— Estou farta de matar goblins! — Ela anunciou, batendo a mão na mesa redonda. Ela sendo, é claro, Alta Elfa Arqueira. Suas orelhas se projetaram para trás enquanto fazia essa proclamação; atraiu a atenção de todos os aventureiros e funcionários da taverna, mas apenas por um segundo. Eles rapidamente voltaram para o que quer que estivessem fazendo como se dissessem, Oh, é aquela elfa de novo.
Tudo isso só significava que a taverna da Guilda dos Aventureiros esta tarde estava tendo um dia perfeitamente normal.
— Você está, é? Aposto que poderíamos encontrar um belo dragão para matar. Ou talvez você gostaria de se tornar uma caçadora de recompensas?
— Não foi o que eu quis dizer, pouca sombra. — Alta Elfa Arqueira acenou com desdém para Anão Xamã, que estava sentado diante dela com o queixo nas mãos e que havia bebido a maior parte da tarde. A elfa desenhou um círculo no ar com o dedo indicador, as orelhas contraídas enquanto murmurava algo sobre como ele simplesmente não entendia. — Hoje em dia não tem nada além de goblins, goblins, goblins, goblins, goblins, não é?
— Bem, ele é Matador de Goblins… — respondeu uma pequena clériga humana também sentada em frente a Alta Elfa Arqueira. Ela sorriu desajeitadamente, brincando com a xícara em suas mãos, então olhou para o lado. Ao lado dela, sentava-se um aventureiro que, em silêncio, polia uma adaga e uma espada de comprimento estranho com um trapo velho. Este homem, que usava um capacete de metal de aparência barata, armadura de couro suja e tinha um pequeno escudo redondo amarrado ao braço, era chamado de Matador de Goblins.
Não ficou claro se estava ouvindo a conversa ou não, mas agora ele resmungou: — Hrm. — Então acrescentou: — Não vejo nenhum problema particular nisso.
— Ha-ha-ha, sem problemas, mas também sem histórias de aventura, bravura ou ousadia — disse Lagarto Sacerdote, dando uma grande mordida na roda de queijo em sua mão. Ele engoliu ruidosamente. O jeito como exclamava sobre o sabor lembrava um dragão devorando um herói.
Anão Xamã assistiu a este elaborado show de mastigação com um sorriso, então estendeu a mão para um dos pratos ainda sobre a mesa. Para o almoço, pediram pão, carne de porco moída e vegetais — tudo muito familiar. Enquanto enfiava na boca uma fatia de pão coberto com carne de porco, Anão Xamã empurrou o prato de vegetais para mais perto de Alta Elfa Arqueira. — Cuidado, Corta Barbas. Seu óleo vai entrar na comida.
— Desculpe. — Matador de Goblins deslizou um pouco para trás da mesa, mas não parou de trabalhar. Sua espada não era notável, mas um único descuido poderia resultar em um desastre crítico. Que os deuses intercedam pela lâmina; para que não lasque quando a sacar, fique presa em sua bainha ou quebre na primeira troca de golpes.
Lagarto Sacerdote, que parou brevemente de consumir queijo, estendeu a mão com um grunhido conhecedor. — Perdão — disse enquanto pegava uma pequena cebola do prato de legumes e a colocava na boca como um doce para limpar o paladar. Sacerdotisa supôs que a maneira como ele revirou os olhos era por causa do sabor forte.
Homens-fera não parecem comer muitas ervas aromáticas, pelo que pude ver.
Não que ela mesma estivesse particularmente inclinada a comer uma grande quantidade de anéis de cebola. Não era como se desgostasse delas, gostava de colocá-las na boca, mordê-las e sentir o delicioso sabor avinagrado das pequenas guloseimas em conserva derretendo em sua língua. mas uma jovem, mesmo que fosse uma aventureira, se preocupava com certos odores. Parecia ser por isso que Alta Elfa Arqueira estava sempre se perfumando com algum cheiro floral da floresta. Não que Sacerdotisa tivesse ciúmes dela… bem, não com muita frequência.
— Perdi a conta depois de dez expedições de matança de goblins. — Alta Elfa Arqueira disse com um bufo fofinho, acenando com a mão para Lagarto Sacerdote. — Estou começando a me preocupar que estar com Orcbolg vai me fazer esquecer que existem outros monstros.
— Nós encontramos aquele vampiro e aqueles pés-grandes… — disse Sacerdotisa sem muita convicção. Ela mesma não estava particularmente insatisfeita com a situação atual, o que era outra coisa que parecia irritar Alta Elfa Arqueira.
— Sim, no inverno passado — respondeu a elfa. Ela tomou alguns goles delicados de seu vinho aguado e deu um suspiro teatral logo depois. — Você sabia que quando saímos para aquele vinhedo, alguns dos outros aventureiros tiveram que lutar contra demônios e outras coisas assim?
— Isso não me interessa — murmurou de Matador de Goblins. Devia ter finalmente ficado feliz com a condição de suas armas, porque colocou a espada de volta na bainha e a faca de arremesso no cinto. Alta Elfa Arqueira o observou com um olhar que dizia: Você literalmente vai jogá-los fora de qualquer maneira. Ele, porém, não pareceu notar, concluindo o que disse antes: — Enquanto os outros aventureiros estão lutando contra seus demônios, é meu papel enfrentar os goblins.
— Por que não estou surpresa? Para ser justa, acho que seria muito estranho se você de repente dissesse: “Vamos acabar com os demônios!” — Alta Elfa Arqueira soltou um suspiro derrotado e caiu sobre a mesa; o incrível era que até aquele gesto parecia elegante vindo dela.
— Está se sentindo um pouco bêbada? — Sacerdotisa perguntou, casualmente olhando para a taça de vinho de sua amiga antes de despejar um pouco mais de água nela. — Devo admitir que temos feito muitas caçadas perfeitamente comuns recentemente.
— Não há nada de perfeitamente comum em não fazer nada além de caçar goblins!
— Você acha?
— Eu não acho. Eu sei!
Ainda não muito convencida, Sacerdotista inclinou a cabeça e Alta Elfa Arqueira, impotente, olhou para o teto. Até mesmo essa conversa soava familiar e nenhum dos outros na taverna prestou atenção nela. Este estranho aventureiro e seu grupo eram apenas parte da vida na cidade fronteiriça agora. Vendo como todos os outros os consideravam, mesmo os novatos que se registraram nesta primavera logo os aceitaram. Mesmo que alguns concordassem em particular que era estranho caçar apenas goblins…
— Ahh, mas é um prazer ter a moça orelhuda aqui — disse Anão Xamã. — Eu nunca quero os acompanhamentos finos para o meu vinho.
Lagarto Sacerdote pegou a jarra de vinho de fogo do Anão Xamã e encheu generosamente o copo do xamã. — Só posso me desculpar por você ter que suportar um homem-lagarto servindo você.
— Não se preocupe. Receio que ter um elfo servindo minha bebida poderia me tirar dessa boa agitação. Talvez fosse engraçado, mas não muito mais. — Ele esvaziou o copo com satisfação, as gotas espirrando em sua barba, mas então semicerrou os olhos. Talvez porque Alta Elfa Arqueira de repente levantou os olhos de sua festa de bebedeira, suas orelhas estremecendo. Seu olhar estava apontado para a entrada da Guilda. Um momento depois, Matador de Goblins também olhou, seguido por Lagarto Sacerdote e Sacerdotisa.
Três aventureiros passaram pela porta da taverna, cada um extravasando seus sentimentos sobre a situação:
— Finalmente, finalmente em casa…
— Controle-se, você está nos envergonhando…!
— Ugh, estou com tanta fome. Duvido que conseguiria dar outro passo!
O grupo consistia em um jovem guerreiro acompanhado por uma clériga do Deus Supremo, bem como uma caçadora que vinha dos homens-lebre. Todos eles estavam cobertos de lama e sangue.
Alta Elfa Arqueira franziu a testa e soltou um som de consternação. Sacerdotisa, muito acostumada com esse fedor em particular, apenas sorriu levemente.
— M-meu Deus… foi tão ruim quanto parece? — Garota da Guilda disse, pela primeira vez emergindo de trás do balcão da recepção. Ela tinha muita experiência com aventureiros e não deixou seu de sorrir, algo que Sacerdotisa admirava muito.
Acalmado pelo comportamento imperturbável de Garota da Guilda, o guerreiro assentiu com firmeza, embora parecesse que poderia desmaiar ali mesmo na porta. — Foi difícil, mas de alguma forma conseguimos. Goblins bons são goblins mortos.
— Bom trabalho — murmurou Matador de Goblins, de todas as pessoas. Isso, primeiro, provocou espanto e depois uma risadinha da clériga.
— Com certeza um bom trabalho — disse ela. — Ótimo trabalho. Seu porrete não acertou nada além do ar e aquelas pedras de funda não se saíram muito melhor!
— Ei, nós acabamos com eles, de qualquer maneira — disse Caçadora Coelha com indiferença. Ela (eles tinham quase certeza de que era um “ela”) agora tinha o pelo manchado de marrom e branco que, no momento, estava meio desordenado, com manchas de sangue. Sacerdotisa levantou-se da cadeira, molhou seu lenço na torneira e foi até os três aventureiros. — Depois de fazer seu relatório, vocês terão que se lavar bem, certo?
— Ooh, obrigada por isso. — Caçadora Coelho disse enquanto Sacerdotisa enxugava seu rosto e cabelo.
— Olhe para ela, agindo como uma adulta. — Alta Elfa Arqueira riu. — Eu entendo, no entanto. Você quer cuidar de pessoas com menos experiência. — Falou tão baixinho que Sacerdotisa não a ouviu. Alta Elfa Arqueira não estava realmente criticando o comportamento doce e sorridente de Sacerdotisa.
— Independente do que pensamos sobre nossa própria matança de goblins, a deles certamente foi um ato de bravura e ousadia — acrescentou Lagarto Sacerdote com uma risada.
— Ha-ha-ha, você está totalmente certo! — disse Anão Xamã.
— Ei, conte-nos tudo quando tiver alguns minutos! — Guerreiro de Armadura Pesada gritou do burburinho da taverna. Garoto Batedor e Garota Druida em seu grupo eram amigos do guerreiro e da clériga, mas pareciam um tanto despreocupados. Contudo, devem ter ficado felizes ao ver seus amigos voltarem para casa. Estavam sorrindo e acenando.
— Se você tem uma aventura bem-sucedida, então oferece a todos uma rodada. Essa é a tradição! Estaremos esperando! — Cavaleira adicionou.
— Gostei dessa ideia! — disse Garçonete Felpubro, batendo palmas. — Isso significa que vão pedir muitas coisas diferentes hoje à noite, certo? Uau!
— E-ei, não ganhamos tanto dinheiro com isso! — Em meio a essa tempestade de elogios, provocações e gritos, o rosto de Guerreiro ficou vermelho; foi constrangimento ou algo mais? Todos os aventureiros, mesmo aqueles que não sabiam seu nome, gritavam para ele. Alguns o parabenizaram pelo trabalho bem feito, outros por ter voltado vivo, outros ainda reclamaram que havia perdido uma aposta. “Listas de Mortos”, apostar em quem iria bater as botas não era exatamente de bom gosto, mas era uma das superstições aqui. Afinal, se o objeto da aposta tivesse sorte, ele “ganharia” voltando vivo para casa. Já que eles haviam vencido, era uma boa desculpa para exigir uma bebida deles.
Assim era a Guilda dos Aventureiros: barulhenta, mas confortável.
— Lugar animado, esse… — A garota-lebre comentou enquanto Sacerdotisa continuava a enxugar seu pelo fofo.
— Certamente é — respondeu Sacerdotisa. — É sempre assim. — Ela mesma havia se sentido um pouco dominada pelo ambiente no começo, mas já estava bem acostumada com isso nos últimos tempos. Isso parecia um pouco triste para ela às vezes, mas sem dúvida havia um lado feliz também. Ela sentiu um orgulho genuíno da etiqueta de patente aço que pendia em seu pescoço. — Tenho certeza de que os dois ficarão felizes, mesmo que não estejam em uma aventura hoje.
— Eles são verdadeiros aventureiros. Quando se trata de matar goblins, dificilmente temos o direito de falar com o Mais Forte da Fronteira — disse Clériga com um meio sorriso.
Sacerdotisa entendia o sentimento, mas ainda franziu os lábios em reprovação. — Desculpe, mas acho que Matador de Goblins é o Mais Gentil da Fronteira, não? Aqui. Segure firme.
— Acho que isso é um pouco cruel, não é…? Ah, obrigada. — Clériga ficou visivelmente aliviada por ter tirado um pouco da sujeira de seu cabelo e rosto. No caminho de volta para casa, ela lembrou, Guerreiro e Batedor estavam tão cansados que teve de ficar de olho; e ela era a última na fila.
Sim, você deve estar cansada.
Sacerdotisa limpou suavemente na camada de sujeira; um ato gentil e reconfortante para esta jovem exausta.
— Ah, sim, sim. Diga, senhorita, posso lhe contar uma coisa? — perguntou Caçadora Coelha, suas orelhas compridas se contraindo; de repente, ela tinha um pedaço de pão na mão.
— Sim, o que é? — Sacerdotisa perguntou, sem parar seu trabalho.
— Ah, nada demais — disse Caçadora. — É só que, no portão da cidade, encontramos alguém que disse estar procurando por você. Ele está esperando bem ali.
— O quê? — Sacerdotisa olhou para a porta para descobrir uma figura esbelta em um sobretudo que a cobria totalmente. As curvas perfeitas das pernas dessa pessoa eram visíveis sob suas calças de couro justas. E em seu quadril pendia um lindo florete de prata, quase ofuscante em seu brilho.
Essa pessoa observou a sala cheia de aventureiros tagarelas com o que parecia ser um sorriso afetuoso. Quando percebeu que tinha o olhar de Sacerdotisa sobre ela, tirou o sobretudo, revelando ricas mechas de cabelo cor de mel.
— Olá e perdoe-me por estar longe por tanto tempo — disse a mulher. Ela, que uma vez tinha sido uma aventureira, agora era uma comerciante. Sacerdotisa exclamou de surpresa e alegria, abandonando seu trabalho no rosto de Clériga e correndo para Comerciante Feminina. Ela apertou a mão de sua amiga pela primeira vez em muito tempo.
— O que a traz aqui de repente? Nenhuma de suas cartas dizia que você viria…
Comerciante Feminina não deixava seu prazer transparecer tão abertamente quanto Sacerdotisa. No entanto, era evidente que estava feliz. — Ah, é uma questão de negócios que surgiu abruptamente. Devo ser cautelosa ao separar meus negócios da vida pessoal…
Essa reunião, é claro, não escapou de Alta Elfa Arqueira, que falou em alto tom: — Bem, não vejo você há algum tempo! Não fique aí parada conversando; venha aqui! Orcbolg, guarde seus brinquedos.
— Oh, eu não poderia… olha, você me conhece. Sempre que algo acontece, venho chorando até você… — Comerciante Feminina parecia bastante envergonhada, mas não se fez de difícil e deixou Sacerdotisa levá-la até um assento.
— Hrm — resmungou Matador de Goblins, mas depois que limpou suas ferramentas e itens, a mesa ficou bastante espaçosa.
— Isso exige uma coisa: mais bebidas! Yo-ho! Tragam uma cerveja para essa garota! — Anão Xamã gritou e Lagarto Sacerdote acrescentou: — Traga alguns acompanhamentos que pareçam adequados também. E um pouco de queijo.
— E-eu não sou muito boa com álcool — disse Comerciante Feminina enquanto era conduzida a seu assento. — Bem, tudo bem, obrigada. Uma cerveja tudo bem. — Ela não parecia muito certa.
Comerciante Feminina provavelmente sabia lidar com esse tipo de situação. Sacerdotisa, por outro lado, tinha a sensação de que, no passado, Comerciante Feminina havia trocado farpas com grandes famílias de mercadores ou descendentes de casas nobres. Sacerdotisa sempre teve o cuidado de nunca perguntar muito sobre os ex-membros do grupo de Comerciante Feminina, mas isso ela intuiu. Era uma sorte ter uma chance maravilhosa de sentar todos juntos e tomar uma bebida.
— Então, o que é esse negócio em que você está? — Sacerdotisa perguntou, oferecendo um pouco de pão e carne de porco.
— Sim, sobre isso. — Comerciante assentiu. As mordidas delicadas que dava no pão eram dignas de uma educação nobre. Ao contrário da graça sem esforço da Alta Elfa Arqueira, esse era um decoro estudado que fazia Sacerdotisa pensar em uma princesa. — Na verdade… bem, por questão de formalidade, pretendo passar pela Guilda para explicar adequadamente. — Com esse pequeno aviso fora do caminho, Comerciante Feminina olhou ao redor da sala. O resto da Guilda dos Aventureiros estava tão ocupada comemorando o retorno de alguns deles que não prestaram atenção a esta mesa.
Comerciante Feminina respirou fundo, seu peito bem torneado subindo e descendo. E então, resoluta, disse: — Há uma missão, uma aventura, da qual peço encarecidamente a todos vocês que participem.
Sacerdotisa soube imediatamente o que Matador de Goblins iria perguntar a seguir. Ela presumiu a resposta assim como todos os outros nesta mesa.
Só pode ser uma coisa…
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— Então são goblins.
— Sim, essa é a essência da coisa.
— Quando vai partir? Eu irei com você.
Eles estavam sentados na sala de reuniões da Guilda. Matador de Goblins sentou-se em frente a Comerciante Feminina; Sacerdotisa sentou rígida e ansiosa ao lado dele. O sofá macio sustentava muito bem seu traseiro modesto, enquanto suas pernas esguias se estendiam até o tapete, que era grosso o suficiente para engolir seus sapatos. As prateleiras ao redor deles estavam repletas de troféus de grandes aventureiros; lembranças que pareciam encará-los com desdém.
Sacerdotisa refletiu sobre o quão raramente vinha aqui; como se sentia desconectada desta sala. As únicas vezes que visitou foram quase todas para entrevistas de promoção.
Era diferente para Matador de Goblins, sentado impassivelmente ao lado dela e de seus outros companheiros. Eles eram todos de nível Prata, o terceiro nível mais alto que um aventureiro poderia alcançar e o nível mais alto a estar em campo. Eles eram encarregados de tarefas pesadas e frequentemente (imaginava Sacerdotisa) encontravam-se com importantes fornecedores de missões aqui nesta sala.
Entretanto, ela não era assim. Ainda era inexperiente; carente de testes reais. Dificilmente poderia ser chamada de novata, mas ainda não acreditava que fosse considerada totalmente madura. E, no entanto, aqui estava ela com Matador de Goblins, a par dos detalhes desta missão. Sua etiqueta de classificação aço a deixou se sentindo completamente deslocada.
Especialmente com todos os outros esperando lá embaixo…
A presença de Comerciante Feminina em frente a eles impediu que Sacerdotisa se revirasse de desconforto. Ela queria sentar-se ereta enquanto ouvia, para pelo menos parecer uma aventureira que sabia o que estava fazendo.
— Acontece que um grande número de goblins foram vistos perto da fronteira com o país ao leste.
— No leste? Isso seria na direção do deserto, não seria? — Garota da Guilda colocou xícaras fumegantes sobre a mesa enquanto ouvia a história de Comerciante Feminina. O chá de Garota da Guilda era um dos pequenos prazeres de Sacerdotisa. Ela pegou uma com as duas mãos, soprando antes de tomar um gole. O calor encheu sua boca. Comerciante Feminina apanhou a outra com ar experiente, saboreando o chá com toda a elegância que costumava exalar.
Apenas Matador de Goblins não se mexeu. Após um momento de silêncio, ele disse simplesmente: — É mesmo?
Garota da Guilda, tendo se sentado, inclinou a cabeça em perplexidade, fazendo com que suas tranças saltassem. — Oh?— Ela perguntou. — Você não sabia?
— Não — respondeu ele, cruzando os braços e se inclinando, armadura e tudo, de volta contra a cadeira. — Nunca saí deste país.
Isso foi um tanto surpreendente e ao mesmo tempo, nem tanto. Sacerdotisa trocou um olhar com Garota da Guilda, então seus olhos encontraram os de Comerciante Feminina. Nenhuma delas poderia imaginar este aventureiro estranho priorizando uma viagem para além da fronteira invés da destruição de um ninho de goblins próximo. A maioria das pessoas naturalmente sabia mais sobre suas próprias casas do que sobre terras estrangeiras, mesmo que tivessem os meios para descobrir tais lugares; o que muitos não tinham. Não bastava estar familiarizado com os arredores de sua aldeia? Quem se importava com o que havia além das montanhas?
No entanto, vindo de um aventureiro de nível Prata, foi um pronunciamento levemente incomum.
— Mas se houver goblins, o assunto está resolvido. Qual é a situação? — perguntou Matador de Goblins. Sacerdotisa sorriu quando ele se curvou para frente da mesma forma que sempre fazia.
— Eles não são exatamente uma nação amigável. — Garota da Guilda disse com uma expressão tensa. Ela sabia que era, antes de tudo, uma burocrata; uma representante de seu governo. Precisou escolher suas palavras com cuidado. — Vários países diferentes compartilham nossa fronteira oriental, mas aquela nação em particular… — Garota da Guilda admitiu que havia pelo menos estradas que chegavam até ela, mas então deu de ombros. — Não tem uma Guilda de Aventureiros.
Sacerdotisa fez um som de surpresa. Ela tinha ouvido uma coisa ou outra sobre a nação que ficava do outro lado das areias movediças, mas esse detalhe era novo para ela.
— Eles têm aventureiros — esclareceu Garota da Guilda. — Ou pelo menos, pessoas que se chamam assim.
Que tipo de lugar poderia ser? Sacerdotisa se perguntou, colocando o dedo indicador nos lábios. Um país com aventureiros, mas sem uma Guilda de Aventureiros. Nos últimos dois ou três anos, ela ganhou muita experiência e aprendeu muitas coisas, mas o mundo era um lugar vasto e ainda havia muito que não sabia.
Ele não disse uma vez algo sobre haver tantas pessoas que sabiam mais sobre o mundo do que ele? Sacerdotisa assentiu para si mesma, lembrando-se de algo que Matador de Goblins havia comentado anteriormente. Mas se assim for, basta ouvir, olhar, lembrar e aprender. Não aprendera com a amiga, tão distante dela na idade, a importância de conservar o sentimento de admiração pelo desconhecido?
— Mas por que as relações com aquele país são tão ruins…?
— Nós preferimos dizer somente que são “não tão boas” — disse Garota da Guilda incisivamente, mas sorrindo. A diplomacia, ao que parecia, era complicada. — De qualquer forma, voltando no tempo do último rei, o último rei deles, não o nosso, as pessoas costumavam ir e vir entre nossos países com muito mais liberdade.
“Porém, quando a posse do trono mudou, as restrições aos estrangeiros no país aumentaram. Rumores inquietantes sugeriam que soldados estavam sendo recrutados, armas e equipamentos adquiridos e um exército reunido. Durante a batalha com o Lorde Demônio, alguns dos soldados do rei supostamente atravessaram a fronteira para esta nação, chamando a si mesmos de mercenários ou um exército voluntário ou algo assim.
“Um grupo de heróis, que por acaso estavam no mesmo lugar ao mesmo tempo, levantou-se para proteger as pessoas… Sim, claro. Era extremamente conveniente que tantos visitantes com armas, cavalos e treinamento militar estivessem por perto naquele momento.”
— Poderia ser apenas… — Um pretexto? Sacerdotisa estava prestes a dizer, mas sabiamente engoliu as palavras.
Garota da Guilda sorriu. Ou melhor… forçou um sorriso. Sacerdotisa assentiu. — De qualquer forma, essa é a situação e a razão pela qual as coisas não estão muito boas entre nós…
— No entanto, os goblins estão se multiplicando, — Comerciante Feminina interrompeu em voz baixa. De alguma forma, o estalo de sua xícara de chá soou como uma espada sendo desembainhada. — E eles estão começando a entrar neste país. Não podemos deixar isso continuar — disse ela antes de acrescentar: — Precisa ser investigado. — Ela então fechou os lábios com força.
Terror. Medo e hesitação. Teria sido fácil notar qualquer uma dessas coisas vendo o tremor do punho cerrado de Comerciante Feminina, mas Sacerdotisa também tinha visto o brilho de luz em seus olhos. Pálido e frio; uma chama fria. Ela pensou tê-lo reconhecido; respirou fundo e soltou o ar, expulsando tudo o que estava preso dentro de si.
Ainda assim…
Enquanto respirava, sua cabeça começou a clarear, começou a trabalhar. Um país com o qual as relações eram “não tão boas”. Um lugar deserto sem Guilda dos Aventureiros. Uma terra repleta de rumores perturbadores.
Goblins entrando no território desta nação. Indo investigar. Aventureiros indo investigar.
Sua missão é… provavelmente outra coisa.
Era algo maior do que apenas comércio. Provavelmente ainda maior do que a Donzela da Espada; muito, muito maior. Uma imagem da comitiva real que conheceram enquanto exploravam a Masmorra dos Mortos passou pela mente de Sacerdotisa.
No passado, ela não tinha certeza, mas talvez se ressentia daquela situação. Agora, porém, curiosamente, não o fez. O fato de a entregadora da missão ser uma amiga querida dela ajudou. Alguém que era quase — ela estava com vergonha de dizer isso em voz alta — como uma irmãzinha. Sacerdotisa sabia do passado doloroso da menina, e por isso estava cheia de desejo de ajudar, mesmo que isso não lhe desse nada.
Grande parte disso foi ter acompanhado Matador de Goblins em suas negociações com a Guilda dos Ladinos. Havia coisas no mundo que eram mais bem feitas nas sombras; coisas que eram melhor tratadas não pela intervenção desajeitada de um governo nacional, mas por aventureiros. Agora que pensou sobre isso, seu próprio encontro com esses raros e preciosos companheiros surgiu por causa de tal incidente.
É uma espécie de destino.
O pensamento a fez se sentir um pouco mais calma. Diplomacia realmente era um assunto complicado.
Então, quando Sacerdotisa fez sua pergunta, o fez tão ampla e educadamente quanto pôde. — Ahem. Não seria um caso para os aventureiros de nível Ouro lidarem?
Normalmente, eram aqueles com classificação Ouro ou superior que lidavam com questões de importação nacional. Normalmente.
— De fato. Só esperava poder pedir a você que agisse como minha guarda-costas enquanto eu viajasse para lá em uma missão mercante. — A expressão rígida de Comerciante Feminina deu uma notável suavizada. Talvez fosse pelo embaraço ou então por uma quase timidez; era como se dissesse que desejava se aventurar com eles de novo, mesmo que apenas na qualidade de fornecedora de missões.
Ficaria emocionada em pensar que era assim que ela se sentia. Sacerdotisa assentiu. Comerciante Feminina suspirou de alívio.
Garota da Guilda, no entanto, rapidamente choveu neste desfile: — Receio que não haja condições de enviarmos alguém de nível Ferro em tal missão — disse ela. Sacerdotisa engoliu seco. O rosto de Comerciante Feminina endureceu. Garota da Guilda, no entanto, não parou de sorrir enquanto endireitava a papelada que Comerciante Feminina havia lhe dado. Sacerdotisa imaginou que isso era o que você chamava de diferença de experiência. Afinal, em termos de número de missões das quais fez parte, Garota da Guilda estava bem acima dos outros na sala. Comerciante Feminina já estava acostumada com essas situações, mas ainda era a mais nova membro desse grupo, e Sacerdotisa era apenas um pouco mais experiente do que ela.
Sacerdotisa olhou para o capacete de metal ao lado dela. Seu dono grunhiu e disse sem hesitar: — Mas isso envolve goblins. Então eu vou.
— Claro, — Garota da Guilda respondeu com um sorriso gentil. — Não estou me opondo a você, Matador de Goblins, senhor.
— Você não se importa de passar esta missão? — Ele perguntou à Sacerdotisa.
— Ahem, no entanto, a entregadora da missão trouxe especificamente essa missão para ela — explicou Garota da Guilda.
Houve alguma careta desconfortável de Comerciante Feminina. Sacerdotisa olhou para ela, mas àquela altura a expressão já havia desaparecido de seu rosto. Sacerdotisa não estava exatamente distraída com o breve interlúdio, mas mesmo assim, levou um segundo para compreender o que Garota da Guilda disse a seguir.
— Nesse caso, creio que isso exija uma entrevista de promoção! — Ela bateu palmas, sorrindo de orelha a orelha. Este não era seu sorriso falso, mas o real.
— O quê? — Sacerdotisa piscou. — Promoção? Você quer dizer… para Safira?! — Ela pulou da cadeira antes de saber o que estava fazendo, mas então se conteve, corou furiosamente e prontamente se sentou.
Promoção da oitava posição para a sétima. Este foi, sem dúvida, seu primeiro passo nas fileiras intermediárias. Ela não seria mais “uma novata com um pouco de experiência”, mas uma verdadeira aventureira estabelecida. Sacerdotisa, sem notar, agarrou a etiqueta de classificação em seu pescoço. Seu coração estava batendo forte.
— Isso mesmo, — Garota da Guilda disse. — Você poderá viajar para lugares bem perigosos… — Ela parou e limpou a garganta. — Quero dizer, áreas menos estáveis como esta missão requer.
Posso realmente fazer isso? Sacerdotisa se perguntou. O que ela deveria fazer? Qual era a resposta certa? Ela viu um brilho nos olhos de Comerciante Feminina. — Uh, hum…
Esperando por algum tipo de ajuda, se voltou para Matador de Goblins mais uma vez, mas ele apenas grunhiu: — Hrm. Nesse caso, não creio que eu deva decidir se você aceita ou não.
Ele estava claramente planejando ir, independentemente de sua escolha. Isso era natural para ele; Sacerdotisa sentiu isso como um baque em suas entranhas. Ninguém estava perguntando se ela poderia fazer isso. Não estavam dizendo a ela para não fazer isso. Tudo, tudo isso, cabia apenas a ela decidir.
Pode-se apresentar inúmeras perspectivas e razões, mas então…
Proteger, curar, salvar.
Ela sabia o que esperava fazer ao sair para o mundo, então mordeu o lábio, então respirou fundo e disse: — Eu… eu farei isso!
Sacerdotisa viu Garota da Guilda sorrir feliz. Os olhos da Comerciante Feminina se iluminaram. Quanto à expressão no rosto por trás da viseira do capacete ao lado dela, Sacerdotisa não poderia adivinhar. A vibração em seu peito, contudo, foi o suficiente para ela.
Ela sabia o que queria: ser uma aventureira.
Tradução: NERO_SL
Revisão: B.Lotus
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