Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino

Como um Herói Realista Reconstruiu o Reino – Vol. 01 – Cap. 06.3 – Socorro

O esforço para o resgate era uma verdadeira batalha.

Todos se reuniram, fazendo tudo o que podiam. Chamavam pelos nomes dos desaparecidos, ouviam com atenção e, se houvesse qualquer resposta, moviam os escombros e terra cuidadosamente para outro lugar.

Não importava quem era soldado ou morador da aldeia, trabalharam todos juntos, movendo a terra e cortando as árvores caídas, em seguida retirando as pessoas presas por baixo de tudo. Kaede também estava usando magia para mover pedras enormes, enquanto as mulheres da aldeia alimentavam os desabrigados e cuidavam dos feridos.

Quanto a mim, eu havia me juntado a Hal e estávamos realizando operações de busca.

— Hal, debaixo daquela árvore grossa! Tem alguém respirando! — gritei.

— Hein?! Não ouço voz nenhuma — disse ele.

— Bem, mas tem! Apenas cave!

Hal tinha uma expressão duvidosa no rosto, mas quando cavou onde eu disse para cavar, encontrou a mão de uma garota.

— Sério…? Só espera, nós em breve te deixaremos em segurança!

Hal moveu a terra para o lado, puxando a garota elfa negra para fora.

Ela já era morena, então era difícil dizer, mas sua pele parecia estar em péssimo estado. Depois de ficar soterrada pela terra úmida por tanto tempo, já era de se esperar.

Era bom que ainda havia o calor do verão. Se já fosse pleno outono, ela poderia ter morrido de frio enquanto continuava soterrada.

Quando voltei com um cobertor, Hal estava segurando a garota e dando tapinhas nas suas costas.

— Você fez bem. Agora vai ficar tudo bem.

— Wah… Wahhhhhhhhhh…!

— Está tudo bem! Agora você está em segurança! — Hal desesperadamente tentava acalmar a garota que não parava de chorar.

Se me perguntassem, diria que homens são inúteis em momentos como este. Hal e eu estávamos perdidos a respeito do que fazer, só repetindo “Está tudo bem” o tempo todo.

Enrolei a garota em um cobertor, esperando que ela se acalmasse, e então chamei um soldado do Exército Proibido que estava por perto.

— Leve essa garota para um lugar seguro.

— Sim senhor! Como ordenar! — disse o soldado.

Depois de a garota ser levada, Hal me disse:

— Estou surpreso por você saber que ela estava lá. Eu não conseguia ouvir som nenhum.

— Mesmo enquanto conversamos, estou fazendo buscas — falei.

— Você conhece algum tipo de feitiço de busca? — perguntou ele.

— Não exatamente… É isso que estou usando. — Quando estendi a palma da mão para Hal, uma coisinha saiu do chão e saltou nela.

Hal olhou para aquilo, piscando.

— Isso é… um rato?

— Um de madeira, sim.

Era um rato talhado em madeira, com cerca de 10 cm de comprimento. Eu estava o manipulando com minha habilidade de Poltergeists Vivos para procurar por sobreviventes no meio dos escombros. Minha habilidade era capaz de operar a longas distâncias caso estivesse usando algum boneco, mas parecia que eles só precisavam ter a forma de uma criatura viva, não necessariamente de uma humanoide. Enquanto eu mostrava este modelo para Hal, havia outros quatro ratos de madeira movendo-se quase como ratos de verdade e procurando por aqueles que ainda precisavam de resgate.

— É uma maravilha que você tenha algo assim — disse ele.

— Eu os encontrei em uma loja enquanto estava no meu encontro com Liscia — falei. — Achei que poderia usá-los para alguma coisa, então coloquei na bolsa de rodinhas com mais alguns outros itens de autodefesa.

A propósito, aquela bolsa também tinha dois bonecos Musashibo que eu estava usando para patrulhar a área. Mesmo em lugares onde o deslizamento de terra danificou as estradas, aqueles pequeninos poderiam ficar pulando sem problemas.

— Sua habilidade é mais incrível do que eu imaginei — disse ele.

— Sim. Sinto que é a primeira vez que tenho uso para isso fora das áreas administrativas… Urkh! — Eu me agachei e comecei a vomitar.

— Uau, o que é isso, do nada?! — perguntou Hal, parecendo preocupado. — E-ei, Souma.

— Blegh… — Vomitei, e então tossi violentamente.

— V-você está bem? Por que começou a vomitar do nada?

— F-foi mal… Enquanto procurava, um dos meus ratos de madeira… de repente encontrou um corpo muito danificado…

— Danificado…?

— Os globos oculares estavam…

— Não, pare! Não quero ouvir isso! — Hal desviou o olhar e tapou os ouvidos.

Eu olhei para a terra à nossa frente.

Quando os jornais fazem a cobertura de áreas de desastres, concentram-se nas tragédias vividas pelos afetados e esperanças dos sobreviventes. Entretanto, desta vez eu estava provando a coisa em primeira mão, e era um inferno ainda pior do que eu imaginava. Essa realidade era dura demais para a audiência em geral. Isso destruiria os seus corações.

Mesmo assim, eu não tinha tempo para pensar nisso.

— Hal! Encontrei duas pessoas precisando de resgate, estão na sombra de uma rocha 50 metros à nossa frente e à esquerda.

— Certo!

Por enquanto, só tenho que sufocar as minhas emoções.

Continuamos diligentemente fazendo nossos esforços de resgate. Conseguimos encontrar muitos elfos negros na terra e nos escombros.

Estavam todos feridos de uma forma ou de outra, e muitos tiveram ferimentos graves que não poderiam ser tratados sem muito cuidado, mesmo depois de serem resgatados. Muitas vezes, quando conseguimos desenterrá-los, já haviam partido.

No início, a proporção de vivos para mortos entre os resgatados estava dividida em meio a meio, mas agora estava resultando em mais mortos. Quando parei para pensar nisso, das quase cem pessoas afetadas que Wodan mencionou quando chegamos à aldeia, apenas dois décimos tinham morrido, então ficou claro que as coisas estavam piorando com o passar do tempo.

Todos que estavam procurando também começaram a demonstrar sinais de exaustão. Estavam descansando em turnos, mas já tinham passado três dias desde o desastre.

Isso era difícil para os elfos negros, é claro, mas para os soldados que percorreram um longo caminho e passaram o tempo todo procurando também era. Eles já haviam desenterrado um bom número de pessoas que precisavam de resgate (algumas vivas, outras não).

Achei melhor contatar Wodan para confirmar quantas pessoas continuavam desaparecidas. Se pudéssemos reduzir o número de vítimas, poderíamos concentrar nossa força de trabalho em vasculhar a área onde pensávamos que estariam.

Enquanto eu pensava nisso…

— Ó Deus-fera! Por que deixou isso acontecer?!

Ouvi um grito desesperado…

Quando olhei, vi um jovem (?) elfo negro que se parecia com Wodan, gemendo ao bater com os punhos e a cabeça no chão.

Aisha havia retornado da evacuação das mulheres e crianças, então perguntei o que estava acontecendo.

— Aisha, quem é aquele?

— Aquele é… meu tio, Robthor Udgard, ele é o irmão mais novo do meu pai.

— Pela maneira como ele está chorando e lamentando, acho que isso significa…

— Sim — confirmou ela. — Sua esposa e a criança, em outras palavras, minha tia e a sua filha, ainda não foram encontradas.

— Isso deve ser… difícil. Você está bem, Aisha?

— Bem, sabe… Se meu pai é o chefe dos liberais, então meu tio é o chefe dos conservadores. Nunca tive muito contato com eles… Sua filha ainda era jovem e bonita, e me dói ver isso acontecer com ela…

— Entendo…

Estávamos bem além do prazo de 72 horas. Se ela ainda não tinha sido encontrada, então…

Então, Robthor olhou em nossa direção. Quando nos viu, ele se aproximou aos tropeços.

— Rei… Ó, rei… Por quê?

Robthor me agarrou pela gola, fazendo Aisha gritar com ele, mas fiz sinal para que ela se afastasse. Em vez de agarrá-la com força e tentar me levantar, ele estava apenas segurando, como se tentasse apenas se apoiar. Se eu simplesmente o afastasse, ele provavelmente cairia.

— Ó, rei… Tenho feito tudo o que posso para proteger a floresta. Então, por que minha família foi tomada…?

Fiquei sem palavras. Olhei para Aisha.

— Meu tio se opôs ao desbaste periódico — disse ela. — Ele disse que era impensável que os elfos negros, como protetores da floresta, cortassem árvores sem necessidade. O lugar que desabou foi aquele no qual não pudemos fazer o desbaste graças às objeções do meu tio — explicou ela.

Isso é… Não sei nem o que dizer…

— Ó, rei! Diga-me o porquê! Por que a floresta que protegi destruiria a minha família? Se eu tivesse derrubado as árvores com Wodan e o seu bando, minha família teria sido poupada?!

— Não há… como saber isso — falei.

— Não! — uivou ele.

— É verdade que se fizer os desbastes periódicos, cuidar da vegetação rasteira e aumentar a capacidade de retenção de água do terreno, é possível criar condições que reduzem a probabilidade de um deslizamento. Entretanto, esse é o motivo menos provável. Em um caso como este, em que a causa foi uma chuva de longo período… Isso poderia ter acontecido em qualquer lugar.

— Não… Então você está dizendo que foi só azar… — murmurou ele.

— Em termos da localização em que o deslizamento aconteceu, sim. Entretanto, a ocorrência do desbaste periódico resulta em constante trabalho em andamento na floresta. Os trabalhadores podem ouvir ruídos estranhos, ver a floresta parecendo se mover e perceber outros sinais de que um deslizamento está para ocorrer. Se eles perceberem, existem coisas que podem ser feitas. As pessoas poderiam ser evacuadas.

Também era dito que esta era uma das vantagens em fazer terraceamento1Terraceamento, também chamado cultivo em terraços ou cultivo em socalcos, é uma técnica agrícola e de conservação do solo empregada em terrenos muito inclinados, permitindo o seu cultivo e, simultaneamente, o controle da erosão hídrica. Baseia-se na criação de terraços através do parcelamento de rampas niveladas. nos campos de arroz.

Qualquer um pensaria que cortar as árvores para abrir espaço para os arrozais tornaria os deslizamentos de terra mais prováveis, mas, na verdade, isso reduz as chances de deslizamentos que resultam em mortes. Por as pessoas terem que ir o tempo todo para os campos, elas logo notam os sinais de aviso, o que torna mais fácil de reagir a tempo. A melhor contramedida para deslizamentos de terra é vigiar a floresta durante o tempo todo. Os elfos não tinham os mesmos sistemas de detecção de fluxo de detritos que o Japão moderno, então isso tornava a vigilância das pessoas ainda mais importante.

— Protegi a floresta durante todo esse tempo… errei ao fazer isso? — gemeu ele.

— Sua crença de que você estava protegendo a floresta estava errada — falei. — A natureza não é tão frágil para precisar de pessoas para protegê-la.

Aisha já havia me dito que as árvores da Floresta Protegida por Deus tinham vida longa. Por isso não perceberam que o lugar havia se transformado em uma floresta broto de feijão e que o solo estava ficando pobre. Mesmo que tenham simplesmente tido sorte para não acontecer nada, eles se convenceram de que estavam protegendo a floresta.

— Se destruir a floresta é egoísmo do homem, então tentar protegê-la também é — falei. — A natureza deve passar por ciclos de vida e morte, mas estamos tentando mantê-la em um estado que nos seja conveniente. Tudo o que as pessoas podem fazer é gerenciar as coisas por meio dos desbastes periódicos, mantendo a floresta em um estado no qual possam coexistir com ela. Tentando o possível para não despertá-la do seu torpor.

Ele parecia sem palavras.

Naquele momento, um dos meus ratos de madeira encontrou algo.

— Ali! Encontrei alguém com uma criança! — gritei.

— O-onde?! — gaguejou ele.

— Espera… Estão em uma casa que desabou à frente e à esquerda, a dois metros do cume da montanha!

Corremos para o local, movendo a areia e os escombros para o lado. Quando fizemos isso, encontramos uma garota e uma mulher que presumi ser a sua mãe em um vão entre as madeiras caídas. A mãe estava segurando sua filha com força, tentando protegê-la. Quando Robthor as viu, soltou um suspiro sem fôlego. Eram, com certeza, sua esposa e filha.

Quando as retiramos, a mulher já estava morta.

Assim que comecei a pensar que a esperança estava toda perdida… Aisha ergueu a voz.

— Majestade! A criança ainda está respirando!

— Leve-a para a equipe de socorro, agora! — gritei. — Não deixe que ela morra!

— Entendido!

Depois de embrulhar a criança com um cobertor e ver Aisha partindo com ela, olhei para Robthor, que chorava ao lado do corpo de sua esposa. Achei que talvez seria melhor deixá-lo em paz, mas o homem ainda tinha coisas que precisava proteger. Eu não poderia deixá-lo assim.

Colocando a mão no seu ombro, falei bem baixinho:

— Ela protegeu a filha de vocês até o fim.

— Sim…

— Se recomponha! Agora é a sua vez de fazer isso!

Ele parecia assustado.

— Sim… Sim…! — falando entre soluços, Robthor balançou a cabeça várias vezes.

Algum tempo depois, o segundo time de socorro que Liscia tinha chamado chegou. Com a busca por todas as pessoas desaparecidas concluída, a equipe avançada foi dispensada das suas funções.

Para o trabalho de reconstrução, o segundo time, mais numeroso e melhor equipado, cuidaria de tudo.

Depois de fazer uma última oração silenciosa por aqueles que se foram, a equipe avançada voltou à capital. Os membros exaustos e cobertos de lama da equipe avançada foram colocados nos vagões de contêineres iguais a atum congelado prestes a ser embarcado em um navio. Neste exato instante, Hal provavelmente estava descansando a cabeça no colo de Kaede e relaxando.

Eu também estava em um estado semelhante, viajando na carruagem com Liscia, que viera me buscar.

Tínhamos deixado Aisha na aldeia. Com sua terra natal naquele estado lamentável, não havia como ela ser capaz de se concentrar em seus deveres. Momentaneamente, falei para ela esperar na Floresta Protegida por Deus.

Quando me encostei à janela, quase cochilando…

— Desta vez não consegui fazer nada — disse Liscia com tristeza.

— Você foi chamar um grupo de socorro, não foi? — perguntei. — Todos trabalharam muito duro. Na verdade… se há alguém que não conseguiu fazer nada, fui eu.

— De modo algum. Ouvi dizer que você foi de grande ajuda — disse Liscia tentando me tranquilizar, mas balancei a cabeça.

— Eu sou o rei. Em tempos de crise, o dever do rei não é ficar dando ordens no campo. O dever dele é se preparar para uma crise antes que ela aconteça. Eu… não fiz o bastante.

— Isso não…

— Acho que o Exército Proibido trabalhou bem como uma unidade de socorro. Ainda assim, houveram muitos pontos em que falhei. Meios de comunicação, remessas de longa distância, acúmulo de suprimentos de socorro em cada área, equipes médicas ligadas aos grupos de socorro, psiquiatras para tratar de pacientes com estresse pós-traumático… Fiquei devendo em todas essas coisas. Por estar tão focado na crise alimentar e na questão dos três duques, fui negligente com os meus deveres.

Olhei para o meu reflexo na janela, coberto de lama e com uma expressão de cansaço.

Liscia estava olhando para mim com preocupação, mas eu fingi não notar.

 


 

Tradução: Taipan

 

Revisão: PcWolf

 


 

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