Marcha Mortal à Rapsódia do Mundo Paralelo

Marcha Mortal à Rapsódia do Mundo Paralelo – Vol 01 – Cap. 04.1 – Encontro

Satou aqui. Sempre fui relativamente popular com garotas mais novas, mas me certifico de nunca ir além de amizade e nunca namorei nenhuma delas. Quando me apaixono por alguém, por algum motivo, é sempre uma mulher mais velha.

Acordei com o barulho alto de alguém batendo rudemente na minha porta.

— Sr. Satou, você está acordado?

— Sim, estou… agora.

Um fino raio de sol apareceu de uma fenda na janela fechada. Era a única janela do quarto, grande o suficiente para colocar uma cabeça para fora, ela não possuía vidro. Talvez fosse para ventilação? Mas lembro que Marta me aconselhou que fechasse a noite por segurança.

Fiz uma verificação rápida da minha aparência antes de ir para a porta. Uma noite inteira se passou, mas não tinha nenhuma barba no meu rosto. Ah, certo, não costumava ter pelos faciais aos meus quinze anos.  Começaram a nascer quando entrei na faculdade, fiquei tão emocionado que queria mostrar para todo mundo.

… Para minha tristeza, minha namorada na época me obrigou a fazer a barba.

Também não tinha um criado-mudo, coloquei o roupão bordado branco que comprei no dia anterior e saí do meu quarto.

— Bom dia.

— Se você não se apressar, sua namorada vai vir procurá-lo!

Desculpe? Minha namorada me largou tem seis meses porque eu estava muito ocupado com o trabalho. E eu não conhecia praticamente ninguém nesta cidade.

Quando segui Martha ao andar de baixo, encontrei a soldado mágico Zena esperando por mim. 

— Bom dia, Satou!

— Oh, bom dia. Você ficou muito fofa com essa roupa. — Zena devia estar de folga, já que não estava de uniforme. Em vez disso, estava usando uma blusa branca com uma saia azul-clara e um xale verde-amarelado um pouco grande sobre os ombros. Não estava particularmente na moda, mas nela, dava uma impressão limpa e saudável.

Deve ser legal ser uma garota bonita.

Ela não torceu o tornozelo? Já se recuperou?

— Sua perna está melhor?

— Sim, um sacerdote do templo Garleon me curou ontem!

Ah, então um sacerdote a curou. Deve ter sido Magia Sagrada ou algo assim.

— E, hmm, já que estou de folga hoje… pensei que talvez… isto é, hmm… poderia te mostrar a cidade…! — Ela parecia que ia desmaiar. Não precisa ficar tão tensa…

Eu devo ter feito uma cara estranha enquanto suprimia minha risada com seus gestos ansiosos.

Oh, querida.

— Muito obrigado! Adoraria.

— Sério? Ótimo! — Zena recompensou minha aceitação de sua oferta com um sorriso enorme, como um girassol florescendo.

Sim, sua juventude era ofuscantemente radiante.

Lavei meu rosto e parti com Zena.

Ela sugeriu que tomássemos o café da manhã nos carrinhos de comida no mercado matinal na Rua Sul. Acho que a garota não tinha reservas quanto a ir para lá, apesar de ser filha de um aristocrata.

Carregado pelo vento, o cheiro de molho de soja fez cócegas no meu nariz.

— Esse cheiro é de molho de soja…?

— Isso mesmo! É um dos dois grandes temperos criados pelo rei ancestral Yamato. É até exportado para outros países! Não tinha esse molho de onde você veio, Satou?

— Tinha sim, só faz muito tempo que não o sentia.

— Ohh, entendi!

Gostaria de saber se Yamato foi escrito com o mesmo kanji que o antigo nome no Japão.

Zena me levou em direção a um carrinho onde estavam fritando algo em óleo. Croquetes, talvez?

— Bom Dia! Dois croquetes Seiryuu, por favor.

— Um momento.

Parecia que o óleo era feito de sebo; o cheiro era terrivelmente intenso.

— Lilio não está com você hoje?

— Ontem ela voltou de uma longa expedição, então ainda está dormindo em seu quarto.

O homem deu a Zena dois croquetes embrulhados em folhas, e ela deu um para mim. Custava uma moeda de cobre cada, então, enquanto suas mãos ainda estavam cheias, paguei ao vendedor.

— Espere, eu queria pagar como agradecimento por ontem!

— Não, não, está tudo bem. Você já fez mais do que o suficiente me trazendo para a cidade e me ajudando a me estabelecer.

Sentamos em um banco de pedra perto do carrinho para comer nossos croquetes. Ele estava um pouco sujo, então peguei um lenço e o espalhei no assento antes de nos sentarmos.

Zena riu. 

— Eu me sinto um pouco como uma princesa. — Parecendo satisfeita e um pouco envergonhada, ela deu pequenas e delicadas mordidas no croquete. Admirei a cena enquanto comia o meu.

O croquete de batata frito e sem carne era muito bom, mas um pouco pesado demais, talvez por causa do óleo. Tive a sensação de que, se comesse mais de dois, teria azia pelo resto do dia.

— Na verdade, o namorado de Lilio foi quem popularizou o croquete de Seiryuu.

— Eh? Ele é um chef?

— Não, não exatamente. Ele não sabe cozinhar, mas sabe como muitas coisas são feitas. É bem estranho.

Hmm. Eu sei que é ruim tirar conclusões precipitadas, mas isso me pareceu uma pessoa japonesa. Parecia que outros japoneses também haviam chegado a este mundo, como aquele “rei ancestral Yamato”. Talvez houvesse uma maneira fácil de chegar aqui e voltar, como entrar por um guarda-roupa ou algo assim.

Terminei de comer primeiro e, enquanto estava sentada à toa, uma menina com flores em uma pequena cesta de vime se aproximou de mim. Ela parou na minha frente, segurando uma florzinha.

— Com licença senhor! Compre uma flor, por favor?

Ela ficou olhando na minha direção por um tempo, devia ter esperado até eu terminar de comer para ter sua chance. Muito inteligente para uma garota tão jovem.

— Claro, eu comprarei uma. Quanto custa?

— É um centavo.

Dei um centavo e recebi uma flor em troca. A garota me agradeceu alegremente antes de correr para encontrar seu próximo cliente em potencial.

Entreguei a flor a Zena, depois de esperar que terminasse de comer seu croquete e limpar as mãos, é claro. Ela parecia extraordinariamente surpresa. O que mais eu ia fazer com isso?

— Hmm… Tem certeza que posso ficar?

— É claro. Iria ficar chateado se não ficasse.

Quero dizer, não vou jogar fora.

Zena sorriu como se estivesse tentando, em vão, disfarçar sua felicidade. Será que é realmente grande coisa? Bem, acho que estou feliz que ela esteja feliz com isso.

Comprei algumas frutas parecidas com melão cortadas em fatias do tamanho de uma mordida para limpar o paladar, depois experimentei algum tipo de caule frito com molho de soja. Fiquei um pouco duvidoso com base na aparência, mas se mostrou perfeitamente saboroso.

O próximo carrinho que Zena me levou, no entanto, foi ainda mais desanimador.

— Essas são chamadas asas de dragão! São asas de morcego fritas revestidas com molho de missô preto. É uma especialidade da cidade de Seiryuu!

Então as asas de dragão eram semelhantes às asas de morcego? Aparentemente, essa comida deveria trazer boa sorte. Zena prometeu que tinha um sabor melhor do que parecia, então confiei nela e comprei duas.

Enquanto estava pagando por nossas asas, ouvi Zena soltar um gritinho atrás de mim.

— Desculpe senhora!

Uma criança esbarrou nela enquanto passava. Isso era bom por si só, mas, infelizmente, o molho de missô da asa de dragão tinha se espalhado por toda a sua blusa branca.

— A blusa que peguei emprestada da minha mãe… — sussurrou, os olhos se enchendo de lágrimas. Talvez se fôssemos à Alameda Teputa, encontrássemos alguém para remover a mancha?

— Desculpe? Não pude deixar de notar seus problemas. Por acaso precisa de um encantador?

— Desculpe, mas o que precisamos é de uma lavanderia onde possamos tirar essa mancha.— Por que essa pessoa está vendendo feitiços ou algo assim em um momento como este? Seja um pouco mais sensível.

— Bem, veja só, eu sou habilidoso com Magia Cotidiana. Posso limpar essa mancha.

Ah, então é isso que um encantador faz? Seu timing perfeito era terrivelmente suspeito, mas, no momento, limpar a mancha era a principal prioridade. 

— Por favor, faça.

— Custará três cobres grandes para o conjunto de feitiços de limpeza e secagem.

Eu não queria me preocupar em pechinchar, então simplesmente paguei as três moedas.

— Agora então, primeiro vou remover a mancha… ▓ ▓ ▓! ▓ ▓ ▓ ▓! ▓ ▓ ▓ ▓ ▓! Limpeza Suave Juusenjou!

A Magia Cotidiana em Zena a deixou ensopada. O envoltório do peito que ela usava no lugar de um sutiã estava aparecendo através de sua blusa, agora transparente, então rapidamente puxei uma toalha grande do Armazenamento e a coloquei em volta de seus ombros. Ouvi algumas queixas de decepção de alguns homens desagradáveis ao nosso redor, mas os ignorei.

A mancha pegajosa de missô que estava na blusa de Zena momentos atrás desapareceu completamente. Como mágica!

— E agora eu vou secar você… ▓ ▓ ▓! ▓ ▓ ▓ ▓ ▓! Secagem Kansou!

Como se tivesse sido colocada em uma máquina de secar, a blusa ficou subitamente seca. Depois que verifiquei que a blusa dela não estava mais transparente, estendi a mão para pegar a toalha. Minha mão deve ter entrado no campo do feitiço de secagem quando fiz isso, porque de repente senti um calor seco e estático como se tivesse a colocado em uma secadora.

> Habilidade Adquirida: “Magia Cotidiana”

Uau, isso foi o suficiente para eu aprender? Habilidades mágicas são super fáceis de aprender.

Dito isto, os encantamentos pareciam muito mais difíceis de aprender, então talvez tenha se equilibrado.

Assim que os feitiços terminaram, a jovem encantadora desapareceu na multidão.

Bem, eu tenho uma usuária de mágica aqui comigo, então talvez ela possa me contar sobre isso. Se eu aprendesse Magia Cotidiana, poderia usá-la no lugar de uma lavadora e secadora.

— Zena, como você recita os encantamentos de feitiços?

— Como assim?

— Bem, a pronúncia parece bem estranha para mim…

— Entendo… Bem, a maioria dos feitiços de Magia de Vento começa com ▓ ▓ ▓ ▓! Se eu tivesse que ouvir, seria algo como ‘lyuuu lia (etc.)… laaa luleli laaaao’, talvez? Mas mesmo que possam memorizá-los, a maioria dos iniciantes ainda não consegue entoar os encantamentos logo de cara. Está…

Zena inclinou a cabeça, pensativa, tentando descobrir a melhor maneira de explicar.

— … ritmo. Sim, é isso. Você pega aquele cântico lento que eu mencionei antes e entona em um ritmo constante. E se mantiver esse ritmo e o aumentar, terá ▓ ▓ ▓ ▓! Ao menos em teoria.

Curioso, tentei praticar a frase que ela me ensinou, mas depois de alguns minutos, tive a sensação de que não chegaria a lugar algum. 

— Isso é muito difícil.

— Bem, sim, claro que é! Normalmente, leva anos para aprender os encantamentos.

— Quantos anos você teve que estudar antes de usar Magia de Vento, Zena?

— Tecnicamente, diria que cerca de três anos de treinamento. Mas, parando para pensar, parece que tenho treinado para ser uma feiticeira todos os dias da minha vida.

O que isso significava? O menor traço de sombra, ou talvez amargura, nublava o seu sorriso geralmente brilhante. 

— Para começar, eu tinha livros infantis sobre a história da magia sendo lidos em voz alta para mim, praticava a leitura de poemas em voz alta e a respiração abdominal… Tinha brinquedos que me ensinavam o fluxo da magia também. Das aulas às brincadeiras, tudo foi projetado para me ajudar a virar uma feiticeira.

Entendo… Então ela foi criada como uma criança talentosa? Havia crianças pequenas no Japão que não podiam brincar com outras crianças porque também tinham aulas particulares, então acho era a mesma coisa.

Talvez não devesse ter perguntado.

— Ah, mas não tenho nenhuma má impressão em relação a meus pais por me criarem assim ou algo do tipo! É divertido usar magia, e meu objetivo é poder voar algum dia. — Sentindo que o clima havia ficado um pouco pesado, Zena acrescentou rapidamente: — Então, por que está interessado em praticar magia, Satou? Seria útil para o seu comércio?

— Oh, não… não tem banho na pousada, então pensei que se pudesse usar Magia Cotidiana, não teria que tomar banho no lado de fora e outras coisas. — Tentando aliviar as coisas, dei o motivo mais idiota em que consegui pensar.

Minha palhaçada deve ter funcionado, porque Zena olhou para mim incrédula por um momento, depois caiu na gargalhada. 

— Ah-ha-ha-ha! Nunca ouvi falar de alguém querendo aprender mágica por uma razão como essa!

Foi realmente tão ridículo…? Deve ter sido muito engraçado mesmo, porque Zena parece não conseguir parar de rir.

— Isso é estranho? — Eu estava brincando, mas não achei que fosse uma razão tão ruim assim. Quem não gostaria de tornar uma tarefa irritante mais conveniente?

Sua resposta foi instantânea. 

— Sim, é! Muito estranho!

— Digo, se você tivesse tempo e dinheiro para aprender magia, seria melhor fazer um banho em sua casa, não é? E você pode simplesmente contratar um servo ou comprar um escravo para aquecê-lo para você!

Ah, então é assim…

Costumo pensar que, se posso fazer algo, prefiro cuidar de tudo eu mesmo, mas acho que era normal pagar pela mão de obra aqui. Aparentemente, também não custava muito.

Mas agora que sabia o básico, achei que poderia encontrar um livro introdutório e praticar um pouco mais.

De qualquer forma, em algum momento do curso dessa conversa, adquiri a habilidade “Sigilo” e os títulos Palhaço e Cavalheiro. Mas não tive tempo para me preocupar muito com o meu histórico.

Tendo restaurado com sucesso o clima de nosso passeio, continuei andando com Zena, experimentando diferentes comidas. Nosso próximo destino era uma área de sobremesas com cheiro doce.

— Um pão doce frito! Eles fazem uma pasta com batatas-doces cozidas no vapor e amassam na massa antes de fritar.

Um pão de sobremesa feito com batata-doce… Isso me pareceu vagamente japonês. Enquanto comia o pão doce, também bebi algo quente com gosto de chá de gengibre diluído.

— E guardei o melhor para o final! Lilio me falou sobre esse lugar. — A próxima barraca onde Zena me levou vendia o mesmo doce de xarope de malte que eu tinha comido com Martha no dia anterior. O lojista estava usando o mesmo avental que o homem de quem os compramos.

Dei ao homem duas moedas de cobre e comprei uma para cada um de nós. Pegando duas varas finas, o vendedor as mergulhou no líquido marrom pegajoso e as girou lentamente antes de puxá-las de volta.

Zena parecia tão animada em me mostrar, então me sentiria mal dizendo que já tinha provado. Em vez disso, decidi agir como se tivesse passado muito tempo.

— Doces de xarope de malte, hein? Isso me traz memórias.

— Ah… então você já comeu isso antes?

Ela parecia um pouco decepcionada. Porra… acho que deveria ter agido surpreso.

— O doce de calda que eu estou acostumado é geralmente claro, então no começo não consegui adivinhar o que era.

— Jovem mestre, o doce de calda incolor é um produto de alta classe, feito com arroz e açúcar. O nosso é mais para os plebeus, por isso usamos batatas e frutas de gabo com malte. É por isso que é marrom, sabe. — O homem mais velho interrompeu rapidamente.

Jovem mestre? Quem, eu? Ele não parecia estar falando com Zena.

— Oh, senhor… sou apenas um plebeu. Um amigo me deu o doce claro há muito tempo, não sabia que era um item de alta classe.

Quero dizer, custou apenas duzentos ienes em um festival.

Depois disso, andamos pelas outras barracas, apreciando as vistas e os sons da rua cheia de gente.

Decidi comprar alguns doces fritos feitos com mel para as meninas que trabalhavam duro na Pousada da Frente. Zena e eu comemos um cada, e eram bem saborosos. Imaginei que as meninas também iriam gostar.

Depois de ter comido e bebido, visitamos algumas barracas que vendiam produtos diversos.

Um suporte com conchas bonitinhas e cerâmica bisque chamou minha atenção. Por alguma razão, o preço de mercado mostrado pela minha habilidade “Estimativa” para as conchas era bastante alto. Quando perguntei à lojista idosa sobre elas, ela explicou que eram vasos para guardar remédios.

— Esta pomada é muito eficaz, jovem mestre.

— O que isso faz?

— Faz maravilhas com cortes ou pele rachada. Se você entregar aos seus servos, eles trabalharão duro como cavalos!

Em uma análise mais aprofundada, a pele enrugada da velha lojista estava muito menos rachada do que a da senhoria da Pousada da Frente. Ela me alimentou bem com comida deliciosa, então decidi que poderia comprar algumas para ela como lembrança. E embora o preço fosse alto, ainda custava apenas algumas moedas de cobre.

— Eu aceito, então, por favor.

— Serão quinze moedas de cobre, mas vou fazer um desconto, doze moedas de cobre.

Uau, isso é realmente mais barato que o preço de mercado. Enfiei a mão no bolso para pegar o dinheiro para pagar a mulher, mas a mão magra de Zena me parou no meio do movimento.

— Com licença, senhora, mas isso parece um pouco caro. Não foram duas por um cobre da última vez que vim aqui? E já que ele está comprando cinco, não pode fazer por nove?

Uau. Zena estava sorrindo docemente enquanto fazia uma pechincha ridícula.

— Nossa, não percebi antes porque você está com um homem hoje, você não é a garota que geralmente está com Lilio? Bem, não posso fazer menos do que dez cobres.

— Então pode incluir três dessas pequenas aqui, por favor? — Reconhecendo que ela não iria abaixar ainda mais o preço, Zena apontou para algumas pequenas conchas ao lado da pomada que eu estava comprando e as pediu como bônus. Com base em seu tamanho, acho que as miniaturas poderiam conter cerca de um terço do que as conchas maiores.

— Deus, garota! Se você começar a agir assim como Lilio, nunca poderá se casar. Vou dar uma das pequenas e nada mais.

Zena contorceu o rosto um pouco na parte do casamento, mas manteve o sorriso enquanto aceitava a pechincha. 

— Muito bem. Isso vai funcionar muito bem.

Ela tem apenas dezessete anos… É um pouco cedo para se preocupar com casamento, não é?

A velhinha embrulhou habilmente as conchas nas folhas, depois usou algum tipo de videira fina para uni-las. Se eu colocá-las na minha bolsa assim, sinto que vão virar uma meleca. Agradeci a Zena por cuidar de mim e lhe dei uma das conchas.

Faria isso de qualquer forma, então…

Depois que chegamos ao fim das barracas, ela me levou para algum lugar novo.

— Você tem certeza de que está bem em ir a um lugar como este?

— Sim, a brisa é ótima.

— Hee-hee, isso é verdade. — Zena riu enquanto olhava a paisagem abaixo. Estávamos no topo de uma das torres das muralhas da cidade. Eu tinha visto a área após as barracas das ruas, então ela se ofereceu para me levar. Como era uma instalação militar, eu não podia andar por ali, a menos que estivesse em sua companhia.

Zena parecia ser relativamente famosa, pois mesmo com suas roupas civis, conseguiu uma autorização sem problemas.

— Eu sei que fui eu quem pediu, mas você tem certeza de que está bem trazer alguém que não faça parte das forças armadas aqui?

— Não tem problema! Os únicos ataques que temos que temer aqui nesta cidade são de wyverns. Não lutamos com nenhum país vizinho há alguns séculos e a guerra com o povo besta acabou há dez anos.

Hmm… eu me pergunto se o povo besta escravo na cidade eram prisioneiros de guerra daquele período?

— Zena, para que é usado aquele moinho de vento?

— Oh, aquilo? É um moinho de farinha. Mas também pode ser transformado em uma plataforma de bateria de armas no caso de um ataque de wyvern.

Uma bateria de arma? No meio da cidade? 

— Se disparassem canhões em um local como esse, não danificaria as casas próximas?

— Bem, têm canhões, mas contra um wyvern disparam apenas redes.

— Entendo… Então é usado para fazer um wyvern mudar de direção?

— Isso. Eles o mandam para um campo naquela mansão ali, para que possam acabar com ele.

Isso não destruiria o campo também?

Zena percebeu que eu estava realmente interessado neste assunto, então se ofereceu para me levar a mansão e ao moinho de vento. Eu estava planejando pedir a ela mais tarde, de qualquer maneira, então funcionou para mim.

No caminho para o moinho de vento próximo, Zena disse que poderíamos parar no templo de Parion. O sacerdote suspeito que causou alvoroço ontem era de Zaikuon, certo? E quem curou a perna de Zena foi Garleon… será que todos os deuses têm “on” no final de seus nomes?

— Aqui estamos!

A poucas ruas da área, com todas as barracas, chegamos ao templo de Parion. Estava em um terreno bastante grande, cerca de três quartos de um acre? De qualquer forma, era três vezes o tamanho de qualquer casa normal.

A muralha ao redor da área parecia servir como muro externo do templo. Foi feito de pedra; ao atravessar a entrada em arco, pude ver um espaço para colocar cavalos e carruagens e um portão aberto.

Havia uma carruagem de aparência cara na área de estacionamento. Talvez fosse errado da minha parte presumir, mas tinha uma forte suspeita de que esse clero estivesse cheio.

Zena pegou minha mão e me guiou para o templo. Dentro havia uma sala grande com um teto alto de pelo menos dez metros de altura. Várias faixas e símbolos sagrados decoravam a sala, e vários sacerdotes realizavam uma espécie de ritual de batismo para o filho de alguém que parecia um comerciante.

Havia claraboias no teto, embora sem vitrais; na metade superior da muralha, estava uma pintura de um cavaleiro empunhando uma espada em combate com um demônio com chifres. A imagem era um pouco estranha, mas estranhamente poderosa.

— Essa é uma pintura do primeiro herói lutando contra o lorde demônio.

— Oh, esse é o herói? Eu tinha certeza de que ele era um cavaleiro.

— Você pode dizer porque a espada sagrada dele está brilhando em azul. Seria fácil dizer se fosse um cavaleiro; em vez disso, usaria uma Espada Mágica, e elas brilham em vermelho.

Pensem bem naquelas espadas sagradas que brilhavam em azul quando as peguei pela primeira vez também. Mas durou apenas um segundo.

— A espada sagrada do herói é a única que brilha?

— Uma espada sagrada deve brilhar em azul somente se aceitar o portador. Mas algumas Espadas Sagradas foram usadas por pessoas sem o título de Herói, como Gjallarhorn, que o rei ancestral Yamato deixou para trás, e Claíomh Solais, a Espada Sagrada que protege nosso reino.

“Aceitar o portador”, hein? Eu não tinha muita confiança no meu heroísmo, então duvidei que uma Espada Sagrada me aceitasse tão cedo. De qualquer forma, Claíomh Solais era um nome famoso o suficiente para parecer familiar, mas eu nunca tinha ouvido falar em Gjallarhorn.

Ah, mas também tenho vários títulos… Desde que matei alguns dragões, me pergunto se consegui o título de Herói. Quando abri a lista de títulos para verificar, encontrei algo estranho.

… Matador de deus?

Alarmado, verifiquei meu histórico duas vezes. Felizmente, não parecia que nada foi excluído ainda.

Entre as notificações de inimigos que havia derrotado, havia um punhado de títulos espalhados. Tinha conseguido alguns títulos como Matador de Homem-lagarto, Matador de Dragão [Menor], Matador de Dragão [Totalmente Evoluído], Matador de Dragão [Ancião] e Matador de Dragão [Deus]. Além de ~ Matador, havia outros como ~ Destruidor e Inimigo Natural de ~.

E depois de todos…

> Deus Dragão Aconcagua derrotado!

> Título adquirido: Matador de deus>

Você acredita em deuses?

Entendo… Então a chuva de meteoros pode matar até deuses? Pode, hein…

Entrei em pânico e usei três chuva, mas se tivesse usado apenas uma, teria recebido um contra-ataque de um deus furioso? Bem, acho que não tem problema quando tudo acaba bem.

— Isso não significa que qualquer pessoa possa usar uma Espada Sagrada.

Depois que fiquei em silêncio em choque, a voz suave de uma mulher interrompeu nossa conversa…

— Somente aqueles heróis que atendem ao chamado de nossa jovem deusa Parion podem lutar contra um lorde demônio. Ante um herói que empunha uma Espada Sagrada de um deus assim, mesmo um lorde demônio nada pode fazer senão cair de joelhos.

Ao me virar, vi uma jovem mulher vestida de escarlate, não muito diferente de uma freira ocidental. Algo nela, talvez a cor pálida de seus olhos, fez toda a sua presença parecer de alguma forma fraca para mim. Seu traje era diferente das roupas que tinha visto no outro clero local. Ela era alguém importante?

Ao lado de seu rosto, uma tela de RA começou a exibir as informações da mulher. Muito conveniente.

— Irmã Ohna!

— É bom vê-la de novo, finalmente, Zena da casa de Marienteil. Seu irmão mais novo está saudável?

— Sim! Ele vai se tornar o novo chefe da família no próximo ano, então está estudando muito.

— Entendo. Se surgir alguma coisa com a qual eu possa ajudar, não hesite em perguntar.

Tendo conversado com a sacerdotisa por um momento, Zena virou-se para mim para apresentações. 

— A irmã Ohna é filha do conde. Minha mãe era sua ama de leite, então a irmã Ohna está sempre preocupada com a saúde do meu irmão mais novo.

Entendo… Ela deve se importar muito com o irmão de Zena, então. A mulher se aproximou de nós apenas para perguntar sobre ele, afinal.

— É um prazer conhecer você. Sou um vendedor ambulante chamado Satou.

— Sou irmã Ohna, uma sacerdotisa que serve ao templo de Parion. Por favor, esqueça a linhagem de que Zena falou; tal status mundano não tem sentido no templo.

Então ser sacerdotisa aqui era como ser um monge budista?

Embora ela fosse mais nova que Zena, sua disposição calma de alguma forma a fazia parecer mais uma mãe amorosa.

— Ainda assim, sua visita me traz muita tranquilidade. Até agora, Zena apenas demonstrou interesse no estudo da magia, mas parece que a primavera finalmente chegou para ela.

— O q-quê…? Não! Não é nada disso! Satou e eu, hmm, acabamos de nos conhecer, então…! — Zena, que aparentemente tinha pouca experiência com o amor, parecia desproporcionalmente perturbada pelos comentários de Ohna e estava freneticamente dando desculpas. Seu processo de pensamento pubescente estava estampado em todo o rosto: eu gosto dele… mas não é amor nem nada… mas acho que não iria me opor se…

Ela era tão inocente… Isso trouxe de volta memórias dos meus dias de escola.

Queria conversar um pouco mais com a sacerdotisa, mas uma comoção perto da entrada nos forçou a parar.

— Sua Santidade! O chefe da família Boril está mortalmente doente! Ele ainda é jovem, por favor, venha ajudá-lo!

— Mestre Boril, é? Só nós, novatos, não podemos aliviar a doença dele…

— Traga a sacerdotisa, então!

— A propriedade Boril não está no bairro oeste? Não podemos enviar a reverenciada sacerdotisa servindo como Oráculo de nosso deus para um lugar de bordéis e sujeira!

— Por favor! Estou te implorando!

Um sacerdote e um homem que pareciam ter invadido o templo estavam tendo uma discussão acalorada. A irmã Ohna virou-se para Zena. 

— Parece haver uma emergência, então devo me despedir agora, Zena.

Com isso, a sacerdotisa foi até os dois homens. 

— Eu vou. Por favor, prepare a carruagem.

O sacerdote ainda parecia indignado, mas ele não era páreo para a vontade da “Oráculo”. Eu podia ouvi-lo discutindo com ela em um sussurro urgente. É rude escutar, é claro, mas tinha esquecido de desligar minha habilidade de “Audição Aguçada”, então acabei me sintonizando.

— Irmã Ohna, você não deve ir ao conde para transmitir o Oráculo que recebeu há pouco tempo?

— Eu já confiei ao sacerdote chefe essa tarefa.

— Mas a previsão dizia que haveria um desastre no templo de Zaikuon, é muito perigoso chegar perto dele no bairro oeste!

— Eu acredito que tudo ficará bem. A propriedade Boril está longe do templo deles.

Templo Zaikuon, hein? É daí que aquele sacerdote rechonchudo era, aquele que estava pregando no bairro leste. Ele faria algo drástico para reconquistar seguidores?

Bem, teríamos que garantir que não iriamos chegar muito perto se parecesse que um tumulto ou algo assim estivesse prestes a acontecer. Eu tinha certeza de que poderia pegar Zena e pular em um telhado, se fosse o caso.

Zena e eu deixamos o templo e voltamos ao nosso passeio pela cidade.

Andar pelas ruas de estilo europeu com uma adorável jovem certamente foi divertido. Parques, praças abertas, poços públicos e afins eram distribuídos por toda a cidade em intervalos regulares. Caminhamos por um caminho próximo a um desses parques, contemplando a paisagem.

Em uma pequena praça onde a grama foi cortada, vimos um casal de idosos com uma criança relaxando em um banco e um grupo de dez ou mais jovens praticando artes marciais. Pensei que o gramado era um tanto uniforme, mas, olhando mais de perto, vi que era uma mistura de gramas e ervas diferentes.

Zena parecia ter encontrado algo interessante, pois parou de repente e correu para uma grande árvore no meio do parque.

— Qual o problema?

— Satou, olha o que encontrei…

Zena estendeu as mãos em concha e lá estava um passarinho.

Uma garota bonita segurando um pequeno pássaro, a luz do sol filtrando-se através das árvores… Agora, era uma imagem que vale mais que mil palavras.

— Parece que tem um ninho no topo da árvore.

O galho mais próximo tinha cerca de dois metros e meio… Hmm. Eu poderia dar esse salto de uma só vez com bastante facilidade, mas provavelmente pareceria um pouco sobre-humano. Provavelmente era melhor apenas subir.

— Hmm, Satou, você poderia, por favor…? — Zena perguntou timidamente, então é claro que concordei de bom grado.

Eu já iria fazer, de qualquer maneira.

Pegando o filhote de passarinho em uma mão, peguei o primeiro galho com a outra. Fiz uma flexão de um braço para subir naquele galho, colocando o pé para cima e escalando para ficar contra o tronco da árvore. Foi muito difícil de fazer sem esmagar o filhotinho.

O ninho estava na base de um galho dois ou três galhos acima daquele em que eu estava, mas consegui alcançá-lo e devolvê-lo sem muita dificuldade. Assim que coloquei o filhote de volta no ninho, sua mãe desceu furiosamente para mim, estava muito ocupado me defendendo para apreciar a visão dos filhotinhos que procuravam comida com seus pequenos bicos abertos.

Desde que recuperei o uso das duas mãos, descer ficou muito mais fácil. Quando cheguei ao último galho, tive que me lembrar de agarrá-lo e me pendurar por um momento antes de descer. Não queria preocupar Zena pulando assim, afinal.

— Uau! Satou, você realmente é muito ágil!

— Oh, não foi nada de especial. — Esquivando-me do elogio de Zena, voltei à nossa conversa fiada.

Enquanto conversávamos, Zena pretendia pedir que eu a levantasse para que ela pudesse devolver o pássaro sozinha. Ah, Zena. Ainda bem que não entendi, porque uma saia não é exatamente o ideal para subir em árvores.

Observando o grupo de crianças praticando artes marciais, fiz uma pergunta. 

— Que tipo de coisas o exército faz para treinar?

— Hmm… Bem, os soldados treinam da mesma maneira aqui como em qualquer outro lugar, mas os soldados mágicos precisam estar atentos para que não usem toda a sua magia. A maioria de nós tenta se manter pronto para lançar com força total.

Entendo. Então eles dividem o treinamento? Fazia sentido, um soldado mágico que não pudesse lançar feitiços não seria de muita utilidade para ninguém.

— Os papéis atribuídos aos soldados mágicos e feiticeiros variam de acordo com seus atributos. Isso tende a surpreender as pessoas fora do exército, mas, por exemplo, os usuários de fogo são o único grupo que realmente se concentra nos feitiços de ataque direto.

Sim, acho que o fogo é definitivamente orientado a ataques.

— Como usuária de vento, tenho feitiços úteis como proteção contra vento, que se defende contra flechas; Almofada de Ar, que pode parar os aríetes; e Sussurro, que pode transmitir ordens. Seria ótimo usar o Voo para explorar e coisas assim, mas não há ninguém no condado que saiba como usar isso.

Isso mesmo, o objetivo de Zena não era poder voar?

— Se você aprender a voar, seria divertido ir a um encontro no céu ou algo assim.

Eu quis dizer isso como uma piada, mas Zena corou até o pescoço e gaguejou: 

— P-por favor, espere!

Ela era fofa, mas eu estava preocupado que alguma pessoa mal intencionada tirasse proveito de sua inocência mais cedo ou mais tarde.

Quando saímos do outro lado do parque, chegamos ao pé do moinho de vento.

Não conseguimos subir até o topo, mas conseguimos ver o primeiro andar, onde moem a farinha. Havia algo empolgante nas vistas e sons estrondosos das densas máquinas de metal em ação.

Mas apesar de tudo, era um moinho de vento bastante normal. Como esse era um mundo de fantasia, gostaria de ver alguns espíritos dançando ao redor enquanto moíam a farinha ou algo assim.

Com isso em mente, perguntei a Zena sobre. 

— Eles não poderiam usar magia para moer a farinha de alguma forma?

— Provavelmente, mas… usar um moinho é muito mais fácil —  respondeu, lançando-me um olhar dizendo: que tipo de pergunta é essa?

Nosso próximo destino, o campo da mansão, ficava um pouco longe, por isso pegamos uma carruagem puxada a cavalo pela Rua Central. Aparentemente, custava um cobre grande para qualquer destino, desde que estivesse dentro dos limites da cidade. O veículo era claramente destinado a turismo, pois não tinha teto e os assentos tinham a altura dos ombros.

Percorremos a cidade a trote lento. Um passeio de carruagem pela cidade em um país exótico com uma linda garota ao meu lado, com a qual eu poderia me acostumar. Seria ainda melhor se fosse uma mulher linda e voluptuosa, mas isso provavelmente seria pedir demais.

A carruagem deixou a rua principal e seguiu para o norte através de um distrito de trabalhadores. Lá, vimos muitas pessoas vagamente musculosas e de aparência teimosa. Passamos por prédios que pareciam oficinas e fábricas, depois por um depósito de madeira, até estarmos diante da muralha interno da cidade.

Prosseguindo para o oeste, alcançamos um pequeno caminho entre a muralha externa no limite da cidade ocidental e a muralha interna, do outro lado da qual era a mansão do senhor.

— Quando passarmos por aqui, estaremos no campo.

— Essas muralhas  são bastante impressionantes, olhando para elas de ambos os lados assim.

— Sim! Isso faz você se sentir seguro, não é?

Zena apertou os dois punhos e se aproximou um pouco de mim. Naquele momento, com o que parecia um momento deliberado, a carruagem estremeceu abruptamente. Deve ter passado em cima de uma pedrinha.

— Ah! — Ela perdeu o equilíbrio e caiu em mim, forçando-me a pegá-la. Zena certamente estava muito mais macia do que em sua armadura de antes. Ainda não havia muito o que mencionar sobre seu peito, mas a garota era muito suave e feminina, embora eu preferisse esperar pelo menos mais cinco anos antes de fazer algo assim.

— Você está bem?

— S-sim! Me desculpe, vou me levantar agora! — Confusa, Zena rapidamente se afastou de mim. Você não precisa se sentir tão mal por isso.

Por um momento, poderia jurar que vi o cocheiro rindo. Isso foi de propósito?! Esse motorista seria um ótimo braço direito.

Depois de percorrer esse caminho por mais algum tempo, chegamos a um portão aberto com um soldado de guarda. O motorista acenou para ele levemente, depois passou pelo portão para a mansão do senhor.

A terra parecia pequena demais para fornecer comida suficiente para toda a cidade, mas grande demais para servir como campo pessoal do senhor feudal. Nossa carruagem prosseguiu lentamente pela estrada pastoral. Parecia que os trabalhadores estavam colhendo alguma coisa. Usando minha habilidade de “Visão Telescópica”, pude ver que estavam colhendo os “frutos gabo” que eu tinha visto antes.

E, como no mercado, muitos dos ajudantes eram crianças do ensino fundamental.

— Essas crianças provavelmente são de orfanatos. Desde a época da colheita, as crianças da cidade também podem começar a trabalhar.

— Esses frutos gabo são saborosos?

— Não, de jeito nenhum. Às vezes, eles aparecem em rações do exército, mas são tão fedorentos e amargos que ninguém realmente gosta.

Zena estava fazendo uma cara extremamente desagradável. Ela os odiava tanto assim?

— Se são tão ruins, por que plantar tantos? — Parecia uma pergunta óbvia quando olhei para o grande campo de gabo. Não seria melhor cultivar, digamos, batatas? Gostaria de saber se eles são particularmente ricos em nutrientes ou calorias, ou algo assim?

— As autoridades civis dizem que são uma colheita confiável o ano todo. Um campo inteiro pode não render muito ao mesmo tempo, mas pode ser colhido uma vez por mês, e a colheita quase nunca falha. Além disso, pode até fertilizar terras de pousio. É graças ao gabo que a taxa de fome na cidade está caindo rapidamente.

Que colheita conveniente de fantasia. Isso quase parecia muito valoroso.

Pode ter sido informações de segunda mão de um funcionário, mas ainda era uma explicação impressionantemente detalhada, Zena.

— Mas, pode ser cultivado apenas em áreas muradas, portanto a situação alimentar no campo aparentemente ainda é bastante difícil.

A muralha externa do pomar era mais baixa que a que cercava a cidade, talvez cerca de quinze metros? Eu me pergunto por que tem que ser cercado? É mais difícil crescer do lado de fora, ou talvez os animais o comem, ou o senhor feudal está apenas monopolizando-o? Achei isso muito intrigante.

— Tem um motivo para isso?

— São a comida favorita dos goblins. Eles virão e devorarão em questão de momentos, caso os campos não estiverem protegidos assim. O fruto também não pode ser exportado para fora da cidade.

Ooh, também existem goblins neste mundo? Eu definitivamente gostaria de ver um. De uma distância segura, de preferência.

— Parece que teria pessoas que tentariam contrabandear eles, de qualquer maneira.

— Bem, se fossem pegos, seriam sentenciados à escravidão.

Sim, mas se houver fome, haveria pessoas que se arriscariam à escravidão de qualquer maneira e tentariam contrabandear.

— Lá é uma torre de defesa anti-dragão.

Zena estava apontando para uma das três grandes torres dentro do terreno da mansão. Dois moinhos de vento presos no topo como o que eu tinha visto de dentro da cidade.

— Parece muito maior e mais resistente do que o de dentro da cidade.

— Sim, é. Tem grandes armas mágicas instaladas na parte de trás, precisam se defender contra invasões de wyrms e dragões voadores, então a torre precisa ser sólida.

Infelizmente, por causa do canhão no topo, os civis não podiam entrar na torre de defesa anti-dragão.

Eu já estava pensando há um tempo: por que eles não lutariam contra os dragões fora da cidade em vez de aqui, onde havia colheitas que poderiam ser facilmente arruinadas por uma coisa dessas? Perplexo, fiz a pergunta para Zena.

— Esses campos foram originalmente preparados especificamente para combater os wyverns — explicou. Aparentemente, como os ataques tinham diminuído e os campos estavam caindo em desuso, o conde atual decidiu que a área deveria ser usada como terra agrícola e como mansão, para que não fosse desperdiçada.

Entendo, então foi isso o que aconteceu.

A carruagem prosseguiu por uma estrada que ligava as torres. Uma delas estava quase destruída, desmoronando e enegrecida por dentro e por fora. Havia algumas pessoas fazendo medições nas proximidades, deviam estar estudando o processo de reparos.

— Um wyvern destruiu essa torre?

— Oh… Não, um dragão menor destruiu em um ataque tem uns dois anos. Aparentemente, derrubou metade das torres da região e causou danos até no castelo. Mas conseguimos expulsá-lo.

— Apenas expulsá-lo?

— Bem, um dragão menor ainda é um dragão, afinal. Wyverns são outros quinhentos, mas derrotar um dragão é impossível. Você teria que ser um grande mágico como o rei ancestral Yamato ou um herói do Império Saga.

Fiquei tentado a examinar meu Armazenamento, mas resisti. A história de Zena ainda continuava.

— Foi suficiente para assustar o dragão menor, mas quarenta anos atrás, quando um dragão negro adulto atacou, eles não conseguiram nem arranhá-lo. É difícil de acreditar, mas dizem que até destruiu a muralha externa! A razão pela qual a muralha da mansão é tão baixa é porque foi construída após esse evento.

— Então como eles se defenderam? Um herói interveio e o derrotou?

— Não… Depois de comer cabras das fazendas, simplesmente foi embora. Acho que, do ponto de vista de um dragão, os seres humanos nada mais são do que formigas.

Os dragões eram realmente tão fortes? Então me pergunto se derrotar dragões significava que eu poderia almejar a dominação do mundo. Não que eu tivesse a ambição ou o desejo de fazer algo assim.

— É mesmo, conversamos um pouco sobre isso no templo, mas o que exatamente faz de alguém um ‘herói’, afinal?

— Um herói? Bem, aparentemente há uma poderosa técnica mágica no Reino Saga chamada Convocação de Herói. Ouvi dizer que o custo da convocação é enorme, portanto, eles a usam apenas durante o ciclo de sessenta e seis anos da invasão dos lordes demônios.

— Eles dizem que o rei Yamato e o primeiro imperador do Reino Saga foram heróis chamados pela magia de Convocação de Herói para salvar o mundo. Incrível, não é?

Então os heróis eram convocados, hein? Talvez eles realmente fossem japoneses então. Yamato era definitivamente um nome japonês, e até esse imperador “Saga” também poderia ser. E a razão pela qual as espadas tinham nomes como “Excalibur” e “Claíomh Solais” também poderia estar ligada a isso.

De qualquer forma, esse “Império Saga” pode ser a chave para voltar ao meu próprio mundo. Por enquanto, escrevi uma nota sobre isso na aba “Rede”.

— Então, esse ‘ciclo de sessenta e seis anos’ significa que vocês sabem quando um lorde demônio atacará?

— É mais como um período em que ele poderia atacar a qualquer momento. Mas ainda não ouvimos nada sobre alguém aparecer.

Hmm. Eu definitivamente sinto que isso poderia ter acontecido um tempo atrás, e as palavras ainda não chegaram aqui.

— Não é possível que um lorde demônio tenha sido revivido e o exército simplesmente não tenha ouvido falar sobre isso?

— O Reino Shiga e o Império Saga têm meios mágicos de transmitir informações urgentes; então, mesmo se alguém voltasse e destruísse a cidade, as notícias ainda chegariam a nós.

Uou, isso é impressionante.

— Além disso, antes que um lorde demônio apareça, as reverenciadas sacerdotisas de todos os templos receberiam um aviso divino chamado Oráculo, para que possamos saber com antecedência.

Ainda mais impressionante. Esses deuses sabem o que estão fazendo!

— O Oráculo é enviado antes de qualquer grande desastre, não apenas um demônio. Mas, aparentemente, nenhuma sacerdotisa teve uma premonição sobre a deriva estelar há dois dias… Talvez o Oráculo não tenha aparecido porque estava do outro lado da barreira do Vale dos Dragões.

Oh, aquela coisa da muralha. Talvez estivesse no domínio de um deus diferente e não se qualificasse para o Oráculo ou algo assim?

— Então, um ‘lorde demônio’ provavelmente tem um exército de monstros, certo?

— Parece diferir dependendo do lorde demônio. Alguns lutaram por conta própria, mas a maioria liderou grandes exércitos de demônios ou monstros em batalha. Dizem que alguns têm até exércitos humanos ou demi-humanos.

Hã?! Há muita variedade.

— Mas os subordinados mais assustadores que um lorde demônio pode ter são demônios infernais. Até os menores são tão fortes quanto aquele wyvern com que lutamos no outro dia.

— Uau. Você pensaria que ‘menor’ significaria que eles seriam fracos.

— Demônios infernais são problemáticos porque só podem ser machucados por armas mágicas ou imbuídas por magia.

— Então, se tem demônios infernais menores, também existem intermediários e maiores?

— Sim. Dizem que demônios infernais intermediários podem facilmente destruir uma cidade inteira. Geralmente, é preciso um grupo inteiro de cavaleiros ou feiticeiros reais para derrotar um. Eles têm maior resistência à magia, então feitiços fracos não funcionam.

Podem destruir uma cidade inteira? Me sinto mal por qualquer herói que tenha que lutar contra eles.

Mas se esse é o nível intermediário, significa que existem outros ainda mais poderosos?

— E os demônios infernais maiores?

— Eles estão no mesmo nível que um dragão ou um lorde demônio. Nenhum humano pode derrotá-los. É o tipo de oponente que você não pensa em como vencer, apenas em como minimizar suas perdas ou fugir.

Então está a par com o dragão adulto sobre o qual falamos anteriormente, acho.

Hã? Tem algo me incomodando… Estou esquecendo alguma coisa? Oh, bem, tenho certeza que logo vou lembrar.

— Então, o que é mais forte, um lorde demônio ou um dragão?

— Um dragão.

Uau, que resposta rápida.

— Uma vez, há muito tempo, havia um poderoso lorde demônio que até derrotou um herói… Mas ele perdeu a batalha contra um dragão.

— Então, em vez de convocar heróis, eles não deveriam apenas pegar um dragão para cuidar dos lordes demônios?

— Isso é impossível. Um dragão pode lutar contra demônios por diversão, mas nunca os derrubará por causa dos humanos. E as baixas de uma batalha entre os dois seriam terríveis, piores que os danos de um lorde demônio sozinho.

Entendo… Então é como se os deuses e os heróis tivessem que colaborar para derrotar o lorde demônio antes que um dragão apareça.

Com o poder da Chuva de Meteoros, posso estar no nível de um dragão agora. Se um lorde demônio atacasse e o herói lutando contra ele perdesse, eu usaria a Chuva de Meteoros para matá-lo à distância. Sou muito desajeitado para lutar de perto.

Conversas sérias demais podem ser cansativas; assim, enquanto observávamos as ovelhas mastigando a grama nos campos não cultivados, conversamos sobre nossas comidas favoritas e menos favoritas e coisas do gênero.

Depois que saímos da mansão, estávamos planejando ir a um restaurante conhecido na praça em frente ao castelo, mas ainda era um pouco cedo para o almoço, então adiamos nosso passeio para a muralha interna e seguimos para o bairro oeste em vez disso.

Aparentemente, havia lojas de alquimia por lá, então eu queria dar uma olhada.

— Além das lojas que atendem aos cidadãos não tão ricos, tem açougues, alquimistas e lojas desse tipo. Há outras coisas lá também, mas… — Zena ficou envergonhada e parou por aí.

Pelo que vi no mapa, havia também casas de penhores, agiotas e bordéis, no mínimo. Havia até um mercado de escravos na mesma rua. Ela provavelmente relutou em falar sobre essas coisas.

É melhor não insistir no assunto, ou pode parecer que estou a assediando.

Depois que passamos por uma área que vendia mantimentos e outras necessidades básicas, começamos a ver lojas de natureza mais duvidosa. Senhoras sexy e homens de aparência desagradável estavam vagando por ali.

A praça no bairro oeste tinha muitas barracas de rua, muitas vendendo gado. Em uma vista mais minuciosa, meninos e meninas jovens estavam alinhados em gaiolas ao lado do gado, escravos. Já tinha visto uma boa quantidade deles, mas esse tipo de tratamento era especialmente doentio.

Fiquei tentado a comprar todos e libertá-los, mas tinha medo de não conseguir cuidar de todos depois.

Na frente da praça, um homem parecido com um comerciante estava anunciando sobre o mercado de escravos. Aparentemente, aconteceria por três noites, começando na noite seguinte.

Quando saímos da praça, uma fila de bordéis nos cumprimentou. A cena lembrava estranhamente um drama histórico.

Definitivamente, seria melhor fazer coisas pervertidas com uma senhora nesta linha de trabalho por vontade própria. Por que forçar um escravo quando você pode estar com uma mulher que conhece seu caminho pelo quarto e realmente quer estar lá?

Eu quero ir a um bar com algumas senhoras bonitas hoje à noite! Gostaria de saber se têm bar hotel aqui. Gostaria de ter uma conversa suja com uma mulher, em vez de tomar um banho de espuma ou o que quer que seja. Oh Oh, merda. Provavelmente não deveria estar pensando sobre isso quando estou com uma garota, mesmo que não estejamos envolvidos. Desculpe, desculpe.

 


 

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Bravo

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