Liberte Aquela Bruxa – Vol. 03 – Cap. 387 – Herança

Agatha saiu do salão assim que terminou de falar e nem deu tempo aos dois homens para se explicarem. Roland virou a cabeça ligeiramente e disse baixinho:

— O que está acontecendo?

— Ambos os lados estão dizendo a verdade. —  Rouxinol sussurrou em seu ouvido.

Roland refletiu sobre isso um pouco e rapidamente adivinhou o que realmente havia acontecido. O que Agatha e a Família Eltek disseram, acreditando ser a verdade, não era necessariamente a verdade, mas apenas o que acreditavam ser verdade. Parecia que o problema real era o que estava, de fato, escrito no livro da Família Eltek.

— Já que você, Duque Eltek, veio de Forte Cancioneiro, não precisa voltar logo. Fique na casa de Ferlin por alguns dias e conheça a vila, passeie pelas ruas e o Mercado de Conveniências. — Roland olhou para o duque confuso e continuou — Vou conversar com ela e talvez vocês voltem a conversar.

— É… é mesmo? — O duque ficou chocado, mas abaixou a cabeça e disse — Obrigado, Vossa Alteza Real.

— A propósito, onde estão as pedras mágicas e os livros antigos que você trouxe?

— Estão todos encaixotados em nosso navio.

— Ótimo, pode trazê-las ao castelo. — Roland disse, assentindo — Eu acho que ela vai ficar mais calma depois de ver todas as coisas que sobreviveram por mais de quatrocentos anos.

Depois do jantar, o Príncipe chamou Agatha para ir até o seu escritório.

— Você deveria dar ao Duque Eltek a chance de se explicar. — Roland contou a Agatha toda a história — Não importa o que seu servo fez, este homem está tentando devolver seus pertences a você, e ele pode até estar tentando corrigir os erros de seus ancestrais.

— Meu servo enganou seus descendentes, então este homem não me deve nada. — Agatha fez beicinho — Além disso, familiares de bruxas não significam nada agora. Além do mais, eles pertencem à aristocracia da Região Oeste, certo? Se eu os aceitar, isso tornaria as coisas difíceis para você, porque você quer ser o único governante da Região Oeste, não é mesmo?

Roland ficou chocado ao pensar nisso e balançou a cabeça com um sorriso.

— Tudo bem, isso faz sentido. Mas você não parece culpá-los.

— Eu não deveria descontar minha raiva de um mortal de quatrocentos anos atrás sobre seus descendentes, especialmente se eles não sabem o que aconteceu.

Agora sim você falou como uma pessoa iluminada do Reino das Bruxas! — Roland pensou — Seja para com os mortais ou aceitando coisas novas, ela sempre tem uma perspectiva positiva. Para mim, esta é sem dúvida um excelente modo de pensar, mas provavelmente Agatha era uma bruxa rara em Taquila, então não me surpreende que ela tenha sido rejeitada por outras bruxas da Sociedade Expedicionária.

— Nesse caso, vou explicar a eles. — Roland disse, sorrindo — Você tem algum interesse nos seus pertences?

Agatha revirou os olhos e zombou:

— Não são meus pertences, são da Sociedade Expedicionária.

Todas as caixas foram levadas para o porão do castelo. Ao lado de Agatha, Roland também convidou Tilly, Sylvie e Anna.

As caixas foram abertas uma a uma sob o olhar de Sylvie. Dez das quinze caixas continham pedras mágicas. Roland pegou um cristal do tamanho de um punho e comentou:

—Você disse que todas estas pedras foram transformadas de uma Pedra da Retaliação Divina, então uma pedra desse tamanho deve valer duzentas ou trezentas peças de ouro.

— Trezentas? — Agatha disse, sem se impressionar — As pedras mágicas só podem ser produzidas por Feras do Caos, então cada peça é praticamente inestimável.

— Que tipo de pedras mágicas são estas? — Tilly perguntou — Elas não parecem fáceis de transportar.

— Pedras de luz. — Agatha pressionou a pedra na mão do Príncipe e canalizou seu poder mágico na pedra, fazendo-a emitir uma pálida luz amarelada, que rapidamente se tornou mais forte que a luz de uma tocha. Quando a luz se tornou ofuscante demais para suportar, Agatha finalmente retirou sua mão:

— Mais da metade destas pedras são pedras de luz. Além das produzidas pelas Feras do Caos, o resto são espólios de batalha que ganhamos ao atacar a Comunidade de Demônios.

— Como as pedras mágicas foram feitas em diferentes tamanhos? — Anna perguntou curiosa — Se fossem todas as Pedras da Retaliação Divina, então não poderiam ser cortadas com poder mágico, mas um grande bloco delas é extremamente duro e tampouco poderia ser cortada com lâminas.

— Um bloco inteiro? — Agatha ficou atordoada — Você está falando do veio mineral de Pedra da Retaliação Divina?

— Sim, está bem debaixo das minas de Vila Fronteiriça. — Roland explicou a história do mapa do tesouro — Sua superfície é muito dura, e até mesmo uma pistola de pederneira mal deixa um pequeno risco.

— Entendi. — Agatha sorriu — Você usou este mapa para encontrar a minha torre, que também era meu laboratório. Sim, realmente foi usado pela Sociedade Expedicionária para marcar o veio mineral de Pedra da Retaliação Divina além de ser um local escolhido para a próxima Cidade Sagrada.

— Cidade Sagrada? — Todos perguntaram, surpreendentemente, em uníssono.

— Sim, pensem dessa forma, por que existiam centenas de cidades nas Planícies Férteis, mas apenas três Cidades Sagradas? — Agatha sorriu sorrateiramente — Essas supostas Cidades Sagradas são todas construídas no topo das veias minerais de Pedras da Retaliação Divina. Precisávamos de muitas delas para pesquisar a relação entre o poder mágico e as pedras mágicas e também para evitar danos em grande escala nos conflitos entre as bruxas.

— Então vocês estavam planejando construir uma nova Cidade Sagrada na encosta norte? — Roland perguntou surpreso.

— Sim, se não fôssemos derrotadas tão rapidamente na Batalha da Vontade Divina. — Agatha suspirou — Pode-se dizer o mesmo da Serra Bárbara na Cordilheira Intransponível. Acho que vocês a chamam agora de Platô de Hermes, onde a Cidade Sagrada da Igreja está localizada.

— A Igreja também continuou usando o termo “Cidade Sagrada”. — Tilly disse com uma expressão amarga — Então é ainda mais possível que eles sejam descendentes da Aliança.

Felizmente a Igreja não construiu a Cidade Sagrada na Região Oeste. — Roland suspirou baixinho aliviado.

— De qualquer forma, a Pedra da Retaliação Divina é basicamente indestrutível, então cortá-la requer uma solução especial. — Agatha continuou. — Só podemos cortá-la com sangue de bruxas, pois possui poder mágico ou… sangue de demônios.

— Sangue? — Sylvie perguntou, boquiaberta.

— Sim, e a quantidade de sangue necessária depende da Pedra. — Agatha disse, abrindo as mãos — Na Cidade Sagrada, todas as bruxas adultas eram obrigadas a doar sangue. Assim que deixa o corpo, o sangue perde poder mágico muito rapidamente, então devemos usar o sangue ali mesmo. A cada dois ou três anos, bruxas adultas seriam ordenadas pela Aliança para ir às minas e doar sangue, e quaisquer demônios capturados também serviriam a esse propósito.

— Você fez isso também? — Anna perguntou.

— Claro. —Agatha disse, assentindo — Nem as três chefes da Aliança foram exceção.

— E quanto às bestas demoníacas? — Sylvie perguntou — Algumas bestas demoníacas híbridas parecem ter poder mágico.

— Sim, mas é muito pouco, então o sangue delas só pode ser usado para lidar com pedras quebradas ou lascadas, e não têm efeito em blocos inteiros. — Agatha respondeu — Depois que a Pedra da Retaliação Divina é cortada, sua dureza diminuirá muito com seu tamanho, e sua extensão de impacto também diminuirá. Por exemplo, as Pedras da Retaliação Divina que os mortais carregam consigo podem ser facilmente esmagadas com um martelo.