Joe acabou ficando doente. Ele era o segundo mais fraco do grupo antes de Papel ser raptada, então agora ele era o mais fraco. Joe estava se sentindo bem na noite em que voltou da praça. Mas no dia seguinte, Dente de Cobra encontrou-o deitado imóvel no feno, gemendo baixinho e com as bochechas vermelhas e brilhantes.
— Ele pegou a peste fria! — Girassol disse enquanto tocava a cabeça de Joe — A testa dele tá ardendo.
— Eu… eu vou morrer?
Joe cerrou os olhos e perguntou baixinho.
Ninguém respondeu.
A peste fria era uma doença extremamente teimosa e, uma vez que alguém a contraísse, só poderia confiar no próprio corpo para resistir à infecção. No entanto, pessoas que se alimentavam bem e estavam em forma, raramente sofriam com o frio, já as mais fracas eram o principal alvo da peste fria, e era por isso que poucas pessoas conseguiam sobreviver. Essencialmente, um rato que contraísse a peste fria estava sentenciado à morte.
— Eu vou tentar encontrar Kanas! — Dente de Cobra disse, quebrando o silêncio.
— E o que é que você vai pedir pra ele?
— Eu vou implorar para ele dar mais comida pro Joe. — Dente de Cobra disse decidido e levantou-se — Ouvi dizer que se a gente alimentar e aquecer direitinho o doente, ele pode sobreviver.
— Ele não vai te dar comida. — Garra de Tigre balançou a cabeça e disse — A gente sabe muito bem que tipo de pessoa ele é.
— Além do mais, você pode acabar sendo espancado. — Girassol disse enquanto colhia feno — Ratos não alimentam uma pessoa inútil.
— Joe não é inútil. — Dente de Cobra replicou — Ele sabe ler!
— Apenas algumas palavras, e Kanas vai fazer o que com isso? Ele quer pessoas que possam roubar casas e outras pessoas.
Dente de Cobra cerrou os dentes, virou-se e caminhou em direção ao quarto do mandachuva do Beco Sem-fim. Ele tinha que tentar, mesmo que apanhasse de Kanas com uma vara.
Surpreendentemente, Kanas ainda não havia voltado.
— Você é sortudo mesmo. — Quando Dente de Cobra trouxe a mensagem de volta para seus companheiros, Garra de Tigre sorriu — E eu que pensei que teríamos que cuidar de mais um.
Girassol suspirou.
— Quando chegar a hora da distribuição de pão, cada um de nós vai dar uma porção do pão para Joe, assim ele vai comer mais.
No entanto, Dente de Cobra não sentiu que estava com sorte. Ele podia sentir que algo não estava certo.
Kanas não levaria nem meia hora para ir correndo até Mão Sangrenta e contar as novidades. — Dente de Cobra pensou — Tudo bem, ele pode ter passado a noite inteira discutindo com o chefe sobre o que fazer, mas… já é meio dia! Eles não deveriam ter terminado já?
Além disso, quando os homens de Kanas abriram a porta, Dente de Cobra deu uma olhada e percebeu que Kanas e sua amante não estavam lá.
A gangue começou a distribuir comida não muito tempo depois, e Dente de Cobra percebeu que a comida estava sendo distribuída pelo confidente de Kanas.
Para piorar, ele recebeu meia fatia de pão duro.
Depois de quatro dias, a condição de Joe estava piorando.
Ainda ontem ele estava resmungando alto que estava com muito frio, mas hoje ele não conseguia falar uma palavra sequer. Suas bochechas rosadas começaram a ficar pálidas e sua respiração estava ficando mais fraca.
— A gente tentou o nosso melhor. — Girassol disse languidamente com a mão em seu estômago.
Eles haviam dado metade de sua comida para Joe nos últimos dias. Se não fosse por eles, Joe poderia não ter vivido tanto tempo. Garra de Tigre, que costumava ser muito enérgico, estava começando a parecer fraco também.
Kanas não apareceu nos últimos dias.
Mais de cem ratos se reuniram na sala e começaram a discutir o assunto. Mas não foi nada além de discussão, afinal, eles ainda estavam recebendo comida como de costume. No entanto, hoje estava especialmente barulhento.
Era o dia da distribuição de mingau de graça, conforme anunciado.
— Eu vou para a praça. — Depois de uma longa contemplação, Dente de Cobra cerrou os dentes e disse determinado — Nós precisamos comer mais do que pão. Joe pode ser capaz de aguentar e sobreviver se eu conseguir uma tigela de mingau de aveia quente para ele.
— Você tá maluco? — Girassol olhou para ele — Não se esqueça de como Kanas nos advertiu. Você realmente quer que ele costure sua boca?
— Isso só vai acontecer se ele souber que eu escapei. Nós nem sabemos onde Kanas está agora. E se o lorde da cidade realmente atacar os ratos?
— Mas os homens dele ainda estão aqui. Você acha que eles vão te deixar sair se descobrirem? — Girassol olhou para Garra de Tigre — Não fique aí sem fazer nada, me ajude aqui a convencer ele.
— Eu vou com você. — Garra de Tigre disse olhando para Dente de Cobra.
— Vocês…
— Fala sério, já devem ter acabado com a comida de graça, ou talvez nem tenha nada! Deve ter sido só um nobre tentando se fazer de bondoso. Tipo, a gente sair não é a mesma coisa que desobedecer Kanas, né? A gente nem vai comer nada mesmo. — Garra de Tigre contorceu os lábios e disse — Eu sou forte, eu posso correr até lá e voltar rapidinho enquanto carrego Joe nas minhas costas, e isso não vai demorar muito tempo. Kanas não está por perto agora e seus homens estão escondidos lá no quarto dele assando a bunda no fogo. Ninguém vai nos notar.
— Hã… — Girassol hesitou.
— Você fica aqui! — Dente de Cobra disse — Alguém precisa cobrir a gente. Se perguntarem, diz que a gente teve uma caganeira e fomos procurar um lugar longe pra não feder a casa toda. Não se preocupe, a gente não vai precisar de muito tempo para ir e voltar. Vai ser rapidinho.
— Ah… então beleza. — Girassol olhou em volta e avisou — Vão rápido!
Dente de Cobra e Garra de Tigre escaparam da casa, correndo pelo beco. A neve estava alta e já encharcava seus pés e estava já chegando nos joelhos. Mesmo que o vento frio que soprava em seus rostos parecesse tão afiado quanto uma faca, não podia detê-los. Extremamente cansados, ao chegar na praça, eles descobriram que havia quase mil pessoas ao redor do palco.
Meu deus! Tem mingau de aveia sendo distribuído de graça mesmo!
Ambos correram rapidamente, mas foram parados por dois guardas em uniformes marrons.
— Devagar, jovens, devagar, sem empurrar e sem passar na frente dos outros, respeitem a fila.
Dente de Cobra notou que havia uma cerca de madeira ao redor do centro do palco. A multidão estava se movendo ao longo da cerca em uma linha como uma serpente. Ele também viu guardas armados com estranhas barras de ferro em alguns pontos da cerca. Eles pareciam os defensores da ordem, pois algumas pessoas eram expulsas da fila de tempos em tempos.
— Meu amigo está doente… Você pode nos ajudar, por favor? Eu imploro! — Dente de Cobra se ajoelhou no chão nevado.
— Ele está morrendo de fome faz dias. Ele está precisando de comida com urgência! — Garra de Tigre se ajoelhou ao lado dele.
— Que tipo de doença?
— É… a peste fria.
Um deles estendeu a mão para Joe, que estava inconsciente, e disse:
— Deixe-o comigo. Vocês dois podem entrar na fila.
— Hã…
— Ele sabe o caminho de volta, né? — O outro guarda perguntou. — Bem, não tem problema se ele não souber, vocês podem voltar aqui e procurá-lo depois.
Enquanto dizia isso, o guarda se afastou com Joe em seus ombros.
— O que vamos fazer? — Dente de Cobra e Garra de Tigre disseram ao mesmo tempo e se encararam.
Nenhum deles esperava que as coisas se desenrolassem dessa maneira. Conforme os planos que eles bolaram, os outros seriam totalmente indiferentes a eles, de modo que eles até poderiam se esgueirar pela cerca para comer mais rápido.
— Vamos voltar. — Dente de Cobra decidiu depois de uma breve contemplação.
— O quê… Voltar? — Garra de Tigre perguntou surpreso. — Sem mingau?
— Se a gente for por ali, vai demorar ainda uma meia hora pra gente chegar. Se a gente demorar muito, podemos ter problemas. — Dente de Cobra disse assentindo. — Podemos sair de novo à noite para trazer Joe de volta.
Garra de Tigre olhou para todo aquele mingau de aveia na mesa de madeira e disse com relutância:
— Certo… então vamos.
Mas Dente de Cobra tinha algo martelando em sua cabeça. — Afinal, se o anúncio do mingau de graça é de verdade, então os outros avisos também são, não é?
Ele vagamente sentiu que uma reviravolta poderia estar vindo em direção ao Submundo.
De volta ao Beco Sem-fim, os dois entraram na casa, andando na ponta dos pés, mas foram pegos de surpresa.
Girassol estava de pé em um banquinho de madeira bem na entrada, tremendo, com uma corda amarrada no pescoço e com as duas mãos amarradas atrás das costas. Os garotos viram vários hematomas no rosto dela. Enquanto isso, os homens de Kanas estavam de pé ao lado dela, zombando dos dois.
— Ahá, parece que os rabinhos voltaram de barriga cheia.
Tradução: JZanin
Revisão: Kabum
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