uma longa história, quando Geese ainda era um aventureiro novato, Ruijerd interveio para salvá-lo quando foi atacado e quase morto por um monstro.

— Bem, foi há uns trinta anos. Eu particularmente não sinto que exista qualquer dívida — disse Geese. A tribo Superd era assustadora, mas Ruijerd era diferente, disse o novato com cara de macaco, rindo.

O Superd relaxou ao ouvir isso. Senti que, logo após ouvir essa história, entendi o significado da palavra karma. Bom para você, Ruijerd, pensei.

— Bem, espero que me deixe ficar com você por um tempo, Senpai ☆

E foi assim que o Fim da Linha ganhou um novo membro com uma cara de macaco… Espera aí, ele não era um novo membro. Só ficaria conosco até chegarmos à próxima cidade, lembrei. Geese alegou que era azarado – sempre que entrava em um grupo de quatro, algo terrível acontecia. Eu não tinha palavras para mencionar o azar que ficar na mesma cela que ele foi. Em qualquer caso, estava tudo bem se não fosse se juntar ao nosso grupo.

Foi assim que partimos em nossa jornada com um viajante extra nos acompanhando.

 

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A carruagem nos carregou por um caminho contínuo que cortava a Grande Floresta. Era realmente uma estrada reta, que se estendia sem parar pelo horizonte, continuando até a capital do País Sagrado. Não havia um único monstro, e a água foi drenada para fora do caminho.

Eu estava desconfiado sobre como esse caminho foi feito, mas Geese me explicou. Esta rodovia foi criada por Santo Millis, o fundador da fé Millis, a maior denominação religiosa do mundo. Com um único golpe de sua espada, Santo Millis cortou as montanhas e as florestas ao meio, dividindo até um rei demônio no Continente Demônio em dois. A estrada foi batizada de Estrada da Espada Sagrada tendo essa história em mente.

Por mais que eu quisesse descartar a história com ceticismo, a mana de Santo Millis ainda permanecia. O fato de não termos encontrado nenhum monstro até o momento era prova disso. A carruagem também não ficou presa na lama. Estávamos viajando tranquilamente. Isso não era nada menos do que um milagre.

Agora eu podia entender o motivo pelo qual sua religião tinha tanto poder. Ao mesmo tempo, temia o possível impacto negativo que muita mana poderia causar ao corpo. Mana era uma coisa útil, mas em abundância poderia ser aterrorizante. Ela também poderia fazer coisas terríveis, como transformar animais em monstros e transportar crianças do Continente Central para o Continente Demônio. Embora, neste caso, não ser atacado por monstros tornava nossa jornada mais fácil.

Havia intervalos fixos ao longo da rodovia onde seria possível acampar. Foram neles que passamos nossas noites. Ruijerd iria caçar algo na floresta para o jantar, então não sofríamos com falta de comida. Às vezes, pessoas-fera de algum assentamento próximo apareciam para vender seus produtos, mas não tínhamos necessidade de suprimentos adicionais.

Havia também uma grande abundância de plantas, como era de se esperar de uma floresta. As flores que poderiam ser usadas como especiarias cresciam em grande quantidade à beira da estrada. Usei o que aprendi na Enciclopédia de Plantas que li quando era criança e juntei alguns ingredientes para temperar nossa comida. Eu não era um cozinheiro muito habilidoso, mas havia melhorado um pouco no ano passado, embora só tivesse ido de terrível para menos terrível.

A Grande Floresta fornecia ingredientes de qualidade muito mais alta do que o Continente Demônio. Não apenas em termos de feras, mas também de animais normais. Os coelhos e javalis tinham um sabor delicioso quando assados, mesmo sem temperos, mas não era o suficiente para mim. Já que tínhamos os ingredientes disponíveis, queria comer pratos mais saborosos. Fiquei ganancioso como sempre em minha busca por boa comida.

Foi aí que Geese entrou. Exatamente como havia declarado, ele era um mestre em cozinhar ao ar livre. A maneira como pegava as nozes e a grama selvagem que eu colhia e as transformava em temperos era como feitiçaria, injetando os sabores mais deliciosos em nossa comida.

— Eu te falei. Posso fazer qualquer coisa!

Essa também não era uma declaração vazia. A carne estava realmente deliciosa.

— Surpreendente; me segure! — Joguei meus braços em volta dele sem nem pensar muito. Geese ficou enojado com isso. Até eu fiquei enojado com isso. Nossos sentimentos eram mútuos.

 

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— Estou entediada — murmurou Eris enquanto preparávamos nossa refeição diária, como de costume.

Coletor de Ingredientes: Ruijerd

Produtor de Fogo e Água: Eu

Cozinheiro: Geese

Nossa atribuição de trabalho era tão precisa que não havia nada para Eris fazer, exceto coletar lenha, mas ela terminava tudo rápido demais. Assim sendo, acabava entediada.

No início, treinava com sua espada e ficava em silêncio. Depois de ser forçada por mim e Ghislaine a praticar exercícios repetitivos, poderia continuar brandindo sua espada por horas. Entretanto, não era como se ela achasse isso divertido.

No momento, Ruijerd estava caçando, Geese estava preparando sopa e eu me acomodei para continuar trabalhando em minha estatueta. A figure de Ruijerd em escala 1:10 estava demorando um pouco para ser concluída, mas eu tinha certeza de que poderia vendê-la. Adicionaria opções a ela para inclusive aumentar seu valor. Usando isso, mostraria às pessoas que os Superds não deveriam ser atacados e, em vez disso, poderiam se tornar amigos.

Deixando isso de lado, Eris estava achando seu tédio incontrolável.

— Ei, Geese!

— Algo de errado, Senhorita? A comida ainda não está pronta. — Ele provou um pouco da sopa antes de olhar para ela.

Eris estava em sua pose usual, com os braços cruzados e as pernas abertas.

— Ensine-me a cozinhar!

— Passo. — Sua resposta foi instantânea. Geese voltou a cozinhar como se a conversa nunca tivesse acontecido.

Eris ficou pasma por um momento, mas se recuperou rapidamente e gritou:

— Por que não?!

 

 

 

 

— Porque eu não quero.

— Então por que não?!

Geese soltou um enorme suspiro.

— Certo, Senhorita. Tudo o que uma espadachim precisa saber fazer é lutar. Cozinhar é perda de tempo. Tudo o que você precisa fazer é comer.

Este era um homem cujas habilidades culinárias iam além de sua mentalidade de “apenas comer”. Ele poderia abrir seu próprio restaurante. O sujeito não era tão bom a ponto de fazer o queixo de um certo rei gourmet cair e ter um feixe de luz saindo de sua boca, mas era pelo menos bom o suficiente para que seu restaurante fosse moderadamente popular por toda a vizinhança.

— Mas, se eu pudesse cozinhar… hum… bem, você sabe, certo? — Ela hesitou em explicar, jogando olhares em minha direção.

O que é isso, Eris? O que você quer dizer? Heh heh, vá em frente e diga, a incitei comigo mesmo.

— Não, nem imagino. — Geese estava sendo frio com ela. Eu não tinha certeza do porquê, mas ele estava sendo excepcionalmente inflexível. O cara não era assim em relação a Ruijerd ou a mim, mas sempre soava distante quando interagia com Eris. — Você é habilidosa com a espada, não é? Então não precisa aprender a cozinhar.

— Mas…

— Poder lutar é uma coisa maravilhosa, sabe? Se você quer viver neste mundo, não há nada mais essencial do que isso. Não desperdice seu talento.

O rosto de Eris ficou sombrio, mas ela não tentou socar Geese. Havia algo estranhamente persuasivo no que ele disse.

— Esse é o meu motivo oficial. — O homem-macaco assentiu consigo mesmo e parou de mexer na panela. Ele então começou a encher as tigelas de pedra que eu fiz. — Veja, decidi que nunca mais ensinaria alguém a cozinhar.

Geese já havia participado de um grupo de ataque a masmorras. Era um grupo de seis, um bando não qualificado que, ao contrário dele, tinha apenas um papel a cumprir. Na época, Geese tinha o hábito de reclamar: “Ei, sério, vocês não sabem fazer mais nada?” O grupo deles não era convencional, mas era eficaz ao fazer as coisas.

Porém, um dia, uma mulher do grupo se aproximou de Geese e disse que queria aprender a cozinhar. Ela queria ir atrás de um dos homens do grupo. É claro que o ditado “O caminho para o coração de um homem é pela boca” também existia neste mundo. Geese respondeu com “Claro, acho, por que não?” e começou a ensiná-la.

Não ficou claro se a culinária teve alguma coisa a ver com o que aconteceu depois, mas a mulher ficou com o homem e os dois se casaram algum tempo depois. Então deixaram o grupo e foram para algum lugar. Tudo bem, disse Geese. Houve uma briga quando os dois foram embora, mas a partida não foi um problema.

O que aconteceu depois é que foi horrível. Quando as duas pessoas mais importantes foram embora, o grupo começou a debandar. Tornou-se um turbilhão de disputas e apatia, tanto que não podiam mais realizar missões e logo se dispersaram por completo.

Geese, entretanto, era um homem que podia fazer qualquer coisa. Ele não tinha talento para a espada ou magia, mas podia fazer todas as outras coisas. É por isso que pensou que logo encontraria um novo grupo. Mas seu esforço acabou resultando em um fracasso esmagador. Na época, ele era um aventureiro bastante conhecido, mas nenhum grupo o pegou.

Geese podia fazer qualquer coisa. Qualquer coisa que qualquer outro aventureiro poderia fazer. Em outras palavras, esse era o problema. Outras pessoas também podiam fazer aquilo que ele fazia. Se um grupo fosse bem classificado, dividiriam essas tarefas servis entre seus próprios membros.

Foi então que ele percebeu que o grupo em que estava antes era o único lugar ao qual pertencia. Percebeu que só era quem era porque todos eram muito inabilidosos. Depois disso, Geese se aposentou prematuramente de sua carreira de aventureiro. Agora vivia das apostas.

— E é por isso que me recuso a ensinar as mulheres a cozinhar.

Mais uma má sorte para adicionar ao seu nome. Embora, se me perguntassem, as “más sortes” de Geese não passavam de um monte de lixo. Eu não via qualquer problema em ensiná-la a cozinhar. A sopa estava deliciosa. Era só provar e parecia que um jazz começava a tocar em sua boca. Ficou tão boa que eu quis que ele também me ensinasse a fazer, então corri para ajudar.

— Entendo que algo terrível te aconteceu, novato, mas você ajudou aquela mulher a conquistar a felicidade dela, não foi? — perguntei, com a nuance adicional de “Então, por que não vai em frente e ensina Eris?”

Geese balançou a cabeça.

— Não sei. Nunca mais a vi. — Ele soltou uma risada auto-depreciativa. — Mas o homem não ficou feliz.

Então talvez fosse essa a razão da má sorte. Não pude dizer nada depois disso, não depois de ver o olhar deprimido no rosto dele. A sopa, que deveria estar deliciosa, de repente não estava mais tão gostosa.

Me perguntei quanto tempo demoraria até que Ruijerd voltasse.

 

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Um dia encontrei um curioso monumento de pedra na beira da estrada, justo onde paramos para descansar. Ele chegava aos meus joelhos e tinha um desenho estranho em uma parte. Um único caractere estava inscrito ali, com sete padrões ao seu redor. Eu tinha certeza de que o caractere era a palavra “sete” na língua do Deus Lutador. Quanto aos outros padrões, parecia que já os tinha visto antes.

Decidi perguntar a Geese.

— Ei, novato, o que é este monumento aqui?

Ele analisou e balançou a cabeça assim que reconheceu.

— Esses são os Sete Grandes Poderes.

— Os Sete Grandes Poderes? — repeti.

— Refere-se às pessoas mais fortes deste mundo… sete guerreiros.

A história conta que, quando a segunda Grande Guerra Demônio-Humano terminou, uma pessoa conhecida como o Deus da Técnica surgiu com esse nome. Na época, o Deus da Técnica era considerado uma das pessoas mais fortes do mundo. Selecionaram sete pessoas (incluindo eles mesmos) e as declararam as mais fortes do mundo. Este monumento era uma forma de imortalizar quem eram essas pessoas.

— Acredito que Mestre Ruijerd sabe mais sobre isso. Mestre Ruijerd! —Geese gritou e o Superd, que estava treinando nas proximidades com Eris, se aproximou. A garota caiu de costas no chão com as pernas e os braços bem abertos, tentando controlar a respiração.

— “Os Sete Grandes Poderes”, hein? Isso traz várias memórias de volta. — Seus olhos se estreitaram enquanto examinava o monumento.

— Então você sabe sobre isso? — perguntei.

— Treinei muito quando era jovem, então um dia um dos “Sete Grandes Poderes” me quis como estudante. — Ruijerd olhou para longe enquanto falava. Muito, muito longe… Espere, afinal de contas, para quão longe no passado ele estava olhando?

— O que é esse padrão?

— São os padrões de cada um. Eles apontam seus sete nomes. — Ruijerd apontou para cada um e me disse seus nomes.

Os sete eram (em ordem de hierarquia):

Número Um – Deus da Técnica;

Número Dois – Deus Dragão;

Número Três – Deus Lutador;

Número Quatro – Deus Demônio;

Número Cinco – Deus da Morte;

Número Seis – Deus da Espada;

Número Sete – Deus do Norte.

— Hmm. Mas eu nunca tinha ouvido falar sobre os Sete Grandes Poderes. — falei.

— O título era bem conhecido até a Guerra de Laplace.

— Por que caiu em desuso?

Ruijerd explicou:

— A Guerra de Laplace trouxe grandes mudanças. Metade dos listados sumiu.

Aparentemente, com exceção do Deus da Técnica, os Sete Grandes Poderes haviam todos participado da Guerra de Laplace. Entre eles, três morreram, um desapareceu e outro foi selado. O único que conseguiu sair ileso foi o Deus Dragão. Depois de várias centenas de anos, com a troca da base dos mais fortes, isso acabou caindo em desuso. Atualmente, o paradeiro dos quatro primeiros era desconhecido.

DEUS DA TÉCNICA: Desaparecido

DEUS DRAGÃO: Desaparecido

DEUS LUTADOR: Desaparecido

DEUS DEMÔNIO: Selado

Não era um bom sistema de classificação, já que os mais fortes estavam ausentes. Foi por isso que o título “Sete Grandes Poderes” caiu em desuso e sumiu da memória das pessoas… ou ao menos era o que parecia.

A propósito, o motivo pelo qual o Deus Demônio não foi removido dessa classificação foi porque não estava morto; apenas selado.

— Será que quantas pessoas daquele tempo continuam vivas?

— Quem sabe — disse Ruijerd. — Mesmo quatrocentos anos atrás, as pessoas duvidavam que o Deus da Técnica realmente existisse.

— Para começo de conversa, por que o deus da Técnica criou essa lista? — perguntei.

— Difícil de dizer. Foi dito que criou isso para que pudessem encontrar pessoas capazes de derrotá-los, mas eu não sei.

Era quase como o Ranking Fukamichi.

— Bem, é um monumento bem antigo, então talvez as classificações tenham mudado — murmurei.

Geese balançou a cabeça.

— Ouvi dizer que o monumento muda por si mesmo usando magia.

— Hã? Isso é sério? Que tipo de magia?

— Como se eu soubesse.

Então, aparentemente, o monumento atualizava a exibição de classificação por conta própria. Gostaria de saber como isso acontecia. Ainda havia tantos tipos de magia neste mundo com os quais eu não estava familiarizado. Eu me perguntei se aprenderia mais sobre esses tipos de magia quando fosse para a universidade.

Deixando isso de lado, os Sete Grandes Poderes, hein? E pensei que o mundo já tinha suficiente gente ridiculamente forte. Parecia que eu realmente não poderia chegar aos melhores deles. Mas, claro, não era como se pretendesse ser um dos mais fortes do mundo. Na verdade, decidi que seria melhor não me preocupar com isso.

Levamos um mês para sair da Grande Floresta. Mas era aquilo… foi só um mês e saímos. Era uma estrada completamente reta sem um único monstro. É por isso que conseguimos dedicar nosso tempo inteiramente à viagem.

Bem, essa era ao menos uma das razões. A outra era porque nossos cavalos eram extremamente eficientes. Os cavalos deste mundo tinham uma resistência insana. Eles podiam correr por dez horas diretas, sem qualquer descanso, e então voltar a fazer isso no dia seguinte. Talvez usassem algum tipo de magia, mas, de qualquer forma, saímos da floresta sem problemas.

Quanto aos acidentes, o único que tivemos durante a viagem foi com minhas hemorróidas. É claro que não contei a ninguém e as curei em segredo usando magia de cura.

Eris passou o tempo todo em pé no topo da carruagem, alegando que fazia parte de seu treinamento. Eu disse para parar porque era perigoso, mas ela apenas bufou e resmungou que não era, que era para treino de equilíbrio. Tentei fazer o mesmo, mas no dia seguinte minhas pernas e quadris tremeram de tanta agonia. Isso fez um novo respeito pela garota surgir.

Logo após as Montanhas Wyrm Azul, havia uma estação de descanso situada em uma pequena cidade na entrada de um vale. Era comandada por anões. Não havia Guilda dos Aventureiros. Era famosa por ser uma cidade de ferreiros, com armeiros e armadureiros alinhados lado a lado.

Geese me disse que as espadas vendidas no local eram baratas e de boa qualidade. Eris parecia melancólica, mas não tínhamos dinheiro sobrando para gastar com nada. Além disso, sem dúvida precisaríamos de um bom dinheiro para levar um Superd de Millis para o Continente Central. Convenci a garota a não comprar nada, alegando que não poderíamos pagar por gastos desnecessários. Bem, de qualquer forma, a espada que ela estava usando não era ruim.

Ainda assim, eu era um homem. Não importava quantos anos eu tivesse por dentro, ver espadas e armaduras robustas alinhadas assim ainda fazia meu coração disparar, embora minha idade (e aparência) parecesse importar para um vendedor que riu de mim, dizendo: “Eu não acho que isso serviria para você, criança.” Ele ficou surpreso quando, depois, descobriu que na verdade eu era de nível intermediário no Estilo Deus da Espada. Bem, de qualquer forma, não tínhamos dinheiro, então eu só estava bisbilhotando.

De acordo com Geese, era neste ponto que a estrada divergia. Se seguisse pelo caminho da montanha para o leste, encontraria uma grande cidade de anões. A nordeste estavam os elfos e a noroeste a vasta terra que os hobbits habitavam. Talvez a falta de uma Guilda dos Aventureiros nesta cidade fosse por uma questão de localização.

Além disso, pelo visto, se entrasse nas montanhas, haveria uma fonte termal. Uma fonte termal! Isso sim chamou a minha atenção.

— O que diabos é uma “fonte termal”? — Eris exigiu saber.

— É quando tem água quente brotando da montanha — expliquei. — É muito bom para tomar um banho.

— Ah, é? Isso parece interessante. Mas, Rudeus, essa não é a sua primeira vez vindo aqui? Como sabe disso?

— E-eu li em um livro.

Isso estava escrito no guia Peregrinando pelo Mundo? De alguma forma, senti que não. Ainda assim, era uma fonte termal. Isso parecia bom. Mas este mundo certamente não teria yukatas. Ainda assim, imaginando Eris com seu cabelo molhado e sua pele cor de pêssego, inconsciente do que estaria acontecendo enquanto submergia na água quente…

Não, provavelmente não teriam algo como um banho misto. Ou teriam? Mas, no caso de ter, o quanto isso não seria incrível? Agora realmente queria dar uma olhada.

Enquanto estava ocupado debatendo o assunto em minha cabeça, Geese fez sua já esperada oposição.

— A estação das chuvas acabou de terminar, então as montanhas estarão uma bagunça. — Levaríamos muito tempo para chegar lá, já que não estávamos acostumados a atravessar as montanhas.

E então, desisti de ir para a fonte termal. Que chatice.

 

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A Estrada da Espada Sagrada se estendia pelas Montanhas Wyrm Azul. Seu caminho dividia a cordilheira em duas, criando um espaço largo o suficiente para duas carruagens puxadas por cavalos passarem uma ao lado da outra. Era uma ravina, mas graças à proteção divina de Santo Millis, raramente acontecia algum deslizamento de pedras. Se esse caminho não existisse, teríamos que seguir um mais tortuoso, viajando para o norte.

Embora dragões azuis fossem raros de se ver pelas montanhas, ainda havia muitos monstros. Tentar passar por elas representaria um perigo considerável. Em vez disso, Millis criou um atalho direto por onde os monstros não apareceriam. Eu podia ver porque esse santo era tão adorado.

Atravessamos o vale em três dias, completando nossa longa e árdua jornada para fora da Grande Floresta. Saímos de lá direto para o País Sagrado de Millis. Finalmente havíamos retornado ao domínio dos homens, fato que fez meu coração pular enquanto continuava minha jornada.

 

 


 

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