Manami ou onda demoníaca. Era um fenômeno de monstros aparecendo em massa no Domínio do Lorde Demônio que se moviam em direção ao sul.
O segundo ano após Souma assumir o trono, em 1.547 do Calendário Continental, foi aquele em que ocorreu a terceira onda demoníaca após a aparição do Domínio do Lorde Demônio.
Em situações onde monstros transbordavam de uma masmorra, mesmo que formassem grupos, haveria, no máximo, várias dezenas deles. Mas no caso de uma onda demoníaca, mais de dez mil monstros invadiriam repentinamente as nações da humanidade.
Naturalmente, ao contrário de quando emergiam de uma masmorra estreita, os monstros seriam espalhados pela fronteira conforme invadiam, então haveria menos deles em qualquer campo de batalha, e a pressão colocada sobre as defesas variaria de lugar para lugar, dependendo da fraqueza ou força dos monstros.
No entanto, se milhares de monstros poderosos invadissem de uma vez, um pequeno país seria impiedosamente pisoteado, e um país de tamanho médio provavelmente enfrentaria uma crise existencial.
Um dos locais que tiveram combates intensos na onda demoníaca deste ano foi o Reino de Lastania, no extremo noroeste da coleção de países de pequeno e médio porte conhecidos como União das Nações Orientais.
Este país tinha uma população de menos de vinte mil habitantes e uma força de apenas quinhentos soldados, mas um enxame de mais de cinco mil monstros agora o atacava.
A maioria deles eram homens-lagarto, que tinham cabeças de lagarto e corpos escamosos humanóides, com suas pernas mais alinhadas com as de uma pequena besta. Se alguém os comparasse a um dinossauro do mundo de Souma, o mais próximo seria um deinonychus1Dinossauro do gênero raptor..
O nome deles pode ser homens-lagarto, mas suas ações eram de natureza puramente bestial, não havia sinal de grande inteligência que diziam ser possuída pelos demônios.
Também havia inúmeras quimeras à espreita perto dos homens-lagarto.
O número desses monstros era maior do que o Reino de Lastania poderia lidar sozinho, mas tanto a União das Nações Orientais a que eles pertenciam quanto o Reino dos Cavaleiros Dragão Nothung com os quais eram aliados estavam sendo afetados pela onda demoníaca e estavam muito ocupados cuidando dos seus próprios problemas para poder enviar ajuda.
Então, em resposta a esta situação, o Reino de Lastania reuniu pessoas que não conseguiram escapar para o sul a tempo para a única cidade murada do país, Lasta, e se preparou para um cerco.
Infelizmente, se somados o exército regular de quinhentos homens com os cerca de cinquenta voluntários, Lastania ainda tinha menos de seiscentos homens no total. Esses não eram números que poderiam repelir os mais de cinco mil monstros.
Para compensar isso, eles recrutaram três mil homens com capacidade de combate dentre os dez mil cidadãos que haviam recebido e os designaram para guardar as muralhas do castelo. Isso elevou o número de defensores para três mil e quinhentos, mas a maioria deles eram pessoas comuns. Uma pessoa sem treinamento não poderia enfrentar nem um monstro fraco sozinha, então era justo chamar a situação deles de desesperadora.
Mas o Reino de Listania ainda estava fazendo um bom trabalho em resistir.
Meio-dia do dia 15, mês 10, ano 1,547, Calendário Continental; Nas paredes de Lasta
— Arqueiros, mirem! Não há necessidade de atingir inimigos distantes no chão! Concentre o fogo naqueles que escalam as paredes e certifique-se de acertá-los!
Julius estava dando comandos no portão sul da muralha enquanto eram atacados por homens-lagarto.
Ele era um general visitante neste país, mas ninguém nesta terra era um comandante mais experiente do que o próprio, então recebeu temporariamente o controle total sobre as forças de Lastania.
Diante dos olhos de Julius, ele podia ver soldados focados nos inimigos que se aproximavam do portão. Eles tinham flechas engatilhadas e voltadas para o portão que não devia cair.
Julius gritou apressadamente para eles.
— Tolos! Concentrem-se no inimigo à sua frente!
— Não, mas se o portão cair… — Um dos soldados começou a contestar. — Uwah?!
Suas pernas cederam quando um homem-lagarto enfiou a cabeça pela fenda de flecha à sua frente. Ele havia escalado a muralha.
O monstro parou diante do soldado, que estava chocado demais para recuperar o equilíbrio. Ele sacudiu sua língua de lagarto e abriu bem a boca para se alimentar do soldado.
— Eek! — O soldado levantou os braços para cobrir o rosto em puro terror.
No instante seguinte, o som abafado de algo perfurando a carne chegou aos ouvidos do soldado. No entanto, o homem não sentiu nenhuma dor, então ele deixou cair os braços hesitantemente.
Havia uma única lâmina perfurando o homem-lagarto pela boca.
— Eu te avisei — disse Julius.
Era sua espada perfurando o homem-lagarto.
Julius empurrou o homem-lagarto contra a borda da parede junto com dela.
Então, chutando-o no torso, ele o jogou enquanto arrancava sua arma. O corpo do homem-lagarto caiu direto do lado de fora da muralha.
Por fim, percebendo que havia sido salvo, o soldado olhou para Julius.
— M-muito obrigado!
—…Hmph. — Julius brandiu sua lâmina, arremessando o sangue do homem-lagarto, depois ergueu sua voz mais uma vez. — Ouçam! O inimigo não está lutando contra um cerco! Os que cercam este castelo não tem inteligência para entrar em uma casa pela porta da frente, para começar! Eles tentam escalar as paredes e o portão! É por isso que todos vocês devem se concentrar no inimigo à sua frente!
— Sim, senhor!
Impressionados com a demonstração de bravura de seu comandante, a moral dos soldados subiu um pouco.
Os soldados atiraram nos homens-lagarto enquanto eles tentavam escalar a muralha e os derrubaram com golpes de suas lanças. A visão deu a Julius um momento de alívio, mas ele continuou gritando.
— É assim que se faz! Não deixem de proteger os lançadores de flechas antiaéreas nos cantos das paredes! Se eles forem destruídos, os voadores poderão cruzar as paredes e atacar aqueles atrás de nós!
Ele estava se referindo àqueles monstros quimeras distorcidos que vagavam dentro do bando dos homens-lagarto. Esses eram uma mistura de diferentes características de animais e não era possível descrevê-los uniformemente. Alguns rastejavam no chão, enquanto outros voavam, tornando mais difícil responder a eles.
Não que os homens-lagarto e os monstros quimera estivessem trabalhando juntos. As quimeras eram carniceiras. Quando os homens-lagarto atacaram os soldados, elas espreitaram a área, procurando reivindicar os soldados mortos e a carne dos homens-lagarto para si.
Se aqueles ao seu redor fossem perigosos para elas, como os soldados ou os homens-lagarto, não representavam ameaça e se limitavam a sua posição de carniceiras. Mas se as quimeras encontrassem presas mais fracas, atacariam ferozmente. Se os lançadores de flechas antiaéreas fossem destruídos, os monstros alados atacariam os não-combatentes escondidos atrás da muralha. Isso tinha que ser evitado a todo custo.
Um dos soldados experientes correu para Julius.
— Sir Julius, você acha que as outras muralhas estão seguras?
— Madame Lauren está defendendo o portão leste e Jirukoma está protegendo o portão oeste. Posicionamos muitas das forças regulares no lado norte, onde não há portão. Para ser honesto, as defesas são mais fracas aqui. Enquanto não houver brecha neste lado, duvido que consigam passar por qualquer outro lugar.
— Entendo… — O soldado experiente assentiu com satisfação e voltou ao seu posto.
Julius continuou direcionando as tropas enquanto observava.
— Ouçam! Os que estão atrás de nós não podem lutar! Para defendê-los, não devemos deixar o inimigo passar por aqui! Se lutarmos muito e ganharmos tempo, tenho certeza que chegarão reforços de outro país! Devemos ser pacientes até lá! Todos, sejam corajosos e lutem!
— Yeahhhhhh! — Os soldados gritaram em resposta.
Talvez os soldados na muralha leste e oeste tenham ouvido, porque os dois grupos também se animaram.
Mesmo cercado pela atmosfera acalorada de uma batalha até a morte, Julius mantinha sua frieza natural e tinha uma compreensão firme da situação atual.
Eu sei que disse isso aos soldados, mas… não tenho ideia de quando o apoio chegará. Refletiu sombriamente. Não posso ter certeza de que isso acontecerá. Estamos conseguindo segurá-los por enquanto, mas se eles continuarem a nos desgastar, eventualmente…
Julius balançou a cabeça. Se o comandante fosse dominado por pensamentos negativos, os homens entrariam em pânico. Ele tinha que ficar calmo e sóbrio.
Julius olhou para o norte, na direção da mansão real. Atrás dele havia alguém que ele queria, que tinha que proteger, não importa o que acontecesse.
Eu não vou deixar essas coisas comerem Tia!
Agarrado ao sorriso inocente da garota que salvara seu coração, Julius continuou dando ordens.
Por fim, o sol se pôs e caiu a noite sobre Lasta.
Talvez os homens-lagarto tivessem uma visão noturna ruim, porque não atacavam à noite. Em seu lugar, as quimeras ficaram mais ativas, embora nenhuma tentasse atravessar a muralha, elas se banqueteavam com os cadáveres de soldados e homens-lagarto que estavam espalhados do lado de fora da muralha.
Eles não podiam baixar a guarda, mas, para os soldados que lutaram durante o dia, a noite era um importante momento de descanso.
Julius, que estava comandando de cima da muralha o tempo todo, também fez uma pausa e sentou-se ao redor de uma fogueira com Jirukoma e Lauren. Ambos lutaram bastante em suas próprias posições, e os sinais de exaustão eram visíveis em cada um de seus rostos.
Julius fez uma pergunta a Lauren.
— Faz cinco dias agora, não é? Quantos nós perdemos?
Lauren mordeu o lábio.
— Outros cem hoje… Se fôssemos contar todos os mortos e gravemente feridos, seriam cerca de seiscentos.
Isso significa que quase um sexto dos três mil e quinhentos soldados defensores haviam se tornado incapazes para o combate.
Jirukoma suspirou enquanto mantinha suas lâminas kukri.
— Estamos com menos de três mil defensores… Enquanto isso, o inimigo não parece ter saído dos cinco mil. Mesmo que eu tenha certeza de que matamos um bom número deles hoje.
Julius cruzou os braços e cuspiu as próximas palavras.
— Parece que mais e mais continuam vindo do norte. Honestamente, isso me incomoda.
O terror da onda demoníaca era que os monstros seriam repostos, com um grupo seguindo o outro como ondas. Era exaustivo pensar que, não importava quanto eles derrotassem, o número de inimigos nunca diminuiria.
Reconhecidamente, esses eram monstros pouco inteligentes, se muitos estivessem em uma área, nem todos poderiam participar da batalha. Isso significa que eles passariam por esta cidade e seguiriam para o sul. Em outras palavras, embora seus números não diminuíssem, eles também nunca aumentariam demais.
— Você acha que as terras ao sul estão bem? — Lauren ponderou.
— Não estamos em posição de nos preocupar com os outros. — Julius rejeitou completamente a preocupação dela. — Enquanto aguentarmos aqui, o número de monstros indo para o sul será menor. Do ponto de vista dos países de lá, mesmo que nosso país seja finalmente destruído, tenho certeza de que eles querem que resistamos o máximo possível e matemos o máximo de monstros que pudermos.
— Embora eles tenham seus próprios países e famílias para pensar, isso parece um pouco sem coração — admitiu Lauren
— É assim que as coisas são. Se você não cuidar primeiro de si mesmo, não pode estender a mão para ajudar os outros.
— Acho que você está certo… Sinto muito, Sir Julius, Sir Jirukoma. — Lauren curvou-se profundamente para os dois. — Sinto muito por envolver estrangeiros como vocês em uma batalha como esta. Eu até mesmo tenho Sir Julius assumindo o comando total de nossas forças… me sinto patética.
Embora Lauren cerrasse os punhos e inclinasse a cabeça com um olhar de dor no rosto, Jirukoma riu com entusiasmo e colocou o braço em volta do ombro de Julius.
— Levante a cabeça, por favor, Madame Lauren. Gostamos mais deste reino do que você pode imaginar. Certo, Sir Julius?
— Saia de perto de mim. Isso é sufocante. — Julius afastou o braço do outro homem e limpou a garganta ruidosamente. — Bem… eu não tive tempo de fugir para o sul, afinal. Quanto a comandar as tropas, não havia ninguém mais capaz do que eu, então esse foi o resultado inevitável. Afinal, prefiro não morrer sob o comando de algum tolo incompetente.
— Hahaha! Você diz isso, mas não tinha a menor intenção de fugir sem a princesa Tia.
— … Você fala demais.
A carranca desajeitada no rosto de Julius fez Jirukoma e Lauren começarem a rir.
Passos leves se aproximaram dos três. Quando os três olharam para cima, uma figura pequena estava trazendo algo grande para eles. Quando essa pessoa se aproximou da fogueira, os olhos de Julius se arregalaram ao perceber quem era.
— Princesa, por que você deixou a mansão real?!
Era a princesa deste país, Tia Lastania. Ela estava usando seu costumeiro vestido estilo tirolês com um avental por cima e segurava uma panela de barro em suas mãos enluvadas.
Quando Tia viu Julius, seu rosto abriu um sorriso.
— Eu estava ajudando as senhoras da cidade a distribuir comida. — Ela explicou enquanto oferecia a panela para os três. — Lorde Julius, Lauren, Sir Jirukoma. É mingau de pão com abóbora e leite. Sinto muito, isso é tudo o que temos para vocês depois de terem lutado tanto…
— N-Não seja ridícula, princesa! Nós o aceitamos com gratidão! — Lauren gaguejou.
Ela cumprimentou ao aceitar a panela e Jirukoma afagou a barriga com uma risada.
— Afinal, estamos com fome após lutar. Tenho certeza de que qualquer coisa parecerá satisfatória neste momento.
— Essa é uma maneira rude de dizer… — Julius balançou a cabeça exasperado, mas sua expressão de antes havia suavizado um pouco.
Então os três sentaram-se em volta da panela de mingau de pão para comer
Tia astutamente sentou em uma posição onde seus ombros tocariam os de Julius. Isso colocou um sorriso irônico no rosto de Lauren, mas subitamente ela voltou a uma expressão mais séria e fez uma pergunta a Julius.
— No final das contas, se esconder aqui é nossa única opção?
— Agora que estamos cercados, escapar é impossível. — Julius respondeu em tom calmo entre goles de mingau. — Se o inimigo fosse autoconsciente, poderíamos negociar, mas eles não tem nada em mente além de comer a presa à sua frente. Apenas tentam repetidamente atacar as muralhas. É por isso que mal conseguimos afastá-los. Mas… se esta é uma batalha de atrito, vai ser difícil.
— Lorde Julius… — Tia agarrou sua manga, seus olhos vacilando com incerteza.
Julius colocou sua mão sobre a dela e continuou:
— Seja qual for o caso, devemos resistir por enquanto, custe o que custar. Manteremos a cidade enquanto esperamos por reforços vindo de algum lugar. Isso é tudo o que podemos fazer agora.
— Os reforços… realmente virão? — Tia questionou hesitante. — Papai estava dizendo que pediu ao Reino dos Cavaleiros Dragão Nothung e à União das Nações Orientais para enviar ajuda.
Julius balançou a cabeça.
— Eles podem vir, mas como outros países da União e o Reino dos Cavaleiros Dragão também são afetados pela onda demoníaca, sua chegada será adiada. Afinal, todos eles têm que priorizar seus próprios países.
— Oh… — Os ombros de Tia caíram.
Sentindo-se mal por ela, Jirukoma perguntou a Julius:
— Você enviou um pedido de reforços usando suas próprias conexões, não é? Temos alguma esperança de que eles apareçam?
— Você fez isso?! — O rosto de Tia se iluminou e ela olhou para Julius.
Incapaz de encontrar seus olhos suplicantes, Julius se virou enquanto respondia.
— Dou uma chance de cinquenta-cinquenta. No final, é uma questão de se esse homem enviará tropas ou não.
As conexões de Julius. Isso significava contar com sua irmãzinha Roroa, que agora era candidata a se tornar a terceira rainha primária do rei provisório Souma Kazuya do Reino da Friedônia. Significava ter Roroa trocando uma palavra com Souma para que ele enviasse tropas.
Para Julius, ambos eram pessoas das quais era antagônico, mas ele não podia se dar ao luxo de focar nisso agora. Para proteger a querida garota que estava ao seu lado, estava preparado para curvar a cabeça diante daqueles com quem estava em desacordo.
No entanto, ao ouvi-lo dizer que as chances eram de 50%, Jirukoma inclinou a cabeça interrogativamente.
— Realmente é cinquenta-cinquenta? Eu entendo que há duas opções para Souma, enviar tropas ou não, mas não existe também a questão de sua irmã repassar o pedido ou não?
— Não, Roroa definitivamente vai repassar.
— Você parece certo disso.
— Minha irmã é calculista, mas quando as emoções se envolvem, ela fica indecisa. Se o irmão que ela exilou vier pedindo ajuda, Roroa não conseguirá decidir o que fazer sozinha. Então deixará a decisão para Souma.
— Então é por isso que a decisão é do Rei Souma, huh… — Jirukoma deu de ombros, insinuando exasperação. Se Julius havia pedido ajuda à irmã, conhecendo aquela personalidade dela, ele era um sujeito desonesto.
Julius riu zombeteiramente de si mesmo antes de olhar para Tia.
— Princesa. Este é o tipo de homem que eu sou. Vou até tirar vantagem da minha própria família, se necessário. O sangue de cobra venenosa da Casa Principesca da Amidônia ainda corre em minhas veias. Então…
— Mas você está fazendo isso por nós, certo? — Tia interrompeu as palavras de auto-rejeição de Julius. Ela envolveu a mão esquerda dele com a sua e deu-lhe um sorriso caloroso. — Tudo bem se você for uma cobra venenosa. Quando o vejo fazendo o que for preciso para nos defender, Lorde Julius… você é tão confiável e amável. Se os reforços vierem e você se sentir mal pelo que fez sua irmã passar, eu abaixarei minha cabeça ao seu lado. Porque quero que sua irmã entenda que você fez isso por nós.
— Princesa…
Ao ser tocado pelo sorriso de Tia, Julius pôde sentir as velhas obsessões dentro dele se desfazendo.
Julius naturalmente colocou a mão direita sobre as mãos de Tia, que envolviam sua mão esquerda.
Sentaram-se juntos em silêncio.
Sentindo a atmosfera entre os dois, Jirukoma e Lauren se afastaram silenciosamente.
No dia seguinte, os homens-lagarto começaram a atacar a muralha de Lasta ao amanhecer.
Seus números ainda não pareciam ter caído de cinco mil, então ficou claro que outro bando de homens-lagarto havia se juntado a eles.
Depois de dias de batalha contínua, a exaustão dos defensores aumentava.
Se fosse um cerco comum, os atacantes teriam evitado pressionar o ataque de forma que só aumentasse as perdas, buscando encontrar uma brecha na defesa. Eles teriam desistido imediatamente quando ficou claro que os defensores não iriam se render, tentando limitar o dano às suas próprias forças.
Os monstros, no entanto, tentaram escalar a muralha, não importando quantos de seus companheiros caíssem, avançando para comer as pessoas lá dentro. A morte de seus camaradas e o esgotamento de suas forças não significavam nada para eles.
Por causa disso, os defensores quase não tiveram tempo para relaxar, e foram levados ao limite tanto mental quanto fisicamente.
Mesmo assim, os soldados de Lastania nas muralhas lutaram ao máximo para evitar uma quebra em suas defesas.
Quando Jirukoma estava dando ordens perto do portão oeste, um dos soldados voluntários, que eram refugiados, veio fazer-lhe uma pergunta
— O que você acha que essas coisas estão pensando quando atacam?
— O que você quer dizer com… no que eles estão pensando?
— Parece que, em vez de tentar tomar a cidade, eles estão apenas tentando nos comer — disse o soldado. — Se eles estão com tanta fome, certamente poderiam apenas comer os monstros que estão à espreita. Quer dizer, eles não parecem ser amigos, até onde eu sei.
Jirukoma estava em silêncio, assentindo. Isso certamente era algo que ele também havia sentido.
A primeira coisa que os homens-lagarto fizeram após escalar a muralha foi tentar morder os soldados. Ele tinha visto essa ação como um sinal de fome intensa.
Vendo a maneira como eles continuaram a correr pelas muralhas em busca de comida, não importando quantos de sua espécie caíssem, eles pareciam ter quase nenhuma inteligência. No entanto, se isso fosse verdade, por que não tentaram saciar sua fome nos monstros quimera que estavam por perto? Afinal, as quimeras estavam se alimentando de seus cadáveres.
Existe alguma razão profunda para isso…? Jirukoma se perguntou, então afastou o pensamento. Ele não conseguia sentir nenhum intelecto dos homens-lagarto lá fora. Provavelmente não havia razão profunda, e a razão provavelmente era incrivelmente simples.
Por exemplo…
— Talvez pareçamos saborosos para eles? Talvez seja por isso que eles correm até nós? — sugeriu.
— Como se pensassem que somos uma iguaria? — O soldado indagou.
— Quem sabe. Por favor, pergunte aos homens-lagarto
Enquanto eles conversavam sobre isso, houve um grito de um soldado perto do portão oeste.
— Sir Jirukoma! Eles estão perto de avançar pelo lado norte da muralha oeste!
No momento em que ouviu aquela voz, Jirukoma preparou as kukri gêmeas que eram suas armas favoritas.
O homem que estava fazendo perguntas a Jirukoma se preparou, colocando a mão no punho da espada pendurada nas costas.
— Equipe de ataque, vamos — disse Jirukoma aos soldados voluntários ao seu redor, então saiu correndo em direção ao lado norte.
Cerca de cinco soldados voluntários seguiram atrás dele.
Quando finalmente chegaram ao ponto em que os monstros estavam perto de avançar, Jirukoma cortou simultaneamente a cabeça de dois que haviam acabado de escalar a muralha. Aqueles que o seguiram derrubaram os homens-lagarto perto deles, protegendo a muralha.
Quando Jirukoma viu que eles terminaram, deu uma ordem para aqueles que o seguiram:
— Estamos aliviando a carga aqui! Sigam-me!
Assim que disse isso, ele saltou para fora da muralha onde os homens-lagarto estavam se aglomerando.
Usando magia do vento para pousar com segurança, ele girou, cortando as criaturas ao seu redor. Então abriu caminho no meio do bando, derrubando um alvo após o outro.
Os membros do que foi chamado de equipe de ataque fizeram o mesmo, cortando qualquer homem-lagarto que eles pudessem colocar as mãos.
Sendo um lutador por natureza, Jirukoma não podia comandar toda a força tão bem quanto Julius. No entanto, como um único guerreiro, ele era melhor do que qualquer um neste reino. Por conta disso, quando havia um ponto na defesa ocidental que parecia que poderia falhar, ele e seus homens entravam e usavam sua rara habilidade de combate para forçar o inimigo para trás.
Além da proeza marcial de Jirukoma e seus homens, ele levantava o moral sempre que exibia seu poder, então a defesa da muralha ocidental era mais resistente do que qualquer outra.
— Já chega. — Ele ordenou. — Nós vamos voltar..
Sempre que o número de homens-lagarto perto da parede caía um pouco, Jirukoma imediatamente ordenava uma retirada. Embora os seis pudessem lançar ataques furtivos, eles acabariam sendo cercados e pulverizados.
Também era verdade que, como eles tinham que se mover para evitar serem cercados, não conseguiam manter isso por um longo período. Independentemente das razões, não era sensato ficar muito tempo.
Jirukoma e seus homens encontraram entalhes na muralha que deviam ter mais de dez metros de altura, rapidamente saltando para retornar.
— Ainda assim… simplesmente não há fim para eles, não é? — Um dos soldados voluntários reclamou, enquanto Jirukoma enxugava seu próprio suor da testa.
Ele deu um tapa nas costas daquele soldado para incentivá-lo.
— Viemos para retornar às nossas terras natais. Se você deixar algo assim fazê-lo choramingar, ir para casa nunca será nada além de um sonho.
— E-eu sei, mas…
Foi quando aconteceu.
Houve o som de uma corneta no meio de Lasta.
Este era o sinal para verificar se havia sinais de fumaça, e o soldado de vigia gritou:
— Sir Jirukoma! Há sinais de fumaça no portão leste!
— Da Madame Lauren, hein? — Ele chamou. — O que eles dizem?
— É um sinal para os comandantes se reunirem!
O sinal de fumaça chamava os comandantes, ou seja, Jirukoma e Julius, a se reunirem. Isso deve significar que Lauren tinha algo a discutir com eles.
— Entendido. — Jirukoma assentiu bruscamente. — Vou deixar este lugar brevemente! Todos mantenham suas posições! Vocês devem resistir até que eu volte! Entendido?!
— Sim! — os soldados urraram.
Jirukoma assentiu, então pulou em um cavalo preparado e esperando do lado de dentro da parede.
Quandoele chegou ao centro da cidade, Julius e Lauren já estavam lá.
— Madame Lauren, aconteceu alguma coisa? — perguntou enquanto desmontava de seu cavalo.
Lauren tirou seu capacete e colocou debaixo do braço, então subitamente exclamou
— Sinto muito! — abaixando a cabeça. — Acabei de receber o relatório, mas pelo que diz a pessoa que administra o arsenal do castelo, nosso estoque de flechas está prestes a acabar.
— Sem flechas… — Julius murmurou.
Isto era um problema sério. Era apenas porque eles tinham armas de longo alcance como arcos e flechas que os recrutas eram capazes de lutar. Sem flechas suficientes, a habilidade de defender as muralhas sofreria um grande golpe.
Julius apertou as têmporas.
— Faz apenas seis dias desde que nos preparamos para o cerco. Não tínhamos reservas?
— É porque o número de soldados regulares que tínhamos era baixo para começar. Deveríamos ter tido o suficiente para durar com nossos números atuais, mas a ofensiva inimiga tem sido intensa. Sem mencionar que muitos dos homens não estão acostumados a usar arco e flecha, então acho que isso nos fez gastar mais rápido. Atualmente, temos ferreiros na cidade fazendo mais, mas no ritmo que estamos indo, eles não conseguem acompanhar.
— É impossível então…
— Sinto muito. — Lauren curvou a cabeça em desespero
Jirukoma colocou a mão em seu ombro.
— Levante a cabeça, Madame Lauren. Certamente isso não é sua culpa. Acredito que as pessoas deste país estão fazendo bem em resistir enquanto estão em desvantagem. Se chegar a isso, vamos tirar tijolos do parapeito, espalhar óleo e afastá-los com lanças.
— Sir Jirukoma…
Os olhos de Lauren estavam úmidos e Jirukoma deu um tapinha em seus ombros para acalmá-la.
Assim que ele pôde ver que Lauren havia recuperado a compostura, Jirukoma se dirigiu a com Julius.
— Ainda assim, se chegarmos a isso, realmente vamos contar com reforços. Suponho que nenhum deles já esteja por perto?
No entanto, Julius balançou a cabeça.
— Com a gente cercado assim, não há informações chegando. Há pouca esperança de reforços de dentro da União das Nações Orientais, então… acho que cabe ao Reino dos Cavaleiros Dragão Nothung.
— E quanto a reforços do Reino da Friedônia? Você disse que enviou um pedido para lá, não foi?
— Mesmo que Souma esteja mandando reforços, esse país está muito longe de lá. Se considerarmos o ritmo que as tropas se moveriam, não consigo visualizá-los chegando hoje ou amanhã.
— Entendo…
Os dois homens franziram a testa, então aconteceu.
Um dos soldados correu apressado, ajoelhando como se tivesse tropeçado e caído. Olhando mais de perto, ele tinha cortes no braço como se tivesse sido arranhado.
— E-Eu tenho um relatório, capitã!
— Onde você conseguiu essas feridas?! — gritou Lauren.
O soldado manteve a cabeça baixa e rapidamente deu seu relatório.
— Os homens-lagarto correram para a muralha norte e romperam-na em alguns lugares! Mais de dez deles se dirigiram para o castelo e agora estão lutando contra os guardas!
Antes que o soldado pudesse terminar seu relatório, Julius começou a se mover.
— Julius! — gritou Jirukoma
Ele ignorou seu colega soldado, montou em seu cavalo e correu em direção ao castelo. Ele não conseguiu ficar parado quando ouviu que o castelo estava sob ataque.
Princesa Tia…
O casal real e a princesa Tia estavam no castelo. A princesa, a garota que libertou o coração endurecido de Julius.
Correndo pela estrada de paralelepípedos, Julius chegou ao castelo avistando os homens-lagarto rastejando pelo castelo como lagartixas.
— Droga! Haaaaaa! — Ele gritou.
Decidindo ignorar os homens-lagarto fora do castelo, ele correu para dentro ainda a cavalo. Lá encontrou três homens-lagarto se banqueteando nos corpos do que deviam ser os guardas. Ele passou correndo por eles, dando um golpe raivoso e separando uma de suas cabeças de seu corpo ao fazê-lo.
Com esforço, acalmou-se e pensou, se eles conseguiram entrar no castelo, a Princesa Tia e sua família teriam fugido mais para dentro. Havia refugiados dentro do castelo também. Nesse caso, eles teriam se dirigido para… o grande salão!
Se alguém precisasse de um lugar profundo que pudesse acomodar muitas pessoas, o grande salão era o único adequado.
Tendo chegado a essa conclusão, Julius correu pelos corredores com seus tetos altos. Ele encontrou um homem-lagarto ao longo do caminho, mas livrou-se dele calmamente com sua espada. Então ele avistou três homens-lagarto agrupados em torno da porta do grande salão. Eles estavam arranhando a porta, tentando entrar
— Mexam-se! — Julius desmontou do cavalo e pôs as mãos no chão.
No momento seguinte, pontas de terra irromperam pelo chão do corredor, empalando os três homens-lagarto de uma vez só. Era a mesma magia do tipo terra que seu pai Gaius já havia usado.
Os monstros soltaram um grito abafado, então não se mexeram mais.
Julius nem sequer olhou para eles enquanto corria para a porta do grande salão. Ele tentou abrir a porta, mas… não conseguiu.
Julius pressionou o corpo contra a porta, batendo e chamando do outro lado.
— Princesa Tia, você está bem?! Sou eu! Julius!
— Lorde Julius.
Ele ouviu a voz de uma jovem garota de dentro. No momento em que percebeu que era Tia, Julius ficou tão aliviado que suas pernas quase cederam sob ele.
No entanto, ainda haviam muitos homens-lagarto, então virou de costas para a porta e ficou alerta.
Muito provavelmente, uma barricada havia sido montada lá dentro. Ele ouviu movimento de dentro por um tempo, então finalmente a porta se abriu e Tia pulou para abraçá-lo
— Lorde Julius! — Ela gritou.
— Princesa Tia… Graças a Deus você está segura. — Julius abraçou-a de volta gentilmente.
Além da porta, ele podia ver os pais de Tia e os refugiados. Alguns ficaram aliviados ao ver Julius, enquanto outros ficaram apavorados e incapazes de compreender a situação. Suas respostas variaram muito.
Julius separou-se de Tia e dirigiu-se ao restante pela porta.
— Por favor, esperem neste grande salão por enquanto. Há homens-lagarto vagando na mansão. Nossos aliados estarão aqui em breve, tenho certeza.
Enquanto Julius acalmava as pessoas no grande salão, Jirukoma o alcançou.
— Julius, foi muito imprudente você vir sozinho!
— Hmph, você foi simplesmente muito lento.
Julius fez um comentário sarcástico, mas Jirukoma puxou o braço de Julius como se não tivesse tempo para se importar com isso.
— Apenas venha, há algo estranho acontecendo lá fora.
— Estranho? — Julius perguntou, em alerta.
Ele disse a Tia e os outros para fecharem a porta mais uma vez, então abriu caminho entre os homens-lagarto junto com Jirukoma para voltar para fora.
Quando olharam para o céu, viram uma formação de mais de cem wyverns passando por Lasta. Eles deviam estar voando alto, porque pareciam terrivelmente pequenos.
Eles provavelmente estavam voando a uma altura em que os lançadores de dardos de repetição antiaérea não os atingissem.
Estes claramente não eram monstros. Era uma força aérea ao lado da humanidade. Jirukoma apertou os olhos.
— Aqueles são… soldados de Nothung?
— Não, eles não usariam wyverns… Além disso, estão vindo do sul.
Quando Julius disse isso, ele viu algo cair de um wyvern. Enquanto eles cerravam os olhos olhando para o céu, um número incontável de coisas de repente se abriu como flores desabrochando.
Objetos redondos e brancos foram espalhados pelo céu. Eram quase como um enxame de águas-vivas.
Enquanto voavam em direção às muralhas do castelo, ficou claro que haviam soldados armados pendurados sob aquelas coisas brancas e redondas. Então, naquele momento, enfiando-se entre os objetos brancos flutuantes, uma grande sombra negra desceu ao chão.
Nadando pelo ar como um peixe na água, uma criatura como uma enorme serpente negra do mar pousou na frente de Julius.
Tinha longos bigodes e chifres na cabeça. Ele segurava algo parecido com uma gôndola em suas patas.
Vendo que era diferente de um wyvern ou dragão, Julius e Jirukoma temeram que fosse um novo monstro atacando e prepararam suas armas. Quando o fizeram, o monstro encolheu diante de seus olhos.
Por fim, antes de encolher completamente, uma figura saltou de suas costas.
Aquela pessoa com uniforme militar com capa preta virou-se para eles e disse:
— Já faz um tempo, Jirukoma. Você também… Sir Julius.
Julius ficou ainda mais surpreso.
— Sir… Souma, huh.
Este foi o primeiro reencontro entre o atual Rei da Friedônia, Souma Kazuya e o ex príncipe herdeiro da Amidônia, Julius Amidônia, após um ano inteiro.
Tradução: VPHz
Revisão: Pride
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