— Estou depositando minhas esperanças em cada um de vocês.
A menina havia sido criada, por assim dizer, entre flores e borboletas. Tendo sido educada com o maior cuidado no que era uma jaula, ela não sabia nada do lado sórdido do mundo. Ninguém a julgaria, sendo a vida humana tão curta de qualquer forma. Quem poderia culpar seus pais por querer dar a ela uma vida doce e de segurança?
Seu pai, meu mestre — o rei anterior — levou uma vida muito parecida. Se alguém tentasse fazer brilhar uma luz nos cantos sombrios do mundo, poderia haver perturbações, mas bastava manter a diplomacia funcionando e não teriam problemas. Que os famintos morram de fome, que os doentes adoeçam, que os ricos sejam ricos e que os prósperos sejam prósperos, pois assim, tudo correria bem. Aqueles que sentiam que lhes competia o dever de mudar o mundo tendiam a ser arrogantes e cruéis.
Os revolucionários achavam que o status quo era perverso e que a segurança não tinha valor e não pensavam antes de pisar nos outros. E por quê? Porque estavam convencidos de que suas próprias ações estavam certas e simplesmente muito acima de todas as outras.
Assim, quando o berço da jovem foi brutalmente estilhaçado, tomei a mim mesma a tarefa de levá-la embora, para ajudá-la a fugir. Para tal, tive a ajuda da minha amiga. Minha pequena e corajosa amiga, que valorizava a princesa mais do que tudo no mundo.
Aquele homem cruel e violento sem dúvida usaria a princesa para seus próprios fins antes de colocá-la de lado. Tinha que garantir que a princesa se retiraria antes disso…
Porém, eu estava errada. Ela estava decidida a ficar no castelo até o fim, voltando-se para nós com um olhar tão severo que nos furou o coração.
Não havia mais nenhuma esperança dentro do castelo. Se houvesse esperança, estaria do lado de fora. Dizia-se que um cavaleiro que uma vez serviu à corte levava uma vida tranquila em algum lugar além da cidade. Muitos cavaleiros tinham se voltado para seguir o primeiro-ministro, ou então estavam sob suas ordens, mas este homem, este cavaleiro… talvez…
E assim, confiando nossas esperanças a um mundo para o qual a princesa se negou a adentrar, fugimos. Nós e aqueles ladinos.
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Já havia passado o tempo em que me cansei tentando contar o número de assaltantes.
Ou, mais precisamente, parecia que estava tudo acabado antes que eu soubesse.
Apesar dos traços de calor que ainda carregava, o vento do deserto era frio demais para a pele exposta. Meus músculos gritavam de dor por causa do tratamento descortês que lhes dei. As estrelas no céu sem nuvens pareciam estranhamente horizontais, a luz delas brilhante a ponto de cegar. Foi isso que finalmente me fez perceber que estava deitada de lado como uma boneca descartada.
Meu corpo estava molhado em seus próprios fluidos, suor, saliva e lágrimas, mas o cheiro de um elfo era o aroma de flores. O fedor flutuante que eu sentia vinha dos restos de um banquete parcialmente comido.
— U-urgh… Isto não é… uma boa maneira de… tratar uma mulher — gemi. Senti que tinha algo preso na minha garganta e uma ponta afiada de ferro quase me virou o estômago. Consegui de alguma forma falar porque, para manter o orgulho, primeiro era preciso despertar o coração.
Agarrei um pano tão encharcado de sujeira que não estava apto para um quarto de dormir, depois rastejei com minhas mãos e joelhos como um bebê recém-nascido desajeitado.
Mas que porra aconteceu com a gente?
Tinha começado quase na mesma hora em que minha amiga e eu nos separamos daqueles ladinos; tínhamos começado a discutir prontamente sobre o que fazer a seguir. Procurar ajuda? Aqui neste deserto era como procurar uma agulha em vinte milhões de palheiros. Eu tinha insistido para que encontrássemos uma carruagem o mais rápido possível, mas aquela minha amiga idiota…!
— É uma missão secreta, devemos ir a pé!
— Pfah! E escolha o caminho mais difícil possível, saquei!
A partir disso, aquilo se transformou rapidamente em xingamentos e, bem, depois de nos separarmos, eu avistei esses comerciantes e chamei por eles; mas quando subi a bordo…
Como eu deveria saber que pertencia a um bando de sequestradores — e que eles a pegaram também?
E então meus próprios raptores foram atacados por um bando de ladrões! Imagine só.
Rastejei desesperada entre os cadáveres dos raptores brutalmente assassinados e pratos de jantar descartados. Meu peito e minhas coxas doíam enquanto raspavam contra areia e cascalho, provocando um pequeno grito meu a cada vez.
Quando os deuses fizeram nossos corpos, por que tinham que nos dar tanta área de superfície?!
Mais tarde, contudo, não tinha ideia de quanto tempo depois, finalmente consegui alcançar o que estava procurando: um vaso de barro, muito parecido com um penico, largado no meio do lixo espalhado. Talvez ainda houvesse algo nele.
Porém, quando tentei estender a mão para pegá-lo, encontrei meus dedos e pernas recusando-se a me obedecer, eu, sua mestre. Não tinha forças para ficar de pé ou mesmo para segurar o vaso ao meu alcance. Então, ele caiu de lado, derramando seu conteúdo sobre a terra.
— Ah, mas que porr…!
Supus que este era meu castigo por zombar dos deuses; o karma foi imediato. Fiz uma careta e pressionei minha boca até a areia onde a água estava escorrendo para dentro. Tentando manter um olho ao meu redor, lambi o fluido lodoso. Ser reduzida a lamber a água da sujeira era tão patético que poderia ter chorado, mas eu precisaria de umidade dentro do corpo.
— …Ergh, ugh. — Tentei bochechar a água na minha boca, depois cuspi um globo pegajoso de saliva. Depois, tentei beber um pouco mais de água. Não havia sabor, não havia nada, mas não importava.
Os Elfos viviam muito tempo. Num piscar de olhos, todos que se lembrassem de minha humilhação desapareceriam. Além do mais, em comparação com os horrores que acontecem naquele castelo, isto não era nada. Isso mesmo… sim, foi por isso que eu fiz isso.
Por ódio aos ladrões, que tinham levado uma parte da “renda” dos raptores, ajudei a fuga daquela carruagem distante. Ou, mais precisamente, aqueles vermes tinham os ajudado a escapar quando me arrastaram para dentro. Os ladrões estavam compreensivelmente putos e, depois de massacrarem todos os sequestradores, ameaçaram punir severamente minha amiga…
— Ugh, por que estou sempre arriscando o pescoço por você está muito além da minha capacidade de explicar… — murmurei, mas minha pequena amiga, que tinha aparecido ao meu lado em algum momento, simplesmente encolheu os ombros. Então, de repente, ela jogou um amuleto dourado na areia, logo à minha frente. Como recuperou o amuleto que os sequestradores haviam me tirado, eu não fazia ideia, mas ela tinha.
— Isto não conta como um favor — resmunguei, mas minha amiga simplesmente sorriu. Muito irritante. Peguei o amuleto delicadamente e o pendurei de volta ao meu pescoço.
Ao que parecia, enquanto estava polindo as lanças dos ladrões e cozinhando pão em seu forno, minha amiga estava negociando com seu líder. Tentando convencê-lo a nos vender no momento em que chegassem à cidade, amanhã ou no dia seguinte. Pelos deuses.
— Suponho que aceitariam um preço barato por nós — murmurei com raiva. — Senhor, eles não sabiam o que tinham em mãos. — Puxei meus joelhos até o peito e encostei-me em minha amiga. Estava muito frio aqui no deserto para passar a noite sentada sozinha. — Se tivéssemos sido vendidas como escravas de extração de água nas minas, talvez não conseguíssemos sair por uns cem anos. O que teria acontecido, então?
Minha amiga balançou a cabeça como se não soubesse. Ah, para…
Se havia esperança lá fora, onde ela estava?
Tradução: NERO_SL
Revisão: B.Lotus
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