Matador de Goblins

Matador de Goblins – Vol. 05 – Cap. 02.1 – Combate em Massa

 

 

Querido Matador de Goblins,

 

Espero que esteja bem quando essa carta chegar. A época dos espíritos da neve chegou, e o frio também. A saúde de um aventureiro é o seu recurso mais importante nessa época do ano. Por favor, tome cuidado para não ficar doente.

Quanto a mim, estou surpresa, mas feliz em dizer que depois de nosso último encontro, não tive nenhum sonho com goblins, e de fato, as coisas tem corrido pacificamente. É tudo graças a você e seus amigos. Envio-te minha sincera gratidão. Gostaria de ter escrito mais cedo e estou envergonhada por nem conseguir alegar falta de tempo para desculpar a intempestividade dessa carta.

Aliás, sinto que é bastante inapropriado de minha parte incomodá-lo de imediato novamente; então devo pedir seu perdão, pois é exatamente o que pretendo fazer. Acontece que há uma missão que gostaria de pedir-lhe para aceitar.

É uma história bastante comum: uma certa nobre jovem fugiu da casa de seus pais para se tornar uma aventureira. Ela pegou uma missão, após a qual todas as comunicações dela cessou; um desfecho triste, mas também não incomum. A de seus pais que visitaram a Guilda para oferecerem uma missão para encontrar a garota, também não é especial.

A única coisa que quero registrar é que a missão que a garota empreendera era uma de goblincídio.

Tenho certeza de que está vendo onde isso vai parar.

A missão de busca que seus pais deixaram, estabelecia que “os aventureiros mais confiáveis e de alto níveis” devem ser aplicados. Mas é claro, dificilmente alguém nos ranques avançados assumem missões de goblincídio. Quando a Guilda me consultou sobre o assunto, não pude pensar em ninguém além de você.

Conhecendo-te, tenho certeza de que está muito ocupado (ouvi sobre o que se passou no festival da colheita), mas se possuir um pouco de tempo livre, pedir-lhe-ia que usasse ele para proporcionar ajuda a uma jovem infeliz.

Rezo pela sua boa saúde e segurança.

 

Atenciosamente,

 

— É de Donzela da Espada. Ela diz que está rezando por você… Cartas humanas são tão fervorosas. — A voz de uma elfa animada soou claramente na estrada nevada.

A estrada se estendia sem parar pela planície varrida pelo vento. A única coisa que poderia ser vista eram as árvores mortas e moitas cobertas de neve até o horizonte. O céu fora pintado de cinza por traços grandes e largos de nuvens; não havia nada de interessante para olhar para qualquer lugar.

Nesse mundo monótono, a voz animada e contente da elfa se destacou. Sua forma magra estava envolta de um traje de caçadora. Um arco estava pendurado em suas costas, e suas orelhas longas se agitavam alegremente.

A curiosidade felina de Alta-Elfa Arqueira não se limitava de modo algum as aventuras. Ela dobrou jovialmente a carta em sua mão, segurada com seus dedos longos, e a passou para trás.

— Não vejo muitas cartas. Elas são todas assim? — perguntou ela.

— Hmm…

A garota humana a qual passou a carta deu um sorriso ambíguo, parecendo um pouco acanhada. Mesmo quando pegou o pedaço de papel, ela parecia hesitante em ler.

Seu corpo esbelto estava coberto de cota de malha, sobre os quais pendiam vestes clericais, e em sua mão, ela portava um cajado de monge: ela era uma sacerdotisa. Era isso; essa missiva possuía o cheiro de uma carta de amor. Seria errado dizer que ela não se perguntou sobre isso, mas ela também não se sentia muito confortável em ler a correspondência de outra pessoa. Se alguém fizesse isso com ela, ela consideraria muito difícil de responder.

— Mas… Mas está ficando muito frio, não é?

Então, por isso, ela resolveu mudar o assunto da conversa, à força se necessário.

Quanto mais ao norte eles avançaram, mais pesado as nuvens no céu se tornaram, até que a luz do sol não pudesse penetrá-las. O vento estava ficando implacável, e às vezes trazia algo branco com ele.

Era inverno. Isso ficava óbvio o suficiente pela neve que começara a acumular ao longo da estrada.

— Estou com frio — disse Sacerdotisa. — Talvez seja culpa minha. Malha não me ajudará a me manter quente…

— É por isso que produtos metálicos não são bons! — Alta-Elfa Arqueira deu uma risada triunfante e estufou seu pequeno peito, com suas orelhas balançando para cima e para baixo orgulhosamente. Era verdade: sua capa de caçadora não possuía nada de metal.

— Feche a matraca — disse um conjurador anão. — Sinceramente, estou espantado por você estar confortável em roupas tão finas.

— O que é isso que ouço? Elfos são mais resistentes do que pensava?

Resistentes e lentos para pegar resfriados são coisas diferentes, moça — disse o anão, passando a mão na barba, e provocando um “o quê?!” raivoso da elfa vermelha.

Sua discussão foi tão barulhenta como sempre. Sacerdotisa sorriu. — Algumas coisas nunca mudam!

— Hm — uma homem-lagarto enorme assentiu ao lado dela. — Eu os invejo pela energia para fazer tanta confusão. — O sangue de seus antepassados, os temíveis nagas, fluía em suas veias; e ele era da tribo do sul. O corpo escamoso de Lagarto Sacerdote tremia no frio congelante da neve.

Sacerdotisa achou isso difícil de se observar e olhou para ele com preocupação. — Você está bem?

— É uma questão de meus ancestrais, que eram igualmente vulneráveis ao frio. Eu poderia estar em vias de extinção. — Lagarto Sacerdote revirou seus olhos imensos e sua língua saiu rapidamente para fora da boca. Ele continuou em tom de brincadeira: — Meu senhor Matador de Goblins parece bem calmo. Você deve ter bastante experiência nisso, imagino.

— …Não.

Lagarto Sacerdote falara com um guerreiro humano que liderava a coluna. Ele usava uma armadura de couro encardida e um capacete de aço de aparência barata. Uma espada de tamanho estranho estava em seu quadril, e um escudo redondo e pequeno estava atado em seu braço. Até mesmo um aventureiro novato provavelmente teria um melhor equipamento.

Matador de Goblins: era assim que as pessoas chamavam esse aventureiro, um homem do terceiro ranque, Prata.

A única coisa que era diferente do habitual era as flechas produzidas grosseiramente que ele segurava em cada mão.

— Antes eu aprendi meu ramo em uma montanha nevada. — Ele mexia nas pontas das flechas enquanto caminhava, sem olhar para seus companheiros.

— Oh-ho — disse Lagarto Sacerdote encantadoramente. — Não é um tipo de prática que poderia imitar. — Sua cauda sibilou.

Matador de Goblins, sem abrandar o ritmo, disse: — Não gostaria de fazer de novo.

Como sempre, não havia qualquer hesitação em seus passos; ele caminhava com coragem, quase com uma impetuosidade indiferente.

— Hum, Matador de Goblins, senhor! — Sacerdotisa foi apressadamente até ele com passos curtos como um passarinho, segurando seu cajado com ambas as mãos. — Obrigada, hum, por isso. — Pedindo desculpa por fazê-lo interromper sua atividade, ela passou a carta de volta para ele. Foi uma boa oportunidade, já que Alta-Elfa Arqueira e Anão Xamã ainda estavam ocupados discutindo.

— Você entendeu o essencial da missão? — Ele segurou as flechas com uma das mãos, pegando jovialmente a carta com a outra e dobrando. Sacerdotisa apanhou um vislumbre do interior da bolsa de itens que ele colocou a carta. Como de costume, estava repleta de todo o tipo de coisas aparentemente aleatórias. Mas para ele, havia uma ordem nela, uma organização, e ele certamente considerava tudo ali necessário.

Talvez eu devesse tentar organizar meus itens com um pouco mais de cuidado também…

Sacerdotisa fez uma nota mental para perguntá-lo sobre isso e assentiu. — Hum… Precisamos resgatar uma mulher, certo? Dos goblins.

— Isso mesmo. — Matador de Goblins assentiu. — Em outras palavras, é uma missão de goblincídio.

E isso, mais ou menos, não passava disso. Pouco depois do festival da colheita na cidade fronteiriça, uma carta chegara da cidade da água. Era da arcebispa do Deus Supremo de lá — conhecida como Donzela da Espada — e tal como antes, a carta endereçava Matador de Goblins pelo nome.

Esse aventureiro excêntrico certamente não recusaria qualquer trabalho envolvendo goblins. E assim Sacerdotisa, que trouxera notícias para eles desde o templo, juntamente com Alta-Elfa Arqueira, Anão Xamã e Lagarto Sacerdote, foram para o norte com Matador de Goblins.

Era o início da tarde, e eles logo chegariam na pequena aldeia ao pé da montanha nevada.

— Espero que esteja tudo bem com a garota…

— Espero que esteja tudo bem com a garota…

— Sim. Detesto pensar nisso… — Alta-Elfa Arqueira, aparentemente cansada de discutir, balançou a mão como que para enxotar o pensamento terrível. Seu tom era leve, mas suas orelhas caídas falavam em nome da tristeza que sentia. — Honestamente, duvido que qualquer refém de goblin esteja segura.

— Bem… Hum…

Sacerdotisa e Alta-Elfa Arqueira deu uma a outra um sorriso tenso, e estava claro do que estavam se lembrando.

— Se ela estiver viva, iremos resgatá-la. Se estiver morta, traremos parte do seu cadáver, ou seus pertences de volta.

Tais horrores, claro, não eram de forma algum exclusiva de goblins. Seja goblins ou quer se trate de um dragão, nenhum aventureiro estava seguro nas garras de qualquer monstro. Então, a resposta de Matador de Goblins foi perfeitamente natural. Ele falou com uma voz calma e — quase mecânica — desapegada.

— …Deve existir uma forma mais agradável para dizer tudo isso — disse Alta-Elfa Arqueira com um aborrecimento compreensível, mas Matador de Goblins não pareceu notar.

— O que podemos fazer? — disse Sacerdotisa encolhendo os ombros e dando um sorriso impotente.

Lagarto Sacerdote interveio no tempo perfeito, não que ele estivesse necessariamente tentando facilitar as coisas para as garotas.

— Gostaria de saber qual motivo que os goblins teriam para atacar uma aldeia no meio do inverno. — Seu corpo imenso tremeu, quase teatralmente, como que para salientar o frio. — Não seria mais agradável para eles ficarem tranquilamente nas cavernas?

— Bem, Escamoso, isso se parece com os ursos, não? — respondeu Anão Xamã, afagando a barba branca. Ele destampou o frasco em seu quadril, tomando um gole e então estendendo para Lagarto Sacerdote. — Aqui. Aqueça um pouco seu interior.

— Ah! Tem a minha gratidão. — O sacerdote abriu suas mandíbulas enormes e deu um gole, depois recolocou a tampa e entregou o frasco de volta para Anão Xamã.

O anão deu uma sacudida no recipiente, ouvindo o som para julgar quanto sobrava, então pôs de volta no quadril. — Precisa de bastante comida, bebida e doces guardados para sobreviver ao inverno.

— Oh? Então parece que o outono seria o melhor momento para atacar uma aldeia. — Alta-Elfa Arqueira fez um círculo no ar com o dedo, e com toda a confiança de patrulheira que possuía, disse: — É isso que ursos e outros animais que hibernam fazem.

— Mas até os ursos se esgueiram de vez em quando no inverno — disse Anão Xamã. — E quanto a isso?

— Às vezes não têm escolha, como se não conseguirem encontrar uma boa caverna para dormir, ou se a caça foi magra no outono.

Ninguém sabia mais do que os elfos no que se refere à caça e armadilhagem. Tal é o fato que até o anão argumentador só pôde resmungar “acho que faz sentido” e assentir.

A conversa fez Sacerdotisa colocar o dedo nos lábios refletidamente e murmurar “hmm”. Ela sentia que possuía todas as peças na cabeça. Agora só tinha que uni-las…

— Oh! — exclamou ela quando a compreensão surgiu.

— O que foi? — perguntou Alta-Elfa Arqueira.

— Talvez — respondeu Sacerdotisa — seja exatamente porque o festival da colheita já acabou.

Sim, tem que ser. Mesmo enquanto falava, ela ficava cada vez mais certa.

— A colheita acabou — continuou ela — então os armazéns nas aldeias e cidades estão cheios. E os goblins…

— …querem tudo para si próprios — disse Lagarto Sacerdote, concluindo seu pensamento.

— Exato — disse Sacerdotisa assentindo levemente.

— Entendo. Então até mesmo os goblins são capazes tomar decisões lógicas ocasionalmente.

— Muito provavelmente só estão tentando causar o maior problema possível — disse Anão Xamã, puxando a barba.

— Não — disse Matador de Goblins, balançando a cabeça. — Goblins são estúpidos, mas não são tolos.

— Você soa muito seguro disso — disse Alta-Elfa Arqueira.

— Estou — disse Matador de Goblins, assentindo dessa vez. — Goblins não pensam em nada além de roubar, mas aplicam sua inteligência ao roubo.

Ele deu uma boa olhada nas flechas que vinha mexendo, depois as colocou em uma aljava em seu quadril. Ele pareceu satisfeito com o trabalho feito enquanto caminhavam. — Já experienciei.

— Entendi… — disse Sacerdotisa com um pouco de admiração.

Alta-Elfa Arqueira acrescentou o seu próprio hmm, mas não era nas palavras dele que estava interessada. O que chamou sua atenção foi o arco e flechas; que ela geralmente considerava sua própria especialidade.

— …Então, Orcbolg, o que fazia com essas flechas?

— Preparando-as.

— Oh, sério? — Ela estendeu a mão com um movimento tão suave que quase não pôde ser notado e pegou uma das flechas da aljava.

— Tenha cuidado. — Matador de Goblins parou com um aviso e não repreendeu a elfa, mostrando que ele estava acostumado com sua curiosidade. Ele, contudo, parecia um pouco irritado.

Alta-Elfa Arqueira fungou em confirmação e inspecionou a flecha. Era uma flecha perfeitamente normal e barata. A qualidade nem de longe se comparava a uma flecha élfica. A ponta possuía um brilho obscuro na luz do sol de inverno. Alta-Elfa Arqueira tocou levemente com o dedo.

— Não parece estar envenenada nem nada…

— Hoje não.

— Aw, seja legal! — A elfa franziu a testa com as palavras bruscas, mas fez um som de interesse quando virou a flecha. — A ponta da flecha não está fixada com firmeza. Ela vai soltar, sabe.

E, de fato, estava exatamente como Alta-Elfa Arqueira disse. Talvez por causa de Matador de Goblins futricando nela, a ponta da flecha barata já não estava fixada no lugar. Mesmo que ele conseguisse acertar o alvo, a ponta da flecha poderia muito bem romper, e quase certamente viria a traçar o ângulo errado.

— Orcbolg, você é um caso perdido. — Alta-Elfa Arqueira deu de ombros e balançou a cabeça, acrescentando “céus” para efeito.

Ela decidiu ignorar o anão atrás de si, que disse: “Você está demonstrando sua idade”.

— Aqui, me dê essa aljava. Vou consertar elas para você.

Ela estendeu a mão, mas Matador de Goblins apenas olhou para ela. Então disse: — Não — e balançou a cabeça. — Elas estão boas.

Alta-Elfa Arqueira olhou fixamente para ele, atônita. — Como assim?

— Porque não sabemos onde os goblins estão dormindo dessa vez.

— E como isso está conectado a essas flechas?

Não faz sentido!

Quando havia algo que Alta-Elfa Arqueira não concordava, ela poderia ser terrivelmente chata com isso.

Eles já se conheciam há quase um ano. Matador de Goblins suspirou. — Quando a flecha acerta, a haste se rompe, deixando apenas a ponta.

— Então?

— A ponta se tornará venenosa. — Ele estendeu a mão. Alta-Elfa Arqueira grunhiu e devolveu a flecha educadamente. Matador de Goblins pôs cuidadosamente de volta à aljava. — Enquanto eles não retirarem, mas simplesmente voltarem para seus buracos, sua carne começará a apodrecer, e a doença se espalhará.

E goblins não possuíam conhecimento em medicina; pelo menos por enquanto.

Um ninho apertado e sujo. Feridas que não curam. Putrefação. Uma doença grave. Isso significava…

— Provavelmente não irá matar todos, mas será um duro golpe.

— Como de costume, Orcbolg, seu plano não faz qualquer sentido para mim — murmurou Alta-Elfa Arqueira, com o rosto abatido. Ao seu lado, Sacerdotisa olhou para o céu como se estivesse angustiada.

Deuses. Ó deuses. Ele não diz por mal… bem, exceto com os goblins. Mas, por favor, perdoe-o.

Era muito tarde para ela ficar chocada com qualquer coisa que ele dissesse ou fizesse, mas ainda assim, ela se sentiu compelida a oferecer uma oração ocasional.

Matador de Goblins, se movendo rapidamente, olhou para ela. — Está assim tão surpresa?

— …Éé, bem, hum… — Sacerdotisa não pôde decidir bem para onde olhar. — Quero dizer, sendo você, Matador de Goblins, senhor…

— É mesmo? — disse ele calmamente, evocando uma risada de Lagarto Sacerdote.

— Não deixe isso te incomodar. É certamente um costume de meu senhor Matador de Goblins.

— Verdade, não é como se tivéssemos alguma ilusão sobre como Corta-barba pensa. — Anão Xamã pegou a garrafa de seu quadril e agitou o vinho para evitar o congelamento. Vinho de fogo podia praticamente queimar; isso foi o suficiente para trazer o cheiro de álcool no ar.

Alta-Elfa Arqueira se engasgou discretamente, apertando o nariz com uma das mãos e balançando o odor com a outra. Anão Xamã limpou algumas gotas da barba.

— Ainda não possuímos resposta para a nossa preocupação original — disse ele.

— Preocupação original? — perguntou Matador de Goblins. — Qual é?

— Não tem como a garota estar ilesa.

— Está falando das chances da garota raptada ainda estar viva.

— Correto. — Ele olhou para Matador de Goblins e esfregou mais energicamente a sua barba. — Eles estão aptos a comê-la, não estão? Caso contrário, terão apenas mais uma boca para alimentar. Eles não possuem qualquer razão para a deixar viver durante o inverno.

— O inverno é longo — disse Matador de Goblins, assentindo. Ele disse friamente: — Eles desejarão algo para passar o tempo.

Não muito depois, eles notaram uma coluna de fumaça subindo da aldeia na base da montanha.

 

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— Orcbolg…!

Alta-Elfa Arqueira foi a primeira a falar, com as orelhas se contraindo.

Seguindo a estrada, não muito longe, um pouco de fumaça subia. Porventura era de alguém fazendo comida? Não.

— Goblins?

— Uma aldeia. Fogo. Fumaça. O cheiro de queimado. Ruído, gritos… Parece provável!

— Então são goblins.

Matador de Goblins assentiu em resposta, e sem um momento de hesitação, ele pegou o pequeno arco em suas costas. Agora movendo-se rapidamente, ele pegou a corda com uma mão hábil, então ajustou uma flecha e puxou.

Ninguém teve que dar a ordem: o grupo inteiro seguiu atrás dele de imediato. Os goblins que atacavam a aldeia estavam obcecados no roubo; eles não destacaram nenhum sentinela e tampouco sabiam sobre os aventureiros que se aproximavam.

Como é que o grupo puniria os goblins por lhes dar estupidamente essa vantagem?

— Matador de Goblins, senhor — disse seriamente Sacerdotisa, a despeito do rosto tenso de nervosismo e respirar profundamente — devo preparar meus milagres…?

— Faça.

— Certo!

Sacerdotisa já era aventureira por um ano. Verdade, tudo o que fizera foi matar goblins, mas a densidade de suas aventuras era muito maior do que a maioria dos novatos. Essa foi a razão pela qual não tinha que perguntar qual milagre preparar, mas sim se ela deveria se preparar. Ela, afinal, conhecia Matador de Goblins a mais tempo do que qualquer outro membro do grupo.

— Ó Mãe Terra, abundante em misericórdia, pelo poder da terra conceda segurança para nós que somos fracos.

Ela segurou seu cajado de monge no peito e rezou à sua deusa. Foi uma atividade intensa o suficiente para consumir parte de sua alma. Um verdadeiro milagre, um que permitia sua consciência tocar a dos deuses nos céus.

Uma luz tênue, mas pura, desceu do céu, abraçando Matador de Goblins e Lagarto Sacerdote. Esse era o milagre Proteção, que salvara Matador de Goblins e os outros em diversos momentos de crise.

Lagarto Sacerdote correu, esmagando o chão, e entrecerrando os olhos enquanto a fosforescência o cercava.

— Hmm! Sua Mãe Terra é realmente capaz de milagres. Se ela fosse uma naga, talvez eu me convertesse para seu culto. Então…

Ele já havia acabado sua oração para seus terríveis antepassados, os nagas, e uma presa polida como uma lâmina estava em sua mão. Lagarto Sacerdote possuía agilidade o bastante para investir no inimigo a qualquer momento. Agora ele olhava suspeitosamente para a aldeia e gritou: — Meu senhor Matador de Goblins, devemos atacar os goblins ou proteger os aldeões?

Ele respondeu calmamente: — Ambos, é claro.

Alta-Elfa Arqueira deu um suspiro, admirada. Ela olhava cada centímetro à frente enquanto corria, com arco em mãos.

Mesmo enquanto avaliava a situação por si mesmo, Matador de Goblins disse a Lagarto Sacerdote: — O que você acha?

— …Não muito bom, receio. — O lagarto era um sacerdote guerreiro veterano, e seu discernimento carregava o poder da autoridade. — Não ouço o ressoar de espadas. Isso quer dizer que a batalha terminou; agora eles estão focados em roubar.

— Se acreditam que venceram, isso os tornará vulneráveis. Não sabemos a força deles, mas…

Mas isso era normal para esse grupo. Matador de Goblins não hesitou.

— Vamos pela frente.

— Guerreiros Dragãodente?

— Não. Explicarei por que depois. — Então Matador de Goblins acelerou o passo. Sacerdotisa estava completamente ocupada tentando acompanhar, enquanto Anão Xamã fortaleceu sua determinação, correndo o mais rápido que podia.

Matador de Goblins não era de enganar. Se dissesse que iria explicar, então iria. Foi por esse motivo que nenhum dos membros do grupo se opuseram. De qualquer forma, não havia tempo para discutir. Seu grupo não possuía um líder em si, mas quando se tratava de lutar com goblins, quem mais iriam seguir?

— Não usem poções. Mas não se segurem com suas magias.

— Vocês entenderam! — A resposta veio de seu conjurador, Anão Xamã. — Presumo que cabe a mim que magias usar? — Enquanto ele corria o mais rápido que suas perninhas conseguiam, o anão já alcançava sua bolsa e fuçava atrás de catalisadores.

Mesmo que fossem um grande número de inimigos, as chances de alguém conseguir usar magia eram pequenas; e não só porque lidavam com goblins. Era simplesmente assim que o mundo funciona. O fato de que três de seus cinco membros de grupo serem conjuradores era um sinal de quão abençoado eles eram.

— Sim, deixarei com vocês. — Matador de Goblins assentiu, então olhou para Alta-Elfa Arqueira. — Encontre um lugar alto e veja o que está acontecendo. Você será nosso apoio.

— Parece bom. — Ela deu um sorriso de satisfação parecido com um gato feliz. Com um movimento elegante, ela preparou seu arco grande e pôs uma flecha.

Tudo estava pronto. Mantendo os olhos em frente enquanto avançavam, Matador de Goblins disse: — Primeiro, um.

Uma flecha voou silenciosamente pelo ar, se enfiando na base do crânio de um goblin que estava recostado na entrada da vila.

— ORAAG?!

O goblin com morte cerebral avançou, mas não ficou claro se algum de seus companheiros notou.

— N-nããão!! Me… me ajude!! Mana! Irmãzona!!

Naquele momento, eles estavam ocupados arrastando uma garota de um barril onde estava se escondendo. Ela gritava e chutava, mas eles a agarraram pelo cabelo; os goblins não pareciam ter entendido ainda a situação.

No mesmo instante que o primeiro goblin caiu morto, flechas ponta-broto começaram a cair como chuva, adentrando olhos e pescoços.

— Ei, Orcbolg! Não é justo começar cedo! — Alta-Elfa Arqueira, com os lábios contraídos, ofereceu quase tantas queixas quanto flechas. Quando ela abatera os goblins, ela saltou, de barril, pilar, ao telhado. Foi um feito que apenas seria possível para um elfo, nascido e criado nas árvores, uma demonstração incrível de acrobacia.

— O quê? Hã…? — A aldeã encarava, incrédula.

Quando Matador de Goblins foi até ela, ele disse sucintamente: — Somos aventureiros.

A garota ainda era jovem; ela dificilmente seria mais velha que dez anos. Suas roupas eram simples, mas feitas de pele; ela estava claramente bem cuidada. Quando viu a insígnia de prata que estava ao redor do pescoço de Matador de Goblins, seus olhos se encheram de lágrimas.

Prata. Isso significava um aventureiro do terceiro ranque. O ranque de um aventureiro representava suas capacidades, assim como o quanto de bem social ele fizera. Era a forma mais importante de identificação na fronteira.

Matador de Goblins não se distraiu nem por um segundo; ele olhou em volta, falando rapidamente. — Onde estão os goblins? Quantos são? O que aconteceu com os outros aldeões?

— É, hum, eu… quer dizer, eu não… eu não sei… — Terror e lamento drenou a cor do rosto da garota, e ela balançou a cabeça. — Mas… todo mundo… eles se reuniram na praça da aldeia… Minha irmã mais velha, ela disse… ela disse para se esconder…

— Não gosto disso — cuspiu Matador de Goblins, preparando uma nova flecha de sua aljava. — Não gosto nada disso.

Seu sussurro continha um manancial de emoções. Sacerdotisa lhe deu um olhar observador, mas isso não a impediu de se ajoelhar em frente à menina.

— Está tudo bem — disse ela. — Vamos ajudar a sua irmã, tenho certeza disso.

— Sério?

— Sério! — Sacerdotisa bateu em seu próprio pequeno peito e deu um sorriso como uma flor desabrochando. Ela afagou suavemente a cabeça da garota que tremia, olhando em seus olhos enquanto lhe mostrava o símbolo da Mãe Terra. — Vê? Eu sirvo a deusa. E…

Sim, e.

Sacerdotisa balançou a cabeça. A garota seguiu seu olhar quando ela olhou para cima. A armadura imunda. O capacete de aparência barata. Um guerreiro humano.

— E Matador de Goblins nunca perderia para um goblin.

Matador de Goblins deu uma olhadela na garota e em Sacerdotisa, depois encarou a aldeia, onde sons de saques podiam ser ouvidos.

— O inimigo ainda não nos notou. Vamos lá.

— Esperem; existe perigo. — Lagarto Sacerdote apresentou sua perspectiva da situação soturnamente. — Goblins ou não, o inimigo parece ser organizado. Não podemos supor demais.

— Sua disposição de atacar em plena luz do dia sugere que pode haver tipos avançados de goblins com eles — disse Matador de Goblins.

Então, talvez eles não devessem deixar qualquer informação voltar ao ninho.

Depois de um momento, Matador de Goblins pegou as flechas, sugerindo matar aos poucos, e as devolveu às suas costas. Em troca, ele sacou a espada familiar com um tamanho estranho.

— Não quero arriscar que alguns deles escapem, mas vai ser difícil mantê-los encurralados na praça.

— Nesse caso, deixe que eu cuido da praça da cidade… pegar todos com magia. — Anão Xamã bateu em sua barriga como um tambor.

— Hmm — murmurou Matador de Goblins, rolando o cadáver do goblin de costas com seu pé.

Um couro bruto. Como arma, uma machadinha que deveria ter roubado de algum lugar. Sua cor estava boa; não mostrava sinais de fome.

— Depende da quantidade. — Matador de Goblins pegou a machadinha da mão do goblin, a colocando em seu quadril. Ele olhou para cima e viu Alta-Elfa Arqueira acenando do telhado. Suas orelhas longas estavam balançando; ela devia estava tentando perceber a situação pelo som.

— Há cinco ou seis deles na praça! — gritou ela de forma clara, e Matador de Goblins assentiu.

— Quantos na aldeia como um todo? Mesmo apenas o que consegue ver.

— Existem muitas sombras, por isso é difícil de contar. Mas diria não mais que vinte.

— Então essa é só uma unidade avançada — disse Matador de Goblins e começou rapidamente a formular uma estratégia.

Supondo que houvesse menos de vinte goblins, incluindo os três que mataram antes. Havia seis na praça. Isso significava que menos de catorze no perímetro, empenhados em pilhar. Era só um palpite, mas provavelmente não era descabido.

Face ao grande número de inimigos, dividir sua própria força era a coisa mais estúpida a se fazer, mas a situação era o que era.

— Vamos nos separar. Praça e perímetro.

— Nesse caso, vou ir para a praça com o mestre conjurador — Lagarto Sacerdote propôs.

— Muito bem. — Matador de Goblins assentiu.

Alta-Elfa Arqueira, que ouvira a conversa do seu local no telhado, falou sem tirar os olhos ou orelhas da aldeia. — Acho que vou dar apoio para você, anão!

— Parece bom, orelhuda! — Anão Xamã deu um gole em sua garrafa e limpou a boca em sua manopla, então bateu em sua barriga como um tambor. — Bem então, escamoso! Vamos?

Enquanto saía, Lagarto Sacerdote bateu forte no ombro de Matador de Goblins. — Lhe desejo sucesso na batalha, meu senhor Matador de Goblins.

— ……

Matador de Goblins não disse nada além de por fim assentir e começar a se mover. Seu andar era indiferente, mas seus passos não faziam som algum. Ele se aproximou do lado da casa, onde Sacerdotisa estava com a menina que salvaram.

— …A garota está bem?

— Sim. Acho que ela está um pouco menos assustada agora… — Sacerdotisa deu um sorriso otimista. Atrás dela, a garota estava deitada no chão, dormindo. Aventureiros vieram, e ela lhes contou sobre sua irmã; porventura ela precisava dar um tempo à consciência depois de tudo.

— O que devemos fazer…?

— Não temos mais tempo para se preocupar com ela.

— Oh… — Mas antes que pudesse dizer algo mais, uma mão bruta e enluvada pegou a garota. Matador de Goblins a colocou no barril próximo. Depois pegou um cobertor de sua bolsa e colocou sobre ela. Ela não estava exatamente segura, mas esse foi o lugar que sua irmã mais velha escolhera. Talvez a ajudasse a relaxar.

Onde estava a Mãe Terra e o Deus Supremo para que não respondessem as preces de uma menina?

— …Isso vai ter que servir — murmurou Matador de Goblins.

— Certo — disse Sacerdotisa com um aceno. Sua mão direita segurou o cajado de monge, mas a esquerda vagou pelo ar, até que a colocou vacilantemente nas costas de Matador de Goblins. — Tenho certeza… de que não há problema.

— …Sim. — Matador de Goblins assentiu. Então ele reforçou a mão na espada, ergueu o escudo e olhou para frente. A aldeia estava queimando e existia goblins para matar. — Vamos.

— Sim, senhor! — respondeu Sacerdotisa sem hesitação enquanto segurava seu cajado com as duas mãos. Ela não se oporia a qualquer coisa que ele a pedisse para fazer. Afinal de contas, ele era a pessoas que lhe salvou a vida.

Ela estava perfeitamente ciente de que suas capacidades ainda não eram grandes, e que ainda era terrivelmente inexperiente. Mas, mesmo assim…

— Não se preocupe. Vou cuidar da retaguarda!

Assim, a batalha começou.

 


 

Tradução: Kakasplat (3 Lobos)

Revisão: JZanin (3 Lobos)

 

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