Império Tearmoon

Império Tearmoon – Vol. 02 – Cap. 10 – Schadenfreude

 

— Tudo bem, pessoal. Gostaria que mantivessem em segredo o que aconteceu naquela floresta. Se alguém perguntar, eu tropecei em uma raiz de árvore e acabei um pouco abalada com a queda. Ok? — disse Mia a seus quatro acompanhantes quando chegaram de volta à cidade do viscondado. Então, ela prontamente se encontrou com Ludwig.

Dion, enquanto isso, acabou cuidando da maior parte do trabalho que se seguiu. Afinal, ele acabara de mover um esquadrão completo de cem homens de volta para a cidade sem uma única baixa. Ele precisava encontrar acomodações para todas as cem pessoas. Isso não teria sido um grande problema na capital imperial, mas tentar espremer de repente tantos soldados em uma cidade em um viscondado provou ser impossível, e ele não teve escolha a não ser espalhar seus homens e fazê-los ficar em várias aldeias vizinhas. Quando ele resolveu tudo isso, falou com todos os aldeões cujas casas estava requisitando e voltou para a cidade do viscondado, teve que admitir que até ele estava se sentindo um pouco cansado.

— Que trabalho infernal… — disse seu vice-capitão.

— Temos sorte de eu comandar apenas cem homens. Se fossem mil ou dez mil, nos mataríamos tentando encontrar camas e comida suficientes. Juro, se houver outra rodada de promoções chegando, espero que me deixem de fora.

— Já disse isso antes e vou dizer de novo. Você é a pessoa menos ambiciosa que já conheci, Capitão. — O homem grande soltou uma gargalhada calorosa. — Falando nisso, acho que aquele seu ditado estava certíssimo.

— Hm? Que ditado?

— Sobre como nada na vida funciona do jeito que você quer. Depois de ouvir todos aqueles rumores sobre como a princesa é a “Grande Sábia do Império” e tudo mais, eu esperava que ela fosse um pouco melhor que o resto deles. Como você disse, acho que foi tudo apenas um pensamento positivo da minha parte. No final das contas, esses nobres são todos iguais.

Ele coçou distraidamente sua barba espessa enquanto falava, mas quando Dion não respondeu, ele franziu a testa. Eventualmente, o capitão soltou um suspiro profundo e balançou a cabeça.

— Aquela princesa… não é brincadeira. Eu tomaria cuidado perto dela.

— Hã? Mas, quero dizer, ela…

— Não se engane, ela é do tipo que maquina coisas. Sente-a em uma sala de guerra e dê-lhe o comando, e ela fará parecer que está perdendo até arrancar a vitória de você no último momento.

Vendo a carranca duvidosa no rosto do homem grande, ele acrescentou:

— Anote minhas palavras, aquela garota sabe o que está fazendo.

Os dois homens seguiram para a taverna local, onde ao entrar foram recebidos por alguns rostos familiares.

— Ah, Capitão Dion…

— Saudações, Capitão. Já terminou todos os arranjos?

Os dois guardas imperiais que acompanharam Mia se levantaram rapidamente e se endireitaram.

— Sim — respondeu ele, retribuindo a saudação com um aceno casual de mão. — Vocês dois estão aqui para beber também?

Os dois guardas, no entanto, baixaram a cabeça.

— Por favor, aceite nossas mais profundas desculpas pelo problema que Sua Alteza causou…

— Hm? Problema?

— Normalmente, ela nunca age com tanta arrogância… Desta vez, só posso supor que ela ficou abalada por um contato tão próximo com o perigo. Se possível, por favor, ignore o comportamento dela hoje.

Ah, que inferno. Eles também? Juro, não é realmente meu trabalho fazer isso, mas…

Dion contraiu os lábios por alguns segundos antes de soltar um suspiro resignado.

— Ok, escutem. Não foi problema nenhum e não me importo. Na verdade, preciso agradecer a Sua Alteza por sua ajuda.

— Hã? A… ajuda dela? O que quer dizer?

Ambos os guardas piscaram para ele, surpresos, claramente perplexos com suas palavras. Ele sorriu ironicamente para o par sem noção.

— Vocês ainda não entenderam? Aquilo foi tudo uma atuação.

Ele empurrou os guardas de volta para seus assentos e sentou-se à mesa deles. Com um estalo, chamou a atenção de um garçom próximo e pediu uma bebida. Após uma curta espera, uma caneca de cerveja apareceu na mesa. Ele pegou o copo de madeira, bebeu metade em um grande gole, soltou um suspiro satisfeito e recostou-se na cadeira. Nesse ponto, a paciência dos guardas finalmente se esgotou e um deles falou.

— Então, Capitão Dion… o senhor disse algo sobre tudo ser uma atuação?

Dion colocou a caneca de volta na mesa e se inclinou para frente.

— Digam-me, vocês dois já estiveram em um campo de batalha? Um de verdade?

Os guardas se entreolharam. Suas carrancas lhe disseram mais do que o suficiente.

— Nenhuma experiência real, hein. Vejam bem, o problema com os exércitos é que eles aplicam pressão apenas por estarem lá. Se alguém está planejando alguma travessura, então apenas ter um exército por perto é um impedimento eficaz. Agora, isso funciona muito bem contra bandidos e coisas do tipo, mas contra guerreiros determinados que estão preparados para a guerra, pode acabar provocando violência desnecessária.

Quando duas pessoas estão apontando suas espadas desembainhadas uma para a outra, o menor motivo pode levar a um golpe. Encarar a lâmina da espada de um oponente é encarar a morte de frente, e o medo e a ansiedade que vêm com isso podem facilmente se transformar em um desejo de matar — de eliminar a ameaça em questão.

— Sua Alteza Bastante Perspicaz sentiu a perigosa tensão no ar e, em vez de assistir dos bastidores, decidiu fazer algo a respeito. A tribo Lulu não vai sair da floresta e nos atacar. Eles nunca foram uma ameaça, para começar. Contanto que deixemos a floresta em paz, podemos evitar qualquer violência desnecessária. O problema é que essas nuances do campo de batalha são coisas sutis, e os superiores são muito ruins em sutileza. Sua querida princesa provavelmente sabia que fazer nossos chefes entenderem era uma causa perdida, então ela tomou as rédeas da situação. E cara, que jogada de mestre foi essa.

Ela pode ter conseguido aliviar as tensões forçando o exército a recuar. No entanto, isso foi, em última análise, apenas uma solução temporária.

Então, o que você está planejando agora, princesa? Qual é o seu próximo movimento…

Ocorreu-lhe que ele estava sentindo prazer — até mesmo ansioso — com os planos de Mia, e não pôde deixar de rir de si mesmo.

— E é por isso que depende de vocês dois — disse ele aos guardas. — Entendem o que quero dizer?

— Hã?

— Tudo o que Sua Alteza fez será em vão se vocês dois saírem por aí falando sobre como os Lulus tentaram atirar nela com uma flecha. Se Sua Majestade ouvir sobre isso, vocês acham que ele vai deixar passar? Por que vocês acham que ela lhes disse para ficarem quietos sobre o que aconteceu na floresta? É crucial que ninguém descubra.

— E-Eu entendo agora! Meus lábios estão selados!

Os dois guardas o saudaram. Ele olhou de um para o outro, depois suspirou.

Que inferno… Por que eu, de todas as pessoas, estou por aí defendendo a princesa?

Nesse exato momento, ele se lembrou do jovem oficial que estava sempre ao seu lado. Dada a rapidez com que a mente de Mia funcionava, parecia provável que ela muitas vezes se esquecesse de explicar completamente seus pensamentos a seus assessores. Aqueles que a auxiliavam — quanto mais sábios, pior para eles, provavelmente — devem ter uma vida bem difícil. Imaginando que devia ser um inferno para aquele sujeito de óculos, ele ergueu sua caneca em uma saudação silenciosa. Seus lábios se curvaram em um sorriso.

Saúde, seu pobre coitado. Ainda bem que não estamos no mesmo barco.

Enquanto bebia o resto de sua cerveja e saboreava o doce gosto do schadenfreude

— Capitão Dion, posso ter um momento com o senhor?

…O homem a quem ele acabara de brindar apareceu atrás dele. De repente, ele teve um pressentimento muito ruim, como se seu barco metafórico estivesse parecendo suspeitosamente semelhante ao de outra pessoa. Algo lhe dizia que o homem que ele acabara de zombar talvez não fosse o único pobre coitado nesta taverna…

 

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Quando Mia chegou à cidade do viscondado, ela havia caído em um estupor confortável de exaustão triunfante.

Ahh, quero uma cama. Estar na cama parece terrivelmente atraente agora.

Claro, ela não podia se dar ao luxo de adormecer imediatamente. Primeiro, ela tinha que lembrar Dion e os outros três que estavam com ela na floresta para ficarem quietos sobre o que havia acontecido.

Não posso deixar que as pessoas descubram que tive um acesso de raiva e descontei em uma árvore por me fazer tropeçar.

Literalmente ninguém ficaria surpreso ao ouvi-la fazendo algo assim, mas desta vez Mia realmente achou suas próprias ações bastante embaraçosas. Ficar com raiva de uma árvore por fazê-la tropeçar e fazer uma cena já era ruim o suficiente, mas ela quase levara uma flechada na cabeça por isso. Só esse pensamento já era o suficiente para fazê-la guinchar de vergonha.

Mia não era sem-vergonha. Seu senso de vergonha era apenas um pouco estranho.

Ao retornar à mansão Berman, ela imediatamente concordou com uma audiência com o visconde. Normalmente, como a princesa, ela não teria obrigação de fazê-lo, mas por acaso ela também tinha algo a dizer a ele.

— VossaAlteza, qual o significado disto? A senhorita não pode simplesmente fazer algo assim… Aquele lugar é perigoso. Se houvesse qualquer confusão, as coisas poderiam ter…

No meio da grande sala de visitas estava Berman, que a esperava com uma expressão de grande desagrado.

— Oh? Está propondo, então, que um mero punhado de homens teria sido suficiente para garantir minha segurança? Sabendo que a área é perigosa, como o senhor mesmo disse, o senhor me faria retornar com não mais que dois de meus guardas?

— Eu… B-Bem, não, não é isso… O que quero dizer é que é um problema Vossa Alteza ter ido a um lugar tão perigoso sem me informar…

— Todas as terras do império são terras da família imperial. Como filha do imperador, se for meu desejo, não há lugar onde eu não possa ir e ninguém que possa me impedir. Estou errada?

Mia apresentou uma imagem impecável da princesa arrogante e egoísta. Afinal, ela tinha muita experiência. Na linha do tempo anterior, esse fora seu modus operandi.

Nossa, isso me lembra os bons e velhos tempos. Como isso é refrescantemente emocionante!

Fazia muito tempo que ela não tinha a chance de usar a Especialidade de Mia em alguém, e ela brilhava de prazer.

— Ah, isso me lembra. Desenvolvi um interesse por aquelas terras florestais e desejo discuti-lo com o Papai. Precisarei que o senhor se abstenha de qualquer desmatamento ou operações militares enquanto isso.

— Absur— Uh, quer dizer, peço perdão, mas isso é perigoso demais. Sem o exército na área, como manteremos aqueles viciosos homens da tribo de cometerem quaisquer atrocidades?

— Não vejo razão para se preocupar, contanto que esta cidade esteja suficientemente fortificada. Se algo acontecesse com as aldeias próximas, bem… Deixe que eles se resolvam. Por que se preocupar com assuntos tão mesquinhos?

Ela inclinou a cabeça para o lado e estendeu as mãos de forma perplexa. Seus lábios, no entanto, estavam ligeiramente curvados em um sorriso malicioso. O que ela descrevera era exatamente como o Visconde normalmente resolveria isso sozinho. Era também a atitude predominante da maioria dos nobres. Refutar isso seria ir contra a norma, revelando assim que ele tinha algum interesse não divulgado no assunto. Ele não teve escolha a não ser permanecer em silêncio.

— Bem, então. Acredito que isso resolve a questão. Confio que o senhor fará os arranjos necessários.

Com isso, Mia puxou a barra de seus shorts em uma reverência superficial e deixou o quarto.

Somente após concluir sua conversa com o Visconde e retornar à sua câmara de hóspedes, Mia chegou a uma importante constatação.

— Hm? Milady, onde está seu grampo de cabelo? — perguntou Anne enquanto a ajudava a se trocar.

A mão de Mia disparou para o lado de sua cabeça, onde não sentiu nada além de seu próprio cabelo.

— Nossa, que estranho… Não está aqui, não é?

Ela não tirara nenhuma roupa desde que retornara à cidade do viscondado, e certamente não tivera tempo de se trocar quando estava na guarnição. Ela também não se lembrava de ter tirado o grampo de cabelo. Coçando a cabeça, ela lentamente vasculhou suas memórias do dia até que uma cena em particular a fez empalidecer.

É isso… Deve ter sido quando aconteceu… Ele saiu quando atiraram aquelas flechas em mim…

Ela também poderia tê-lo perdido quando tropeçou na árvore, mas de qualquer forma, o grampo estava atualmente no meio daquela floresta.

A-A-Ai, meu Deus… Isso não é bom!

Mia começou a entrar em pânico. Ela tinha quase certeza de que conseguira evitar o conflito que teria eclodido aqui. No entanto, aquele grampo de cabelo viera da floresta… O que significava que estava inextricavelmente ligado a todo este evento. Perder algo assim parecia um péssimo presságio. A situação ainda estava tensa, e a menor coisa poderia reacender o conflito. Logo o incêndio da revolução a consumiria. O que a esperava nesse caminho, ela sabia bem. O silvo de uma lâmina caindo, e o baque de uma cabeça decepada…

N-Nem pensar… Me recuso a passar por isso de novo!

Havia também outro motivo por trás de seu desejo de recuperar o grampo. Ela o queria de volta por causa daquele garoto que o dera a ela. Se tivesse sido um presente comum, ela não teria se importado tanto, mas não podia simplesmente esquecê-lo sabendo que era a lembrança de sua falecida mãe. Ele lhe dera algo terrivelmente precioso, e sem dúvida ficaria triste se descobrisse que ela o perdera. Embora ela definitivamente não quisesse deixar o garoto com raiva dela, mesmo que ele não sentisse raiva alguma, o pensamento de desapontá-lo ou desencorajá-lo não lhe agradava.

Nada de bom vem de tratar a bondade com desprezo.

Com a mente decidida, ela sabia o que tinha que fazer.

— Tenho que ir e encontrá-lo. Preciso dele de volta.

— Milady? O que quer dizer?

— Anne, poderia por favor pedir a Ludwig que me atenda?

 


 

Tradução: Gabriella

Revisão: Matface

 

 

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