Um festival é um dia de celebração. Música alegre enche o ar, convidando a todos e a seus cães a sair para se divertir. Seria mentira dizer que não há quem não goste desses momentos, mas mesmo assim, um festival é um dia de celebração.
Neste dia de festa em particular, o Templo da Mãe Terra fazia parte da festa na cidade fronteiriça.
— Tudo bem, todo mundo, vamos lá! Pisem nessas uvas! — Os clérigos exortavam, produzindo um grito empolgante dos espectadores reunidos.
As uvas da colheita precoce seriam esmagadas sob os pés neste dia, um festival dado na esperança de um bom vinho no outono. Embora fosse um dia santo, reconhecidamente, alguns estavam ali simplesmente para verem as moças descalças. Outros só queriam beber um pouco de vinho ou esvoaçar pelo festival mordiscando isso e aquilo por aí. Outros ainda vieram apenas para ficarem boquiabertos, mas um dia de celebração é aquele em que todas essas coisas e muito mais são perdoadas. Nem os clérigos que serviam à Mãe Terra, ou qualquer outro deus, se importaram.
Tenho certeza de que é melhor assim, Matador de Goblins pensou distraidamente de onde estava sentado, longe da multidão. Estava encostado no tronco de uma árvore, usando sua sombra para sair do sol forte. Enquanto olhava para a multidão parada na luz, considerou a recente comoção. Muitos aventureiros salvaram este lugar, então hoje muitos aventureiros foram convidados. Ele estava entre eles, e pensou em recusar.
“Se você viesse, isso me faria… muito feliz!”
Mas depois desse empurrão final de Sacerdotisa, ele dificilmente poderia recusar. No entanto, apesar de sua presença no festival, Matador de Goblins não tinha certeza de como se divertir.
— O que está errado? Já parou de beber?
Ele se virou na direção da voz inesperada. Lá encontrou Irmã Uva, que lhe deu um aceno amigável e disse: “Olá”. Ela não estava com seu costumeiro hábito[1] de freira, mas com um vestido carmesim especial para esmagar uvas.
Matador de Goblins pensou por um momento, então balançou a cabeça como se dissesse não.
— Eu não bebo muito.
— Algumas pessoas podem dizer que um homem que não sabe desfrutar de uma bebida não sabe como viver.
Foi um comentário despreocupado, mas Irmã Uva o amenizou com um sorriso amigável.
— Pelo menos agora sabemos por que você não está se divertindo.
— Não… — Matador de Goblins pensou por mais um momento, então virou seu capacete na direção da festa. Lanceiro, que estava observando as clérigas pisarem nas uvas, estava sussurrando algo para Bruxa. Cavaleira, em trajes civis, tinha uma taça de vinho em uma mão e um rubor no rosto enquanto falava eloquentemente com Guerreiro de Armadura Pesada. Os meninos mais novos pareciam paralisados pela visão das clérigas, enquanto as meninas faziam caretas exasperadas e comentários sarcásticos. Caçador Homem-Lebre estava se divertindo muito, pois era um festival, mas estava soltando pelos demais para poder pisar nas uvas.
Garçonete Felpubro podia ser vista vagando sobre uma barraca de comida, arrastando a aprendiz da oficina atrás dela enquanto corria pelas festividades. Quanto ao dono da fazenda, estava conversando com a madre superiora do templo, talvez ele tenha fornecido alguns dos alimentos. Os membros da equipe da guilda, incluindo o inspetor, devem ter decidido tirar o dia de folga, pois vagaram pela multidão em roupas pessoais.
Lagarto Sacerdote e Anão Xamã estavam enchendo suas bocas e barrigas com comida e bebida e se divertindo muito.
— Não estou… não me divertindo.
— Sério? Bem, bom, então. — Com isso, Irmã Uva se serviu de um lugar perto da árvore em que ele estava encostado, apoiando-se nela como ele estava. O olhou, apenas brevemente, então coçou a bochecha como se estivesse envergonhada. Finalmente, conseguiu dizer: — Ouça, uh, obrigada. Por tudo.
— Não fiz nada em particular.
Ele poderia dizer que ela o olhou então, embora ela tivesse movido apenas os olhos.
— Isso é uma tentativa de modéstia? — Havia uma suavidade em seu tom. Matador de Goblins não conseguia imaginar o que poderia estar por trás disso.
— Não, é um fato. Eu… — Ele ficou em silêncio por um momento, procurando as palavras corretas para dizer. — Só matei os goblins. — Incapaz de apresentar algo mais articulado ou mais elaborado, o que finalmente emergiu de sua boca foi essa declaração característica e desapaixonada.
Irmã Uva fechou a boca e olhou para o chão. Um sopro de vento passou, farfalhando os galhos. O silvo das folhas soou muito alto.
Depois de um longo momento, ela finalmente disse: — Mais uma razão para eu agradecer, então… eu acho.
Parecia-lhe que talvez Irmã Uva não fosse melhor do que ele em encontrar as palavras certas.
— É assim mesmo?
— Claro que é.
Então os dois acenaram um para o outro e a conversa sobre a inquietação que havia engolido os dois parou por aí.
Alguns minutos depois Irmã Uva disse: — É melhor eu ir falar com os outros — e se afastou da árvore.
— Tudo bem. — Matador de Goblins respondeu e assentiu.
Ele a observou ir em direção a um jovem de aparência nobre. O filho do comerciante de vinhos. Parecia exausto, mas ainda tinha uma ansiedade sobre ele enquanto chamava Irmã Uva. Ela hesitou, mas não havia preocupação em sua voz; ele estava até sorrindo.
Isso é bom, pensou Matador de Goblins. O que quer que eles pudessem falar agora, qualquer que fosse o relacionamento entre eles no futuro, era bom.
Pelo que ouviu, o comerciante de vinhos começou a vender uma safra que apelidou de “Vinho do Verão da Matança de Goblins”. Exigiu uma certa dose de coragem, esse movimento, mas, novamente, talvez fosse isso que precisava para ser um homem de negócios…
Matador de Goblins considerou por um momento, então descartou esse pensamento. Seja como for, não importa quando ou como, se as pessoas estavam tentando avançar, então isso em si deveria ser aplaudido. Tudo se resumia em fazer ou não fazer. Como seu mestre lhe havia dito muitas vezes.
Suponho que se ele ouvisse sobre o que acabou de acontecer, gritaria comigo e me daria um bom soco…
— …Eu fiz isso?
— Fez o que?
Desta vez, sabia quem tinha vindo até ele. Era a garota, sua amiga de infância, espiando por cima do ombro dele. Ela estava usando o mesmo tipo de vestido vermelho da Irmã Uva e irradiava alegria.
— Ah, você quer dizer isso? — Ela levantou a bainha como se para sua inspeção. O vento o pegou e ele subiu, de modo que pudesse ver a costura fina. — Hee-hee! Eles até me convidaram e eu pensei, por que não? O que você acha?
— Realmente não sei.
Essa resposta, que ele havia produzido com bastante preocupação e consideração, parecia atender às expectativas dela. — Ah é? — respondeu ela sorrindo, girando algumas vezes para seu benefício. — É tão raro eu me vestir bem. É fácil se deixar levar!
Talvez isso também explicasse o humor incomumente jovial das clérigas. Quando pensou sobre isso, percebeu que Sacerdotisa estava quase sempre em suas vestimentas também e se alguém fosse trancado em um templo o tempo todo…
— Diga.
— O quê?
Ela se sentou ao lado dele. Estava tão perto que mesmo através de sua armadura, ele podia sentir o calor de seu corpo.
— Você se lembra como… o casamento surgiu, daquela vez?
— …Sim — assentiu Matador de Goblins. Assentiu e grunhiu baixinho. Como sempre, não tinha certeza do que dizer. — Há muitos obstáculos.
Portanto, quando ele finalmente falou, ela disse: — Sim — acenando com a cabeça como fazia quando eram crianças. — Eu entendo… — Sua voz era tão baixa. Por alguma razão, evocou uma memória de muito tempo atrás, quando eles brigaram.
— …Tudo o que posso fazer é lidar com o que está diretamente na minha frente, uma coisa de cada vez.
Passaram-se cinco anos, e depois mais dois anos, e algo parecia de alguma forma ter mudado, esse foi o resultado. Ele tinha sido capaz de fazer alguma coisa? Talvez até o pensamento fosse infantil.
— Claro, mas… — Ela estava sorrindo, sua voz alegre. — Se você continuar cuidando de uma coisa e depois de outra, eventualmente você cuidará de tudo, certo?
— Você acha…?
— Sim.
Ela parecia realmente acreditar nisso, do fundo de seu coração. Não houve hesitação em suas palavras; sua voz era cristalina. Matador de Goblins olhou para o céu através dos galhos da árvore.
— …Entendo.
— Hmm. — Ela deu um aceno rápido, então pulou de pé com um caloroso “Hup!” Deu um tapinha para tirar a grama de sua saia, então olhou para Matador de Goblins. — Está bem então. Vou pisar em algumas uvas, você quer vir assistir?
Ele pensou por um momento, então assentiu.
— Sim.
— Estarei esperando por você! — Ela disse, acenando. Correu pela grama com passos leves, em direção ao enorme barril cheio de uvas. Sacerdotisa, Alta Elfa Arqueira e Garota da Guilda estavam todas esperando por ela, vestidas com roupas desconhecidas.
A felicidade está brotando em videiras,
uma encosta viva com borboletas azuis dançantes,
e a lua cheia do outono
um broche no pescoço da Mãe Terra.
Quando as flores desabrocharem e frutificarem em toda a sua glória,
com minha amada na segunda noite estrelada,
com o canto dos pássaros da floresta para os sinos do amanhecer,
Sinto o toque suave da Mãe Terra.
O doce e ainda amargo néctar
acende uma chama no meu coração
abrangendo as estrelas com as luas gêmeas;
a canção alegre da Mãe Terra está chamando.
As jovens levantavam a voz, rindo, tocando, cantando uma canção, enquanto pisavam nas uvas, fazendo o vinho.
Seria um bom vinho este ano, com certeza. Ele ficou surpreso ao encontrar-se pensando assim. Matador de Goblins viu toda a cena, então lentamente se levantou e começou a andar.
Se hoje foi de fato um dia de celebração, então, por enquanto, que o pensamento de celebração seja o suficiente.
[1] Roupa utilizada pelas freiras que cobre a cabeça da freira
Tradução: Nero_SL
Revisão: Bravo
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