Matador de Goblins

Matador de Goblins – Vol. 03 – Cap. 01.2 – Lua da Colheita

 

— Ele não usa palavras suficientes! De forma alguma! Sempre! — Alta-Elfa Arqueira bateu na mesa com sua caneca. — Entendi. Isso é verdade? É verdade. Goblins, goblins, goblins… Já chega!

Suas orelhas se moviam para cima e para baixo, refletindo seu copo de vinho agitado.

Seu rosto, normalmente quase translúcido, estava vermelho-vivo enquanto seus olhos começaram a se revirar.

Era um estado impróprio para um alto-elfo, ou seja, ela estava bêbada.

A noite tinha caído. Apesar de se situar em uma cidade fronteiriça, a taverna da Guilda dos Aventureiros era bem frequentada.

A maioria dos clientes tinham acabado de terminar um trabalho ou estavam se preparando para começar um, e gritos apaixonados para louvar os caídos ou animar os feridos intercalavam o barulho.

Posto isso, Alta-Elfa Arqueira e a fumaça de raiva que surgia de suas orelhas não mereciam atenção. Mas, se o clima do bar e a sua embriaguez fossem bem juntos, era outra questão.

Lanceiro — nessa altura um rosto familiar — deu um gole em sua caneca imensa de ale e disse: — Você está chateada com isso agora? Há quanto tempo o conhece?

— Quando eu pergunto se ele tem planos, não me importo se ele diz “Goblins”. — Ela não estava chateada. Alta-Elfa Arqueira assentiu a alguém, embora ninguém estivesse realmente lá. — Ele é Orcbolg, certo? Fico feliz em ignorar isso. Mas! — Ela bateu sua caneca de novo, derramando o vinho que deixou uma mancha vermelha em seu peito. — Essa não é a resposta que espero quando peço um pouco de ajuda!

— Em outras palavras — disse Lanceiro, arrastando uma tigela de nozes para longe de Alta-Elfa Arqueira — ele te deixou.

— Não!

Ela bateu com a caneca, embora dessa vez colocou toda sua força nisso e levantou um verdadeiro tsunami de vinho do copo. Lanceiro se abaixou para evitar a espuma voadora.

Alta-Elfa Arqueira contraiu os lábios e fez um som de desgosto, porventura, lamentando o desperdício.

— Esse é o problema com vocês humanos. Vocês são tão bons em fazer de tudo por uma coisa!

— Mas ele te rejeitou por sua pequena aventura, não foi, moça?

— Calado, anão!

Ela balançou o copo para ele. Mas graças a sua altura ínfima, ela só acertou o ar.

 

 

 

Talvez porque a sua mira era ruim, apesar de ser tanto uma elfa quanto uma arqueira; ou talvez porque ela estava podre de bêbada.

Anão Xamã estava tão vermelho quanto sempre. Apalpando sua barba branca, ele disse com enorme seriedade: — Se me perguntasse, eu diria que você deveria se oferecer para ajudá-lo.

— Se eu estiver sempre fazendo isso, ele vai começar a pensar que eu quero ajudá-lo.

— E não está?

— Não!

Ela se sentou mal-humorada e resmungou para si mesma.

Goblins isso, goblins aquilo. Suje sua roupa! Não olhe para os meus itens! Todas as vezes…

Anão Xamã meramente balançou a cabeça com um chilique.

— Nunca vi alguém ficar tão bêbada com um único copo de vinho. Pelo menos ela é devagar com as moedas.

— Não é o máximo relaxar de vez em quando?

A última observação veio de Lagarto Sacerdote, que estava dando mordidas alegremente em uma rodela inteira de queijo. A visão disso tomava dele a seriedade que normalmente acompanhava um clérigo lagarto.

— Néctar! Doce néctar! Se todo o mundo tivesse uma cama e uma refeição tão boa quanto essa, não haveria mais guerras.

— Isso e vinho, talvez. E então lutaríamos sobre o que comer com eles.

— Nada é fácil no mundo material.

Lagarto Sacerdote pareceu ponderar sobre as suas palavras, com seus olhos vagueando pela taverna.

— Dessa vez, meu senhor Matador de Goblins foi sozinho com nossa querida sacerdotisa. Talvez alguns se sintam ameaçados com isso.

— Há, muitas, rivais, não? — disse uma mulher voluptuosa saboreando elegantemente seu vinho, Bruxa tinha um sorriso fraco.

Ela furtou um pouco de comida do prato de Lanceiro enquanto os olhos dela se viravam significativamente para o lado.

— Tenho certeza que não sei do que está falando — disse Garota da Guilda com uma risada.

Ela ainda estava com o uniforme, embora seu horário de trabalho tivesse terminado. Talvez ela só parou na taverna antes de ir para casa. Suas bochechas estavam vermelhas pela bebida.

— Meu, quão… despreocupada.

— Não, não exatamente. — Garota da Guilda brincou com o copo na mão, esperando os distrair um pouco. Enquanto ela o girava delicadamente, ondas em miniatura percorriam o vinho. — Só estou… esperando minha oportunidade.

— Esperando… por cinco anos, não?

Não havia nada que Garota da Guilda pudesse dizer. Ela apenas tomou um gole do copo com uma expressão ilegível.

Quando ela foi designada para a filial da Guilda nessa cidade, ele foi um dos aventureiros colocados sob sua responsabilidade.

Como ela poderia deixar de notá-lo enquanto ele fazia aquilo que tinha de ser feito?

Ela o via quando ele partia, depois esperava pelo seu regresso. Não havia nada dramático nisso, sem dúvida, mas…

Os sentimentos e afetos das pessoas também se construíam nessa espécie de cotidiano.

Embora nesse aspecto, eu também compreendo a abordagem desse homem.

Ela olhou para Lanceiro, a quem Bruxa interrompia toda vez que tentava dizer alguma coisa. Até Garota da Guilda podia dizer que ele estava claramente dando em cima dela.

Ele era bastante bonito, extrovertido e gentil com as mulheres. A única falha nesse diamante era sua tendência em flertar.

Ele era inteligente, forte, bondoso e animado. Ele fazia um bom dinheiro, e embora pudesse ser um pouco indisciplinado, ele não chegava a ser insuportável. Objetivamente falando, ele parecia um homem decente. Garota da Guilda não tinha especificamente antipatia por Lanceiro. Salvo as vezes em que ele costumava gozar de Matador de Goblins.

Mas, bem, ela não se apaixonava por cada homem meio decente que via. Nem era obrigada a responder da mesma forma só porque alguém tinha se apaixonado por ela.

— Hmm.

Mas talvez, ela pensava, isso a tornava uma rival no amor.

Costuma se dizer que a amizade das mulheres é instável, mas Garota da Guilda não tinha tanta certeza.

O membro do grupo de Lanceiro, Bruxa, estava sentada sem seu chapéu característico, mas com um sorriso inescrutável.

— Isso, é muito, complicado.

— Para nós duas.

As duas mulheres trocaram um sorriso irônico, depois assentiram amigavelmente uma a outra. O homem não pareceu notar.

— Parece que tem havido uma enorme quantidade de missões relacionadas a demônios, tendo em conta que o Deus Demônio deveria ter sido derrotado. — Lanceiro tomou um gole de ale, talvez finalmente endireitado por Bruxa. — O que está acontecendo?

Talvez ela pudesse conversar com ele sobre isso. Garota da Guilda se sentiu um pouco mal por ele, mas aventuras era um tema seguro.

— Meus superiores parecem achar que os nossos heróis deixaram passar alguns dos caras maus.

— Acho que só lidar com os inimigos do alto escalão não significa que todo mundo poderá voltar para casa. — Lanceiro pegou uma noz e a colocou na boca, mastigando ruidosamente. — Demônios são perigosos.

— Eles podem se disfarçar de humanos, entre outros estratagemas. Eles não são fáceis de lidar. — Lagarto Sacerdote assentiu severamente para Lanceiro, juntando as suas palmas em um gesto estranho. — Fiquei muito grato por sua ajuda a esse respeito.

— Não fale disso! Havia uma missão, e eu a peguei. — Ele ignorou a gratidão de Lagarto Sacerdote. — E quando a sua aventura funciona como um encontro, também não é ruim.

Como Lagarto Sacerdote tinha dito, dessa vez, os cinco tinham lidado com um demônio em forma humana.

A missão em si fora terrivelmente mundana: investigar um novo culto que tinha se espalhado por uma cidade.

A cidadezinha ainda se gabava de um templo do Deus Supremo, mas parecia que tinham perdido seu implemento sagrado. A missão envolveu recuperá-lo. Todavia, quando a questão de saber se os goblins estavam envolvidos surgiu, a resposta foi um rotundo não.

Não era uma missão de goblincídio.

“Então irei em uma de extermínio de goblins” disse Matador de Goblins, e Sacerdotisa seguiu atrás dele com um “Desculpe” e curvou a cabeça.

“Está bem, vamos lidar com isso nós mesmos!” exclamara Alta-Elfa Arqueira, mas mesmo ela sabia que eles estariam menos preparados para o combate sem ele.

Justo quando eles estavam decidindo como resolver essa questão, Lanceiro os chamou.

Foi perfeito. Os cinco formaram um grupo temporário e deram início as suas investigações…

Naturalmente, eles encontraram provas suficientes de sequestros, tráfico de drogas, furto e extorsão.

Quando eles encontraram o implemento roubado, um diamante azul lapidado que se parecia com um olho, eles souberam muito bem o que estava acontecendo.

Encontrar a sede do culto, onde eles praticavam seus rituais bizarros e capturar seu líder, era só uma questão de tempo.

— UUUUUUU…! AKAATERRRAAAABBBBB!!!

Face ao diamante, o segundo em comando do culto se revelou ser o verdadeiro cabeça; um demônio. É claro.

E por fim, o demônio abandonou seu disfarce e enfrentou os aventureiros em uma batalha épica.

— Como se lembram, foram as minhas flechas que deram o golpe final.

— Sim, nós sabemos. Está tudo escrito claramente no relatório. — Garota da Guilda notou o testemunho de Alta-Elfa Arqueira na sua papelada.

Agora, a atiradora estava ilustrando a batalha dramaticamente com gestos selvagens.

Garota da Guilda nunca se cansava de vigiá-la. A elfa era facilmente 2.000 anos mais velha que ela, mas parecia como uma irmã mais nova.

— Talvez você tenha bebido o suficiente…

— Não tem problema. Estou bem! É só um copo de vinho tinto. Está tranquilo!

Alta-Elfa Arqueira estava completamente embriagada e longe de estar “bem”.

Bem, todo mundo precisa experimentar uma boa ressaca uma vez em suas vidas. Garota da Guilda colocou um sorriso irônico e resolveu ajudar a elfa a subir as escadas quando o efeito do álcool se fosse, depois tomou outro copo. Ela se inclinou para trás delicadamente, aproveitando a sensação do vinho em sua língua. Ela lembrou das palavras de Bruxa de alguns minutos antes.

Muitas rivais.

Comparada com a sacerdotisa, que podia ir com ele em aventuras, era verdade que Garota da Guilda estava em desvantagem porque tudo o que poderia fazer era esperar.

Que desvantagem? Não seja tonta.

Por aqui, mesmo uma recepcionista poderia tomar a ofensiva.

Ainda assim, ela tinha um pouquinho de medo de dar esse passo…

Ela estava surpresa com o quanto adorava suas relações como empregada da Guilda e com os aventureiros. Mas, caso venha parar aqui…?

Pelo canto do olho, ela viu Bruxa admoestando Lanceiro enquanto ele tentava falar: “Está com problemas, senhorita?”.

Garota da Guilda se viu dando um pequeno suspiro. E naquele momento…

— …?

A porta vaivém do edifício rangeu ao abrir.

Depois surgiu o som de passos casuais e indiscretos.

As orelhas de Alta-Elfa Arqueira se levantaram, como um predador apanhando o som de um coelho.

Então eles o viram: um aventureiro com um equipamento ridiculamente de segunda categoria. Equipamentos tão patéticos que causava agitação até entre os ranques Porcelana, os completo novatos. Um aventureiro cuja roupa única era conhecida por cada um da Guilda.

Matador de Goblins.

— Eu cuido da papelada. Descanse.

A ordem brusca foi direcionada para a sacerdotisa seguindo atrás dele.

Ela quase não conseguia suportar o cansaço. Sua cabeça balançou para cima e para baixo, com as pálpebras meio fechadas.

As magias de um sacerdote eram chamadas de milagres porque, exatamente como o nome implicava, o conjurador fazia uma súplica direta aos deuses no céu. O esforço que isso exigia não era menor que de um guerreiro na linha de frente, e isso havia desgastado seriamente essa jovem esbelta.

— …Siimm, senhor… Hm…

— O quê?

— Boa noite… Matador de Goblins, senhor…

Ela assentiu bruscamente com as palavras de Matador de Goblins e foi subir as escadas.

Ele esperou que ela chegasse com seus pés trêmulos em segurança no segundo andar antes de ir.

Mas os outros não poderiam só observar ele andar até a recepção.

— Ei, Orcbolg, aqui! — chamou Alta-Elfa Arqueira a todo pulmão, depois que reconheceu seu companheiro distinto por meio do efeito do álcool. Ela se levantou e balançou seu copo de vinho loucamente para ele, espirrando seu conteúdo no lanche de Lanceiro.

Ele mastigou lentamente uma noz encharcada de vinho, ganhando uma risada de Bruxa.

Matador de Goblins veio até a mesa e se deparou com a cena.

— O que foi?

Anão Xamã e Lagarto Sacerdote partilharam um olhar e deram de ombros.

Eles não tinham certeza se achavam ou não reconfortante que Matador de Goblins fosse exatamente o mesmo logo após uma aventura como sempre.

— Você sabe muito bem o que! — Alta-Elfa Arqueira, no entanto, não parecia satisfeita. Ela bateu na mesa repetidamente e olhou para o capacete de aço. — Quando você volta de uma aventura, você deveria dizer oi pelo menos!

— É mesmo?

— É!

Alta-Elfa Arqueira bufou. Garota da Guilda sorriu para ela, então deslizou para o lado. Ela gesticulou para Matador de Goblins se sentar, o que ele fez gentilmente. Ela virou seu sorriso para ele e disse: — Bem-vindo de volta, Sr. Matador de Goblins. Como foi?

— Farei o meu relatório — disse ele, depois inclinou a cabeça. — Seu turno não acabou?

— Ah, vamos — disse Garota da Guilda, fazendo bico com um pouco de aborrecimento. — Eu sou sempre a primeira a ouviu sobre suas aventuras. Por que não me diz?

— Hum. — Matador de Goblins cruzou os braços e pensou. Então ele declarou: — Havia goblins.

— Uau, quem poderia adivinhar? — grunhiu Lanceiro. Ele deu de ombros e balançou a cabeça como se dissesse: Esse cara não entende. — O que nossa querida Garota da Guilda está perguntando é, o que você fez que se destacaria sobre o que nós fizemos?

Matador de Goblins voltou a pensar.

— Abatemos quinze deles.

Lanceiro sabia que não poderia esperar uma anedota pormenorizada sobre a aventura de Matador de Goblins, mas até ele baixou a cabeça decepcionado.

— Vamos, Matador de Goblins. Diga alguma coisa interessante!

Bruxa cerrou os olhos distraidamente e colocou o copo na boca.

— Talvez, não há nada interessante, para dizer…

— Quando Corta-barba está metido, suponho que não haveria.

— Nós falamos do meu senhor Matador de Goblins. Ele tem suas peculiaridades.

— Eles tinham equipamentos.

Anão Xamã e Lagarto Sacerdote assentiram conscientemente um ao outro, mas Matador de Goblins balançou a cabeça.

— As mulheres sequestradas estavam todas bem.

— Sério? — pestanejou Garota da Guilda. — Isso é maravilhoso, mas… bastante incomum.

Ela esteve trabalhando aqui durante cinco anos, e raramente ouviu falar em tal coisa.

Embora carecesse de experiência real com aventura, ela tinha ouvido mais sobre isso que qualquer outra pessoa. Certamente mais a ver com goblins. Às vezes as informações vinham antes que as mulheres fossem raptadas, outras vezes logo depois. Às vezes duas semanas depois.

— Elas estavam sendo mantidas como comida…? Ou alguém no comando as queria como reféns?

— Não. — Ele balançou a cabeça. — Elas estavam feridas e aterrorizadas.

— Isso foi em uma mina, não foi?

— Visarem uma mina foi bastante estranho.

— Significando que não estavam atrás de comida. Hmm…

Garota da Guilda demonstrou como ela estava entre os poucos que podiam seguir a conversação de Matador de Goblins. Ela tocou o dedo contra os lábios enquanto digeria os pedaços de informações que ele partilhou.

Ela não reparou em Lanceiro exclamando: “Então, talvez eu devesse estudar sobre goblins!”.

Nos casos que envolviam goblins, de cada dez sequestros, oito a nove vezes eram mulheres jovens. Mas isso era em grande parte para as usar como escravas sexuais, brinquedos para descarregar a raiva.

Da mesma forma que as pessoas achavam os goblins repugnantes, os goblins não conseguiam tolerar os humanos.

Garota da Guilda conhecia muitos exemplos de brutalidade que, como uma boa mulher, fazia ela desejar que não tivesse ouvido dizer nem ler sobre eles.

Poderia se esperar que ela ficaria contente ao ouvir a notícia do resgate.

— …Hmm. Então nós não sabemos o suficiente para dizer alguma coisa…

Algo parecia incomodar Garota da Guilda. Ela inclinou a cabeça, tentando entender o que era.

Talvez fosse o mesmo com Matador de Goblins. Ele disse desapaixonadamente:

— Esse é o meu relatório preliminar. Vou apresentar um mais detalhado mais tarde. Dê uma olhada.

— Claro. Como é obvio, meu turno acabou por hoje, por isso será a primeira coisa para amanhã cedo.

— Sem problema.

— Não de minha parte, não está! — irrompeu Alta-Elfa Arqueira.

Deitada na mesa, ela olhou para Matador de Goblins, se esforçando em fazer seu olhar exaltado devidamente ameaçador.

— …Quem se importa com o seu relatório estúpido? Você deveria cumprimentar seus amigos e companheiros antes! …Embora eu saiba que os goblins são importantes para você — murmurou ela.

O homem armadurado balançou a cabeça lentamente.

— Você já sabe que estou aqui. Não há necessidade.

— Não importa. Devia fazer isso de qualquer forma.

— É assim que é?

— …Todo mundo estava preocupado com você.

Isso provocou um murmuro “…Estavam?” de Matador de Goblins. — Eu vou mudar.

— Que bom. — O rosto de Alta-Elfa Arqueira se derreteu em um sorriso suave, finalmente contente.

Suas orelhas balançavam com seu humor melhorado.

Ela jurava que quando eles alcançavam 2.000 anos, os elfos eram considerados adultos, mas ela certamente não agia assim. Francamente, ela pode ser meio que uma vergonha para com seus antepassados alto-elfos.

Ao menos, isso é o que Anão Xamã estava pensando quando Garota da Guilda se moveu silenciosamente.

Ela se inclinou indiferentemente e pôs a mão no joelho de Matador de Goblins.

O movimento foi surpreendentemente natural, e ela parecia totalmente séria.

— A propósito, Sr. Matador de Goblins.

— O quê?

— O, hum, o festival da colheita é depois de amanhã.

— Sim.

Garota da Guilda respirou e soltou um suspiro. Ela colocou a mão no peito, como se tentando conter fisicamente seu coração acelerado.

— Você tem… algum compromisso?

A atmosfera mudou instantaneamente.

Até mesmo os aventureiros tagarelando e bebendo nas proximidades pararam para ouvir, se esquecendo das pessoas na mesa deles.

Ela sentiu seus nervos enrijecer assim como eles ficavam entrando em uma masmorra.

Bruxa usou Silêncio para impedir Lanceiro de exclamar: “Eu estou livre!”.

Os olhos de Alta-Elfa Arqueira estavam abertos, mas sua embriaguez lhe permitiu apenas oferecer um murmúrio moroso e incoerente.

E no centro do clima indescritível, Matador de Goblins disse.

— …Goblins.

— Ah, quero dizer… algum plano não-goblinsesco?

— ……Hum.

Com esse simples som, Matador de Goblins abaixou a cabeça como se perdido em pensamentos.

Ou talvez sem palavras. Ambos seriam uma visão incomum.

Enquanto todos à sua volta esperavam com a respiração suspensa, só Garota da Guilda ainda tinha um sorriso no rosto.

Depois de um momento, Matador de Goblins disse: — …Não, suponho que não.

— Sabe, vou estar livre a tarde toda nesse dia.

Ela parecia estar esperando por algum tipo de resposta.

É agora ou nunca!

Era o festival da estação, e ela tinha planejado por esse momento. Ele tinha acabado de terminar uma missão de goblincídio, e a recompensa pelo seu trabalho duro e incansável lhe permitia tirar uma folga quando realmente precisasse.

Tinha também o vinho. Emprestando as forças do álcool, ela pensou que essa seria sua melhor chance.

— Eu… Eu pensei que t-talvez gostaria de ir… ver o festival comigo.

— …

— Di… digo, o festival… pode não ser completamente seguro, certo?

Um dos seus dedos desenhava formas sem sentido em sua palma. Garota da Guilda observava o capacete de aço.

A mesma coisa medíocre que ele sempre usava que escondia seu rosto por detrás.

A única maneira que ela poderia o alcançar era se manter falando, embora sua voz estivesse cada vez mais tensa graças ao seu coração acelerado.

Para Garota da Guilda, cada segundo que ele ficava calado parecia como… um minuto? Não, uma hora.

— …Está bem.

Matador de Goblins assentiu.

A voz dele poderia ter sido desapaixonada, quase mecânica, mas não havia dúvida sobre o que ele disse.

— Você é sempre de uma grande ajuda para mim.

— Ah, certo… Eu… Obrigada — disse ela se curvando, jogando sua trança no ar.

Ops. Se diz “obrigada” nessa situação?

Ela estava um pouco preocupada, mas era uma coisinha de nada, completamente subjugada pela alegria se espalhando rapidamente pelo seu coração.

— Ah… oh, certo! Sr. Matador de Goblins, gostaria de algo para comer?

— Não, estou bem. — Balançando firmemente a cabeça, Matador de Goblins se levantou do banco. Como sempre, ele verificou sua armadura, escudo e luvas com um olhar experiente, então assentiu.

— Assim que eu fizer meu relatório, voltarei durante o dia.

— A-ah, En… Entendi. — Garota da Guilda sentiu uma mistura estranha de emoções, desapontada, mas também satisfeita com sua resposta bem característica.

— Nesse caso, hum…

— O dia do festival da colheita, ao meio-dia, na praça. Pode ser?

— Sim!

— Tudo bem então.

Matador de Goblins assentiu, então inquiriu todos na mesa.

— O que vocês irão fazer?

Garota da Guilda conseguiu manter suas mãos longe da cabeça, mas seu rosto traía claramente seus sentimentos. Ela deveria ter esperado isso.

Lagarto Sacerdote e Anão Xamã pareciam o mesmo. Eles se limitaram a dar de ombros e decidiram fazer o que poderiam para ajudar.

— Minha intenção é passar esse dia desfrutando de uma refeição com Mestre Conjurador.

— Ah, sim! Eu sempre quis beber com Escamoso em uma mesa. Essa será uma boa oportunidade.

Anão Xamã bateu em sua própria barriga, depois esfregou as costas de Alta-Elfa Arqueira.

— Venha conosco, Orelhuda. Não importa o que digam, elfos e anões têm um longo relacionamento!

— Bwah? — Um ruído em desacordo deixou sua boca. Era o tipo de som informe que uma criança fazia como protesto de se levantar da cama.

— Ah, vamos lá… Eu lhe darei um copo de vinho!

— …Está bem.

— Entendi. — Matador de Goblins aceitou a resposta deles com sua frieza habitual, então se preparou para ir.

Lanceiro abriu a boca como se fosse dizer algo, mas Bruxa o interrompeu. — Nós dois temos um encontro.

— Vou indo, então.

Sem muitas palavras de despedida. Como sempre.

Ele foi para a recepção e sinalizou para a funcionária mais próxima para fazer seu relatório, depois foi para fora.

Seu passo ousado não continha qualquer sinal de hesitação, como sempre.

Ele era um aventureiro um tanto estranho.

O grupo o viu indo, incapaz de dizer algo.

— Meu deus — disse Lagarto Sacerdote, dando um suspiro de admiração. — Um feito muito impressionante.

— Heh… Ah-ha-ha… Fico feliz que deu tudo certo. — Garota da Guilda corou timidamente e brincou com sua trança.

— De fato. — Bruxa sorriu, dando a Lanceiro pálido uma palmadinha. — Você, se esforçou, também.

Anão Xamã deixou escapar um suspiro exasperado. — A peito-plano aqui poderia aprender uma coisa ou outra de vocês.

— Ah, cale sua matraca. — Alta-Elfa Arqueira se virou devagar e fastidiosamente para olhar para o anão. — Eu só quero ir em uma aventura juntos. Aquele idiota não vai mesmo vir comigo!

— Sim, moça, você falhou bem miseravelmente.

— Aa… Aaaaah!

— Ah, ora. Aqui, tome uma bebida.

Ele derramou uma quantidade boa de vinho no seu copo. Ela lhe poupou com um olhar rápido antes de colocar o copo em sua boca com um leve aceno.

Garota da Guilda, vendo tudo isso, franziu sua testa apologeticamente.

— Hum… Eu… Eu sinto muito…

— Pfft. Como se eu ligasse. Eu já te disse, eu não penso nele dessa forma. — Alta-Elfa Arqueira deu goles delicados em sua bebida, observando Garota da Guilda. — Ei — disse ela.

— Sim?

— Foi uma boa fala: “Algum plano não-goblinsesco?”. Posso usar ela?

 

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Quando Matador de Goblins deixou a Guilda, um aroma doce o envolveu.

Que aroma pode ser esse…?

Enquanto ainda estava pensando, uma rajada de brisa fresca levou embora o cheiro.

Quando o sol se pôs, o calor do dia recuou como se nunca tivesse existido.

A noite se aproximou. Ele olhou para um céu gelado repleto de estrelas.

As luas gêmeas, cheias com a promessa de uma colheita abundante, brilhava com uma luz que era de alguma forma metálica e inorgânica.

— Hum.

Já era outono.

Mas isso não significava muita coisa para ele.

Após a colheita, as incursões dos goblins provavelmente aumentariam.

Havia um estilo de luta apropriado para a primavera, bem como um para o verão, para o inverno, e, claro, para o outono.

Ele examinava as ruas silenciosas.

Os estandartes e flâmulas estavam penduradas antecipadamente para o festival, juntamente com as torres de madeira, projetando uma rede complexa de sombras no chão. Matador de Goblins se entrelaçou por elas enquanto caminhava.

Essas eram ruas que ele conhecia bem, mas cada vez que ele passava por uma sombra, ele formava um punho reflexivamente.

Provavelmente não havia nada se escondendo na escuridão. Mas os goblins poderiam aparecer a qualquer momento e em qualquer lugar.

Nem todas as preparações eram úteis, mas uma pessoa nunca poderia deixar de estar preparada.

Esse era um dos princípios mais preciosos de Matador de Goblins.

— Oh, aí está você!

Dessa forma, ele pôde apanhar a voz inesperada, mas familiar, com facilidade.

O cumprimento vivo e amigável não correspondia muito com a noite, embora talvez ele precisasse da luz.

— Ah — disse Matador de Goblins. — Você veio me encontrar?

Era, é claro, Vaqueira.

— Heh-heh! — Com um sorriso em seu rosto e um salto de seu peito, ela foi rapidamente na direção dele. — Gostaria de dizer que sim. Por acaso eu estava na cidade. Trabalho, sabe.

— É mesmo?

— Sim, é. — Ela assentiu firmemente. O capacete encardido a seguiu atentamente.

— Uma entrega?

— An-ham. — Vaqueira acenou com a cabeça. — Falar com um cliente. Tio me disse para cuidar disso para aprender sobre o lado das questões comerciais.

— É mesmo? — disse ele de novo, assentindo.

O sol estava ausente e a cidade escura, deixando os dois sozinhos na negritude. A rua fora do portão da cidade estava ainda mais solitária e escura.

— …Quer ir para casa?

— Sim, vamos.

Eles partiram, dando passo ao lado do outro.

Eles seguiam suas próprias sombras se estendendo pelos ladrilhos e iam silenciosamente para casa.

Não com pressa, mas tampouco lentamente.

A falta de conversa não os incomodava. Às vezes era muito bom.

— Ah…

Com um vuum, o vento fresco soprou de novo e trouxe aquela fragrância agradável com ela.

Matador de Goblins parecia não perceber bem o que lhe lembrava.

Uma pétala de flor dançou pelo ar, acompanhando a brisa e o cheiro.

Matador de Goblins olhou para cima. Ele viu uma árvore coberta por flores douradas.

— Ah, é uma flor-do-imperador. — Vaqueira seguiu o olhar dele para cima e usou sua mão para proteger seus olhos da luminosidade. — Já está florescendo. Acho que é nessa estação.

Tinha sido o aroma da flor.

— Isso mesmo — murmurou Matador de Goblins, agora que ele sabia de onde o odor vinha.

Era estranho como a estrutura das flores amarelo-clara fazia até mesmo as luas frias parecerem quentes.

Quando ele começou a se afastar, sentiu uma sensação suave envolver de repente sua mão esquerda.

Vaqueira tinha entrelaçado sua mão na mão enluvada dele.

Ela estava corando o bastante para ser visível, seus olhos se desviaram bem ligeiramente.

— Pode… Pode ser perigoso, andar enquanto você olha assim para cima. Está… Está escuro.

— …

— Desculpa. Eu…?

Ela olhou para o rosto dele, tentando decidir como tomar seu silêncio.

Depois de um momento Matador de Goblins, com sua expressão oculta pelo capacete, balançou lentamente a cabeça.

— Não.

— Hee-hee.

Vaqueira partiu, puxando Matador de Goblins atrás dela.

Matador de Goblins podia sentir o calor das mãos de Vaqueira através de sua armadura. Agarrando-se a essa sensação, ele seguiu atrás dela.

Ela olhou para ele de soslaio.

— A propósito…

— O quê?

— Sabe o que a flor-do-imperador simboliza na linguagem das flores?

— Linguagem das flores? — repetiu Matador de Goblins, como se nunca tivesse ouvido a expressão antes. — Não, não sei.

— Bem, então acho que devia descobrir.

Ela soou muito parecida com uma criança tentando imitar um adulto.

Vaqueira riu e sorriu deliberadamente, balançando levemente seu dedo indicador.

— Para mim, acho que te cai bem.

— …Vou me lembrar disso.

Matador de Goblins assentiu, e Vaqueira respondeu com uma espécie de “Hmm” de afirmação.

Toco no assunto?

Vaqueira havia conseguido quebrar o gelo.

Despeito do seu capacete, ele não era difícil de se decifrar. Ainda assim, ele poderia ser surpreendentemente teimoso, então ela teria de usar a cabeça.

— …O festival está chegando… já é depois de amanhã.

— Sim, é. — Ele assentiu assiduamente. — Eu fui convidado.

— Guah?! — Uma exclamação estranha escapou dela.

— O que foi?

— Não, eu… uh, digo… Quem te convidou? E o que você disse?

— A recepcionista da Guilda. Acho que você a conhece.

Vaqueira assentiu.

Garota da Guilda. Elegante, competente e atenciosa. Uma jovem madura.

— Não tive motivos para recusá-la. Eu perguntei a todo mundo se queriam vir junto, mas parece que todos têm planos.

Vaqueira parou de andar de repente.

— …O que foi?

— Ah… Ahh-ha-ha-ha-ha-ha!

Com sua mão livre, ela brincou com seus cabelos para o distrair.

Gah. Ela me passou a perna…

Entendendo ou não o que ela estava pensando, Matador de Goblins repetiu desapaixonadamente: — O quê?

— …Ahh, não é nada. — Vaqueira balançou lentamente a cabeça.

Não… Não é nada demais. Não é?

Então ela não tinha conseguido o que queria.

Ela não estava certa de que deveria dar voz aos seus pensamentos agora, mas eram apenas palavras, certo?

— Eu só… eu estava esperando ver o festival com você, também. Só isso.

— Estava?

— É.

Ela assentiu, assim eles ficaram em silêncio de novo.

Antes que percebessem, os ladrilhos tinham dado lugar a uma estrada de terra, e eles saíram pelo grande portão principal.

Na primavera, essa colina se preenchia com margaridas. Era onde os aventureiros travaram a batalha com os goblins. Agora, com a aproximação do inverno, tudo o que restava eram as pastagens e seus próprios passos barulhento.

Escutando atentamente, ele podia ouvir o bzzz, bzzz fraco dos insetos, e a respiração da sua velha amiga ao lado.

Havia ficado mais frio, mas não o suficiente para que suas respirações esfumaçassem.

— …Ei.

— O quê?

— Que horas é o seu encontro?

— Meio-dia.

As luzes cintilando da fazenda estava aparecendo ao longe.

Matador de Goblins manteve seus olhos — seu elmo, na verdade — em frente enquanto respondia calmamente.

— Ah — sussurrou Vaqueira, movendo sua mão trêmula ao peito. — Então… Posso te convidar para ir pela manhã?

— Sim.

— O qu…?

Ela esteve prestes a retrair tal pedido atrevido, e agora tudo que podia fazer era ficar a olhar fixamente.

O capacete encardido se misturava tão bem com a escuridão que ela mal conseguia dizer onde acabava o aço e onde a noite começava.

Tal e qual ela não conseguia dizer bem se ele estava sendo sincero.

Ele era fácil o bastante de entender, mas… não estava ela projetando seus próprios desejos em suas palavras?

Vaqueira engoliu em seco. Ela desejou que sua voz não tremulasse.

— S-sério?

— Por que eu mentiria?

Não havia nenhum indício em sua voz.

Claro que ele não era o tipo de homem que diria uma mentira tão estúpida. Ela sabia disso.

— Mas, isso… Você tem certeza…?

— Não é essa a questão. — Ele desconsiderou facilmente sua pergunta preocupada. — Você me convidou.

— Ah… Então… você não se importa?

— Não me importo.

— Iupi!

Vaqueira não poderia ser culpada pela exclamação animada depois da resposta objetiva dele.

Ela pulou no ar, seu peito generoso balançou e girou na frente dele.

— Muito bem, é um encontro! A manhã do festival.

— Sim. — Afligido, Matador de Goblins inclinou a cabeça, perplexo. — Isso te fez tão feliz?

— Que pergunta!

Vaqueira lhe lembrou com um sorriso enorme o que ele já deveria ter percebido.

— Já passaram quase dez anos desde que fui em um festival com você!

— Tem?

— Tem sim.

— …Entendi. — Matador de Goblins balançou a cabeça com a maior seriedade. — Não tinha notado.

Eles podiam sentir, mesmo que pouco, o cheiro de creme fervendo. Vaqueira havia deixado os lacticínios cozinhando quando pensou que estava pronto, indo se encontrar com ele sobre o pretexto de um recado.

A casa agora estava bem na frente deles.

 


 

Tradução: Kakasplat

Revisão: JZanin

 

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