Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino

Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 10 – Cap. 07 – Hora de Encarar Um ao Outro

 

“Por volta do fim do primeiro mês do 1548º ano, Calendário Continental”

Era próximo da hora quando os reforços enviados para a União das Nações Orientais retornavam, e toda a limpeza acabara. Noite tão fria que estava nevando na capital real.

Komain veio ao quarto de Serina no Castelo de Parnam e estava sentada à mesa do outro lado do dono do quarto. Embora houvesse chá servido na mesa, havia uma atmosfera bizarra no ar que a deixou incapaz de relaxar e bebê-lo.

Nessa situação tensa, Komain perguntou: 

— Se importa, Serina? Vou perguntar mais uma vez.

Em resposta à expressão séria de Komain, Serina estava calma como normalmente.

Komain encontrou sua determinação e abriu a boca: 

— Não há muito tempo, então não enrole. Como se sente a respeito de Poncho?

Komain com certeza foi direto ao ponto.

Serina inclinou a cabeça para o lado. 

— Não sei o que lhe dizer. Acho que Sir Poncho é o Sir Poncho?

— Não é isso que eu quero dizer. Estou perguntando se você gosta dele ou não.

— Se eu… gosto dele? — Serina gemeu. 

Ela era bela, então havia um certo floreio na forma como se parecia quando mergulhada em pensamentos. 

— Eu o acho… amável, sabe? Ele pode ser pouco determinado e indeciso, e eu ficaria grata como sua ajudante se tivesse um pouco mais de autoconfiança, mas tem bom caráter. Eu diria que, sem dúvida, ele é uma pessoa amável.

— Eu concordo, mas… não é isso que eu estava perguntando. 

Komain agarrou a própria cabeça, perguntando-se como havia chegado a isso.

Souma pedira a ela que sutilmente ajudasse Serina a perceber seus sentimentos amorosos, mas uma Serina inconsciente era uma adversária e tanto.

Da perspectiva de Komain, eles pareciam compatíveis.

Serina era altamente capaz e compensava os defeitos de Poncho como ministro, enquanto ele usara sua comida para tomar controle do estômago dela.

A relação de Komain com Poncho era similar, mas ela sentia que os laços dele e Serina eram ainda mais profundos.

Eles precisavam um do outro.

Isso irritava e frustrava Komain, que ansiava por Poncho para si mesma.

— Você adora a comida de Poncho, não é, Serina? — ela perguntou.

— Certamente.

— O que você acha de Poncho, que faz essa comida? Como um homem.

— Eu respeito-o. Acho que ter encontrado aquele tipo de comida é a maior felicidade em toda minha vida. É por isso que sou grata a Poncho por criar todos aqueles pratos.

Serina parecia extasiada. Komain achava que realmente havia algo aí.

— E esse respeito e gratidão não se transformaram em sentimentos amorosos em algum ponto? — Komain perguntou.

— Sentimentos amorosos… é? 

Serina olhou levemente para cima em resposta a isso.

Essa mudança fez Komain pensar: 

— Oh?

Essa era Serina, sempre calma e composta, sua expressão nunca mudando, e agora ela parecia só um pouquinho melancólica.

Enquanto Komain esperava, imaginando o que podia ser…

— Ahm… Eu não entendo direito o que “sentimentos amorosos” são — Serina confessou, como se procurando por palavras para se expressar.

— …Como?

— Minha família tem servido a família real por gerações. Fui educada desde jovem para tornar-me uma criada condizente com a família real. Fui ensinada que lealdade e sinceridade devem ser reservadas para aqueles na família real. Como resultado, nunca pensei em alguém fora da família real.

Komain ficou sem palavras. Parecia que a ignorância de Serina a respeito do amor vinha da sua devoção ao dever da família e da educação minuciosa que a moldara em criada.

Não, não importa quanto orgulho uma família tivesse em trabalhar a serviço da família real, eles não iam suprimir todos os sentimentos pessoais exceto a lealdade à coroa. Se eles proibissem sentimentos amorosos, então a própria Serina jamais teria nascido.

No entanto, Serina, sempre leal a seu dever, deve ter tomado seus ensinamentos ao pé da letra.

Pensando na família real primeiro, ela descartara quaisquer sentimentos especiais em relação a outras pessoas fora como se fossem desnecessários. Serina podia habilmente cuidar de qualquer trabalho que fosse ordenada a fazer, mas ela era muito desajeitada em relação a si mesma.

Komain deixou os ombros caírem, porque é claro que isso seria difícil, mas ao mesmo tempo ela pensou: Mas mesmo ela sendo assim, Serina tem um forte interesse na comida de Poncho. A máscara de ferro de costume dela tem a mania de se desfazer enquanto ela está comendo também. Com mais um empurrão, talvez ela perceba seus próprios sentimentos?

Se isso acontecesse, o que seria necessário em seguida era a determinação de Komain. Para abrir um coração que estava bem trancado, métodos um pouco forçosos podiam ser necessários.

— Muito bem — Komain disse — Encontrarei minha determinação, então.

— Hum? Não tenho muita certeza do que você quis dizer. 

Serina inclinou a cabeça para o lado. 

Komain levantou e olhou para baixo para ela. 

— Se é assim que vai ser, vou com tudo! Para alcançar o lugar que eu quero estar, não tenho o luxo de ser seletiva.

Enquanto Komain achava sua determinação e deixava o quarto, Serina olhava perplexa.

 

 

Foi alguns dias depois.

Poncho estava num quarto em uma certa mansão na capital com um olhar tenso no rosto.

Pouco tempo antes, chegara uma história de um encontro de casamento arranjado, e ele estava prestes a conhecer a dama em questão hoje.

Embora a quantidade houvesse caído em relação ao pico, Poncho ainda era solteiro e rico, então as ofertas continuavam.

Normalmente, Serina e Komain ficavam de pé atrás dele, mantendo olhos atentos para segundas intenções, mas hoje Komain estava fora a negócios. Por causa disso, a única atrás de Poncho era Serina.

Quando era quase hora do encontro e Poncho estava perdendo a compostura, ele tentou puxar conversa com Serina atrás dele para distraí-lo do nervosismo.

— Eu me pergunto quem exatamente vou conhecer hoje, sim.

— Hum? Não ouviu? — Serina perguntou.

— Não ouvi, não. Foi de repente trazida ao castelo, então a informação de minha parceira não teve tempo de chegar a mim. Quer o castelo que ao menos tente conhecê-la.

— Isso é… estranho.

Alguém vai para uma entrevista a respeito de um potencial casamento arranjado sem nenhum conhecimento de seu parceiro? — Serina perguntou-se — Se eles esperavam formar relações com Poncho, deveriam preparar o terreno antes. Normalmente não dariam o nome da dama e fariam propaganda de sua linhagem, aparência, e talentos, de forma a dar a Poncho a impressão mais positiva o possível dela?

Enquanto Serina pensava sobre isso, Poncho curvou-se com pesar.

— Sinto muito por sempre dar trabalho para você assim, Madame Serina. Fazendo-a acompanhar-me nessas entrevistas de casamento.

— Não, esta é uma tarefa que realizo sob ordens de Sua Majestade.

— Ainda estou grato, sim. Gostaria de casar-me logo. Me sinto mal por você e Madame Komain, me ajudando desse jeito.

— Bem… sim, suponho.

Vendo Poncho fechar os punhos com entusiasmo, Serina sentiu-se só um pouco irritada. No entanto, ela não sabia em relação ao que.

Poncho não dissera nada particularmente estranho. Mas ainda assim… por algum motivo, tinha um ruído no coração dela.

Enquanto Serina apertava o peito, houve uma batida na porta.

— E-entre, sim — chamou Poncho.

— Perdão — a resposta veio enquanto a porta abria, e entrou uma mulher com belas roupas. Esta mulher era supostamente sua parceira do dia.

Quando eles viram seu rosto, não só os olhos de Poncho, mas os de Serina também se arregalaram.

— M-madame Komain?! Não disse que tinha negócios hoje?! — Poncho gritou.

— Sim — Komain respondeu com um sorriso.

Hoje, estava mais bem vestida que o normal. Ela vestia um vibrante xale por cima de sua roupa parecida com de índio, e em sua cabeça usava um aplique feito de jade. Esta provavelmente era a vestimenta elegante de sua tribo. Usava maquiagem também, embora fosse leve.

Vendo Komain toda enfeitada assim, Poncho finalmente se deu conta.

— V-você seria minha parceira de hoje?

— Sim — Komain disse — Pedi a Sua Majestade Souma que organizasse isto para mim. Por favor, cuide bem de mim hoje!

Um instante depois, uma intensa onda de pressão foi na direção dela. Detrás de Poncho, Serina virara para Komain aqueles olhos que repeliram tantas potenciais parceiras de casamento calculistas.

Atingida por esse olhar frio, como de um lobo selvagem, uma mulher comum teria quebrado. No entanto, Komain já houvera experimentado isso uma vez, e ela sabia que vinha, por isso estava preparada.

Não perderei, Madame Serina. 

Komain ficou de pé, olhando de volta diretamente naqueles olhos. Sem retornar a pressão, simplesmente encarando Serina.

Respondendo: Não tenho o que sentir culpa, e não tenho medo de sua intimidação.

Ela ao que continuava encarando de volta, Serina logo parou de pressionar.

Talvez fique tudo bem com Komain? — ela cedeu. 

Ela sabia que a mulher não estava se aproximando de Poncho com segundas intenções. 

Eu conheço a personalidade de Komain bem. Ela não tem artifícios, é alegre, e tem respeito puro por Sir Poncho. No caso dela, mesmo que eles se casassem, não vejo nenhuma desgraça recaindo sobre Sir Poncho como resultado… ou pelo menos não deveria…

Ela reconhecera Komain como uma parceira válida, mas o peito de Serina estava preenchido por um turbilhão de sentimentos em conflito.

Enquanto Serina inclinava a cabeça, incapaz de entender porquê, Komain sentou-se à frente de Poncho.

— Ahm… se você está aqui como uma parceira de casamento em potencial, isso significa que, você, ahm… estaria disposta a se casar comigo, sim? — Poncho perguntou hesitante.

— Sim — Komain respondeu com firmeza — Tenho muito respeito por você, Poncho… Lorde Poncho. Tem a minha gratidão pelo que você fez pelos refugiados na nossa hora de necessidade, mas também estou apaixonada pela sua personalidade gentil. É claro, também adoro os vários pratos que você faz.

Essa expressão de afeto direto fez Poncho corar.

Já tinham rido de sua aparência antes, mas Poncho não estava acostumado a ter esse tipo de puro afeto direcionado a si, então ficou perturbado.

— A-ahm…  Não sou muito em termos de aparência ou personalidade, mas ainda deseja estar comigo, sim? Ah, não, não pretendo dar a entender que estou insatisfeito com você de qualquer forma, Madame Komain. Mas ainda assim, seu irmão mais velho, Jirukoma, é um guerreiro másculo, nada parecido comigo, certo? Para alguém tão adorável como você, Madame Komain, pensaria que poderia encontrar um homem mais talentoso e atraente, um que realizasse grandes atos de coragem, sim.

— Suponho que poderia. Muito tempo atrás, eu queria casar com um homem forte e maneiro, como meu irmão — Komain riu — Mas a pessoa por quem me apaixonei foi você, Lorde Poncho. O coração nunca age bem como esperamos, não é? Quer dizer, apaixonei-me por você, embora seja o oposto do meu tipo.

— Madame Komain… obrigado, sim — Poncho respondeu o sorriso tímido de Komain do seu próprio jeito tímido.

Ele conhecera Komain enquanto estava distribuindo ajuda alimentar para um campo de refugiados, e ela lhe ajudara com os antigos refugiados depois de ele tornara-se o magistrado de Venetinova.

Então Komain acabara servindo Poncho, apoiando-o tanto abertamente como secretamente.

Era por isso que Poncho sabia quão bondosa a natureza de Komain era. Pensava que ela era boa demais para ele, mas se estava disposta a casar-se com ele, não poderia haver um resultado mais feliz.

Poncho virou-se e perguntou a sua assistente, que estava de pé atrás dele: 

— O que acha, Madame Serina?

— …Deixe-me ver. 

Parecendo pensar por um momento, Serina olhou para Komain e disse: 

— Podemos esperar que Komain apoie-o sem segundas intenções. No entanto, você é um ministro deste país, e, embora seja um em ascensão, é parte da nobreza. Sem apoiadores influentes, acho que Madame Komain merece alguma preocupação nesse quesito, não acha?

O que Serina dizia provavelmente estava certo.

As pessoas que eles tinham mandado embora até então vinham de linhagens de cavaleiros, nobres e comerciantes influentes. Se Komain, que não tinha apoiadores, se tornasse sua esposa agora, não daria para esperar que ela repelisse ataques de mulheres de tal parentesco.

Entretanto, Komain olhou direto de volta para Serina e respondeu: 

— Se eu for me tornar a esposa principal de Lorde Poncho, Sua Majestade Souma irá organizar a minha adoção por uma família apropriada. Ele parece sentir que é uma ameaça que um bom vassalo como Sir Poncho permaneça solteiro por tanto tempo.

— Q-que vergonha… Sim… 

Poncho curvou a cabeça com pesar, mas a razão pela qual ele não tinha casado não era culpa dele. Era porque Serina e Komain estavam intimidando as candidatas.

Serina deu um olhar investigativo para Komain e perguntou: 

— Verdade. Nesse caso, sua linhagem não deve ser problema algum. No entanto, nesse caso, as responsabilidades da primeira esposa de um nobre cairão totalmente sobre seus ombros. Consegue suportar isso?

— Vejamos. O que eu realmente quero é que Sir Poncho tome alguém confiável como sua primeira esposa, e então mantenha-me ao seu lado como sua segunda.

— …Isso é verdade?

— Sim. Entretanto, essa pessoa só não aparece — Komain disse — Se eu ficar só esperando assim, nunca sei quando minha vez poderá vir. Sendo assim, acho que vou dar o meu melhor para conseguir lidar com isso eu mesma.

As palavras de Komain eram sérias, determinadas, e não havia nada que Serina pudesse dizer em resposta.

O caminho que ela trilharia certamente seria repleto de dificuldades. Mesmo sabendo disso, Komain decidira segui-lo. Com ela e Poncho apoiando um ao outro.

Fazer pouco caso dessa determinação… era algo que Serina não conseguia.

Serina fechou os olhos e deu um passo para trás.

Isso era a prova dela reconhecendo Komain como adequada para Poncho.

Poncho evitou dar uma resposta a Komain de imediato, devido à natureza desses tipos de encontros, mas ele prometeu dar uma resposta favorável. Eles provavelmente noivariam para casarem em pouco tempo.

— É estranho dizer isso, mas é um peso a menos nos meus ombros, sim — Poncho acrescentou.

— He he — Komain riu — Você passou por vários desses encontros de casamento, afinal. Perdeu peso, não é?

— Perdi? Não acho que a linha da minha cintura mudou muito.

— Você não seria o Poncho se não fosse pançudo, afinal.

Observando os dois conversando, sorrindo, de perto, Serina sentiu como se tivesse sido deixada sozinha pela passagem do tempo.

 

 

— Ufa…

Alguns dias passaram-se desde então. Num quarto no Castelo de Parnam, Serina soltava o enésimo suspiro do dia.

Carla simplesmente não podia ficar só olhando, e hesitantemente falou com ela.

— …Ahm, Criada chefe? Aconteceu alguma coisa? Parece-me que você tem suspirado bastante hoje.

— Perdoe-me. Estou um pouco perdida em pensamentos. 

Depois de seu meigo pedido de desculpas, Serina voltou a limpar o quarto como criada, mas sua expressão continuava carrancuda como antes. 

Francamente… o que é…? — Serina perguntou-se.

Desde que ela ouvira a declaração de Komain, havia um turbilhão de emoções conflitantes revolvendo dentro do peito dela.

Poncho era um bom colega dela, e Komain era uma garota agradável. Ela devia ter ficado feliz que eles noivaram, então porque ela não conseguia dar as bençãos aos dois?

Eu acho que vou me sentir sozinha depois que eles se casarem…? Isso é absurdo. Não sou nenhuma criança. Não deveria me sentir excluída. Então porquê…?

Apesar das mãos de Serina não terem parado de trabalhar, seus pensamentos estavam em loop, e eles finalmente vazaram em outro suspiro.

Normalmente, a persona padrão de Serina era do tipo legal e séria cujas emoções eram difíceis de ler, o que fez Carla ficar ainda mais alarmada vendo-a tão melancólica.

— Ahm, poderia ser que você não se sente bem em algum lugar? Se estiver mal, talvez devesse deixar isso comigo e tirar o resto do dia de folga?

— Não é isso não, sério… Meu trabalho foi desleixado de alguma forma?

— Não, você estava indo bem — Carla disse rapidamente — Na verdade, a forma como você parecia tão triste, mas suas mãos ainda estavam se movendo direito fez ser ainda mais medonho… Nossa, me desculpe!

Percebendo seu deslize, Carla apressadamente fez continência e pediu desculpas.

Vendo Carla tão perturbada, Serina soltou um suspiro irritada. 

— Tem horas quando eu não estou no meu melhor, também.

— Ahm… realmente tem certeza que não vai considerar descansar? — Carla sugeriu.

Serina chacoalhou a cabeça. 

— Seria bom se eu pudesse, mas… nesse caso, não deixaria minha mente descansar.

— Sua mente? Não é seu corpo?

— Sim. Como posso colocar…? Não gosto de deixar coisas que poderia estar fazendo para outras pessoas. É o trabalho de uma criada cuidar dos outros, então sinto que outros cuidarem de mim é contrário a meu papel.

— Entendo… — Carla disse — Bem, tenho que dizer. Você não é a criada chefe à toa. Você é tipo a criada ideal.

A criada ideal. Foi disso que Carla chamou-a, mas Serina inclinou a cabeça para o lado e perguntou-se se ela realmente o era.

Ela sentia que o desejo de não ter os outros preocupados com ela vinha não de seus pensamentos como uma criada, mas sim de seus pensamentos como indivíduo. Serina odiava ter que contar com os outros. Ela desejava que os outros não a menosprezassem só porque haviam emprestado sua força.

No fim… Suponho que eu seja desastrada.

Se ela pudesse ser honesta consigo mesma e aceitar a ajuda de outras pessoas, a vida seria bem mais fácil.

De fato, o rei deste país, Souma, sempre reconheceu honestamente quando não podia fazer algo por si mesmo, contratou alguém para quem pudesse delegar a tarefa e manteve o país funcionando suavemente confiando neles.

Entretanto, porque Serina teve o azar de ser talentosa o suficiente para fazer qualquer coisa, ela viera até aqui sem contar com os outros. Ela não podia simplesmente mudar a forma como vivera depois de tanto tempo.

Se minha personalidade me deixasse contar com os outros melhor… Tenho certeza que poderia ter perguntado a alguém a respeito dessas sensações conflitantes… — Serina refletiu.

— Ah! Mas Criada Chefe, você deixou Sir Poncho cozinhar para você antes, certo? Ouvi dizer que ele fez isso para você várias vezes como agradecimento por ser sua assistente. 

Carla de repente mencionou isso.

— Sim — Serina disse — O que tem isso?

— Não, ahm, se você odeia que outras pessoas façam coisas por você, talvez você na verdade não goste quando Sir Poncho cozinha para você… é o que eu estava pensando.

As palavras que Carla disse improvisadamente dispararam um ruído no peito de Serina.

— Isso não é verdade — Serina disse — Os pratos de Sir Poncho são todos únicos, nada que eu pudesse bolar. Isso não é algo que eu poderia fazer eu mesma, percebe?

— Ah, não, talvez isso fosse verdade da primeira vez, mas você é uma cozinheira melhor que muitos, certo? Os pratos que Sir Poncho e o mestre fazem usam vários ingredientes incomuns, mas fazer os pratos em si é incrivelmente simples. Se você tivesse pedido que ele anotasse a receita, não teria porque de incomodar Sir Poncho. Você poderia fazer os pratos por si mesma, não poderia?

— Hã?! 

Quando Carla apontou isso, os olhos de Serina se arregalaram.

Agora que ela diz, isso é verdade.

Os pratos de Poncho eram inovadores, mas todos eram feitos com ingredientes acessíveis e se ele tivesse passado a receita para ela, é claro, Serina poderia fazê-los também.

Apesar disso, Serina nunca tentara fazê-los por si mesmo. Ela somente lambia os lábios e comia o que Poncho fazia para ela com um olhar extasiado.

Embora ela alegasse que odiava deixar que outras pessoas fizessem por ela o que ela podia fazer por si mesma, Serina esteve deixando Poncho cozinhar para ela.

Serina certamente estava cuidando de Poncho, mas Poncho esteve cuidando dela, também.

E nem uma vez isso fora desagradável para ela.

Agora que fizeram ela perceber isso, Serina ficou parada com um raro olhar de surpresa no rosto.

Eu… estava contando com Sir Poncho, não estava? E a razão pela qual não percebi foi que veio tão naturalmente…

Essa foi a primeira vez que ela percebeu quão especial Poncho era.

 

— O tempo está horrível, não? — Serina queixou-se.

Estava naquela tarde. O céu estava carregado de nuvens.

De acordo com a Previsão de Tempo Semanal de Naden, que ela, como criada chefe, verificava devidamente toda semana, era esperado que nevasse com chuva, tornando-se neve de noite.

Debaixo de um céu que pesava sobre ela só de olhar, Serina partiu pelos portões do Castelo de Parnam e foi para a cidade.

Ela tinha trabalho como ajudante de Poncho hoje, então estava a caminho de sua residência.

Ser uma ajudante de Poncho era um trabalho respeitável, então normalmente ela era capaz de receber permissão para tomar uma carruagem… mas hoje ela estava com um humor de andar.

Ela andou pelas ruas frias vestindo um casaco sobre seu uniforme de criada clássico.

Quando uma beldade como Serina andava pela cidade, ela naturalmente atraía os olhos dos homens passando. Se esses homens tivessem mulheres acompanhando-os, as mulheres ciumentas às vezes puxariam as orelhas deles ou dariam tapas por causa disso.

Da perspectiva de um homem, ela era uma baita mulher pecadora.

Enquanto olhava a paisagem da cidade, Serina deu um suspiro. Normalmente, ela não pensaria nada sobre essa paisagem, mas hoje parecia muito solitária para ela.

Tenho certeza de que Sir Poncho dará uma resposta a Komain em breve. Aqueles dois vão noivar e então alguma hora se tornarão marido e mulher. Não tem lugar para mim aí…

Serina lembrou-se de algo que a secretaria e criada de Ginger, Sandria, dissera. — Então, como se sentiria se Lord Ginger fosse uma mulher? Se fosse uma mulher com a qual Lorde Poncho estivesse se divertindo conversando agora mesmo, você ainda não se sentiria nem um pouco ansiosa?

O que eu respondi naquela hora…?

Se ela se lembrava, era algo sobre como, se Poncho apenas fizesse comida para aquela mulher, e ela não pudesse mais comer com ele, ela não gostaria … ou algo assim.

Se as coisas continuassem como estavam, aquela que comeria com Poncho seria Komain.

Estava tudo bem odiá-la por isso?

Serina tinha o direito de fazer isso?

É como uma cena que eu estou vendo através do vidro…

Encarando a janela de vidro de uma carruagem que acabara de parar na frente dela, foi isso que Serina pensou.

Ela podia ver as pessoas dentro claramente, mas elas estavam num espaço separado, e por mais inveja que tivesse do que viu, ela jamais poderia tê-lo para si mesma.

Olhando para seu rosto refletido na janela, Serina parecia com uma criança prestes a entrar em prantos.

Começou a cair chuva e nevar do céu.

— Começou a cair, hã? — Serina murmurou.

Era neve encharcada que se tornava água no segundo que tocasse pele ou roupas.

Serina tinha ficado encarando para cima em direção ao céu à toa, mas nesse ritmo, ela ia pegar um resfriado.

Ela pretendia chegar na mansão de Poncho antes que começasse a chover para valer, então não tinha feito nenhum preparo para a chuva em absoluto. Felizmente, não era longe.

Serina andou rapidamente pela chuva com neve até chegar na mansão de Poncho.

Quando ela bateu para informá-los de sua chegada, Komain veio para atender a porta e seus olhos se arregalaram.

— Uou! O que houve, Serina?! Você está encharcada!

— Fui pega pela chuva por um tempo curto.

— Isso levou mais do que um pouco… Porque não veio de carruagem?

Enquanto Komain alardeava e convidava a Serina ensopada para entrar, passos pesados soaram do fundo da mansão.

É claro, que era o mestre da casa, Poncho. Ele tinha uma grande toalha de banho em mãos.

Ao correr para o lado de Serina, ele jogou a toalha por cima da cabeça dela. 

— Eu… Eu ouvi a voz de Madame Komain, então trouxe uma toalha. Se você não se secar rápido, vai pegar um resfriado! Madame Komain, por favor ferva um pouco d’água e traga aqui, sim.

— E-entendido!

Vendo Komain sair depressa, Poncho começou a secar o cabelo de Serina com a toalha. Suas mãos não eram nada gentis e Serina estava a sua mercê. De cabeça baixa e olhos fechados, Serina estava pensando.

Não… Eu realmente não desgosto disso nem um pouco…

Seu cabelo molhado estava sendo tocado e esfregado. Ela estava deixando outra pessoa cuidar dela. Apesar disso, ela não sentiu nenhum desprazer disso em absoluto.

Não… Não posso mais esconder. Essa pessoa é especial para mim.

Serina finalmente reconheceu seu próprio amor.

Ela pôs a mão direita em cima da mão esquerda de Poncho, que estava do outro lado da toalha, e a trouxe para descansar na bochecha dela. A mão grande dele era quente e reconfortante.

— M-madame Serina?! O-o que é, sim?!

A ação de repente de Serina fez os olhos normalmente estreitos de Poncho se ampliarem.

— Nada demais… Só o que eu quero fazer. Quando ela olhou para cima, Serina tinha sua cara destemida e séria de costume. Entretanto, os cantos de seus lábios estavam levantados só um pouquinho. 

— Sir Poncho, sua mão direita está folgando. Você ia secar meu cabelo, não ia?

— S-sim… Ahm, mas, é difícil fazer isso só com a minha mão direita…

— Aguente isso pelo menos. Porque você é uma pessoa especial que tem permissão de cuidar de mim.

— Eu… Eu não sei do que você está falando. Espere, Madame Serina. Porque está tocando na minha bochecha agora?!

Dessa vez, a mão esquerda de Serina estava na bochecha de Poncho. Isso por fim os pôs numa posição em que estavam segurando as bochechas um do outro.

Os olhos se moveram rapidamente enquanto ele tentava processar a situação. — O-o que é isso?! É uma piada?! Você está me provocando, sim?!

— Sim. Estou provocando-o. Mas isso não é nenhuma piada. Do meu próprio jeito, estou mostrando meu amor por você aqui.

— S-seu a-amor…?! Espera, o queeê?!

Serina recuou um passo do Poncho surpreso e então levantou a barra de sua longa saia e curvou-se, como se estivesse perguntando-lhe se eles podiam ser os próximos a dançarem num evento social.

— Sir Poncho. Você é especial para mim. É por isso que não posso tolerar que você me ignore para dividir sua mesa com outra pessoa. Mesmo se for um membro familiar. Se você diz que só permite que família sente a sua mesa, então deixe-me ser parte dessa família.

— Hã…? O que você quer dizer com…

— É simples. Se você for tomar Komain como sua esposa, por favor me tome, também.

Poncho ficou sem palavras, com a boca apenas abrindo e fechando em silêncio como se ele fosse um peixinho dourado.

Quando uma beldade como Serina, que ele assumira que estava muito fora de seu alcance, declarou seu amor para ele, mesmo ela fazendo isso de um jeito estranho e indireto, a mente dele ficou em branco.

Isso foi bem quando Komain voltou com uma bacia de água quente. 

— Ahm… Alguma coisa aconteceu enquanto eu fervia a água?

— Só estava expressando meu desejo de que Sir Poncho me faça sua esposa. — Serina disse despreocupadamente.

Os olhos de Komain arregalaram-se. 

— Certo, então! Você se deu conta de seus próprios sentimentos, Madame Serina?

— Sim. Levou algum tempo para encará-los, porém.

— Ahaha… Tempo demais — Komain disse, deixando a bacia com uma risada — Mas fico feliz. Se você vem, não preciso ser adotada por uma família de nobres. Estou bem sendo a segunda esposa.

— Komain… tem certeza disso?

— Eu disse que daria o meu melhor se a necessidade surgisse, mas acho que realmente seria muito difícil para mim agir como a esposa de um nobre, no fim das contas. Se você vai cuidar das coisas fora de casa como a primeira esposa, eu focarei dentro de casa.

Vendo o sorriso tranquilo no rosto de Komain enquanto ela dizia isso, Serina sorriu um pouco, também.

Ela tinha certeza que se daria bem com ela.

— Espere, Poncho?! — Serina gritou — Seus olhos giraram para dentro da sua cabeça! Você está bem?!

Komain balançou Poncho e tentou chamá-lo de volta para a realidade.

Enquanto observava-a, Serina de repente lembrou-se de algo que Komain dissera antes. 

— A propósito, qual era o “lugar que você quer estar” que você estava falando naquela hora?

No dia que ela muito provavelmente tinha resolvido ter o encontro de casamento com Poncho, Komain dissera que era para alcançar o lugar que ela queria estar.

Komain respondeu: 

— Isso é óbvio — e sorriu — A mesa em torno da qual Poncho, você e eu podemos sentar como família.

 

 

Mais tarde, o noivado de Serina e Komain com Poncho seria amplamente divulgado, e as mulheres interesseiras ficariam muito desapontadas.

Por outro lado, Souma e os outros membros de elite do reino que tinham estado preocupados com Poncho ficaram aliviados.

— Parece que tudo ocorreu da forma como deveria no final — Souma disse satisfeito.

— Sim — Hakuya concordou — Se Madame Serina e Madame Komain estão com ele, podemos ter certeza que elas vão proteger o gentil, porém tímido Sir Poncho daqueles que tentem tirar vantagem dele.

Souma fez um grande aceno com a cabeça em concordância. 

— Ele é alguém que precisamos que continue fazendo um bom trabalho para nós no futuro. Pelo desenvolvimento de reino, e pelas minhas próprias razões pessoais, quero ver Poncho construir uma família feliz e estável.

Que os três sejam felizes juntos — Souma desejou em silêncio.

 


 

Tradução: Enzo

Revisão: Merovíngio

 

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Rlc

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  • Aweeew falta ajeitar mais algum sacrifício pra ir pro altar junto com o souma?? Kkkk acho q já foram todos

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