Algo escuro respingou na neve branca.
— GOROBOGO?!
O uivo inarticulado não pertencia a nenhum humano. Era horrível e distorcido, a voz de um goblin.
O monstro se debateu e lutou em meio ao turbilhão. Uma lâmina o atravessou como o frio do gelo. O monstro gritou uma vez e então nada mais pôde ser ouvido.
…Não, havia outra coisa.
Caminhando descuidadamente pelo tapete de gelo e neve estava uma única figura solitária, um aventureiro.
Ele tinha um capacete de metal de aparência barata, armadura de couro encardida, um pequeno escudo redondo no braço e uma espada de um comprimento estranho no quadril.
Manchado de vermelho e branco por respingos de sangue e neve, o aventureiro disse calmamente, como se não tivesse acabado de tirar uma vida.
— Cinco.
Misericordiosos e frios, os lindos flocos dançantes, as fadas da neve, já cobriam todos os corpos. Ou talvez para eles, o branco puro em si fosse lindo e eles estavam simplesmente sobrescrevendo o mundo inteiro. Logo um véu de neve seria colocado sobre os cadáveres frescos.
Para ele, um goblin vivo era motivo de grande preocupação, mas um morto mal valia a pena se considerar. Ele caminhou pela neve caindo silenciosamente, permanecendo alerta enquanto falava em seu tom baixo de costume.
— Vamos lá.
— C-certo…!
A voz em resposta era frágil, tremendo como uma bola que foi lançada com força contra o chão. A garota que emergiu da neve atrás dele estava pálida, tentando desesperadamente o acompanhar, tinha cabelos ruivos e um peito amplo. Não era apenas o frio que a fazia estremecer.
— V-você tem certeza sobre isso………?
— Não vejo problemas — disse ele, então pensou por um momento e acrescentou reflexivamente — Nem para mim, nem para o que está ao nosso redor.
— O-ok…
— Você está bem?
A situação não era propícia para relaxar. Ainda assim, ela forçou sua expressão rígida a suavizar-se um pouco, não parecia muito com o sorriso que ele estava acostumado a ver dela, no entanto.
— Sim, estou bem… estou bem.
Ele acenou com a cabeça, depois baixou os quadris e começou a caminhar, ainda vigilante. Ela o seguiu com uma enxurrada de passos curtos e rápidos. A maneira como ela constantemente esquadrinhava a área ao seu entorno tornava sua ansiedade muito óbvia.
Ela tropeçou em algum galho, o que a fez pular. Sob a neve havia árvores podres. Pedras também. E provavelmente ossos humanos.
Houve uma aldeia aqui, uma vez. Há muito, muito tempo.
Não aquela em que ele e ela tinham vivido, aquela terra já tinha um novo uso, uma instalação de treinamento para aventureiros estava sendo construída nela.
Aldeias em ruínas podem ser encontradas virtualmente em qualquer lugar. Talvez goblins tenham feito isso, ou uma epidemia, ou um dragão.
Ele sabia disso e ela também.
Embora ele entendesse totalmente, ela nunca havia sentido na pele antes.
Acima do vento uivante, o cacarejo vil dos goblins ecoou.
E agora, finalmente, ela entendeu o que significava se aventurar onde os goblins moravam.
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— Olha essa neve!
A janela da Guilda dos Aventureiros estava toda coberta de branco. Aos olhos da elfa, deve ter parecido que as filhas do gelo e da neve estavam fazendo uma dança. Ela estava sentada olhando para fora com o queixo entre as mãos e as orelhas compridas tremulando, um sorriso agradável no rosto.
— Eu te digo que é assim que o inverno deveria ser. Mesmo que isso signifique que o lado de fora está frio, gélido e soprado por um vento assobiador.
— Quanto a mim, muito frio reduz minha pressão sanguínea a ponto de flertar com a morte — em contraste, Lagarto Sacerdote estava o mais perto que podia da lareira. Os outros aventureiros mantiveram uma distância saudável, mas o consideraram com aceitação. Afinal, já haviam se passado quase dois anos desde que esse temível visitante viera pela primeira vez à cidade fronteiriça. Os únicos que o olhavam com os olhos arregalados atualmente eram os membros recém-registrados da guilda.
— Só serve para mostrar que você não se fortaleceu o suficiente! — Cavaleira abriu a porta, parecendo tão cheia de energia quanto um cachorrinho que saiu para brincar na neve. Atrás dela vinham Guerreiro de Armadura Pesada, Garoto Batedor e Guerreiro Meio-Elfo, todos parecendo exaustos. A propósito, todos estavam cobertos de neve, parecia que foram forçados a acompanhar a Cavaleira em seu treinamento.
Garota Druida surgiu para ajudar servindo um pouco de vinho quente, que Cavaleira aceitou com indiferença.
— Você nunca ouviu falar de um Dragão de Diamante?
— Esses reinos sagrados ainda estão muito além de mim — disse Lagarto Sacerdote, respirando uniformemente enquanto se inclinava em direção à lareira.
— Quer… se… aquecer…? — sem nunca mudar sua atitude melancólica, Bruxa fez algo bastante incomum: ela acendeu uma chama na ponta do dedo. Ela o soltou como uma bola de fogo e ela voou para a lareira, transformando as chamas em um incêndio estrondoso.
— Ohhh, muito obrigado…! — Lagarto Sacerdote juntou as mãos em um gesto estranho, como se estivesse adorando uma deusa; Bruxa apenas riu profundamente.
Lanceiro se aproximou (Bruxa mal havia gesticulado para ele) e sentou-se ao lado dela com autoridade.
— Grandes lacunas entre espécies significam grandes problemas — disse ele. Ele estendeu uma caneca espumosa de hidromel: Aqui.
— Hmm…
— Não é queijo, mas aposto que você ainda vai estourar o usual “Néctar!”
— Mmm — Lagarto Sacerdote engoliu o conteúdo em um único gole, depois exalou, perdido em pensamentos — O sabor é bastante único…
— Eu sempre acho estranho o quão sensível é sua língua. Não faz bem a um cara ter gostos e desgostos tão fortes, sabe?!
— Ha-ha-ha-ha-ha, eu sou um carnívoro, você deve se lembrar. Não suporto comer folhas — a brincadeira sugeriu que ele havia começado a se aquecer um pouco.
Alta Elfa Arqueira, vendo Lagarto Sacerdote de bom humor novamente, cutucou-o no ombro com um “Oh” e um sorriso.
— Então, o que isso nos torna?
— Dente-de-leão-nívoros, eu suponho. Fale sobre mau gosto — Anão Xamã colocou a cabeça para fora da cozinha para fazer seu comentário.
— Esqueça ele! — Alta Elfa Arqueira atirou nele, as orelhas voltadas para trás — Isso é discriminação racial, anão!
— Você deveria aprender a comer um pouco de carne. E você se pergunta por que ainda é uma bigorna depois de todos esses séculos.
— Não tire sarro de mim! — Alta Elfa Arqueira respondeu, estufando o peito de raiva genuína — Eu tenho dois mil anos, lembre-se!
— Não há nada do que se gabar — respondeu Anão Xamã, coçando a barba exasperado. Para a mesa no meio da taverna, ele trouxe um enorme guisado. Lá dentro, porções abundantes de repolho, batata, fígado e bacon ferviam alegremente.
— Nossa especialidade! — Garçonete Felpubro chamou da cozinha com o braço levantado, dando a eles um sinal de positivo — Feito por um Rhea, preparado por uma Felpubro!
— …E temperado por um anão. Aqui, coma.
O vapor saiu da panela. Guerreiro Novato e Clériga Aprendiz, curvados pela fome e pelo frio, se aproximaram e olharam ansiosamente para a refeição. A dupla finalmente se formou da caça de ratos, mas ainda achavam difícil terem uma vida adequada.
— Poderíamos…?
— …Não vejo razão para não — Anão Xamã estendeu tigelas para o par relutante. O menino e a menina se entreolharam, depois olharam para a panela fumegante e, um segundo depois, caíram sobre a comida.
— Ah, vão em frente e devorem isso, crianças. Comam o quanto quiser.
Então………
— Ah, ufa…! — entrando na guilda como um filhotinho estava Sacerdotisa esguia e graciosa. Ela se sacudiu vigorosamente, limpando a neve de sua capa. Ela respirou com as mãos trêmulas, suspirando de alívio por estar dentro do calor — Olá a todos, estou de volta agora…
— Bem-vinda de volta — disse Alta Elfa Arqueira com um aceno tímido de sua mão — Como estava o Templo?
— Está tão frio este ano. Há uma gripe horrível por aí… — o rosto de Sacerdotisa caiu.
As temperaturas do inverno foram castigantes este ano. Se fossem apenas os espíritos do gelo sendo mais ativos do que o normal, isso estaria pelo menos dentro dos limites dos fenômenos naturais. Como uma serva da Mãe Terra, ela simplesmente teria que aceitar isso sem amargura ou reclamação e tentar o seu melhor para lidar com isso…
Mas a doença que se espalhava era ruim o suficiente para que, para tratar os aflitos, exigisse chamarem Sacerdotisa, que não estava mais trabalhando como parte da equipe do Templo, o que era algo digno de nota. Mesmo se a pessoa em questão aceitasse tudo simplesmente sem nada além de um pensamento de “se é assim tudo bem”.
— Espero que não seja a peste negra ou a gripe ocidental — disse Anão Xamã — Aqui — ele serviu uma boa porção de guisado em uma tigela para Sacerdotisa.
— Obrigada! — disse ela, aceitando a comida quente com as duas mãos e provando — …É delicioso — ela nem mesmo quis dizer isso; tinha apenas escapado de sua boca, prova de que ela realmente sentia isso. Que alegria sentir o calor espalhar-se por todo o seu corpo.
Isso é pimenta?
O leve formigamento na ponta da língua indicava que poderia ser… não, deveria ser. Sacerdotisa acenou com a cabeça e tomou outro gole. Então, de repente, ela olhou em volta, aparentemente preocupada.
— Hum, onde está Matador de Goblins…?
— E a primeira coisa com que ela está preocupada é Orcbolg. Boooo. A nota de exasperação na voz de Alta Elfa Arqueira fez Sacerdotisa corar e olhar para o chão.
— Matador de Goblins? Receio que ele não esteja aqui hoje.
A resposta que Sacerdotisa estava procurando não veio da taverna, mas do prédio ao lado que cuidava dos negócios da Guilda. Garota da Guilda, tendo encerrado o expediente, enfiou a cabeça para dentro enquanto vestia o casaco, se preparando para ir para casa.
— Ele está fora em um trabalho?
— Uh-huh. É por isso que não vou ficar até mais tarde — Garota da Guilda deu uma risadinha, ignorando Lanceiro, que Bruxa já estava arrastando de volta para seu assento — Há algumas aldeias que não conseguem sobreviver ao inverno com este frio. Estaremos emprestando provisões para eles, então ele está ajudando na entrega.
— Então… a mulher da fazenda também está envolvida? — Sacerdotisa pensou brevemente na jovem alegre que vivia na fazenda com Matador de Goblins. Ela estava apaixonada pelas mulheres mais velhas ao seu redor, como Bruxa e Donzela da Espada, mas se sentia quase da mesma maneira por Vaqueira. Ela conseguia agir tão… natural.
— Sim. É um pouco trabalhoso, então acredito que eles não voltem por alguns dias — Garota da Guilda respondeu com uma nota de solidão em sua voz.
— Entendo… — Sacerdotisa assentiu, então se virou para olhar pela janela. A escuridão branca estava ficando cada vez mais densa. Quando ela pensou sobre como ele estava em algum lugar além daquela cortina, enquanto ela mesma estava em um lugar em que ele não podia vê-la…
Não pare, tenho que me controlar.
Sentimentos de mal-estar e solidão rodopiaram em sua mente, mas Sacerdotisa balançou a cabeça.
Ela não conseguia desenvolver o desejo de voltar para o Templo hoje. E era impossível praticar atirar pedras do lado de fora.
Acho melhor fazer o que puder.
Com esse pensamento em mente, Sacerdotisa disse, “Hum,” falando hesitante, mas claramente para Garota da Guilda.
— Se estiver tudo bem, posso pegar emprestado o Manual dos Monstros de novo?
— Ooh, uma pequena leitora ávida — Garota da Guilda disse com um sorriso— Certamente, espere só um minuto.
Sacerdotisa soltou um suspiro quando Garota da Guilda voltou correndo para o escritório como uma criança animada. Ela olhou para Alta Elfa Arqueira, que estava sorrindo em sua direção.
— S-sim?! O que foi?
— Não estamos ansiosos.
— Isso não é verdade — sussurrou Sacerdotisa em angústia, mas Alta Elfa Arqueira a ignorou.
— Esse tipo de coisa se perdeu em mim. Simplesmente não sou boa nisso. Mesmo se eu tentasse ler, tenho certeza de que ficaria apenas nas partes famosas. Como dragões, gigantes, vampiros — Alta Elfa Arqueira contou em seus dedos e de fato, aqueles eram todos monstros que até mesmo Sacerdotisa conhecia pelo menos por nome. Assim, ela decidiu não dizer mais nada, mas esperar pacientemente que Garota da Guilda voltasse.
Se eles descobrissem que a primeira página que ela folheava era sempre a dos goblins e como ela começava a ler a partir daí todas as vezes…
Sacerdotisa aceitou o Manual, de alguma forma se sentindo muito constrangida, e continuou lendo o mais discretamente que podia.
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— Ugh, eu não aguento isso!
Quando sua sobrinha entrou voando em casa com um grito já esperado, o dono da fazenda apenas acenou com a cabeça.
— Eu te disse. Disse que não deveria sair assim.
— Ah, mas…
Vaqueira respondeu sem muito entusiasmo, parecendo estranhamente à beira das lágrimas.
Sua expressão não era a única coisa incomum nela; suas roupas também eram diferentes. Ela usava uma camisa rendada que deixava seus ombros expostos. Um espartilho estava preso ao redor de sua cintura, enfatizando seu peito, também estava usando uma saia pregueada vermelha. O traje não era seu traje habitual de trabalho, nem o vestido que ela usara no festival, estava obviamente em suas melhores roupas.
Ainda assim, o proprietário falou em tom de repreensão, como se estivesse repreendendo a filha por fazer algo bobo.
— É inverno… há neve lá fora, pelo amor de Deus.
— M-mas acabei de comprar este novo… — ela esticou o lábio, mas suas palavras não tinham o poder de desafiar a realidade. Não depois que ela saiu voando ansiosamente porta afora e quase tão rapidamente voltou voando, com os ombros tremendo e a bainha da saia enrolada…
Estava frio, a saia tornava difícil andar e parecia sujeita a ficar coberta de neve e lama de qualquer maneira. E também, estava verdadeiramente frio.
— Como eu poderia não querer usar isso?
Todos esses fatores contribuíram para que ela voltasse correndo, segurando a saia e à beira das lágrimas. O proprietário dificilmente poderia deixar de ficar irritado.
— E se você pegar um resfriado usando isso, o que acontecerá?
Uma pergunta cruzou sua mente, ela teria começado a trazer pessoas para sua cama? Mas ele não tocou no assunto, ela nunca pareceu o tipo de fazer tal coisa. Ele ficou mais do que feliz em vê-la interessada em estar na moda, em sair, em fazer as coisas que uma garota de sua idade deveria fazer. O problema era…
…aquele com quem ela está fazendo aquelas coisas.
O proprietário soltou um pequeno suspiro, tentando não deixar sua sobrinha ver o que ele estava pensando.
— Em vez dessa saia, use calças de montaria ou algo assim. E coloque um casaco.
— Sim senhor…
Sua sobrinha desapareceu em seu quarto, claramente desanimada. O proprietário olhou da porta batida para a janela, de onde pôde ver a figura blindada parada na neve. Ele suspirou novamente.
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Matador de Goblins observou a queda insistente da neve. Ele ficou olhando para o céu, ao lado da carroça, que estava cheia de cargas e, o que era mais incomum, tinha um cavalo amarrado a ela.
— … — a respiração que emergiu da viseira do capacete de metal ficou branca antes de subir em direção às nuvens de chumbo.
Não era como se ele tivesse qualquer sentimento especial em relação à neve. As coisas que seu mestre lhe ensinou naquela montanha nevada eram muito brutais para serem chamadas de memórias queridas. No momento, ele estava pensando nas dificuldades de um grupo armado viajando pela neve, nos perigos potenciais e nos goblins. Ele teria que proteger a carga, o cavalo e ela também. Como ele deveria responder se encontrassem goblins?
Devo chamar meus amigos?
Seu escrúpulo em pensar na garota e nos outros como amigos havia quase desaparecido agora, mas essa “missão” não era oficial, praticamente um favor pessoal.
Melhor não, então.
— Desculpe deixá-lo esperando! — ele foi emboscado por uma voz alegre vindo da neve.
Ele olhou para ver Vaqueira correndo em direção a ele, sua respiração embaçando no ar frio. A pele de seus ombros expostos estava vermelha, quente com o sangue convocado pelo frio. Ela colocou um sobretudo para ajudar a se proteger das intempéries, puxando o capuz enquanto corria.
— O que você acha?
— Se você não está com frio, então está tudo bem.
— Sim? — ela quase parecia estar se divertindo mostrando sua roupa para Matador de Goblins, girando na frente dele.
— Suas pernas — disse ele, percebendo algo diferente de antes — Você está bem assim?
— Oh, essas calças? …Sim — Vaqueira acenou com a cabeça — Você gostou mais da saia?
— Ambos estão muito bons — disse ele, com uma voz baixa e rouca.
— Certo — Vaqueira disse, entrelaçando os dedos enquanto pensava — Acho que a saia é um pouco mais pesada. E deixa minhas pernas um pouco mais frias.
— Calças, então.
— Mas a saia não é mais bonita?
— …Não tenho certeza — enquanto ele falava, Matador de Goblins pulou no banco do motorista, agarrou as rédeas do cavalo com a mão direita, estendendo a mão para Vaqueira.
— Suba.
— Ah, claro — a mão dela, um pouco grande e musculosa para a de uma jovem, encontrou o caminho para a palma enluvada dele. Com seu aperto firme e silencioso, Matador de Goblins ajudou a puxá-la para o banco.
Seu traseiro bastante grande pousou no assento ao lado dele com um poompf e ela riu.
— Hee-hee — então disse — Ah, e as refeições embaladas…?
— As que você fez? — Matador de Goblins perguntou.
— Uh-huh — Vaqueira acenou com a cabeça novamente.
— Eu as trouxe.
— Ok, tudo bem, então — Vaqueira estufou seu peito generoso com orgulho, dando tapinhas gentis no braço do Matador de Goblins. Sua cabeça balançou para cima e para baixo, e então ele deu um estalo nas rédeas. O cavalo relinchou e avançou, as rodas da carroça ganharam vida, abrindo sulcos na neve.
Iria levar apenas alguns dias para chegar à aldeia que estava à espera dos suprimentos que carregavam. Uma entrega simples, nada a mais ou a menos.
O mundo estava fervilhando de monstros e bandidos estavam por toda parte; não existia uma viagem verdadeiramente segura, mas isso era um truísmo, um simples fato da vida.
Esta não era uma aventura, era apenas uma entrega.
Até Matador de Goblins pensava assim.
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A neve continuou caindo. O rangido das rodas do carrinho era o único som enquanto eles se moviam por um mundo que ficou branco. Na origem daquele som estava uma única figura escura, sentada em cima do carrinho. Matador de Goblins continuou a trabalhar nas rédeas silenciosamente; ao lado dele, ela descobriu que não conseguia dizer nada.
Ou melhor, não tinha ideia do que dizer…
Agora que pensava sobre isso, esta era a primeira vez que ela fazia qualquer tipo de viagem com ele, mesmo que durasse apenas alguns dias. Não era como quando eles tinham ido para a aldeia de Alta Elfa Arqueira. E não era como quando faziam uma de suas entregas regulares.
Tão estranho.
Vaqueira mudou de posição, puxando os joelhos e soltou um suspiro. Ela se sentia como se tivesse estado com ele praticamente todas as vezes que estava na cidade, mas agora tudo o que ela podia fazer era ficar sentada em silêncio, olhando para a lateral do rosto dele. Parecia exatamente como sempre: um capacete de metal inexpressivo.
Eu me pergunto que expressão ele está fazendo…?
— Ei.
— Hwha?! — a maneira como ele falou de repente quando ela estava imersa em pensamentos fez com que seus ombros se sacudissem de surpresa — S-sim, o quê?!
— Você não está com frio?
— Er, uh, n-não… estou bem.
— Entendo.
Vaqueira acenou com a cabeça e esse foi o fim da conversa.
Por mais algum tempo, ouviu-se novamente apenas o som das rodas raspando na estrada. Os dedos de Vaqueira brincavam sem rumo na frente de seu peito rechonchudo. Ela respirou fundo e depois soltou o ar. Se ela deixasse a oportunidade escapar, eles continuariam assim.
— E-ei, uh…
— O que? — a resposta foi breve e suave. Ela sabia que era assim que ele sempre soava, mas por um instante ela foi quase oprimida.
— Um… — as palavras ficaram presas em sua garganta; ela fechou a boca, depois a abriu novamente — O-o que você normalmente… fala?
— Usualmente?
— Tipo, quando você está em uma aventura… quero dizer, com seu grupo.
Ele resmungou baixinho e não respondeu imediatamente. Talvez ele estivesse procurando as palavras certas. Como sempre.
— …Nada em particular.
Essa foi toda a resposta que ela obteve, curta e sucinta.
— Ah, tudo bem — ela sussurrou e olhou para baixo. A neve estava se acumulando em seu capuz e ela sentiu um arrepio percorrer seu corpo.
Estava tão, tão frio.
— ………………… Iniciando…
— Huh? — a palavra a pegou de surpresa e ela piscou.
— Iniciar uma conversa não é meu forte.
— …Certo.
Ela sabia disso. Vaqueira acenou com a cabeça. Ela não lembrava se isso sempre tinha sido verdade, mas certamente era agora. Ela sabia muito bem.
— Então — ele disse e então parou por um momento — Então… eu escuto o que os outros dizem e só respondo.
— …Entendi — ela olhou para longe dele, para o céu. Ela viu flocos brancos de neve dançarem descendo das nuvens pesadas, como se tivesse vindo direto para eles. Viu sua respiração se transformando em vapor, misturando-se aos flocos de neve enquanto flutuava para longe.
— Bem então…
— Sim?
Vaqueira piscou enquanto olhava para cima, então deu apenas uma olhada para ele.
— Posso… Posso falar? Sobre, sabe… tanto faz.
— Sim.
Ele tinha respondido duas vezes agora com a mesma palavra, mas o rosto de Vaqueira se iluminou.
— B-bem, ok, uh…! Quando eu estava de folga há pouco tempo…!
— Certo.
— A recepcionista, as outras e eu, todas jogamos um jogo juntas. Algum tipo de… uh, alguma coisa de mesa…
Ela parecia estar se gabando para o garoto da porta ao lado. Sua conversa vagou sem rumo, não foi como se algo notável tivesse acontecido. Às vezes, as jogadas de dados eram boas, às vezes ruins. Ela falou do clima que a visitava a cada dia e das colheitas e dos animais da fazenda.
Ela falou sobre o que aconteceu enquanto ele esteve fora, como os outros aventureiros pareciam. Sua voz alegre saltou da neve, desaparecendo com o som das rodas. Ainda estava tão frio como sempre, mas Vaqueira não se importava mais.
Não era muito longe até a aldeia, mesmo com a estrada coberta de neve. E as pessoas estavam esperando por eles. Não seria bom chegar atrasado sem motivo. E ainda assim…
Gostaria que pudéssemos, talvez, ficar um pouco mais assim.
Ela balançou a cabeça com o pensamento constrangedor.
— Oh, isso mesmo. É quase meio-dia, se você quiser almoçar, devemos parar em algum lugar e…
Creak. A carroça parou.
— …? Ah, você quer comer aqui?
Sem resposta.
Ele estava olhando para a frente e parecia quase como se tivesse parado de respirar. Então o capacete virou para a direita, depois para a esquerda em movimentos rápidos. Ele olhou para ela? Não, não era isso, seu olhar tinha ido além de Vaqueira, para onde a neve estava se acumulando em montes de neve.
— Uh, ei…?
— Isso é ruim — disse ele rapidamente, severamente.
Um instante depois, a neve pareceu explodir para cima, empinando no ar.
— Eek?! — Vaqueira, assustada e perplexa, foi jogada de lado. Algo alojado no banco do motorista com um thunk onde sua cabeça estivera meio segundo antes.
Uma lança…?!
Vaqueira havia sido jogada no chão, mas ela ficou surpresa ao descobrir que não sentiu muito impacto.
O motivo era claro: ela estava envolvida em seus braços. Ela enrijeceu quando a compreensão a atingiu.
— Er, uh, o que… o quê…?!
— GROORBB!!
Esse grito inarticulado foi toda a resposta de que ela precisava.
— GBB! GOROB!
— GROBR!
Sombra após sombra após sombra após sombra ergueram-se da neve, deixando de lado os panos que os cobriam. Rostos horríveis torcidos pela luxúria, eles eram monstros segurando armas de todo tipo. Eram quase tão grandes e tão fortes quanto crianças e tinham a mesma inteligência cruel. Eles eram os mais fracos de todas as criaturas que Não-rezam, encontradas em todos os cantos do mundo.
— G-goblins…?!
— Por aqui! — Matador de Goblins não hesitou. Ele deu um puxão forte na mão de Vaqueira e saiu correndo como uma flecha.
— O q-que… e o cavalo e nossa carga…?!
— Considere-os perdidos.
Falhamos. A resposta padrão teria sido ignorar o ataque e fazer o cavalo correr o mais rápido possível, atropelando os goblins com velocidade total, mas, felizmente… não, ele não deixou seus pensamentos irem mais longe. A explicação para suas ações estava próxima, na verdade, estava literalmente em sua mão. Não havia necessidade de pensar em mais nada.
— 1!
— GGOORBG?!
Matador de Goblins se chocou contra um dos goblins que os cercavam. Antes que a criatura pudesse responder, ele sacou sua espada e a apunhalou na barriga. Era um ponto vital; o goblin morreu sem conseguir respirar fundo. Matador de Goblins chutou o cadáver, puxando sua espada; ele nunca parou de correr.
— GOR! GOBG!
— GBBGR!
— Heek?!
Pedras voando, gritos de goblins, lanças, cadáveres. Ela não sabia a quem estava reagindo.
Ouvindo o grito assustado atrás dele, Matador de Goblins apertou sua mão. Ele não podia usar o escudo com a mão esquerda. E suas costas ficaram expostas. Ele teria que empurrá-los enquanto prestava atenção absoluta. Quais eram suas chances?
Ele pensou que quase podia ouvir o som de dados sendo rolados acima de sua cabeça, mas para o inferno com Destino e Chance.
Através da neve podiam ser ouvidos os últimos relinchos desesperados do cavalo sendo comido vivo. Matador de Goblins lançou um olhar por cima do ombro. Ele viu seu rosto; ela parecia prestes a chorar a qualquer momento.
Ele continuou correndo. Não havia outra opção.
— Ei… Ei… esse cavalo…! — ela puxou sua mão, sua voz trêmula — O pobrezinho vai morrer…!
Matador de Goblins não disse nada, apenas olhou para frente e correu.
Não porque optou por não falar, ele não conseguiu.
Ele também não conseguia olhá-la no rosto, não poderia dizer a ela o quão grato ele estava pelos goblins terem sido distraídos pelo cavalo. Que tipo de expressão ele deveria usar ao dizer a ela uma coisa dessas? Não importava que seu rosto estivesse coberto por um capacete de metal.
Certamente até ela estava mais preocupada com sua segurança; não, talvez a segurança dele do que a do cavalo, mas como ele poderia obter qualquer satisfação com isso?
— GOOROBG!!
Então ele pegou tudo isso e jogou no goblin à sua frente.
O monstro estava correndo, ansioso para receber sua parte, não querendo ser deixado para trás por seus companheiros. Matador de Goblins pode ter percebido isso, ou não; independentemente, ele golpeou a criatura com sua espada.
— ?!
O goblin, com o cérebro derramado pela lâmina, caiu morto sem nunca perceber o que havia acontecido.
— Dois! — Matador de Goblins agarrou a clava do cinto do monstro enquanto ele corria. Era um item tosco feito de osso. Um fêmur humano, provavelmente.
— Ugh… Errgh…! — Vaqueira forçou de volta o que ameaçava surgir, levando a mão livre à boca. Eles mal tiveram tempo para ajoelhar e vomitar.
Em vez disso, ela agarrou sua mão cada vez mais forte. Se ele a soltasse, não que houvesse chance de ele fizesse tal coisa, ela não sabia o que faria. Subitamente tomada pela sensação de que poderia ser deixada sozinha, ela estremeceu por causa de algo decididamente separado do frio.
— O-o que vamos fazer…? — ela perguntou, incapaz de evitar o tremor em sua voz — A cidade fronteiriça… É por aquele caminho, não é?
— Não podemos voltar — sua resposta foi sucinta e imparcial — Os goblins estão nos emboscando.
— Então…
— A aldeia deveria estar por perto — disse ele e então acrescentou — Pelo menos costumava estar.
Vaqueira engoliu em seco, engolindo não apenas sua saliva, mas também as palavras que ela estava prestes a dizer.
Com tantos goblins…
…A aldeia poderia ter sobrevivido?
Ela sabia que só iria distraí-lo fazendo a pergunta em voz alta.
E então havia a neve. Ele poderia ter conseguido voltar para a cidade a pé, mas ela duvidava que ela mesma pudesse. Havia apenas uma estrada.
Aquela garota… Se ela…
Aquela sacerdotisa que sempre estava com ele… o que ela faria?
Vaqueira nunca se interessou em se tornar uma aventureira, mas agora ela lamentava não ser. Se ela fosse, se ela tivesse sido…
— Eles estão vindo!
— C-certo! — ela foi trazida de volta à realidade de suas reflexões quase escapistas. No mesmo momento em que ele falou, ouviram-se dois gritos horríveis. Ela podia ouvi-los mesmo durante a nevasca.
— GOROGB!
— GBG! GOOBG!
Goblins!
Um aventureiro e uma jovem, os goblins devem ter sentido que já haviam vencido. Eles se aproximaram, praticamente explodindo de desejo, os rostos iluminados por uma alegria nojenta. Era mais do que suficiente para aterrorizar Vaqueira e fazê-la querer gritar. Sem aviso, ela sentiu algo quente escorrer por suas pernas e então não sabia mais o que fazer.
Mas ele fez.
— Três!
Ainda segurando a mão de Vaqueira, ele deu um grande passo para frente, trazendo a clava do alto sobre sua cabeça.
Goblins são mais baixos que humanos. Os humanos também têm membros consideravelmente mais longos.
— ?!
O goblin foi incapaz de diminuir a distância entre eles antes que sua cabeça fosse esmagada e seu cérebro estivesse espalhado por toda a volta. O cadáver tombou, rapidamente escondido de vista pela neve.
O preço que Matador de Goblins pagou foi que a clava que ele segurava quebrou. Às vezes o osso era simplesmente frágil.
— GGBBGRO! — o goblin restante sorriu quando viu isso. Seu inimigo agora estava desarmado. A vitória era dele. Ele mataria esse homem, não, enquanto o aventureiro observava, ele pegaria a garota e…!
— ?!
Mas não era para ser.
Sem hesitar, Matador de Goblins enfiou o osso quebrado no olho do goblin. O fragmento perfurou o frágil globo ocular e penetrou no cérebro do monstro. A morte foi instantânea, a criatura deu uma cambalhota, caindo na neve, onde continuou a se contorcer.
Matador de Goblins esmagou sua mão sob os pés e estabilizou sua respiração.
— Você pode continuar?
— Eu… estou bem… eu acho.
Vaqueira não sabia o que estava bem, no entanto. Ela só sabia que devia estar horrível.
— Vamos lá — ele deve ter notado sua aparência, mas não disse nada sobre isso.
Ele provavelmente está sendo atencioso.
— Certo — Vaqueira disse em uma voz quase imperceptível e acenou com a cabeça, segurando sua mão de novo. Ela não conseguia se imaginar partindo. Sem dúvida ela se sentia assim há algum tempo.
— GOROBG!!
Houve mais gritos aterrorizantes. Ele deve ter notado muito antes dela.
Segurando a mão de Vaqueira, ele avançou, cortando de lado a forma que apareceu através da nevasca. Algo escuro respingou na neve branca.
— GOROBOGO?!
O uivo inarticulado não pertencia a nenhum humano. Era horrível e distorcido, a voz de um goblin.
O monstro se debateu e lutou em meio ao turbilhão. Uma lâmina o atravessou como o frio do gelo. O monstro gritou uma vez e então nada mais pôde ser ouvido.
…Não, havia outra coisa.
Caminhando descuidadamente pelo tapete de gelo e neve estava uma única figura solitária, um aventureiro.
Ele tinha um capacete de metal de aparência barata, armadura de couro encardida, um pequeno escudo redondo no braço e uma espada de um comprimento estranho no quadril.
Manchado de vermelho e branco por respingos de sangue e neve, o aventureiro disse calmamente, como se não tivesse acabado de tirar uma vida.
— Cinco.
Misericordiosos e frios, os lindos flocos dançantes, as fadas da neve, já cobriam todos os corpos. Ou talvez para eles, o branco puro em si fosse lindo e eles estavam simplesmente sobrescrevendo o mundo inteiro. Logo um véu de neve seria colocado sobre os cadáveres frescos.
Para ele, um goblin vivo era motivo de grande preocupação, mas um morto mal valia a pena se considerar. Ele caminhou pela neve caindo silenciosamente, permanecendo alerta enquanto falava em seu tom baixo de costume.
— Vamos lá.
— C-certo…!
A voz em resposta era frágil, tremendo como uma bola que foi lançada com força contra o chão. A garota que emergiu da neve atrás dele estava pálida, tentando desesperadamente o acompanhar, tinha cabelos ruivos e um peito amplo. Não era apenas o frio que a fazia estremecer.
— V-você tem certeza sobre isso………?
— Não vejo problemas — disse ele, então pensou por um momento e acrescentou reflexivamente — Nem para mim, nem para o que está ao nosso redor.
— O-ok…
— Você está bem?
A situação não era propícia para relaxar. Ainda assim, ela forçou sua expressão rígida a suavizar-se um pouco, não parecia muito com o sorriso que ele estava acostumado a ver dela, no entanto.
— Sim, estou bem… estou bem.
Ele acenou com a cabeça, depois baixou os quadris e começou a caminhar, ainda vigilante. Ela o seguiu com uma enxurrada de passos curtos e rápidos. A maneira como ela constantemente esquadrinhava a área ao seu entorno tornava sua ansiedade muito óbvia.
Ela tropeçou em algum galho, o que a fez pular. Sob a neve haviam árvores podres. Pedras também. E provavelmente ossos humanos.
Houve uma aldeia aqui, uma vez. Há muito, muito tempo.
Não aquela em que ele e ela tinham vivido, aquela terra já tinha um novo uso, uma instalação de treinamento para aventureiros estava sendo construída nela.
Aldeias em ruínas podem ser encontradas virtualmente em qualquer lugar. Talvez goblins tenham feito isso, ou uma epidemia, ou um dragão.
Ele sabia disso e ela também.
Embora ele entendesse totalmente, ela nunca havia sentido na pele antes.
Acima do vento uivante, o cacarejo vil dos goblins ecoou.
E agora, finalmente, ela entendeu o que significava se aventurar onde os goblins moravam.
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— Ahhhh, meu Deus, o que fazer, o que fazer… — a voz queixosa de Alta Elfa Arqueira soou na taverna. Esticada sobre a mesa, agitando os braços e chutando as pernas, ela parecia a própria imagem de uma criança.
— …Você tem realmente dois mil anos de idade, é?
— Claro que tenho. Que rude.
— Você teria sorte de se passar por treze — Anão Xamã suspirou exasperado do fundo do coração e tomou um gole de sua xícara.
O sol estava se pondo e uma letargia havia se apossado da assembleia de aventureiros embriagados na taverna.
A neve era abundante, o vento forte e frio. Seria preciso muita necessidade de dinheiro para sair para aventurar-se em uma noite como esta.
— Aquele Matador de Goblins, ele não tem nada além de tempo em suas mãos — Cavaleira tinha reclamado antes, junto com outras coisas do tipo, mas agora ela estava completamente dominada pela bebida. Ela foi jogada para a frente como um remador em um barco; no que parecia ser um mar de baba.
Guerreiro de Armadura Pesada olhou para ela e grunhiu.
— Sem esperanças. Você não é mais adulta do que as crianças.
Ele a ergueu em seu ombro. Na verdade, Garoto Batedor, Garota Druida e o Guerreiro Meio-Elfo não estavam em lugar nenhum. Os dois mais novos foram mandados para a cama mais cedo, enquanto Guerreiro de Armadura Pesada acompanhava Cavaleira em suas canecas de chopp.
— Vamos encerrar a noite — disse ele — Não fiquem todos de ressaca.
— Maldito… Se vai levar uma garota para seu quarto, trate-a como se ela fosse uma princesa…
— Sim… você, uma princesa. Certo… — Guerreiro de Armadura Pesada ignorou o murmúrio sonhador de Cavaleira, as escadas rangendo enquanto ele subia.
— Certo — disse Lanceiro e lançou um olhar furtivo para Sacerdotisa — Você não precisa dormir um pouco, mocinha? Você trabalhou no templo de novo hoje, não foi?
— Estou bem — disse Sacerdotisa, piscando suas pálpebras pesadas — Algo pode… acontecer…
— Você está obcecada — Lanceiro bocejou indiferente — Você poderia esperar a noite toda hoje; ele não vai voltar tão cedo.
— Não é exatamente por isso que eu…
…estava esperando. Sacerdotisa coçou a bochecha timidamente, olhando para baixo enquanto Bruxa ria para si mesma. Ela entendeu como seus sentimentos eram transparentes, mas não pôde evitar ficar envergonhada. Tentou disfarçar acrescentando — M-mas você está certo; apenas ficar esperando sem fazer nada…
Alta Elfa Arqueira encolheu os ombros.
— Que tal um pouco de RPG de mesa, então? — ela olhou para a mesa da recepção, que agora estava vazia. Garota da Guilda, que partiu na neve após o término de seu turno, não estava em lugar nenhum; ela provavelmente estava confortável em casa agora. A recepcionista do turno da noite estava tentando evitar o sono com um pouco de chá, preenchendo a papelada sem pensar.
— Porém, não temos gente suficiente, então não poderíamos continuar com nossa aventura.
— Nesse caso… — Lagarto Sacerdote, que estava perto da lareira, esticou o pescoço comprido — …E se considerássemos uma aventura de verdade?
— Não há gente suficiente para isso também!
Por gente, neste caso, ela realmente se referia às pessoas da linha de frente da formação.
Matador de Goblins, Sacerdotisa, Alta Elfa Arqueira, Anão Xamã, Lagarto Sacerdote. Ela estava bem ciente de que para um grupo abençoado com três lançadores de feitiços como eles eram, seria egoísta pedir muito mais, mas era verdade que eles só tinham um membro verdadeiramente da linha de frente.
Sacerdotisa olhou para Lagarto Sacerdote. Ele certamente era robusto, é claro.
— Sem Matador de Goblins, não é fácil, hein?
— Não sei se podemos realmente chamar um esquisito como ele de guerreiro adequado, no entanto — Alta Elfa Arqueira disse com uma gargalhada e uma nota de afeto em seu tom.
— Isso é verdade — Sacerdotisa disse ambiguamente, incapaz de negar.
Um guerreiro, hein?
Ela pôs um dos dedos longos e finos nos lábios, pensativa, os olhos fixos em Lanceiro.
— …Er, vocês dois formam um grupo há muito tempo?
— Hrm? — Lanceiro ergueu uma sobrancelha — Ah… Eh, cinco ou seis anos agora, ou… um pouco mais, talvez?
— Sim… cerca desse tanto… de tempo — Bruxa apertou os olhos com familiaridade e deu um sorriso amoroso — Algo… em sua… mente?
— Bem, uh, er… — presa no lugar por aqueles lindos olhos, Sacerdotisa tagarelou e tentou decidir para onde olhar. Negar parecia insuportavelmente infantil — …M-mais ou menos?
— Heh-heh… — evidentemente se divertindo, Bruxa tirou um cachimbo de seu amplo peito, sussurrou algo e bateu na ponta com um dedo. Houve um Fooshe e uma luz fraca apareceu; Bruxa deu uma longa tragada no tubo, seu corpo esguio se movendo quase ansiosamente. Então ela abriu os lábios como se estivesse dando um beijo, produzindo um anel de fumaça de cheiro doce.
— Tudo… a seu tempo… — ela disse, uma risada saindo de sua garganta — Você… vai chegar lá… Tudo a seu tempo.
— …Certo — Sacerdotisa assentiu resolutamente, então deixou seus olhos caírem em direção a seu copo de leite, agora morno.
Mas quanto “Muito” de tempo era considerado um “bom tempo”? Até que ela se tornasse uma aventureira com classificação Prata? Ou até que ela não estivesse mais preocupada em ser deixada sozinha?
Ou talvez… até que seus preconceitos tivessem desaparecido?
Sentindo-se como se Bruxa tivesse detectado aquele lado feio dela, Sacerdotisa levou o leite aos lábios com algo como convicção.
— …Uh, tem um segundo? — uma voz gritou hesitante.
— ?! — Sacerdotisa tossiu e quase engasgou, então se virou para ver dois aventureiros familiares.
Eram Clériga Aprendiz e Guerreiro Novato, duas pessoas mais ou menos da idade dela que pareciam ter quase superado seus apelidos. O jovem estava usando uma armadura de couro bem usada e carregando uma clava (na verdade, uma vara longa talvez um pouco estreita para esse termo) e ele tinha uma espada em seu quadril. Um protetor de cabeça de couro pendurado em seu ombro. Ele parecia quase um guerreiro talentoso.
Quanto à clériga, ela não parecia muito diferente, mas a maneira como se portava era mais composta e confiante.
E eu…?
E quanto a ela? Sacerdotisa apenas sorriu, com cuidado para não deixar o pensamento aparecer.
— Algo de errado?
— Na verdade, nós, uh… Parece que vamos ser promovidos… — coçando a bochecha timidamente, Guerreiro Novato explicou que a decisão já havia sido tomada não oficialmente.
— Nossa — Sacerdotisa disse, seus olhos arregalados e então ela bateu palmas — Parabéns para vocês dois!
— Eu acho, mas quero dizer, ainda é apenas de Porcelana para Obsidiana.
Da décima à nona classificação. E quanto a ela? Ao lutar contra aquele ogro nos esgotos, ela tinha… Não, antes disso, ela havia sido salva por ele, depois se juntou a seu grupo atual; isso permitiu que ela avançasse mais rapidamente. Caso contrário, ela estaria no mesmo lugar que os dois jovens diante dela; isso se ela tivesse sobrevivido à primeira caverna.
Mas… hã? Sacerdotisa inclinou a cabeça com curiosidade. Ela tinha mostrado a ele a prova de sua promoção com tanta alegria…
— Nenhum de vocês parece muito feliz. O que está errado?
— Sobre isso — disse Clériga Aprendiz franzindo as sobrancelhas — Quando eu disse ao Templo, houve um comunicado…
Comunicados eram entregues pelos deuses a seus seguidores: mensagens, profecias e, às vezes, comandos. Ninguém poderia ser forçado a segui-los, mas houveram muito poucos que os ignoraram. Afinal, que benefício haveria em fazer isso? Supondo que alguém não fosse obcecado por matar goblins.
Assim, Sacerdotisa adivinhou rapidamente qual deveria ser o problema.
— Ouvi dizer que as provações impostas pelo Deus Supremo podem ser muito difíceis. É isso…?
— Uh-huh — Clériga Aprendiz assentiu, desanimada como uma criança que se perdeu na estrada — Vá avante para o pico norte, ele diz. Mas…
— Nós passamos todo o nosso tempo em torno de cidades, nunca no topo de qualquer montanha nevada — Guerreiro Novato disse, sua expressão sombria. Era verdade; se eles partissem agora, provavelmente acabariam mortos.
Sacerdotisa colocou um dedo nos lábios com um som pensativo. Na verdade, seu grupo havia se envolvido em uma batalha no topo de uma montanha nevada no inverno anterior. Foi uma provação difícil, que poderia ter sido muito pior para ela se não tivesse companheiros experientes com ela.
Verdade seja dita, ela estava pensando em simplesmente voltar ao Templo para trabalhar enquanto esperava por ele, mas…
O que ele faria?
— …São goblins?
— Huh?
— Oops… — Sacerdotisa riu desconfortavelmente e balançou a cabeça. Ela não quis dizer isso. Isso não faz diferença.
Não, não fazia diferença, mas ainda assim deu a ela o empurrão de que precisava. Ela cerrou o punho, bebeu resolutamente o resto do leite e pegou o cajado. Ela podia ver Bruxa acenar com a cabeça no limite de seu campo de visão. Ela acenou de volta.
— Eu gostaria de ajudar vocês — Sacerdotisa disse, sua voz falhando ligeiramente. Ela respirou fundo, falava como se estivesse orando — O resto de vocês se juntarão a nós?
— Uma aventura! — Alta Elfa Arqueira respondeu imediatamente. Ela chutou a cadeira para trás e se levantou de um salto, as orelhas tão retas quanto o braço que ela ergueu como voluntária — Estou dentro! Vou me gabar para Orcbolg sobre a aventura que tive que seguir enquanto ele estava fora!
— …E você acha que isso vai incomodá-lo? — perguntou Anão Xamã, firmando a mesa que Alta Elfa Arqueira quase derrubara. Ele juntou o resto da comida e começou a mastigá-la como se quisesse insinuar que, de outra forma, seria um desperdício. Ele engoliu com um gole de vinho de fogo e depois arrotou ruidosamente.
— E você, Escamoso?
— Estou muito lisonjeado ao ver minha ajuda procurada. Isso acontece muito raramente — Lagarto Sacerdote falava com sua gravidade usual, mesmo enquanto ficava perto da lareira, tentando absorver seu calor — Eu mesmo não tenho objeções. Afinal, um pouco de frio não vai estragar a comida. Ah, cultura é uma coisa boa!
Ele parecia querer dizer que, contanto que tivesse queijo, tudo ficaria bem; Alta Elfa Arqueira cedeu e encolheu os ombros com altivez.
— Então? E você, anão? Um pouco de frio não deve incomodá-lo, com todo o seu isolamento.
— Uma boa surra te curaria desse seu preconceito desagradável — Anão Xamã escovou as migalhas da barba, içando-se da cadeira — Não tenho intenção de te impedir, mas…
— Mas o que? — as orelhas de Alta Elfa Arqueira agitaram-se com desconfiança.
— O que fazemos sobre a recompensa?
— Ah! — a exclamação de surpresa veio de ninguém menos que Sacerdotisa.
Eu não tinha pensado nisso…!
O que fazer…? O que fazer?
Sacerdotisa, andando de um lado para o outro, não conseguiu encontrar nenhuma resposta. A onda de coragem que ela sentiu um momento antes murchou. O menino e a menina também pareciam que iam chorar. Eles não tinham nenhum dinheiro.
Então…
— Dividam em… metade e… metade — o resgate veio na forma de uma voz ao lado deles. Sacerdotisa olhou para ver Bruxa piscando para eles como uma criança travessa — Como… bons… amigos.
— …Ela está certa — disse Lanceiro, que observava os procedimentos em silêncio — A melhor coisa a fazer em uma busca como essa é dividir tudo o que você ganha com isso.
— Oh, b-bem, vamos fazer isso então! — o rosto de Guerreiro Novato se iluminou imediatamente.
Clériga Aprendiz o cutucou na lateral do corpo.
— O que o deus nos disse para ir buscar, porém, não podemos dividir! — Guerreiro Novato pareceu decepcionado, mas ela o ignorou.
— Hmm — disse Anão Xamã, balançando a cabeça com satisfação — Parece bom para mim.
— … — Sacerdotisa não podia dizer nada. Ela se sentou pesadamente em sua cadeira, olhando para sua caneca. Estava vazia. Não havia mais nada dentro.
Alta Elfa Arqueira havia feito a bola rolar; todos os seus amigos estavam conversando animadamente sobre o que iriam fazer. Ela estava feliz por isso. Ainda bem que eles aceitaram sua sugestão, mas…
— …Vamos amanhã, quando a neve diminuir um pouco.
A noite que viria ainda era longa, a neve ainda caía rápido.
Tradução: Nero
Revisão: Sonny
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