A União das Nações Orientais, situada ao norte da Friedônia, era uma agregação de Estados em pequeno e médio porte.
Esta terra já fora inundada por muitos destes estados, às vezes se aliando ou guerreando uns contra os outros. Era um ambiente desunido, no entanto, quando o domínio do Lorde Demônio se fez presente há mais de uma década e o perigo que o mesmo representava começou cair sob suas cabeças, os estados finalmente se uniram para formar a União das Nações Orientais.
Cada país dentro da União governava a si mesmo, porém, eram convocados para contribuírem com soldados de forma igualitária a suas próprias forças. Os países pequenos deveriam enviar um décimo de seus soldados; já os estados de médio porte, três décimos. Com esses combatentes, foi criada uma força que transcendeu as fronteiras entre as nações, as Forças Unidas dos Estados Orientais (ou Forças Unidas). Se outro país ou o Domínio do Lorde Demônio tentasse invadir uma das fronteiras da União, as Forças Unidas seriam enviadas imediatamente para combatê-los.
Na extremidade noroeste da União, na divisa entre o Domínio do Lorde Demônio e o Reino dos Cavaleiros Dragões Nothung, ficava o Reino de Lastania.
Esse país era uma pequena monarquia com uma população total beirando os vinte mil, sendo tão pequeno que parecia estar a um passo de ser soprado pelo vento. Situados nas proximidades do Reino dos Cavaleiros Dragões Nothung e do Domínio do Lorde Demônio, a população deveria estar aos prantos, tremendo de medo, esperando a qualquer momento as chamas da guerra chegarem em sua civilização. No entanto, a situação que se encontravam era diferente.
Era verdade, eles tinham algumas incertezas quando se tratava do domínio do Lorde Demônio, mas fazer fronteira com o Reino dos Cavaleiros Dragões era deveras reconfortante e embora Lastania pertencesse à União das Nações Orientais, possuíam uma aliança longínqua com o Reino dos Cavaleiros Dragões. Tendo firmado contratos com os dragões da Cordilheira do Dragão Estrela, e possuindo poderosos cavaleiros dragões, o Reino dos Cavaleiros Dragões Nothung era uma potência mais do que capaz de enfrentar o Império Gran Caos em uma guerra puramente defensiva. No entanto, seu poder não fora usado para a expansão de suas fronteiras, devido ao contrato com a Cordilheira do Dragão Estrela.
Os dragões se tornarão parceiros dos cavaleiros, correndo em uníssono pelo campo de batalha.
Os cavaleiros receberão os dragões como seus parceiros, e os ajudarão a produzir descendentes.
No entanto, se os cavaleiros usarem o poder dos dragões para satisfazer sua própria ganância, este contrato será anulado.
E assim dizia o contrato entre Nothung e a Cordilheira do Dragão Estrela.
Em outras palavras, a troca pelo poder dos dragões era levada por uma reprodução conjunta, sendo possível apenas pelo fato dos dragões serem criaturas capazes de adquirir a forma humana. Além disso, caso o poder desses dragões fossem utilizados de forma egoísta e seus cavaleiros tentassem invadir outros países através desse poder, o contrato seria rompido e o Reino dos Cavaleiros Dragões perderia seus laços com a Cordilheira do Dragão Estrela. Por esse motivo, o Reino dos Cavaleiros Dragões era um país que trabalhava com uma política “não agressiva”. Este território também não se envolveu na invasão do Domínio do Lorde Demônio no Império.
Ter um aliado por perto era um ingrediente que contribuía para a paz de espírito do Reino de Lastania. Mesmo se o Domínio do Lorde Demônio atacasse, seu território era pequeno, então os cavaleiros dragão seriam capazes de defender os mesmos enquanto defendiam a si próprios.
Pode ter sido por isso que, no Reino de Lastania, o Rei e muitas outras pessoas tinham personalidades despreocupadas.
O Reino dos Cavaleiros Dragões preferiu aderir essa postura a ter de compartilhar sua fronteira com governantes gananciosos. Da perspectiva da União das Nações Orientais, Lastania estava funcionando como uma janela diplomática para o Reino dos Cavaleiros Dragões, então essa abordagem foi permitida.
Agora, na mansão real em Lasta, a cidade central do Reino de Lastania, havia um homem se prostrando diante do Rei do país.
A propósito, era no feudo real onde morava o Rei deste país. Não havia castelos grandes em um território pequeno como este, então o Rei habitava uma residência impressionante dentro das muralhas da cidade.
Aquele que estava ajoelhado dentro da câmara de audiência naquela mansão real era um homem moreno que parecia ter cerca de trinta anos. Seu rosto estava pintado, mostrando-se um pouco semelhante a um nativo americano.
— Você diz que… deseja se juntar ao meu exército? — O bondoso rei dirigiu-se a ele do trono.
O homem respondeu, ainda prostrando-se diante do rei:
—Sim senhor. Sou Jirukoma. Vim liderando os guerreiros do povo nas fronteiras do norte.
— Senhor Jirukoma, por favor, levante a cabeça.
Quando Jirukoma ergueu os olhos, viu que o rei de Lastania tinha um rosto gentil. A rainha similarmente bondosa que estava ao seu lado e a princesa esbelta e encantadora sorriam.
O rei de Lastania olhou para Jirukoma com olhos gentis.
— Eu te darei as boas-vindas. Este é um país pequeno, portanto, temos poucos soldados. Tão poucos que o povo se vê obrigado a pegar armas em caso de invasão. Os homens do norte são famosos por sua bravura e mesmo que sua estadia seja apenas ate retornarem aos seus próprios países, ficaríamos honrados em receber sua ajuda.
— Sim senhor — disse Jirukoma, abaixando a cabeça novamente. — Se nos deixar ficar em suas terras, pretendo retribuir lutando em seu nome, enquanto esperamos o dia em que poderemos retornar para nossa terra natal.
Naquele dia, Jirukoma, que havia deixado sua posição como chefe dos refugiados no Reino da Friedônia para sua irmã Komain, havia chegado ao Reino de Lastania levando os refugiados que eram radicais e tinham um grande senso de lealdade para seu antigo país. Em resposta ao chamado do Reino de Lastania por tropas, partiram para aguardar o dia em que poderiam voltar para sua pátria.
O rei da Lastania se levantou e ficou ao lado de Jirukoma, colocando a mão em seu ombro.
— Sim. Este é um país com nada a oferecer, mas até seu desejo se concretizar, ficarei feliz se pudesse vê-lo como sua segunda casa. Amanhã vou lhe apresentar ao homem que será seu comandante. Podem descansar por hoje.
— Sim senhor. — Jirukoma se prostrou.
Da perspectiva de Jirukoma, o rei de Lastania não dava a sensação de estabilidade que Souma tinha, mas ele o achou gentil e magnânimo. No mínimo, não parecia o tipo de pessoa que abusaria dos refugiados ou os faria trabalhar até a morte.
Aliviado com esse fato, Jirukoma encerrou sua audiência com o Rei.
Finalizada a audiência, Jirukoma caminhava pelos corredores da mansão real quando viu alguém parado ao lado de um pilar. A pessoa, que usava um capuz branco que cobria seus olhos, estava encostada no pilar com os braços cruzados. Mesmo com o capuz e uma estatura esguia, era evidente que era um homem.
Quando Jirukoma tentou passar por ele, o homem falou:
— Você é aquele que conduziu os refugiados até aqui?
Jirukoma franziu a testa.
— Eu mesmo… Posso lhe ajudar?
O rei parecia um homem gentil, mas talvez seus súditos não fossem. Será que era um daqueles que não gostava da colaboração dos refugiados, então foi colocá-lo em seu lugar? Enquanto Jirukoma pensava nisso, o homem, provavelmente sentindo a cautela de Jirukoma, abandonou o tom interrogativo.
— Ah, me perdoe. Eu simplesmente queria perguntar algo. Ouvi dizer que seu povo veio de Elfrieden… ou é Friedônia agora? É isso mesmo?
— Sim… — disse Jirukoma. — É exatamente isso.
O homem mostrava sinceridade, então Jirukoma respondeu honestamente. Parecia que ele tinha algumas preocupações em relação ao Reino da Friedônia.
Quem era ele? Enquanto Jirukoma tinha suas suspeitas, o encapuzado soltou uma risada meio debochada.
— Mesmo assim, você também é estranho. Esse país, o Reino da Friedônia… Por mais que eu odeie admitir, agora estão estáveis, não estão? Você teve a sorte de escapar de lá, mas agora veio se alistar em um pequeno país que está na linha de frente. Não consigo entender isso.
— Você não fala como um homem daqui… —, disse Jirukoma.
— Sou um general visitante — disse o homem. — Posso falar o que penso justamente por não ser daqui.
Mesmo que Jirukoma pensasse ter encontrado uma pessoa desagradável, o homem respondeu sua pergunta.
— É verdade, o Rei Souma nos ofereceu um caminho em troca de desistir de voltar para casa por um tempo, poderíamos nos tornar parte do Reino da Friedônia — disse Jirukoma. — No entanto, nem todos os refugiados podiam aceitar isso. Havia aqueles que definitivamente não podiam desistir de retornar para casa. Se essas pessoas tivessem permanecido no reino, teriam atrapalhado aqueles que tentavam obter a paz tornando-se cidadãos do reino. É por isso que estou os levando de volta para o norte.
— Me esforço para entender por que você abandonaria uma garantia de paz, mas… nesse caso, por que escolheu este país? — perguntou o homem. — Este é um país pequeno. Se me perguntasse se o pagamento é bom, não diria que sim. Além disso, por mais gentil que o rei de Lastania seja, ele carece de ambição. Ele é um homem medíocre que me lembra o último rei de Elfrieden. Mesmo se você esperar neste país, o dia em que poderá atacar o Domínio do Lorde Demônio nunca chegará.
— Nenhum país tem o poder de invadir o Domínio do Lorde Demônio — respondeu Jirukoma. — Não importa onde fôssemos, seríamos usados apenas como defensores descartáveis. Sabendo disso, escolhemos o lugar mais próximo de nossa pátria.
— Pátria… Sua pátria, hein. — Ao ouvir aquela palavra, o homem de capuz cruzou os braços e suspirou. — Isso é… algo pelo que vale a pena abandonar a paz e lutar?
— Hm? O que você está perguntando? — indagou Jirukoma. — Você certamente tem uma pátria, não tem?
— Sim, eu tenho… Não, é o que eu acho, até certo ponto… sou alguém que foi descartado por sua terra natal… — disse o homem imparcialmente.
Não havia nenhuma gota de tristeza ali, mas Jirukoma podia sentir um pouco de confusão e hesitação. Então o homem começou a resmungar para si mesmo, como se estivesse perdido em pensamentos.
— Eu sei que lutamos pelo povo. Agora, por quê…? Por que a vontade do povo se afastou de nós? Não, não foi isso? Nossa guerra não era a vontade do povo? Mas estávamos perseguindo os objetivos de nossa pátria. Não… Talvez esses objetivos estivessem errados? O que as pessoas realmente queriam? O que realmente desejavam de meu pai e de mim? É porque eu não entendi que fomos… que eu fui derrotado…?
Jirukoma não fazia ideia sobre o que ele estava falando, mas pôde ver que o homem se envolveu em um processo de auto interrogatório, tentando encontrar uma resposta.
— Você parece bastante abalado. Não tem nenhuma confiança em si mesmo?
— Confiança…? A minha foi destruída há muito tempo — disse o homem gargalhando com escárnio. — Houve um tempo em que eu transbordava de confiança. No entanto, quando fui expulso da minha terra natal, essa confiança foi despedaçada. As coisas que pensei ter feito pelo meu país não foram por ele, e fui traído por aqueles que amava e pensava que também me amavam. Na época, fiquei ressentido com os traidores… e minha pátria. No entanto, quanto mais eu me questionava, mais descobria que não sabia o quanto pensava. As coisas que eu acreditava estarem certas eram realmente certas? Ao pensar nisso, descobri que não conseguia mais acreditar em mim mesmo. O que é um país? O que é um soberano? A vontade do soberano não é a vontade do Estado? O que é o povo? Qual é a sua vontade? O povo e sua vontade são duas coisas diferentes? Por que houve uma desconexão entre o trono e a vontade do povo?
Observando o homem se questionar repetidamente, Jirukoma notou se tratar de uma pessoa que persegue suas metas. Alguém que se perdeu e continuou a procurar seu caminho. No entanto, pelas palavras que ele falou, percebeu que não estava procurando caminho algum. Este homem estava pensando em “reis” e “povo”… Talvez já tenha tido uma posição elevada.
— Quem… é você? — perguntou Jirukoma.
O homem puxou o capuz.
— Eu sou Julius Amidônia. Embora esse sobrenome não tenha nenhum significado agora. Sou o estúpido que foi derrotado pelo Rei Souma da Friedônia e que teve seu país roubado por sua irmã mais nova.
Tradução: Bruno
Revisão: Alice
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