Quem puxou as cordas por trás do sequestro foi o mordomo, Thomas. Ele era a pessoa que tinha conexões com o nobre pervertido que os bandidos mencionaram. A Jovem Senhora aparentemente chamara a atenção daquele nobre há um tempo, e ele queria acabar com o espírito feroz e inflexível dela. Thomas, seduzido pelo dinheiro, adicionou os dois homens indicados pelo nobre pervertido ao seu plano.
Nossa, realmente há gente sem vergonha em qualquer lugar. Se ele faria isso de novo, gostaria que ao menos viesse conversar comigo primeiro.
Seu cálculo saiu errado por duas coisas. Primeira, eu possuía magia e coragem o suficiente para fugir dos dois bandidos, e segunda, aqueles dois não eram nada leais.
Quanto ao nobre pervertido, posou como inocente e escapou de qualquer punição. Parte disso foi porque o testemunho de Thomas era falho, e parte porque os dois bandidos estavam mortos, então não seria fácil encontrar provas de envolvimento do nobre. Havia um bom bocado de variáveis desconhecidas. Suspeitei de que algum esquema político pudesse estar envolvido.
O incidente foi considerado resolvido inteiramente graças ao envolvimento de Ghislaine. A família Greyrat podia dizer que tinha o Rei da Espada, Ghislaine, com eles, evitando possíveis incidentes futuros ao mesmo tempo que proclamava sua força e riqueza.
Fui obrigado a deixar todo o crédito para Ghislaine, mesmo após contar tudo o que aconteceu. Parecia que não queriam que outros membros da família Greyrat descobrissem sobre a minha existência. Mais barganhas políticas, presumi. Mas minha maior surpresa foi que existiam ainda mais Greyrats.
— E é isso. Entendido?
— Sim… entendido.
Philip me explicou tudo isso na sala de recepção. Pensei que ele era apenas o filho do lorde suserano, mas também era o prefeito da cidade. Gostaria de saber se foi ele quem cuidou do problema.
— Você parece bem tranquilo para alguém que teve a filha sequestrada.
— Agora estou. Entraria em pânico se ela ainda estivesse desaparecida — disse ele.
— Claro.
— Agora, sobre você ser o tutor da Eris…
Quando estávamos prestes a discutir o meu futuro, a porta foi aberta com um estrondo, e então entrou o incrivelmente exuberante avô de Eris.
— Eu ouvi tudo — disse Sauros. Ele entrou na sala de recepção e bagunçou meu cabelo com sua mão firme. — Ouvi dizer que você salvou Eris!
— Do que você está falando? Foi Ghislaine quem fez isso. Eu não fiz nada!
Seus olhos brilharam sombriamente, iguais aos de uma ave de rapina.
Q-que aterrorizante!
— Você! Acha que pode mentir para mim!
— N-não! Mas Lorde Philip me mandou dizer…
— Philip! — Ele virou-se para o filho e, sem qualquer hesitação, balançou seu punho. O acerto soltou um estalo incrível.
— Ugh! — O jovem lorde levou um golpe direto na cara e chega caiu do sofá. O punho do lorde suserano foi tão rápido. Muito mais rápido que o de Eris, rápido demais para que acompanhasse com os olhos.
— Bastardo! Isso é pelo garoto que salvou a sua filha! Como ousa não oferecer sequer uma palavra de gratidão?! É só assim que funciona esse seu teatrinho idiota entre nobres?!
Philip, ainda atirado no chão, respondeu sem se mover:
— Pai, Paul pode ter sido deserdado pela nossa família, mas ainda é um Greyrat. Isso significa que seu filho, Rudeus, que também carrega o nosso sangue, também faz parte da nossa família. Então, em vez de o elogiar e recompensá-lo externamente, pensei que o melhor agradecimento seria tratá-lo com bondade, como parte da família — disse ele com muita naturalidade para alguém deitado no chão. Talvez já estivesse acostumado a ser socado por Sauros.
— Muito bem! Então vá em frente e mantenha essa farsa diante dos nobres! — O homem mais velho se jogou no sofá vazio. Parecia que não iria se desculpar pelo soco que deu em Philip. Esse era exatamente o tipo de pessoa que ele era. Por aqui, castigos físicos eram tão naturais quanto respirar.
Parando para pensar nisso, Eris também nunca me pediu desculpas. E tampouco me agradeceu por salvá-la.
Ah, bom, tudo certo.
— Rudeus! — O lorde suserano cruzou os braços, empinou o queixo e olhou para mim.
Isso parecia familiar.
— Eu tenho um pedido!
Esse era o tipo de atitude adequado para se pedir algo a alguém? Ele era igual Eris! Não, pelo contrário – afinal, era ela quem o imitava.
— Quero que ensine magia a Eris.
— Por que, se é que posso perguntar?
— Ela veio até mim solicitando. Disse que sua magia estava tão gravada em sua mente que não conseguia tirar isso da cabeça.
Bem, de qualquer forma, realmente era magia que poderia queimar os olhos.
— É cla… — Mordi minha língua assim que comecei a instintivamente responder. A razão mais provável para sua personalidade horrível eram os infinitos mimos de Sauros. Talvez não fosse a única razão, mas com certeza influenciou muito, com base no tanto que ela imitava a sua personalidade.
Se ela iria se desenvolver como pessoa, eu precisava acabar com essa personalidade mimada. O seu crescimento poderia até não ser de minha responsabilidade, mas se as coisas continuassem como estavam, iria influenciar sobre minha capacidade de ensiná-la.
Era melhor lidar com os problemas que aparecessem um de cada vez.
— Isso não é algo que o senhor pode me pedir, Lorde Sauros. É Eris quem devia fazer isso.
— O que você disse?! — Indignado, ele ergueu o punho.
Na mesma hora entrei em pânico e cobri o rosto com as mãos. O que ele era, algum tipo de bomba nuclear pronta para explodir?
— Você realmente pretende que Eris seja uma adulta incapaz de abaixar a cabeça para pedir algo que ela queira?
— Oho! Você apontou algo interessante! Está certo! — Ele bateu o punho no joelho e assentiu com vigor. Com uma voz alta e estrondosa, gritou: — Eriiiiiis! Venha na sala de recepção agora mesmo!
Pensei que meus tímpanos iriam explodir. Que tipo de capacidade pulmonar alguém precisava para poder gritar tão alto assim…? Eris era exatamente igual. Ninguém nesta mansão entendia o conceito de pedir aos outros para entregar uma mensagem?
Que selvagens, pensei.
Philip voltou a se sentar no sofá enquanto um mordomo (um diferente, aparentemente chamado Alphonse) fechava a porta que havia sido deixada aberta. Mais tarde, soube que, por Sauros ser como um furacão que saía dos cômodos tão logo quanto entrava, esperavam um pouco para fechar as portas. Ele era um velho egoísta que amava abrir tudo, mas não gostava de fechar nada.
— Táááááá! — Uma voz soou respondendo de algum outro lugar da mansão. Após algum tempo, ouvimos passos aproximando-se. — Aqui estou, como pediu! — Ela não tinha a força do avô, mas ainda assim, Eris energeticamente empurrou as portas com tudo.
Todas as suas ações eram baseadas em seu avô. Afinal, crianças adoram imitar adultos. Se eu não tivesse levado um soco no mesmo dia que cheguei, poderia até rir da semelhança. Em vez disso, poderia firmemente afirmar que isso também precisava mudar.
— Ah… — Assim que ela me viu, levantou o queixo e me encarou. Essa pose intimidadora era hereditária na família Boreas? — Vovô, você falou com ele sobre o que conversamos?!
Ele se levantou de repente e cruzou os braços, olhando para ela. Era exatamente a mesma pose.
— Eris! Se você quer pedir algo a alguém, precisa inclinar a cabeça e pedir!
Os lábios dela formaram um beicinho.
— Mas você disse que iria pedir por mim…
— Basta! Se você não perguntar pessoalmente, não o contrataremos!
Hã? O que ele disse?! Não, não, espera, digo, acho que isso está certo. Seria um pouco problemático para mim, mas acho que isso era como colher o que planta, não?!
— Grr… — Eris olhou para mim com as bochechas vermelhas feito pimentão. Não era um rubor de vergonha; estava chateada e humilhada. Seu rosto dizia que, se seu avô não estivesse ali, me perseguiria até os portões do inferno e me transformaria em picadinho de carne.
Assustador…
— P-por favor…
— É esse tipo de atitude que deve ter quando pede algo a alguém?! — berrou Sauros.
Como se você pudesse falar algo, pensei.
— Grr… — Eris pegou um punhado de seus longos cabelos vermelhos em cada mão. Ela fez uma maria-chiquinha de cada lado das têmporas; como se fossem duas orelhinhas iguais; então, assim, piscou para mim. — Por favor, me ensine magia, mew ✩
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Espera. Eu estava sonhando? Acho que apaguei por um minuto. Parecia que tive um sonho realmente terrível.
— Não se preocupe em me ensinar a ler ou escrever, mew ✩
Minha nossa, não foi um sonho! M-mas que diabos? O que diabos estava acontecendo?
Acabei sendo transportado para uma dimensão alternativa esquisita? Se vai tão longe, ao menos me transporte para o mundo bidimensional de um anime!
— Também não preciso de aritmética, mew ✩
De qualquer forma, isso foi estranho. Até mesmo aterrorizante! A pose de Eris deveria ser fofa, mas tudo o que fez foi me amedrontar. Seus lábios estavam virados para cima, mas seus olhos não sorriam. Eram os olhos de um predador.
Mais importante, era assim que deveriam agir ao pedir algum favor neste mundo?! Só pode ser brincadeira!
— Eu só preciso de magia, mew ✩
Pare de brincar com isso! Isso é completamente pior do que antes. Vamos lá, só olhe para o rosto dela.
Suas bochechas até mesmo queimavam de tão vermelhas, e sua expressão dizia: “Se as circunstâncias fossem outras, eu te daria um soco que levaria do inferno até o céu”. Parecia oitenta por cento zangada e vinte por cento humilhada, e nada tímida. Não havia nada de fofo nela, nada.
V-vamos lá, Sauros, deixe-a parar, pensei.
— O-ooh… Nossa Eri é tão fofinha. Rudeus, é claro que você vai ensiná-la, não é?
De repente, ele virou um velhote apaixonado. Quem diabos é você?!, pensei. Para onde foi aquele meu tio-avô rigoroso e confiável?!
— O Mestre gosta muito do povo fera. Foi ele quem deu a palavra final sobre a contratação de Ghislaine — explicou educadamente o mordomo.
Ah, agora entendi. Então aquelas orelhas de cabelo deviam ser para imitar as orelhas de animais. Pareciam orelhas caídas. Parando para pensar nisso, a maioria das empregadas também eram do tipo fera.
É claro, agora entendi. Sim… E parei meu monólogo interior.
— Eris. — O pai dela entrou na conversa.
Ah, sim, esqueci que ele estava aqui, pensei. Certo, Senhor Philip, é sua hora de brilhar, mande-a parar!
— Coloque os quadris um pouco para frente, assim vai parecer mais atraente. — Ótimo, mais um inútil.
Tudo bem então. Agora entendi. Agora entendi o tipo de pessoas que são os Greyrats, incluindo Paul. Na verdade, Paul talvez fosse o mais normal desse grupo.
— Um, Lorde… Sauros. Posso perguntar uma coisa?
— Fale!
— H-homens também devem pedir favores assim?
— Tolo! Um homem deve pedir como um homem!
Não sabia bem o que isso significava, mas entendi que era uma repreensão. Bem, eu estava certo. Comparado a esse grupo, Paul era quase normal. Ele simplesmente gostava de mulheres peitudas.
Certo, calma, disse a mim mesmo. Vamos pensar nisso. Isso é um bom ou ruim?
Eu estava sendo encarado. Retomei a compostura e olhei para Eris. Irritada e humilhada, ela parecia a ponto de perder o controle. Como um leão mostrando as presas enquanto estava preso em uma jaula.
Bem, talvez eu devesse apenas não pensar no futuro e aceitar isso.
Não, eu tinha que pensar nisso. Precisava antecipar as consequências possíveis.
Isso mesmo, ela não gostava disso, notei. Era contra esse costume estranho! Se eu falasse para ela ser educada enquanto fizesse algum pedido e estivéssemos a sós, eu seria rasgado em pedaços!
Certo, mudei de ideia. Precisava acabar com esse costume estranho.
— É esse o tipo de atitude que vocês têm quando pedem um favor a alguém?! — Minha voz saiu tão alta que ecoou por toda a mansão.
Gastei horas nisso, dando um longo discurso. Minha paixão parecia estar ao máximo, já que depois disso o estilo Boreas de pedir favores foi abandonado. Ghislaine elogiou meus esforços quando tudo acabou, mas Eris continuou me olhando com frieza.
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