Matador de Goblins

Matador de Goblins – Vol. 11 – Cap. 05.2 – Matador de Goblins em um País de Areia

 

— Ah. Há outro desmaio… — Comerciante Feminina murmurou para si mesma enquanto outro dos guardas na guarita caiu no chão, inconsciente. Sentiu uma gota de suor frio escorrer por sua bochecha.

Cometi um erro.

Ela não podia escapar desse pensamento. Especialmente com o soldado a sua frente observando-a de forma intimidante.

— …Qual é o problema? É sua vez.

— …Acha que eu não sei disso?! — Franzindo o rosto, o homem agarrou a adaga alojada no tampo da mesa. Ele estendeu a mão sobre a mesa e respirou fundo. — Vinte vezes antes que a areia do copo acabe.

— Entendido.

— Bom! …H-hrah! — Ele imediatamente começou a golpear com a ponta da faca entre os dedos. Um pequeno erro poderia custar-lhe um dedo, mas ele não podia hesitar. Um momento de relutância significava derrota. Este jogo, mumblety-peg, era sobre velocidade e quantas vezes conseguia golpear com a ponta da faca. Era melhor do que a roleta de fortaleza — na qual tinha seis adagas, cinco das quais eram de brinquedo e uma de verdade e os jogadores apunhalavam uns aos outros com elas —, mas não muito.

Cometi um erro enorme, enorme.

Comerciante Feminina lutou para manter seu arrependimento e ansiedade longe de seu rosto. Só deixou a expressão transparecer uma vez desde que chegou à fortaleza. Não foi quando deu chá e salgadinhos para os soldados na guarita. Nem quando os soldados se amontoaram para pegar as mercadorias, se empurrando para ser o primeiro com todo o entusiasmo de homens que sempre foram contidos pela disciplina.

Não, foi apenas no momento em que um dos soldados estendeu a mão e a tocou como brincadeira. — Eek! — exclamou como uma garotinha e deu um tapa na mão dele. Essa foi a única vez.

Quando se arrependeu do lapso, já era tarde demais. Ninguém gosta de ouvir alguém ficar chateado consigo. Os soldados estavam animados, desfrutando de guloseimas que raramente recebiam e da adorável (se é que ela se considerava assim) estrangeira.

Porém, a atmosfera mudou num piscar de olhos e Comerciante Feminina se viu alvo de muitos olhares desconfiados. Talvez também não devesse ter dado aquele passo para trás naquele momento. No entanto…

Eles pareciam muito com goblins.

De repente, percebeu que seus ouvidos estavam cheios de vento sibilante, muito parecido com uma tempestade de neve. O vento que a levava de volta para onde uma vez estivera no início da noite. Os amigos, as novas aventuras, tudo o que havia feito até aquele momento não passava de uma agradável fantasia. Começou a pensar que talvez ainda estivesse presa naquele deserto nevado…

— …….

Shf. Ela sentiu o guerreiro dragodente se mover atrás dela. Olhou em sua direção, percebendo que sua respiração estava ficando rápida e superficial. O Guerreiro, é claro, era apenas um esqueleto coberto por um cachecol e casaco; não havia expressão em seu rosto. Não tinha vontade própria, mas simplesmente obedecia ao comando de seu mestre para proteger esta jovem. A espada de aço que carregava era apenas algo que ela tinha arranjado na cidade, uma arma comum, mas naquela época, nunca poderia imaginar ter alguém para protegê-la.

E desde que foi resgatada, seus amigos fizeram muito mais do que simplesmente protegê-la.

Ela respirou fundo.

— Está tudo bem! — disse com um sorriso corajoso, gesticulando para o guerreiro dragodente atrás de si. Então continuou: — Vamos fazer isso como gente civilizada. — Então tirou o sobretudo. Sabia que o suor fazia sua camisa grudar na pele. Ignorou os soldados que a encaravam (seja de choque ou excitação, ela não se importava). Com a mão direita, sacou uma adaga de alumínio; estendeu a esquerda sobre a mesa e então, com um sorriso de uma flor desabrochando, desafiou: — Que tal uma rodada de Mumblety-Peg? Certamente guerreiros fortes como vocês não têm medo, não é?

Houve um barulho de moedas de ouro e prata se acumulando na mesa e, bem, você sabe o resto.

Impulsionados pela embriaguez e excitação, os soldados não se contiveram e foram logo para um jogo bem arriscado. Um jogo angustiante. Os soldados que observavam engoliam em seco cada vez que levantavam suas facas. Quando um baixava a faca, com muito medo de ir mais longe, havia uma multidão empurrando e exclamando: — Saia do caminho, eu sou o próximo!

Gradualmente, no entanto, seus movimentos tornaram-se menos seguros. Alguns roçaram os dedos. Um esfaqueou a palma da mão. Um cheiro de ferro se espalhou pela sala. Então, finalmente, os soldados começaram a cair um a um, como se desmaiassem de cansaço. O resto dos homens notou a perturbação estando fixados como estavam nos oponentes à sua frente? Ela esperava sinceramente que não. Tinha que manter o ato para se certificar de que não. Afinal, o perfume embebido em suas roupas apenas convidava à embriaguez. Na comida, o sabor medicinal poderia denunciá-la, mas quem sabia como cheirava o perfume de uma mulher estrangeira? Eles não pensaram duas vezes. Especialmente enquanto estavam ocupados se deliciando com um entretenimento (e um apetite) que provavelmente não encontrariam novamente tão cedo. Todo aquele estímulo colocaria a droga em circulação em seus sistemas mais rápido também.

— Você é a próxima, mocinha!

— Claro. Foram vinte vezes você, não é? — Comerciante Feminina acariciou os anéis com as pontas dentro para estimular seus dedos, então focou sua concentração. Puxou um punhado de moedas de ouro de sua bolsa e as jogou sobre a mesa, então virou a ampulheta. — Vou fazer trinta, então.

— Hngh…!

Não havia como ter certeza de que você venceria no mumblety-peg. O mais próximo de uma garantia era focar em três fatores: frieza, exatidão e precisão. Então só poderia esperar que um oponente sobrecarregado perdesse um dedo ou cedesse sob a pressão.

Bah, o que é isso para mim?

Se perdesse um dedo, e daí? Não era nada comparado a ter uma marca queimada na carne de seu pescoço.

— Aqui vou eu.

Comerciante Feminina lambeu os lábios cor-de-rosa com a língua rosada e baixou a adaga.

 

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— Deuses… eles nunca ouviram falar em terminar o que começaram? — Anão Xamã reclamou, trabalhando seus braços e pernas atarracados enquanto subia a torre de madeira que abraçava o penhasco. “Caverna” acabou sendo a palavra certa para o caminho que havia sido escavado na rocha; continha vários sulcos naturais na pedra. Talvez não fosse tão surpreendente que os guardas não descessem aqui. Sacerdotisa era mais alta e tinha braços mais longos do que Anão Xamã e até ela achava o caminho difícil de trafegar. Para um soldado de armadura completa, mesmo um com treinamento e resistência, ter que vir aqui todos os dias…

— Não sei… dizer — comentou, forçando sua respiração a permanecer estável —, se eles… pensaram nas… pessoas vindo por aqui.

Pela enésima vez, saltou para o andaime acima, agarrou-se a ele desesperadamente, então se arrastou para cima. Ninguém os atacou, mesmo quando foi tomada pela necessidade de se agachar e respirar. O ar subterrâneo era relativamente fresco sem o calor escaldante do deserto, uma pequena bênção. Se o ar quente tivesse provocado outra tempestade de areia aqui embaixo, nunca poderiam ter continuado.

— Talvez nunca tenha sido a intenção deles que as pessoas fizessem isso — disse Lagarto Sacerdote, não soando indevidamente sobrecarregado. Tinha um corpo grande e muita força, além de garras nas mãos e nos pés. Era capaz de segurar com as mãos com facilidade, subindo tão facilmente quanto uma lagartixa.

— O que quer dizer? — perguntou Sacerdotisa.

Lagarto Sacerdote respondeu: — Exatamente como eu disse. — Coçando o nariz comprido com uma garra. — Talvez quisessem selar algo aqui embaixo. Algo que desejassem não ser visto ou tocado.

— Não me importo porquê fizeram isso. É um pé no saco. — Alta Elfa Arqueira reclamou. Apesar de sua evidente frustração, ela subiu pela parede com movimentos leves e fáceis. Pa-pa-pa. Encontrou pontos de apoio nas tábuas com a mesma facilidade com que uma pedra salta sobre a água, colocando a mão no quadril e dobrando a cintura. — Sinto que vou perder a noção de onde estamos. — Fazendo um movimento irritado com suas orelhas. — É muito difícil dizer no subsolo. E há aquele som à distância, como uma alma penada.

Sacerdotisa notou a mesma coisa desde que desceram aqui. Talvez fosse apenas o vento passando pelas fendas da caverna, mas parecia algo como o barulho de uma criatura se aproximando da morte…

Tenho certeza que esse é o barulho que o vento deve fazer quando sopra no esqueleto de uma pessoa…

Não era um pensamento útil, mas não conseguiu resistir. Sacerdotisa balançou a cabeça.

— Muito bem, mas concentre-se — disse Matador de Goblins, seus movimentos precisos, um membro de cada vez, em contraste direto com a leveza dos pés de Alta Elfa Arqueira. Ele usava o equipamento mais pesado de todos na equipe, mas movia-se facilmente; uma prova de suas habilidades como batedor. Só cairia se realmente não tivesse sorte — ou se Alta Elfa Arqueira o chutasse. Evitando diligentemente as pernas esguias que dançavam logo acima de sua linha de visão, ele subiu até o andaime. — Existem armadilhas.

— Eu sei. — Alta Elfa Arqueira parecia bem calma, mas o que se estendia diante dela não era mais uma caverna, mas praticamente um labirinto. Já fazia algum tempo que estavam vendo divisórias artificiais — parecia que o número aumentava à medida que subiam. Paredes reforçadas com pedra de construção, pavimentos revestidos em pedra de calçada. Contudo, algo parecia errado com elas. Algumas das pedras de pavimento não estavam bem alinhadas; outras chocalhavam quando eram pisadas.

— Aqui, deixe o anão dar uma olhada.

— Nah, não se preocupe. — Alta Elfa Arqueira disse, cheia de cautela. — Mais rápido contorná-las do que ter que desarmá-las. — Ela bateu os dedos dos pés contra a pedra e um flash de luz prateada saltou do chão. Era uma série de pontas de prata longas e afiadas, destinadas a espetar qualquer transeunte descuidado. Obviamente, qualquer um que corresse por aqui de forma descuidada seria saudado apenas por uma morte brutal. Alta Elfa Arqueira, valendo-se de toda a graça de seu povo, deslizou suavemente entre os pregos. — …Huh! — exclamou com prazer genuíno. — Tudo certo. Vamos com calma.

Agora tudo o que precisavam fazer era confiar em sua batedora, indo exatamente por onde ela fosse a fim de evitar as armadilhas. E, de fato, nenhum membro do grupo duvidaria do que Alta Elfa Arqueira dissesse. Como poderiam se aventurar juntos se não confiassem um no outro? Mesmo se cometesse um erro, não seria culpa dela. Se um batedor errasse, seria igualmente um fracasso daquele que optou por deixar as coisas nas mãos daquele batedor. Se o trabalho de um batedor fosse abrir baús de tesouro, era dever da primeira fila lidar com qualquer monstro. Enquanto estavam fazendo isso, os lançadores de feitiços do grupo podem estar apenas parados, sem entoar nenhum feitiço, mas o momento deles chegaria.

Portanto, os melhores grupos de aventureiros não tinham hierarquia de papéis. O grupo viveria e morreria junto.

— Parece que essas coisas rasgariam meu vestido só de tocá-las… — Mesmo assim, era especialmente difícil passar pelas armadilhas usando as vestes de um clérigo. Era muito fácil dizer apenas passe por eles, mas se o vestido dela prendesse em alguma coisa e ela caísse, seria o mesmo que pular na armadilha.

Alta Elfa Arqueira riu ao ver Sacerdotisa parecendo tão séria enquanto avançava.

— Não se preocupe. Você é muito melhor do que aquele barril trapalhão.

— E um barril é melhor que uma bigorna! Eu sou só muito musculoso…!

Se fosse assim, então parecia que o momento mais difícil seria para aquele com o maior corpo e a cauda mais longa…

Eh, acho melhor guardar isso para mim. Sacerdotisa sorriu apesar de sua própria situação, olhando para baixo para esconder a expressão. Em vez disso, se concentrou em se mover delicadamente.

A ordem foi como sempre. Alta Elfa Arqueira e Matador de Goblins estavam na ponta, Sacerdotisa e Lagarto Sacerdote no meio, com Anão Xamã fechando a retaguarda. Foi por isso que Sacerdotisa estava tão empenhada em não ser o elo fraco, mas enquanto abria caminho através da floresta de espinhos…

— …Tem algo errado?

Ela viu que Matador de Goblins e Alta Elfa Arqueira haviam parado e estavam agachados. Sacerdotisa não era tão inexperiente a ponto de não entender o que isso significava. Rapidamente agarrou seu cajado com as duas mãos, procurando um bom lugar para ficar enquanto se preparava para o que estava por vir. Firmou a respiração, concentrou-se, preparando-se para rezar qualquer cântico que fosse necessário a qualquer momento. Anão Xamã e Lagarto Sacerdote também se prepararam; todo o grupo estava pronto. A espada de comprimento estranho brilhou, o arco de teixo foi esticado, o saco de catalisadores foi aberto, as garras e a cauda estavam prontas.

— Cuidado com a retaguarda. Podem haver armadilhas lá atrás, mas não queremos que venham por trás de nós.

Anão Xamã e Lagarto Sacerdote assentiram e tomaram posições na parte de trás, olhando para a caverna que se abria atrás do grupo. Sacerdotisa se viu no meio do grupo; tentou se posicionar para estar preparada, não importando de que direção o ataque viesse.

— Podemos lidar com eles aqui? — perguntou Matador de Goblins.

— Parece improvável — respondeu Lagarto Sacerdote. — Espinhos atrás de nós, um único túnel à frente e muitos de nós. Só podemos esperar que seus números não sejam muito grandes.

— Então, abriremos caminho.

Nessa breve troca, a estratégia do grupo foi definida. Então os viram na escuridão à frente. Esperavam que não os encontrassem, mas sabiam que provavelmente os encontrariam.

Pequenos como crianças, equipados com o que os faziam parecer horríveis caricaturas de soldados e pele verde.

— Goblins?!

— GOORG?!

Nenhum dos lados esperava ou desejava esse encontro aleatório, mas os aventureiros, sempre antecipando a batalha, estavam apenas um passo à frente dos goblins com suas lanças e capacetes.

— Vamos lá! — Matador de Goblins clamou, então mergulhou entre eles ainda agachado, mesmo quando as flechas de Alta Elfa Arqueira começaram a voar. Um projétil com ponta de botão disparou pelo espaço, passando pelo capacete de metal, indo diretamente para o globo ocular de um goblin.

— GOGGB?!?!

A flecha atravessou o olho e entrou no cérebro, acabando com a vida da criatura, mas Matador de Goblins manteve seu ímpeto. Esse foi o primeiro goblin, mas certamente não seria o último.

— GOOROGB!!

— GOBBG! GRRBG!!

A força dos goblins estava em seus números. O terrível esquadrão de soldados com sua heterogênea coleção de armas surgiu da escuridão. Sem um momento de hesitação, Matador de Goblins ergueu a espada em sua mão direita e a arremessou.

— GGBGOOROG?!

Era muito lenta em comparação às flechas de Alta Elfa Arqueira, porém, mais do que suficiente para matar um goblin. A lâmina se alojou na garganta da criatura que teve o excesso de confiança de tentar liderar o ataque, fazendo-a girar para trás. Enquanto os outros goblins pisavam impiedosamente sobre o corpo, a mão livre de Matador de Goblins já estava pegando uma lança do chão. Levantou o escudo em seu braço esquerdo, usando a tocha em sua mão para distrair os monstros, então golpeou para cima com a lança.

— GOBB?! BGR?!

Esfaqueie um monstro no pescoço e mesmo que não morra imediatamente, estará fora da luta. Reduzido a tossir e se afogar com o próprio sangue. Matador de Goblins chutou para o lado o goblin espumando sangue, soltando sua lança e puxando sua espada para fora do corpo do segundo goblin. — São três… — murmurou dentro do capacete, avaliando rapidamente o número de adversários. Podia ouvir mais passos no corredor. Os números…

Dez, talvez?

Não muitos que pudesse ver, mas se mais aparecessem por trás, poderia haver problemas. Passar e sair daqui tinha de ser sua maior prioridade.

— Luz!

— Sim, senhor! — Sacerdotisa avaliou imediatamente a situação estratégica e, ainda olhando para frente, recuou vários passos.

— Tudo limpo na parte de trás!

— Faça o que quiser!

Com Anão Xamã e Lagarto Sacerdote guardando suas costas, se concentrou nas duas figuras à sua frente na primeira fila, então soltou sua oração com uma respiração rápida:

— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, conceda tua luz sagrada para nós que estamos perdidos na escuridão!

Um clarão ofuscante iluminou o nojento túnel abaixo da fortaleza.

— GBBOGOB?!

— GOG?! GGRGB?!

Os goblins gritaram e cobriram os olhos, cambaleando para trás da luz sagrada. Algo um pouco mais à frente parecia estar diminuindo sua velocidade e se viram presos em um gargalo antes que pudessem passar por trás das divisórias. Matador de Goblins diminuiu a distância até eles numa só respiração, chutando o monstro mais próximo o mais forte que pôde. O goblin se esparramou no chão, então esbarrou em algo e caiu de bruços.

— GOORGB?!

No instante seguinte, lâminas impiedosas surgiram de cima e de baixo, quase literalmente mordendo a criatura. Os espasmos mortais do goblin espalharam seu sangue recém-exposto e suas vísceras por toda parte. Foi uma armadilha tão brutal que Sacerdotisa se encolheu involuntariamente. Era isso que os goblins estavam lutando para passar?

Para Matador de Goblins, porém, dificilmente poderia ter sido mais útil.

— Quatro. Armadilhas à frente.

— Acho que deixei claro que já sabia disso!

— Vamos avançar.

— Arrrgh! — Alta Elfa Arqueira acrescentou algo elegante, mas não caridoso na língua élfica, então puxou outra flecha de sua aljava. Deu um beijo e o botão floresceu, depois murchou, deixando uma noz. Disparou a flecha com ponta de noz em um goblin, fazendo-o cambalear com o impacto.

— GOG?! GORGB?!

— GGOBB?!

Quando a flecha com ponta de noz passou zunindo pelo goblin, se abriu, espalhando sementes que atingiram outros goblins, fazendo-os esquecer o que deveriam estar fazendo e correrem para se proteger. Podem ter armaduras, mas ainda eram apenas goblins. Não aceitariam um desafio.

— GOOBGB?!

Naturalmente, algumas dessas criaturas completamente distraídas logo se viram divididas em duas por uma espada. Matador de Goblins não poderia ter se importado menos sobre como um goblin morria. Estava substancialmente mais preocupado com a poça de sangue se espalhando pelas pedras, ameaçando seu equilíbrio.

— Seis… sete! — Estava entre os goblins agora, empunhando armas em ambas as mãos, atacando em todas as direções. Os olhos dos goblins estavam queimados onde as sementes os atingiram; havia armadilhas atrás deles e inimigos à frente.

Sua força estava em seus números. Não eram mais inteligentes ou fortes do que crianças cruéis. Queriam ferir, matar, mas isso era tudo o que tinham. Então, agora que estavam presos num túnel onde não podiam usar sua única virtude…

— Com esse, treze. — Então ele havia subestimado alguns, não que importasse. Eram os monstros mais fracos do Mundo de Quatro Cantos. Matador de Goblins bateu a tocha crepitante na última criatura, colocando um ponto final em sua vida. — Tolo. — Pronunciou uma única palavra de advertência enquanto jogava a tocha de lado. Para Sacerdotisa, parecia que ele estava falando com alguém que não estava presente.

— …Acho que pelo menos passamos por eles. — Por enquanto, o principal era seguir em frente. Sacerdotisa controlou sua respiração, fazendo um barulho com seu cajado. Ofereceu uma oração breve e privada pelo repouso de suas almas, para que os goblins que partiram não se perdessem após a morte.

A morte era o fim. Melhor não esperar mais do que isso. Mesmo que fossem goblins.

— Eu meio que esperava mais deles… — disse Sacerdotisa.

— Eu diria que foram muitos — respondeu Alta Elfa Arqueira com uma carranca. — O que faremos com todos esses corpos? São muitos para esconder. — Ela teve a decência de parecer um tanto envergonhada, mas isso não a impediu de sair por aí tirando suas flechas dos cadáveres. Elfos e apenas elfos podiam disparar flechas com ponta de botão, seria algo que os denunciaria; como se os gritos e as lutas não tivessem sido suficientes.

— Acho que não precisaremos escondê-los — disse Matador de Goblins ressentido, olhando para a escuridão além. Tirou uma nova tocha de sua bolsa, acendendo-a nas últimas brasas da que estava no chão. — Vamos em frente.

— Hmm… — Lagarto Sacerdote levou a mão ao queixo pensativamente, então revirou os olhos enquanto pensava. — Entendo. Você tem um plano sórdido, não é, milorde Matador de Goblins?

— Planos sórdidos não são novidade para Orcbolg. — Alta Elfa Arqueira disse com um suspiro do que poderia ser fadiga ou talvez apenas exasperação. Olhou para trás, enviando uma ondulação através de seu cabelo. — Como vai você aí atrás? Acho que estava bem quieto atrás de nós, certo?

— Sim, certo! — Sacerdotisa assentiu rapidamente. — Estou bem.

— Eu também — respondeu Anão Xamã, guardando o machado de batalha que Sacerdotisa não sabia quando ele havia sacado. Se a linha de frente tivesse sido pressionada muito para trás, sua linha de trás que teria sido empurrada para os pregos.

— Tudo bem. — Alta Elfa Arqueira respondeu aliviada, como se reconhecesse essa responsabilidade.

Anão Xamã estreitou os olhos e olhou para o sangue manchando suas botas.

— Eles podem estar em conluio com o Caos, mas ainda assim… É isso que você normalmente encontra num castelo nacional?

— É exatamente o tipo de coisa que eles inventam… pensando que são mais espertos do que são. — Matador de Goblins não estava exatamente respondendo à pergunta; na verdade, parecia estar falando sozinho. Incomum para ele — de fato, incomum —, parecia profundamente irritado. — Usando goblins como soldados.

Matador de Goblins enfiou vísceras de goblin nas partes móveis da armadilha de lâmina, desativando-a. Era necessário para seguir em frente, mas não parecia muito agradável.

Contudo, o túnel subterrâneo pelo qual o grupo prosseguiu tinha algo muito mais terrível reservado para eles, pois o abismo nessas profundezas era a própria fonte da voz estertorante que ouviram.

— Isso significa que eles não pensam melhor do que um goblin.

 

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O que estava acontecendo no ventre escuro desta fortaleza? Talvez seja melhor deixar os detalhes não revelados. Era a imagem típica do santuário interno de um ninho de goblins. Na verdade, era ainda pior do que isso, pois as jovens acorrentadas ali haviam sido capturadas por mãos humanas; compradas e trazidas para este lugar. Os pedaços de carne que provavelmente passavam por comida aqui foram todos jogados por mãos humanas. Algumas das meninas tiveram isquiotibiais ou tendões do braço cortados; outras tinham pontas cravadas nos tornozelos.

Também havia aquelas com pele imaculada e sem ferimentos, aos quais faltava apenas a luz dos olhos. Elas estavam sendo poupadas. Não por goblins, obviamente. Este era um criadouro de goblins talhado em pedra, feito por mãos humanas.

— …….

Quando o grupo arrombou a porta e entrou, as palavras falharam à Sacerdotisa. Seu rosto não refletia a crueldade da cena, não mostrava repulsa. Em vez disso, sua expressão parecia perguntar: “Por quê?” A sala estava cheia de gritos de dor, súplicas, desespero — e o barulho desesperado de almas enervadas que ecoavam pela fortaleza.

As garotas acorrentadas aqui logo estariam mortas. Seus corpos ou seus espíritos sucumbiriam. O que se poderia dizer diante disso? O que havia para dizer?

— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, conceda-nos paz para aceitar todas as coisas.

— Beba fundo, cante alto, deixe os espíritos guiarem você. Cante alto, pise rápido, para quando dormir eles te virem, que uma jarra de vinho de fogo esteja em seus sonhos para saudá-las.

Quando Sacerdotisa abriu a boca, no entanto, foram as palavras de uma oração que saíram, seguidas logo por Anão Xamã convocando seus espíritos. No momento em que os goblins ergueram os olhos surpresos de suas refeições terríveis e ações mais profanas, já era tarde demais. Exclamaram em vozes que não eram vozes, então começaram a tropeçar como se estivessem com sono antes de cair no chão.

Então Matador de Goblins e Lagarto Sacerdote fizeram sua entrada num movimento rápido. Em um espaço confinado como este, as flechas não seriam tão eficazes quanto uma espada ou garras, presas e cauda.

Os dois foram atrás de suas presas com entusiasmo e acabaram com os monstros indefesos. Isso lembrou Sacerdotisa da câmara em algumas ruínas há muito tempo. A diferença, se é que havia uma, era que, embora os goblins estivessem sem voz e estupefatos, ninguém sentiu pena deles dessa vez.

Não é para menos que os goblins de antes pareciam não estar em seus melhores dias: Ainda estavam regozijando de sua visita a este lugar. Sacerdotisa observou ele com um olho enquanto continuava a rezar. Suas maneiras em sua armadura de couro encardida eram indiferentes; cortaria uma garganta de forma profissional, seguraria o monstro acordado, então trocaria sua espada para a outra mão. Ela testemunhou cenas semelhantes muitas vezes ao longo de suas aventuras com Matador de Goblins.

E temo que estou quase… acostumada com isso, pensou de repente. Um calafrio a percorreu por causa da ideia. Nunca deveria se acostumar. Não sabia dizer porquê, mas sentia que jamais deveria se acostumar com isso. Sim, isso era algo que acontecia regularmente, mas isso não significava que ela deveria começar a tratar como algo do cotidiano.

— ……! — Sacerdotisa mordeu o lábio com mais força do que o normal e agarrou-se ao cajado. Então se ajoelhou na lama e abraçou as meninas presas. Algumas delas certamente foram “usadas” recentemente, mas Sacerdotisa não hesitou. Sem se importar com a sujeira que manchava suas vestes, abraçou cada uma delas, todas elas, limpando seus corpos.

Como sabemos, Sacerdotisa recebeu o milagre Purificar. Um uso e poderia resolver tudo num instante, mas não era para isso que serviam os milagres. Eram significativos apenas porque a própria Sacerdotisa queria fazer algo para ajudar essas meninas, trazendo-lhes todo o conforto que podia. Apesar da cena cruel e sangrenta que se desenrolava não muito longe, agora como no passado, o silêncio era suave e gentil. Aquelas que sobreviveram a este terrível covil de reprodução agora estavam meio em transe resgatadas de seu inferno.

— …Às vezes não consigo acreditar na maneira como os humanos se comportam. — A primeira coisa a ser ouvida na sala foi um comentário frio de Alta Elfa Arqueira. Estava com o colarinho puxado sobre o nariz, talvez para ajudar a bloquear o cheiro e Sacerdotisa não conseguia ver sua expressão.

Sacerdotisa abriu a boca primeiro, depois fechou. Anão Xamã, por sua vez, soltou um suspiro.

— E o quê, Orelhas Compridas? Quer dizer que os humanos são simplesmente maus, então todos deveriam ser destruídos?

— Não estou dizendo isso. — Alta Elfa Arqueira colocou as orelhas para trás ao olhar suspeito que o anão lançou para ela; não era algo do qual um elfo pudesse falar.

— Só para deixar claro, isso também não é considerado aceitável neste país.

— Eu não disse isso! — atirou de volta. Logo estavam discutindo, mas pelo menos a tensão havia diminuído. Talvez não houvesse nenhuma tensão para começar. Sacerdotisa estava apenas preocupada. Não sobre a paz mundial ou algo tão elevado quanto isso, mas uma coisa simples: Queria que tudo estivesse bem com seus amigos.

— Bom… — Não tinha realmente a intenção de deixar as palavras saírem, mas pareceram alcançar as longas orelhas de Alta Elfa Arqueira. Ela coçou desajeitadamente uma bochecha avermelhada e disse, como se estivesse se desculpando: — Só os humanos falam nesses tipos de absolutos de qualquer maneira, certo? Quem fez isso, são os bandidos, não é?

— É claro que é natural ver a responsabilidade no campo de batalha não como pertencente à infantaria, mas a seus comandantes. — Lagarto Sacerdote cuspiu um pouco de sangue no chão. Ele valorizava a oportunidade de comer o coração de um oponente poderoso, mas goblins não eram adversários assim. — Concordo que parece provável que algum líder aliado às forças do Caos esteja sobre eles.

— Ainda assim… o que era isso? — Matador de Goblins virou a cabeça como se pudesse encontrar as palavras flutuando no ar. — …Aquele monstro Ogro, até ele era melhor.

— Huh, você realmente se lembrou disso — disse Alta Elfa Arqueira enquanto reprimia uma risada, provavelmente intencionalmente. Matador de Goblins a ignorou completamente, em vez disso resmungou baixinho: — Seja quem for, são como os que enfrentamos no festival da colheita no ano passado; amadores que não entendem como lidar com goblins.

— Ah… você quer dizer aquele elfo negro. — Sacerdotisa encontrou seus pensamentos voltando para o elfo negro que encontrou na cidade. Não queria ser preconceituosa, mas também reconheceu que muitos elfos negros estavam alinhados ao Caos e atacariam a Ordem no mundo. Até ouviu rumores de que foram elfos negros puxando as cordas no incidente com o vinho do ofertório.

Se fosse a mesma coisa aqui…

…bem, isso não seria muito bom, ela pensou. Embora tivesse certeza de que não era o caso.

— Agora temos que ajudar essas pessoas… — Não, agora não. Sacerdotisa manteve seus pensamentos em movimento. Estavam em terreno inimigo. Precisava pensar. — É uma questão de como ajudá-las, não é?

— Primeiro, nos unimos com nossa contratante. — Matador de Goblins jogou fora sua espada, embotada com sangue coagulado e vísceras e pegou a lança de um goblin. Colocou-a nas costas e complementou com um sabre suavemente curvo que colocou na bainha em seu quadril. — Vamos nos mover com muita gente, por isso teremos que criar uma distração.

— E se a garota não sair daqui segura, nós falhamos em nossa missão. — Anão Xamã tomou um gole de vinho aparentemente como um limpador de paladar, enxugando as gotas perdidas de sua barba com o braço. — Não temos sido exatamente sutis, então o fato de não termos tido companhia parece um bom sinal.

— Meu guerreiro dragodente continua com boa saúde, então não se preocupe — disse Lagarto Sacerdote enquanto pegava as jovens facilmente, agora apenas ex-cativas, mas ainda dormindo. Aparentemente, Sacerdotisa supôs, havia algum tipo de conexão espiritual entre um conjurador e seu familiar. Seria assim para um clérigo que convocou um mensageiro divino e Lagarto Sacerdote parecia ter a mesma conexão com seu Guerreiro.

— Pode nos guiar e carregar as mulheres ao mesmo tempo?

— Não poderei procurar por detalhes de onde quer que nos encontremos, mas se precisarmos apenas de um entendimento básico, acredito que seja possível. — No mínimo, não seria capaz de lutar com todas essas mulheres montadas em suas costas. Ele revirou os olhos, sabendo que não precisava dizer isso em voz alta.

— Isso será o suficiente — respondeu Matador de Goblins com um leve aceno de sua cabeça com capacete, então partiu em ritmo ousado. Seu passo indiferente era o mesmo de sempre, o que provocou um encolher de ombros impotente e um aceno de cabeça de Alta Elfa Arqueira.

— Você precisa explorar à frente. Sei que sabe como fazer isso, Orcbolg. — Ela o acompanhou até a porta oposta à entrada pela qual entraram e começou a inspecioná-la.

Parecia que ainda tinham um longo caminho a percorrer. Sacerdotisa achou entender o porquê os soldados acima estavam tão ansiosos para selar este lugar, salpicando-o de armadilhas e o escondendo no subsolo. Seria difícil viver uma vida normal sabendo que um lugar tão terrível estava logo abaixo de seus pés. E pior, viver com a compreensão de que suas ações eram parte do que permitia que aqueles goblins fizessem o que estavam fazendo. Quando um soldado tinha que descer aqui, os gritos e choro das mulheres, das cativas, o atormentava. Mesmo que fosse resultado direto do que havia feito, algo que endossava implicitamente.

Não posso imaginar que não sentiriam isso. Se não sentirem…

Então já eram praticamente seres Não-Propensos à Crença.

Sacerdotisa deu a volta por trás de Lagarto Sacerdote, tentando não pensar nisso enquanto ajudava a colocar as mulheres em suas costas.

— …Guerreiros Dragodentes são muito úteis, não são? — Quase sussurrou as palavras. Era apenas conversa fiada. Não havia brisa aqui embaixo para carregar o ar estagnado. Então tentavam conversar e rir para aliviar o clima da melhor maneira possível.

— Ah, o bom e o ruim deles depende do lançador. Com talento suficiente, a força de alguém pode ser tão ampla quanto o céu, profunda como o oceano ou infinita como a terra. — Lagarto Sacerdote revirou os olhos, recebendo uma exalação aliviada de Sacerdotisa.

— Espero que um dia me seja dado ter um mensageiro da Mãe Terra — disse.

— Se sua fé não vacilar, então esse dia chegará.

Sacerdotisa sentiu alguém pressionar suas costas. Anão Xamã sorriu para ela como se dissesse: Não se preocupe com isso. Ela virou os olhos para a frente para descobrir que Matador de Goblins e Alta Elfa Arqueira já tinham aberto a porta e estavam esperando pelo resto deles.

Minha fé…

Perguntou-se, ainda assim, se essa era a palavra certa para o que sentia por dentro. Essa dúvida a acompanhava desde que voltara viva de sua primeira aventura. Porém, ao mesmo tempo, havia outro pensamento: Talvez a questão seja a minha fé.

As coisas que aprendeu com os membros mais experientes do templo e tudo pelo qual passou até agora a fizeram pensar assim. Ela correu atrás de Matador de Goblins, de quem se sentia um pouco mais próxima do que antes. Rezou pelo repouso dos mortos, pela cura e felicidade final das mulheres feridas e pela segurança de seus companheiros e amigos.

 

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Tradução: NERO_SL

Revisão: ZhX

 

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