Em meio ao 8º mês do ano 1547 do Calendário Continental
Nesse dia claro, estava voando pelo céu montado nas costas de Naden enquanto ela estava em sua forma de ryuu.
A altura me assustou no começo, mas depois de ser enviado para fazer a previsão do tempo algumas vezes, me acostumei completamente. Até mesmo consigo dormir a uma altura de 1000 metros agora.
Se bem que Naden fica brava se eu adormeço…
— Tudo bem aí, Alteza? — perguntou Aisha.
— Não é nada. — respondi.
Naquele dia em específico, Aisha estava sentada logo atrás de mim; suas mãos enroladas firmemente em torno da minha cintura. Ela estava comigo por conta de nosso destino final ser sua terra natal, a Floresta Protegida por Deus.
— Ainda assim, por que estamos indo para a Floresta assim do nada? — questionou Aisha.
— Porque, apesar de estarmos noivos, ainda não prestei meus respeitos a Sir Wodan. Temos nos comunicado por cartas, mas tenho tentado arranjar algum tempo para poder encontrá-lo.
— Estamos aqui só para tratar do casamento?!
— Uhum. Já conversei com os pais de Liscia e também com Excel, já que ela era guardiã de Juna. Quanto a Naden, Tiamat era como sua mãe, então as formalidades chegaram até ela também. Já Roroa… Pretendo visitar seu túmulo em breve.
Próximo à Van, a antiga capital do Principado, havia um cemitério para a família real de Amidônia. Ali jaziam os pais de Roroa. Não consigo imaginar Gaius abençoando nosso casamento, mas acredito que a mãe de Roroa, que era uma mulher amável segundo Sir Gouran, teria aceitado.
— Então, nesse caso, estamos visitando a casa da família de Aisha, Huh? — indagou Naden.
— Urgh… se era sobre isso, podia ter me contado. Não estou mentalmente preparada… — Aisha pressionou a testa contra minhas costas.
Deixando uma confusa Aisha de lado por enquanto, conversei com minha outra noiva, que gentilmente nos deu uma carona.
— Desculpe, Naden. Fiz com que Aisha montasse em você novamente.
Acariciei suas costas.
Ela voltou sua cabeça de ryuu em nossa direção e respondeu:
— Realmente não me importo se for a Aisha. — usando sua telepatia. — Ela já montou em mim antes. Além disso, “a parceira do meu parceiro também é minha parceira”.
— Sim, você já disse algo assim antes.
Aisha, que parecia ter parado de se contorcer de vergonha, inclinou sua cabeça para o lado.
— Hm… Se Naden e eu somos parceiras, qual de nós é o marido?
Que bobagem era essa que Aisha estava perguntando assim do nada?… foi isso que pensei, mas Naden ponderou sobre a questão com uma quantia surpreendente de seriedade.
— Hmm, não seria você, Aisha? Você é forte, no fim das contas.
— Você também é forte na sua forma de ryuu.
— Mas comparada à Juna, você faz mais o tipo de marido, não concorda?
— Me comparar com Juna não é justo. Ela é mais mulher que qualquer uma.
— Nessa forma, meus peitos são maiores que os dela… calma, dizer isso só me deixa triste. Mas quando você reflete, a Liscia não seria quem é mais parecida com um marido?
— Lady Liscia tem coragem. — concordou Aisha. — De certa forma, ela tem mais potencial de marido que Vossa Majestade.
— Vocês só estão falando o que bem entendem… — ouvir elas falarem fez meus ombros desabarem. Mas era bem verdade. Não tinha metade da coragem que Liscia tinha. — No fim, vocês duas ainda preferem ser as esposas, não é?
— Bem, é claro.
— Falando por mim mesmo, eu preciso de vocês duas como esposas.
— Alteza! — Aisha gritou.
— Souma!
As duas sorriram amplamente.
Me senti um pouco envergonhado por ter dito aquilo.
— É vergonhoso ter meu superior flertando bem do meu lado, sabia? — reclamou Hal.
Ele estava voando ao nosso lado montado em Ruby, que estava em sua forma de dragão vermelho. O sujeito nos encarou com uma cara de quem foi forçado a comer caramelo.
Sua montaria também encarava Naden com seus olhos dourados.
— Você também Naden. — Ruby disse com raiva, desviando o olhar com desgosto. — Se você é um dragão da Cordilheira do Dragão Estelar, se mantenha focada enquanto seu cavaleiro monta você. Essa é a dignidade esperada da companheira de um cavaleiro.
— Souma não é um cavaleiro. É um rei, então não conta.
— Não venha com essa! Isso faz dele ainda mais que um cavaleiro!
— Oh, pelo amor, cale a boca!
Aquelas duas começaram a discutir enquanto ainda estávamos nas alturas.
Embora elas não fossem tão hostis quanto costumavam ser na primeira vez que as encontrei, nenhuma delas abandonou suas personalidades teimosas, então brigas assim eram ocorrências diárias.
Tendo dito, faziam isso como amigas.
Como minha noiva, a posição de Naden era maior que a de Ruby, mas o fato de que ainda podiam brigar em termos iguais demonstrava que nenhuma das duas deixou isso ficar entre elas. No fim, ainda eram as mesmas pessoas que conheci em sua terra natal.
E então, Naden disse:
— Nyahh! — E cerrou os dentes. — Você podia parar de se preocupar comigo e aproveitar o tempo com seu próprio cavaleiro, não acha? Aquela maga com orelhas de raposa não está aqui hoje, então vocês podem ser tão assanhados quanto quiserem.
— O-O que está dizendo?! Eu não iria…
— Oh, o que é isso? Você está toda vermelha, Ruby? — provocou Naden.
— Essa é minha cor normal!
Depois disso, Naden e Ruby continuaram gritando e se divertindo. Para onde foi aquela dignidade esperada da companheira de um cavaleiro…? Bem, desde que estivessem brigando amigavelmente, eu poderia deixar passar.
— Mas não tinha necessidade de me trazer, tinha? — perguntou Hal. — Se Senhora Aisha e Senhora Naden estão com você, já não é o bastante para protegê-lo?
Isso era verdade; enquanto tivesse comigo a maior guerreira do reino, Aisha, e Naden, que poderia derrubar 10 wyverns de uma vez só em sua forma ryuu, não havia razão para trazer Hal com intuito de me proteger.
Contudo, havia um bom motivo para trazê-lo junto.
— Quando enviei uma carta a Sir Wodan dizendo que “iria visitá-lo em breve”, ele me pediu que o trouxesse conosco. — expliquei. — Parece que Sir Sur estava a fim de vê-lo.
— Por Sir Sur, você se refere a… ohh, aquele elfo negro que nos forneceu reforços antes, huh? — Hal disse, batendo as mãos.
Na época em que o Exército Proibido e o Exército se encararam próximos a Randel, uma unidade de elfos negros arqueiros avançou em seu socorro; uma forma de retribuir a ajuda que receberam após o desastre do deslizamento de terra. Aquele que liderou os reforços foi Sir Sur. Nossas tropas estavam reduzidas, então ainda era muito grato por sua ajuda.
— Mas por que ele quer me encontrar? — questionou Hal. — Ele já pagou seus débitos, não pagou?
— Oh, bem, parece que quem quer realmente te encontrar é a filha de Sur. Ao que parece, ela é uma das pessoas que salvou enquanto procurávamos sobreviventes.
— … É, eu não me lembro dela. Salvamos um monte de gente naquele dia, no fim das contas.
— Mesmo que tenha se esquecido dela, ela não se esqueceu de você. Você é aquele que salvou a vida dela, afinal.
— Apenas porque era essa a missão… — Hal coçou a cabeça.
Ele não gostava de aceitar muitos elogios. Pode perder a cabeça vez ou outra, mas essa personalidade direta era a cara dele, e isso me deixou uma boa impressão.
— Pelo menos deixe que ela o agradeça. — pedi. — E agora… Vamos lá, Naden, Ruby, não podem ficar brigando pra sempre. Vamos nos apressar rumo a Floresta Protegida por Deus. Sir Wodan está esperando por nós.
— Oh! Sim. Entendido.
— E-Entendido.
Com as duas garotas dragão tendo recobrado os sentidos e recuperado o ritmo, nos dirigimos a Floresta Protegida por Deus.
As folhas esverdeadas da Floresta Protegida por Deus reluziam sob o sol do verão.
Quando fornecemos suporte antes, estacionamos o trem rinoceronte fora e prosseguimos para a vila a pé, mas estávamos chegando pelo ar dessa vez, então poderíamos pousar diretamente na vila dos elfos negros.
— E-Ele realmente veio em um dragão! — exclamou um elfo.
— Esse é bem graúdo…
Não estavam desconfiados, já que foram notificados de antemão, mas os curiosos elfos negros assistiam o ryuu e o dragão aterrissando de longe.
Quando tocamos o solo e Naden e Ruby assumiram a forma humana, as pessoas antes afastadas agora avançavam como se uma barragem tivesse acabado de se romper. Cercados por elfos negros de todas as idades, desde crianças a adultos, acabamos sendo espremidos.
— Quê?! Essas garotas são dragões?!
— Wowwwie! Ei, se transforme outra vez!
— Oh, Rei Souma, que bom receber sua visita.
— Você foi de grande ajuda da última vez.
— Ei, Lady Aisha, que bom vê-la de volta.
— Lady Aisha, parabéns pelo noivado com Vossa Majestade.
— Essa garota ruiva é parceira de Sir Hal? Ela é lindíssima.
— Quem é essa de cabelo preto? Huh? Ela não é uma criança?
Foi mais ou menos assim, com perguntas sendo feitas repetidamente e tornando impossível determinar quem estava falando. Finalmente acabou depois de alguém bater palmas.
Olhando na direção do som, o pai de Aisha, Sir Wodan, nos encarava com um sorriso sem jeito.
— Pessoal. Vossa Majestade e sua comitiva acabaram de chegar. É rude rodeá-los e questioná-los desse jeito.
Quando Wodan, sutilmente, os repreendeu, os elfos negros recuaram parecendo um pouco embaraçados.
Agora que a multidão nos libertou, podíamos finalmente recuperar o fôlego.
— Você é um salva-vidas, Sir Wodan. — disse, agradecido.
— Não, não. Os aldeões estavam sendo rudes. Entretanto, isso é porque ficaram sabendo que você, que veio ajudar nossa vila, estava vindo visitar. Todos ficaram animados para recebê-lo. Perdoe-os, por favor.
— Não se preocupe sobre isso. Sou grato pelas boas-vindas.
Troquei um firme aperto de mãos com Wodan. Naquele momento, todos os elfos negros começaram a aplaudir…
Não sei, ser tão bem recebido meio que me deixava envergonhado.
— Agora, não fiquemos conversando aqui em pé para sempre. — anunciou Sir Wodan, indicando a direção que queria que seguíssemos. — Por favor, venha à minha casa.
— Chefe. — Uma mão se ergueu em meio a multidão de elfos negros.
Aquele com a mão levantada era Sir Sur, o mesmo que liderou os reforços que aderiram a batalha contra o Exército.
— Gostaria de convidar Sir Halbert para minha própria casa. — disse ele. — Estaria tudo bem?
— Hmm, o que me diz, Rei Souma? — Sir Wodan perguntou.
Sorri e acenei.
— Não me importo. Foi por isso que o trouxe em primeiro lugar.
— Obrigado. — agradeceu Sur. — Agora, Sir Halbert, venha até minha casa, por favor.
— Tudo bem?
Sir Sur arrastou Hal pelo braço. Ruby logo foi atrás.
Separados de Hal, Aisha, Naden e eu fomos para a morada de Sir Wodan.
Olhando para a vila ao longo do caminho, quase não encontrei sinais do desastre que aconteceu anteriormente. Seus lares estavam em meio a uma floresta, e muitos deles eram simples, então não deve ter demorado para que os reconstruíssem.
— Você fez grandes avanços rumo à reconstrução. — comentei.
— Foi graças a sua generosa provisão de materiais. — respondeu Sir Wodan. — Você tem minha sincera gratidão.
— Também devo agradecê-lo. Obrigado por enviar reforços durante a guerra recente.
— Não foi nada. Há vezes em que precisamos ajudar um ao outro.
Conforme andávamos, chegamos a casa de Wodan.
Adentrando a sala de estar, Wodan me ofereceu a cadeira do chefe da casa à mesa, mas firmemente recusei.
— Não vim aqui hoje como um rei, mas apenas como um homem vindo pedir a mão de Aisha. Por favor, sente-se na cadeira do chefe, Sir Wodan.
— … Entendo.
Wodan acomodou-se na cadeira do chefe, e me sentei de frente a ele. Aisha estava ao meu lado, e Naden estava esperando um pouco atrás.
Curvei minha cabeça.
— Mesmo que meu noivado com Aisha já tenha sido acordado, devo me desculpar por ter atrasado minha vinda para prestar a você, pai dela, meus respeitos. Por favor, dê-me a mão de sua filha… deixe Aisha ser minha esposa.
— P-Por favor, Pai. — Aisha curvou a cabeça apressadamente.
Quando olhei, Naden também curvou sua cabeça conosco.
Sir Wodan suspirou de leve.
— Ergam as cabeças. — disse.
Quando levantei a cabeça, Sir Wodan tentou forçar um sorriso, mas falhou. Era uma expressão desconfortável.
— Tenho certeza de que foi Aisha quem pediu pelo casamento, não foi? Não há razão para baixar a cabeça, Sir Souma. Isso é complicado para mim como pai, mas já que é o desejo de minha filha… Parece que terei de dar minha benção.
— Paaaaiiii…. — Aisha disse com lágrimas aos olhos; emocionada. Sir Wodan respondeu sorrindo, e suas feições voltaram ao normal logo depois, passando a me encarar nos olhos.
— Os elfos negros são uma raça que vive bastante. Aisha é mais jovem que você, e tenho certeza de que viverá mais. Quando chegar ao fim de sua vida natural, estará deixando Aisha para trás. Você entende isso?
— Sim.
A vida de um humano normal como eu, quando comparada aos longos anos vivido por raças como a de Naden ou Aisha, devia parecer bem curta. Ainda assim, ambas Aisha e Naden desejavam viver comigo.
Em prol de garantir que não se arrependeriam do tempo que passaram ao meu lado, jurei do fundo do coração que tentaria ao máximo ser um bom rei e um bom companheiro. Mesmo que chegasse a hora em que teríamos que nos separar.
Ainda assim, tinha a impressão de que Sir Wodan queria dizer algo um pouco diferente das minhas reflexões. Ele começou a falar, soando como se tivesse descoberto algum tipo de iluminação.
— Contudo, sendo tão longeva quanto nossas raças são, ainda é possível para nós viver vidas mais curtas que os humanos. Podemos morrer em guerras ou acidentes. Caso soframos com epidemias, podemos morrer facilmente. Minha própria esposa, mãe de Aisha, faleceu por conta de uma doença. Caso baixe a guarda porque ela viverá muito, Aisha pode morrer antes de você.
Não disse nada.
— Então, por favor, tome conta dela. Dê a ela uma nova família e construam memórias para que, quando chegar o dia, você possa partir antes dela. — Sir Wodan se curvou em silêncio.
O desejo de um pai sempre seria a felicidade de sua filha.
Logo eu também seria pai. Não tinha certeza se seria um garoto ou garota, mas ainda poderia chegar a minha vez de confiar minha crianças a alguém, tal como Sir Wodan fez.
Escolhi as palavras com cuidado e o respondi em tom calmo.
— Aisha é uma pessoa mais forte do que eu. Daqui em diante… Tenho certeza que ela me protegerá no campo de batalha.
Ele não disse nada.
— Sendo assim, acredito que protegerei o sorriso de Aisha de todo o restante. Então, um dia, ela poderá ter um sorriso no rosto quando me ver partir. E não se arrependerá de nosso tempo juntos.
— Alteza… — Aisha chorava e me puxou para perto.
Também pude escutar fungadas atrás de nós. Suas lágrimas devem ter acabado fazendo Naden chorar.
Sir Wodan se ergueu e caminhou em minha direção. Então, colocando as mãos sobre a minha e a de Aisha, disse com um sorriso:
— Sir Souma, conto com você para cuidar de Aisha.
— Sim, Pai, eu irei.
— Aisha. Seja feliz.
— Eu serei… Pai.
— Madame Naden, tenho certeza de que será esposa de Sir Souma também. Por favor, trate Aisha bem como um membro da mesma família.
— É claro que eu vou! Entendido!
Tendo dado nossas respostas, Sir Wodan riu com gosto e acenou em satisfação.
***
Enquanto isso, quase simultaneamente…
Tendo se separado de Souma e companhia, Halbert acabou sendo praticamente arrastado para dentro da casa de Sur.
Ele ia onde era puxado. Com a força de Halbert, que se encontrava entre as maiores do reino, seria fácil se livrar daquele aperto, mas ele não sentia nada além de boa-vontade por Sur, então não poderia tratar o homem de forma rude.
Ruby correu atrás daqueles dois.
Halbert virou a cabeça na direção dela e perguntou em um sussurro:
— E-Ei, Ruby, o que tá rolando aqui?!
— N-Não pergunte para mim. — Ela retrucou, também sussurrando. — Não consegue sair dessa?
— Seria uma coisa se ele estivesse hostil, mas me sinto mal em recusar o convite de alguém bem intencionado.
— Então só podemos esperar e ver aonde isso vai, certo?
Enquanto os dois conversavam, Sur se virou com um sorriso no rosto.
— Okay, chegamos. Bem-vindos à minha casa.
— Huh? — Os dois disseram em uníssono.
Quando perceberam, os dois tinham sido conduzidos a uma pequena casa com teto de palha. Estava claro que era a moradia de um fazendeiro, mas o telhado era estranhamente íngreme.
— Você tem uma casinha bem pontuda… Huh…
A observação de Halbert era mais ou menos precisa, então Sur gargalhou.
— Aqui na floresta, quando o inverno chega, temos uma boa acumulação de neve. Caso não tenhamos tetos assim para fazer com que a neve caia, vão colapsar.
— Vocês acumulam tanto assim? — indagou Hal.
— Sim. Por causa disso, não podemos caçar no inverno, e todos passam o tempo dentro de casa costurando ou fazendo a manutenção de suas armas. Apesar de que o último inverno foi diferente.
Sur apontou para uma pilha de lenha próxima às escadas.
— Porque fizemos lenha com as árvores que caíram no deslizamento, bem como daquelas que derrubamos periodicamente seguindo o conselho de Vossa Majestade. Fazíamos peças de arte tradicional, como estátuas, e elas começaram a ficar populares mundo afora, o que nos trouxe uma renda significativa. De vez em quando, comerciantes que recebem permissão tanto do rei quanto da Floresta Protegida por Deus vêm comprá-las.
— A mais popular delas era… Vejamos, eu acho que tinha uma por aqui… — disse Sur, começando a revirar a pilha de madeira.
Não demorou para que puxasse um longo e fino objeto da pilha.
— Ahh, aqui está. — Ele segurou o objeto para que Halbert e Ruby vissem. — É isto. Este é nosso item mais popular.
— Por isto, você quer dizer… Uma espada de madeira?
O que Sur empunhava era uma espada feita de madeira. O mais impressionante é que não era uma espada ortodoxa de duas lâminas usada no reino, mas uma moldada na katana, que era principalmente usada na União do Arquipélago do Dragão de Nove Cabeças. Além do que, havia algum tipo de símbolos gravados no punho.
— Vossa Majestade chamou isso de souvenir bakuto. — disse Sur.
— Oh… Claro que Souma estaria envolvido. — anunciou Halbert, balançando com a cabeça exasperado.
Quando Sur começou a falar sobre arte tradicional, mas disse que o item mais popular era a bakuto, ele teve aquela sensação. Se esse era o tipo de coisa sobre a qual ele não poderia dizer o ponto à primeira vista, tinha que ser coisa do Souma.
— Quem escreveu isso no cabo também foi ele?
— Sim. Ele disse que representa o nome dessa floresta na linguagem de seu mundo. — Sur apresentou-lhe os símbolos e explicou.
Halbert e Ruby não conseguiam lê-los, é claro, mas havia quatro kanji, 神 護 之 森, cravados ali.
Inicialmente, Souma considerou cravar o nome daquele lago de Hokkaido, já que ninguém poderia ler aquilo, de todo modo. Entretanto, quando imaginou os soldados treinando arduamente com uma daquelas espadas de madeira em mãos… Não, ele mesmo desistiu da ideia.
Sur ofereceu a bakuto para Halbert.
— Sir Hal, gostaria de ter uma?
Halbert encarou a proferida bakuto.
Ruby pensou: o que exatamente você está encarando com tanta seriedade? Mas… Eventualmente, Halbert a aceitou em silêncio.
— Huh?! Vai ficar com isso?! É só um graveto, não é?! — Ruby reagiu a atitude de Halbert com os olhos esbugalhados de surpresa.
— Eu não sei por quê! Não sei dizer, mas eu queria muito isso!
Sur acenou conforme Halbert tentava se explicar.
— Eu compreendo. Há algo que você, como homem, acha estranhamente excitante sobre isso.
— Tem razão! Se você ver algo assim, não tem como não tocar! Há algum tipo de mágica lançada sobre esses símbolos?
— Eu não sinto nenhum poder mágico. — afirmou Ruby, receosa. Dragões vermelhos eram sensíveis ao poder mágico.
Era mais provável que o que Halbert e Sur estavam sentindo era aquela mesma coisa que todos os garotos que compraram o souvenir bakuto em uma viagem de campo sentiram. Contudo, Halbert não sabia que isso existia, então sentia que havia sido enfeitiçado de alguma forma. Esse era o terror do souvenir bakuto.
Enquanto eles estavam discutindo sem preocupações, algo pulou para fora da casa de Sur.
Halbert, sendo um guerreiro por natureza, se aprontou para lutar no instante em que aconteceu, mas assim que percebeu que era uma criancinha, sua tensão se esvaiu…
E isso tinha sido um erro.
— Lorde Hal! — gritou a criança, antes de emendar um impacto energético no estômago dele.
— Guhhh! — Halbert deixou um gemido escapar.
—Hal?! — gritou Ruby.
Ele deu um sinal de mão para que ela soubesse que estava bem.
Aquela que agora estava abraçando Halbert era uma pequena elfa negra.
Talvez tivesse doze anos. Seu cabelo foi cortado curto, então tinha um rosto fofo. Sem se importar com a reação de Halbert, a garota esfregou a cara contra seu abdômen.
— Lorde Hal! Estive esperando para ver você!
— Erm… você é a filha de Sir Sur? — perguntou Hal, lembrando-se que Sur mencionou que ela queria vê-lo. A menina que deu um abraço voador tinha que ser ela.
A garota o soltou, curvando sua cabeça educadamente em seguida.
— Me desculpe por isso. Eu sou a Veiza, filha de Sur. — Ela ergueu o rosto e sorriu. — Não sei se lembra de mim, Lorde Hal, mas sou uma das que você salvou de ser soterrada por terra e sujeira. Muito obrigada por aquilo.
E curvou a cabeça novamente.
Halbert estava incerto.
— Não, não foi nada que você precise agradecer. Apenas segui as ordens de Souma…
— Ainda assim me deixou feliz. Nunca esquecerei o dia em que me salvou. Nem me esquecerei de você, Lorde Hal, tão pouco meu débito e gratidão.
— Não sei o que dizer… — Halbert estava sobrecarregado pelos agradecimentos persistentes da criança.
— Heh heh. Ela é uma garotinha bem educada, não concorda? — Ruby, que não tinha qualquer envolvimento com isso, comentou com Sur. — Ela é tão pequena, mas já é tão centrada.
— Me explique isso. Quando que a minha filha travessa ficou tão educada ass-Gwah!
— Sir Sur?!
Em meio à frase, Sur começou a ofegar de dor. Velza chutou um pedaço de madeira, e ele atingiu em cheio o queixo de Sur.
Mesmo com tudo isso, ela jamais deixou de sorrir.
Quando Halbert e Ruby viram Velza sorrir daquela maneira, lembraram-se de uma raivosa Kaede, e calafrios desceram por suas espinhas.
Como Halbert e Ruby possuíam ambos personalidades diretas, costumavam brigar, mas sem a coisa ficar feia. Agora, se dessem um passo fora da linha, sabiam que seriam repreendidos por uma Kaede com um sorriso estampado no rosto. O sorriso daquela menina era o mesmo que Kaede tinha naqueles vezes.
Velza ficou diante de Ruby.
— Hum… Poderia ser você a esposa de Lorde Hal?
Ruby ficou abismada por um momento, mas logo confirmou.
— Sim. Sou Ruby, a dragão. Formei um contrato de cavaleiro de dragão com Hal. Já que contratos entre dragões e cavaleiros fazem deles parceiros por toda vida, pode-se dizer que somos casados.
Quando Velza ouviu a resposta de Ruby, bateu palmas.
— Oh, nossa! Você é aquela dragão, Senhora Ruby? E pensar que ele se tornou um cavaleiro de dragão. Como esperado de Lorde Hal.
Tendo dito isso com um brilho inocente nos olhos, Velza pegou as mãos de Ruby.
— Quero me juntar às Forças de Defesa Nacional como Lorde Hal no futuro. Se possível, gostaria de me alistar à unidade de Lorde Hal. É um prazer conhecê-la, senhora.
— C-Claro…
Parecia que Ruby não estava plenamente confortável em ser chamada dessa forma.
Vendo Velza cimentar seu caminho até as boas graças de Ruby sem demora, Halbert sentiu que a situação fugiria de seu controle.
O-O que é isso…? O sentimento que seu acampamento foi completamente cercado sem você sequer notar…?
Enquanto Halbert ponderava, Sur, que se recuperou de sua dor, agarrou o ombro de Velza com um suspiro.
— É rude fazer nossos convidados aqui fora para sempre. O que acha de levar a conversa para dentro?
— Oh, nossa! Tem razão. Que descuido de minha parte. Estava tão feliz por ver Lorde Hal que me deixei levar sem perceber. Agora, venham Lorde Hal, Lady Ruby,
Velza pegou as mãos de Halbert e Ruby e lhes mostrou a casa.
Se outro alguém visse, pareceria uma irmãzinha sendo mimada pelos irmãos mais velhos. Halbert e Ruby também não se importavam em ter uma garotinha para adorá-los.
Ainda assim, atrás dos dois que estavam sendo guiados por Velza, Sur estava sorrindo com gosto.
Que os deuses me ajudem, ele pensou. Ela pode acabar seguindo os passos de sua mãe apaixonada… Se você não botá-la nas rédeas, vai ter uma jornada dura, Sir Hal.
Enquanto matutava, Sur acompanhou os três para dentro da casa.
***
Naquela tarde, depois de finalizar as formalidades com Sir Wondan, Aisha, Naden e eu fomos visitar o túmulo da mãe de Aisha.
Na Floresta Protegida por Deus, as pessoas eram enterradas nas bases das árvores. Seu costume era de retornar os corpos, que cresceram em meio às bênçãos da natureza, à floresta.
Escutamos o farfalhar da folhagem e o zumbir dos insetos.
Me ajoelhei diante da árvore onde a mãe de Aisha foi posta para descansar. Juntei minhas mãos à moda de oração japonesa. Assim como jurei para Sir Wodan, eu protegeria Aisha da tristeza usando o melhor de minhas habilidades.
Então, por favor, me ceda sua filha, orei.
Depois de ficar assim por um curto período de tempo, me levantei e encarei Aisha e Naden.
— Tem algo que preciso dizer pra vocês duas.
— O que seria, Majestade? — perguntou Aisha.
— Quê? Por que está tão formal?
As duas me encararam inexpressivas. Escolhi minhas palavras com cuidado.
— É sobre… Depois de partirmos.
As duas arregalaram os olhos em choque.
Isso era algo que as duas teriam de encarar eventualmente, afinal.
— Se baixar a guarda, mesmo um membro de uma raça longeva pode viver uma vida curta. — disse a elas. — O que Sir Wodan estava dizendo faz perfeito sentido. Contudo, o resultado mais provável é que Liscia, Juna, Roroa e eu acabemos deixando vocês duas para trás. Faço esse pedido com base no que pensei que isso significa.
Olhei diretamente em seus olhos perplexos e continuei.
— Por favor… Não fiquem solitárias. Estou feliz por tê-las conhecido. Não quero fazer desse momento de que se recordam com tristeza enquanto pensam: as coisas eram melhores antes.
Nenhuma das duas disse nada, apenas se calaram e ouviram minhas palavras.
— Quero que estejam felizes quando lembrarem. O ideal seria vocês serem capazes de se lembrar e pensar: estou feliz agora, mas também era feliz antes. Uma vez que não estejamos mais aqui, mantenham contato com nossas crianças e com outras pessoas longevas como Carla e Excel… E se acharem um bom companheiro, não me importo que se casem.
Elas baixaram os olhares e não disseram nada.
— Tenham certeza de sempre estarem conectadas a alguém, e não fiquem solitárias — concluí. — Jamais…
Aisha e Naden me abraçaram sem dizer uma palavra.
Elas podiam estar tanto aceitando ou rejeitando o que estava dizendo. Afinal, todos sabíamos muito bem o que os outros estavam sentindo.
Se elas estivessem em minha posição, poderiam ter pensado a mesma coisa. Se estivesse na posição delas, tenho certeza de que me sentiria do mesmo jeito. Não havia necessidade de resposta.
Se as duas se lembrassem de mim dizendo isso no futuro, poderia dar a elas o empurrão que precisam caso se sentissem perdidas quando o inevitável acontecesse. Isso era o melhor que poderia fazer por elas. Sua falta de resposta deve ter sido sua própria forma de serem compreensivas.
Acariciei as costas de ambas e, com uma risada, disse:
— Apesar de que jamais vou deixá-las ir enquanto estiver vivo. Estarei com vocês até que se cansem de ver minha cara.
— Okay. — respondeu Aisha. — Vamos ficar juntos tanto quanto pudermos.
— Também não vamos te deixar ir tão facilmente. — concordou Naden.
Lágrimas escorriam de seus olhos, mas ambas estavam sorrindo.
— Vamos ter certeza de ter filhos também. — adicionou Aisha. — Farei o meu melhor.
— Sim. — concordei. — Definitivamente.
— Uma não vai ser o bastante. — continuou Aisha. — Vou me assegurar que você vai dar duro, Alteza.
— C-Claro… farei o meu melhor.
Vendo Aisha ficar tão entusiasmada, fiquei um pouco desgastado.
Naden logo se juntou.
— Se tivermos um ryuu, teremos que deixá-lo na Cordilheira do Dragão Estelar, então eu preferiria um dragonato, se possível. Gostaria de dar a luz a pelo menos um ryuu para demonstrar minha gratidão a Lady Tiamat, então… Oh! Mas se for dragonato, seria um membro da raça das serpentes marinhas, certo? O que vamos fazer se a criança crescer para se tornar como Duquesa Walter?
Uma criança como Excel, huh…
— Vamos todos trabalhar juntos para educar nosso filho para que isso não aconteça. — anunciei fervorosamente.
— De fato. — concordou Aisha.
— Entendi!
Com isso, nós rimos enquanto continuávamos a nos abraçar.
Tradução: Black Lotus
Revisão: Pride
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