Como… isso é possível? — Sem-rosto pensou enquanto sentia um arrepio por todo o corpo. Ela engoliu a saliva e depois falou em um tom baixo:
— Que tipo de brincadeira é essa? Eu sou Vorte.
Não deve ser possível que eles tenham a sorte de se conhecer, há tantos mercenários no campo. — Aphra pensou — Não me diga que ela pode se lembrar de cada um de seus nomes?
Entretanto, Sem-rosto jamais imaginou receber uma resposta sarcástica:
— É mesmo? Pois eu não sabia que homens também poderiam ter poder mágico em seus corpos. Logo, ou você é uma bruxa que planejou se infiltrar no campo ou você é um bruxo, o que é extremamente improvável. Além do mais, nada disso importa, pois você não se chama Vorte, como acabou de dizer. Dentre os soldados do Primeiro Exército, definitivamente não há ninguém que possua magia dentro do corpo.
Essa pessoa… pode ver o poder do diabo? — Aphra percebeu que não havia mais saída, agora que ela fora descoberta. Havia mais de quatro bruxas no campo, e a mulher atrás dela também deveria ser uma bruxa. Além disso, ela tinha uma habilidade semelhante ao Olho da Verdade.
As Escrituras da Igreja sobre a magia descreviam que o Olho da Verdade tinha centenas de variações, inclusive existindo casos em que poderia aparecer em conjunto com outra habilidade, coexistindo naturalmente.
Como não vi ninguém ao meu redor ou alguém se aproximando…. isso significa que a habilidade principal desta bruxa é ocultação? — Aphra pensou.
— Agora, ajoelhe-se e coloque suas mãos atrás das costas. Faça isso e talvez eu poupe sua vida. — A mulher gritou em alto e bom som — Faça o que eu digo!
Os mercenários no entorno ainda estavam ocupados com a batalha, então eles não notaram a cena que estava acontecendo na área central. Entretanto, as bruxas próximas à fogueira perceberam que alguma coisa não estava certa. Assim que perceberam a situação, elas arregalaram os olhos e perguntaram:
— Rouxinol, qual é o problema? Aconteceu alguma coisa?
Esta é minha última chance! — Aphra sabia que sua especialidade era o assassinato e não uma batalha em campo aberto, especialmente pelo fato de ela não está usando uma Pedra da Retaliação Divina e não ser capaz de suprimir as habilidades fantásticas das outras bruxas — Caso a bruxa que pode voar fuja, não tem problema, no entanto, a bruxa que pode curar a praga demoníaca definitivamente tem que morrer aqui. Caso contrário, ela representará uma séria ameaça para os futuros planos da Igreja.
Claro, também havia a possibilidade de que ela não poderia escapar após assassinar a bruxa da cura. Pensando nessa possibilidade, ela não conseguiu evitar a sensação apertada em seu peito, mas ela logo se acalmou novamente. Após recordar que o objetivo da Igreja era unificar os quatro Reinos, nenhum esforço deveria ser poupado para resistir aos diabos do inferno. Ela se sentiria muito bem em se sacrificar pelo bem maior, como muitos outros guerreiros já fizeram.
Além disso, ela acreditava que Heather não a esqueceria, Heather se certificaria de que seu nome também fosse registrado nas escrituras sagradas.
— Não venham para cá. — Rouxinol gritou — Ela é uma…
Nesta fração de segundo, de repente, Sem-rosto ergueu o cotovelo para atingir o braço da bruxa atrás de si, curvando a cabeça para evitar ser esfaqueada com a arma.
Sem-rosto sempre foi instruída a manter-se calada quando fosse pega, pois é impossível você prestar atenção enquanto estiver falando. Além disso, caso ela quisesse escapar ou contra-atacar, o melhor momento para ela aproveitar a situação, era justamente quando o inimigo estivesse cometendo este erro.
Dentro da manga, ela havia escondido um mecanismo que ativava no primeiro momento de contato, pulverizando um pó alquímico branco na parte de trás, que em contato com a água liberaria muito calor. Caso isso entrasse em contato com os olhos ou a boca do inimigo, os quais eram úmidos, eles perderiam sua força de luta imediatamente. Mesmo que tivessem a sorte de não respirar nem um pouco do pó, pelo menos ficariam nervosos.
Assim, após pressionar o gatilho e pulverizar o pó branco na bruxa que estava atrás de si, Aphra imediatamente correu na direção das quatro bruxas próximas a fogueira. A bruxa com cabelos dourados rapidamente voou, enquanto a única bruxa que parecia ser a mais velha desconsiderou sua própria segurança e ficou na frente das outras duas. Desembainhando uma adaga afiada, Aphra imediatamente esfaqueou a primeira bruxa. Como elas não podiam escapar de qualquer maneira, e todas as três morreriam sob sua mão, não era necessário diferenciá-las e nem priorizar uma ou outra.
Entretanto, no momento em que sua adaga atingiu a bruxa à sua frente, Aphra viu uma cena incrível. Algo como um fantasma apareceu na frente dela em um lugar que definitivamente estava vazio um segundo atrás, com dois olhos ardentes fitando ela sob um capuz.
Esta… esta é a Rouxinol que estava atrás de mim? Ela estava tão perto quando eu joguei o pó branco, então, por que ela está agindo como se não tivesse sofrido nada? — Aphra pensou.
Quase não acreditando no que seus olhos presenciaram, Aphra viu Rouxinol erguer o braço e uma chama explodir da arma de prata. E então seu corpo foi fortemente empurrado para trás. Ela perdeu o equilíbrio e caiu no chão desnorteada.
Não… eu ainda preciso matar as duas… — Aphra queria se levantar, queria segurar sua adaga e apunhalar a próxima bruxa, mas até mesmo levantar parecia difícil e sua consciência já havia começado a se desvanecer.
Que lástima… — Foi o último pensamento que passou em sua mente.
Depois de atirar, Rouxinol permaneceu no mesmo lugar, observando o soldado que havia sido atingido no peito cair. Então, o corpo do soldado começou a se contorcer e encolher, voltando lentamente para a aparência de uma mulher desconhecida.
Esta foi a primeira vez que Rouxinol matara outra bruxa. Ela ficou tão aturdida com a situação que só voltou a si após ouvir Lily chamando-a desesperada.
Suprimindo a emoção crescente em seu coração, ela pôs a arma de volta no coldre e correu na direção de Wendy.
— Onde você foi atingida?
— Não é nada, só estou sentindo um pouco de dor. — Wendy acenou com a mão, indicando que elas não deveriam entrar em pânico — Acho que a adaga não conseguiu perfurar essa roupa.
— Isso significa que a roupa protetora funcionou?
— Parece que sim.
Levantando os seus fartos seios, Wendy viu que a adaga ainda estava presa em sua roupa. Assim que ela levantou a jaqueta, a faca caiu no chão. Na roupa de proteção, apenas a camada externa tinha um pequeno rasgo, enquanto a camada interna macia permaneceu intacta.
— Você… você realmente me assustou! — Lily disse, soltando um longo suspiro, e depois caiu com a bunda no chão — Na próxima vez, não precisa ficar na minha frente, não! Eu não preciso que você faça isso. Eu.. eu…
— Olha pra mim. — Wendy acariciou suavemente a cabeça dela — Eu não estou bem?
Lily se levantou e pôs sua cabeça entre os seios de Wendy, soltando um grito abafado.
— Eu também estava com medo quando fui proteger vocês. Até mesmo esqueci de usar o meu poder. — Wendy balançou a cabeça — Se eu tivesse criado uma forte rajada de vento contra ela, ela não teria conseguido nem chegar perto de mim.
— É porque você raramente está lutando com os outros, então uma reação como essa é bastante normal. — Rouxinol consolou.
— Felizmente você estava vestindo a roupa de proteção. — Eco disse, ainda demonstrando estar assustada — Caso contrário, teria sido uma situação muito pior que essa.
Antes de sua partida, Sua Alteza Real tinha dado a cada uma delas um colete especial, além disso, ele havia exigido que elas nunca tirassem esta peça de roupa sob nenhuma circunstância. Mesmo que o colete parecesse um pouco grosso, ainda era muito leve. Aparentemente feito de muitas camadas, Sua Alteza explicou que cada camada tinha sido revestida por Soraya, dando-lhe um alto grau de flexibilidade, mas também dificultando a perfuração com objetos afiados. Oferecia uma excelente proteção contra espadas, flechas e virotes. Se Wendy não estivesse protegida pelo colete, ela provavelmente não conseguiria suportar o ferimento e esperar pelo atendimento de Nana.
Raio pousou lentamente ao lado da bruxa morta e perguntou:
— Por que ela nos atacou? Ela também não é uma de nós?
Rouxinol olhou para a mulher sem vida, incapaz de falar por um longo tempo. Com os olhos da bruxa fechados, os longos cabelos azuis espalhados no chão e sua expressão pacífica, ela não parece ter experimentado muita dor. Mas Rouxinol ainda não podia esquecer que, quando essa bruxa esfaqueou Wendy, ela não demonstrou nenhum sinal de hesitação em seus olhos, apenas a determinação de que o que ela estava fazendo era inevitável e justo. Como se ela não estivesse matando uma pessoa, mas sim cumprindo o dever de sua vida. Talvez no coração dela, isso era o certo a se fazer.
— Não. — Rouxinol suspirou suavemente — Ela não era uma de nós. Ela era apenas uma pessoa patética.
Tradução: JZanin
Revisão: Kabum
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