Bruxa Errante, a Jornada de Elaina

Bruxa Errante, a Jornada de Elaina – Vol. 4 – Cap. 06 – A Cidade Submersa

Uma única bruxa estava sentada em sua vassoura, ziguezagueando entre as brechas das árvores enquanto avançava pela floresta.

A luz do sol filtrada pela cobertura de árvores cintilava como um céu estrelado.

No entanto, assim como o calor das estrelas flutuando pelo céu noturno não alcança a terra, o interior da floresta estava tão escuro quanto a meia-noite. Muito pouco da luz que se derramava dos céus alcançava a bruxa sob os galhos. Todo o brilho estava reservado para o espaço acima das árvores.

Então, por esse motivo, mesmo sendo o comecinho da primavera, a bruxa estava com um pouco de frio e abraçou os próprios ombros enquanto seguia adiante.

Ela era jovem, vestida com um robe preto e um chapéu pontudo. Parecia estar até no final da adolescência. Seu cabelo era longo, não branco nem preto, mas de uma cor acinzentada, e flutuava suavemente enquanto seguia pela brisa. Seus olhos lápis-lazúli examinavam a floresta sombria.

A entrada além deste ponto é…

Neste lugar, sem sinais de outras pessoas, viu um vestígio remanescente da atividade humana.

Parou bem no meio do caminho para ler a placa em que costumava estar escrito ENTRADA PROIBIDA – mas as letras estavam borradas e a tabuleta cheinha de hera. Isso parecia há muito tempo ter perdido as suas funções.

A bruxa agiu como se nem tivesse visto a placa e avançou em sua vassoura. Ela teria continuado o seu caminho, mesmo se a placa ainda estivesse intacta.

— …

Tratava-se de uma bruxa podre que descaradamente ignoraria as regras e procuraria pelo perdão, não pela permissão, fingindo ignorância e dizendo algo como “Ah, sinto muito mesmo! Eu não sabia!”

Quem diabos poderia ela ser?

Isso mesmo. Euzinha.

— …

Eu não estava particularmente vadiando pela floresta por estar buscando algo como as coisas no lado extremo da floresta.

Só tinha visto uma placa semelhante à qual acabei de ver na entrada – uma que dizia A ENTRADA ALÉM DESTE PONTO É PROIBIDA. Fiquei intrigada porque estava caída no chão, e isso despertou o meu interesse, então fui floresta adentro.

Não existia nenhum bom motivo para a minha presença. Não era como se houvesse algo que eu sentisse que precisava ver ou coisa do tipo. E se não houvesse nada no lugar, poderia simplesmente voltar por onde entrei.

E assim continuei por um tempo, deslumbrada, olhando para a copa florestal e bocejando enquanto avançava.

Podia ver a luz brilhando pelas brechas das árvores.

Finalmente acabou? Foi uma longa viagem.

Com esses pensamentos ainda girando em minha mente, dirigi-me em direção à luz, mas…

— Você… Pare.

Assim que deixei a floresta, notei que cada pedacinho de solo que estava em minha visão estava coberto de espadas. Inúmeras espadas, todas imóveis e apontadas em minha direção.

— Hein…?

Reflexivamente, levantei as duas mãos. Ofereci a minha rendição enquanto ainda não fazia ideia do que estava acontecendo.

Diante dos meus olhos estava uma única garota, olhando para mim com olhos tão afiados quanto as próprias lâminas.

Um lindo cabelo negro pendia para fora do chapéu pontudo que usava em sua cabeça. Sua pele era bronzeada e seus olhos de uma cor azul-clara, assim como o oceano na primavera. Sua roupa era estranha. Tenho certeza de que ela estava usando um chapéu pontudo e um robe, mas, por baixo do robe, estava bem exposta: sua barriga e coxas estavam totalmente nuas. Se tivesse tirado o robe, nada impediria de dizer que estava só com as roupas de baixo.

Você não vai ficar doente se continuar se vestindo assim nesta época do ano?

— É você quem tem invadido o nosso território, correto?

— Não, não sou.

— Mentirosa. Posso sentir o cheiro das mentiras em você. Você exala o fedor da mentira.

— Sem chances. — Cheirei o meu robe, mas ele só estava com o agradável cheiro de roupa limpa.

— Por que você veio para este país? Veio nos atacar, não é?

— Ah, isto é um país?

Mesmo sem muralha, portão nem nada?

Com as duas mãos ainda levantadas, inclinei-me para o lado por um instante e olhei para além da garota.

— Bem…

Lá, vi uma cena muito estranha, mas maravilhosa, se desenrolando.

Uma cidade submersa em água.

Havia um mar azul profundo que parecia que sugaria qualquer um, espalhando-se a partir da borda da floresta. Os edifícios rompiam a calma superfície da água. Havia torres de todos os tamanhos que pareciam ter brotado das profundezas, bem como muitas residências menores que flutuavam pela superfície. Cresciam árvores tortas na parte rasa, suas raízes só meio submersas.

O lugar onde a garota estava, logo diante de mim, parecia ser o litoral. Observar a água cintilante suavemente lambendo suas pernas nuas e bronzeadas me trouxe de volta à realidade.

Ao seu lado, havia um barquinho balançando com as ondas, parecendo até se divertir com os tremores. Havia peixes dentro de uma rede no barco, era como se ela tivesse acabado de voltar de uma pescaria, e eles também estavam se debatendo.

De qualquer forma, parecia que eu havia chegado a uma cidade subaquática.

Mas como fui aparentemente objeto de algum tipo de estranho mal-entendido, disse:

— Não sou uma pessoa suspeita, sabia? Olhe para o meu broche. Sou uma bruxa. — Estendi o peito do meu robe, mostrando-o com orgulho para a garota.

— Uma bruxa? Nunca ouvi falar sobre isso. Você pode comer aquelas… coisas?

— …

Hein?

— Aquilo tem uma forma deliciosa…

— …

Ah, não adianta conversar com ela.

Rapidamente desisti da possibilidade de nos entendermos. Joguei a toalha, sem qualquer esperança de se comunicar.

— Você é suspeita. Te levarei comigo.

A garota, por fim, me puxou pelo braço, guiando-me para o barquinho e me levando para a cidade com ela. Mas, antes de partirmos, amarrou os meus braços com uma corda. Ficou bem frouxo.

Tive uma visão otimista.

Bom, suponho que assim que encontrarmos alguém com quem eu possa conversar, vai dar tudo certo.

Enquanto esses pensamentos corriam pela minha cabeça, o barquinho começou a deslizar pela água.

— Nngh…! Oof!

A propósito, a garota estava remando, seus braços tremendo enquanto impulsionava o barquinho para a frente.

Não poderia simplesmente usar magia…?

— Pops! Encontrei uma mulher suspeita!

Já tínhamos passado algum tempo à deriva na água.

A garota me levou para a torre mais alta, onde abriu uma porta estranhamente posicionada e gritou bem alto.

O interior era muito espaçoso, mas o adorável teto branco era baixo o suficiente para ser tocado com as mãos, talvez porque a estrutura não tivesse sido originalmente projetada para ser uma residência. O chão era feito com simples ripas de madeira. A aparência era bastante rústica, como se fosse deformar tudo caso pisasse com muita força.

— Huh…

No fundo, sentado em uma cadeira de madeira feita à mão, estava um senhor de aparência impetuosa, de pele marrom-escura.

— O que é isso? Outro ataque da cidade? — perguntou o senhor.

A propósito, ele estava quase nu. Como roupa, usava um único pedaço de tecido enrolado em volta dos quadris.

Você não está com frio? Seus músculos protegem o seu corpo do frio? Isso é possível?

A garota puxou o meu braço com muita força enquanto eu continuava ali, chocada.

— Aqui! Essa pessoa! Muito suspeita! Ela parece suspeitíssima!

— Na verdade, não sou tão suspeita.

Como se tal esclarecimento da minha parte não fizesse sentido nenhum, o homem impetuoso se levantou.

— Bem, por agora, só a jogue na prisão… Vou interrogá-la mais tarde. Primeiro o jantar.

O que há com essa resposta preguiçosa…?

— Certo! Entendido! Vou torturá-la!

Você quer dizer “interrogar”, certo?

No final, fui arrastada à mercê da garota excessivamente entusiasmada.

O interior da torre parecia bem espaçoso. No segundo andar havia uma enorme cela de prisão. A garota me jogou lá, dizendo apenas algo como: “Espere aí e fique quieta!” e voltou ao primeiro andar. A propósito, a cadeira na cela era igual todo o resto, feita de madeira.

— …

— …

Havia outra pessoa ali dentro. Parecia que também estava presa, assim como eu. Pude vê-la no canto da cela.

— Você também foi presa?

Era uma mulher adulta que parecia ter um espírito livre, mas refinado.

Sua idade parecia estar por volta dos vinte e poucos. Seu cabelo loiro macio estava preso em um único punhado na lateral da sua cabeça, e as pontas roçavam o seu ombro. Seus olhos eram de uma cor roxo-azulada, e também estavam emoldurados por óculos com aros finos de prata.

Ela estava usando roupas que me fizeram pensar no que diabos costumava fazer com o seu tempo – um vestido e um xale, igualzinho uma garota da cidade. Dentro de uma cela como esta, parecia terrivelmente deslocada.

— Olá. — Por enquanto, me curvei em saudação.

A mulher disse “olá” com um sorriso.

— Meu nome é Viola. Sou uma bela jovem arqueóloga em uma importante jornada.

— … — Bem, eu não sei se você deveria se chamar jovem…

— Ah, a coisa de “bela jovem arqueóloga” foi uma piada, oh hoh hoh! — Viola elegantemente levou a mão à boca. — Qual é o seu nome, Senhorita Bruxa?

— Ah, me chamo Elaina. Sou uma bruxa viajante.

— Ora, uma viajante fofa e com o nome fofo!

— O-Obrigada…

Sentei-me bem no centro da cela da prisão e, por algum motivo, Viola se levantou e sentou-se novamente ao meu lado.

— … — De repente, cara a cara, me senti um pouco desconfortável.

— Hm, qual diabos é o problema deste país? — perguntei enquanto tentava colocar um pouco de distância entre nós.

Viola voltou a rir.

— Este lugar se chama Cidade Submersa! — Ela voltou a diminuir a distância entre nós.

— Cidade Submersa, hein…? Nunca ouvi falar. — Me afastei, irritada, mas isso só serviu para ela continuar se aproximando.

— Isso porque só as pessoas que moram aqui a chamam assim. — Viola chegou muito mais perto. — Quanto à coisa sobre este lugar, sabe, é que a história daqui é bastante triste.

— Uhum… — Eu me afastei.

— Quer ouvir a respeito? — Ela se aproximou.

— Antes de começar, acho que você está um pouco perto demais.

— Ah, não me importo! Sou famosa por não ter senso de espaço desde quando era criança.

— Tem certeza de que não é famosa por atropelar os limites pessoais dos outros?

— Só quero chegar perto das garotas fofas, então não precisa se preocupar, tá?

— …

— Oh hoh hoh hoh hoh… — Ela preguiçosamente escovou o cabelo.

Um arrepio correu pela minha espinha.

— …! — Fiz de tudo para escapar para o canto da cela e criei uma parede entre nós usando a minha bagagem.

Senti que estava em perigo.

O que há com esta prisão? O interior da célula é mais perigoso do que o exterior! Não existem leis aqui! Estou com tanto medo. Estou aterrorizada. O que devo fazer? Preferia lançar alguns feitiços e escapar.

Eu estava tentando me livrar da corda que prendia as minhas mãos.

— Trouxe comida para vocês.

A garota com a pele bronzeada de antes apareceu, segurando um prato cheio de salada em cada mão. Já que estávamos em uma cidade na água, ingenuamente pensei que poderiam nos servir peixe ou frutos do mar.

Mas parecia que tudo que serviam aos criminosos era salada.

— Humph…! Você pode acabar definhando se comer só folhas! — Em um tom agressivo, a garota largou os pratos por um momento, se esforçando para abrir a cela e nos entregando a salada. — Sim, aqui está. — E ela foi embora de novo.

Ou era o que eu pensava. Ela voltou mais uma vez, entregando várias garrafas, e disse:

— Aqui, molho para salada — e dessa vez foi embora de verdade.

Sua boa educação se revelou.

— Aquela garota se chama Atolie. Ela parece ser uma das poucas magas deste país. E aparentemente é filha do patriarca. — disse Viola enquanto mastigava folhas.

— Patriarca?

Mastigando sua salada, Viola continuou.

— Havia um homem mais velho quase nu no andar de baixo, certo? Aquele homem é o chefe da tribo que vive nesta cidade.

— Entendo. — Balancei a cabeça. Parecia estranho para um patriarca.

— A propósito, a pequena Atolie é fofa, não é?

— Uh, huh… bem, sim…

— Antes, eu disse que era uma bela e jovem arqueóloga em uma jornada, mas a verdade é que sou só uma amadora. Estou tentando criar um manual de referência ilustrado de garotas bonitas.

— Com licença, não sei para onde essa conversa está rumando.

— Ah, pensando bem, há uma razão pela qual existem os restos de uma cidade submersa aqui.

— Isso está por todo o lugar.

— Arrá!

— …

Ah, não adianta tentar falar com ela.

Mas, de qualquer forma, eu estava reconhecidamente interessada em descobrir como essa cidade ficou em tal estado, então dei ouvidos a Viola.

— Ah, pensando bem…

Ela continuou.

A conversa seguiu mudando de novo e de novo, mas ela eventualmente me contou um pouco sobre a história da cidade.

Aconteceu algo quando Viola visitou a Capital Ancestral, Lolia, uma cidade comum, durante as suas viagens.

— Eu sou o rei deste país.

No terceiro dia de sua estadia por lá, foi convocada pelo rei.

— Ah, olá.

Ela parecia bem indiferente, mesmo lidando com a realeza.

— Ouvi dizer que você é uma arqueóloga viajante… Isso é verdade?

— Aham. Sou uma jovem e bela arqueóloga!

— …

— Ah, a parte da “jovem e bela” foi uma piada.

— É… é mesmo…? — O rei tossiu e pigarreou. — Bem, há algo que eu gostaria de lhe pedir.

— Quer que eu te faça companhia durante a noite? Receio que isso seja impossível.

— Não é isso.

— Sinto muito, é que não quero formar esse tipo de relacionamento com um homem…

— Eu disse que não é isso.

Exasperado, o rei se inclinou para frente de onde estava sentado em seu esplêndido trono e começou a falar de forma mais séria:

— A verdade é que nosso país vem sofrendo com a escassez de alimentos…

De acordo com a sua história, a população de seu país havia superado a sua capacidade de alimentar todo o seu povo. Haviam tentado importar alimentos de outros países, mas seus vizinhos pareciam estar em circunstâncias difíceis. Mesmo se tivessem conseguido fechar um acordo, seria apenas algo como uma gota no oceano.

O rei estava completamente perdido.

— Antes, a fim de obter alimentos para meu país, pensei que deveríamos desenvolver novas terras para nos abastecer.

— Entendo.

— Enviei o exército, fiz uma pesquisa pelas regiões próximas e descobri que há um lago no meio da floresta proibida. Nossos soldados rapidamente dedicaram todos os seus esforços à pesca, mas… parece que havia algum problema por ali.

De acordo com o rei, não tinham encontrado um lago qualquer, mas sim uma cidade submersa onde outras pessoas já viviam. Os residentes eram terrivelmente agressivos e eram implacáveis em seus ataques aos soldados do rei. Não havia como conseguirem sucesso na pescaria.

— Então — disse o rei —, gostaria que você fosse até a cidade do lago, a Cidade Submersa, e conversasse com aquelas pessoas. Queremos evitar violência desnecessária. Então, gostaríamos que você se comunicasse com os nativos do lago.

— …

— Suponho que esta não seja uma tarefa indesejável para você, já que será capaz de explorar uma terra bastante nova e não desenvolvida.

Resumindo, a tarefa nada mais era do que arriscar a vida se aventurando sozinha e desarmada em uma terra sem leis e convencer o inimigo a largar as armas. Era meio que uma missão de morte certa.

Existiria algum motivo para tomar frente em algo assim? Era uma missão tola. Não havia como aceitar.

Viola então balançou a cabeça.

— Se você for e fizer isso por nós, vou perdoar qualquer conduta indecente anterior e te perdoar por sair dando em cima de todas as garotas da cidade.

Ela então assentiu com entusiasmo.

Viola, no dia seguinte, chegou à Cidade Submersa.

Ela foi presa da mesma forma que eu e jogada na prisão, mas, depois disso, foi capaz de se encontrar cara a cara com o patriarca para defender a sua posição, e ele rapidamente a libertou.

Parecia que as pessoas da Cidade Submersa eram na verdade bastante simpáticas. Assim que entenderam que não se tratava de uma inimiga, o povo da tribo mudou sua atitude em relação a ela e a receberam calorosamente. O pai de Atolie ofereceu-lhe peixe cozido em casa, temperado com um pouquinho de sal no final, enquanto sua filha Atolie fazia a dança de boas-vindas ou coisa do tipo.

Viola, então, contou o motivo para a sua visita à Cidade Submersa. Ela sequer comeu o peixe. Devia estar encantada demais com a dança de Atolie.

O pai acenou com a cabeça.

— Hmm…

Atolie estufou as bochechas.

— Sem chances. Foram eles que começaram com as hostilidades. Foi por isso que os matamos.

Como assim? Que estranho. Antes de continuarmos com as discussões, acho que devo voltar a Lolia e descobrir por que as duas histórias são tão diferentes.

Parecia ser nisso que Viola estava pensando, mas a garota chamada Atolie era fofa demais, e Viola achava que, por ela ser tão fofa, não ligava muito para o que acontecia, então, por algum tempo, baniu todos os pensamentos sobre a sua missão para um cantinho afastado da sua mente.

No final, decidiu continuar na Cidade Submersa sob o pretexto de conduzir algumas pesquisas. Afinal, era uma arqueóloga bem curiosa a respeito da cidade.

O chefe ficou bastante satisfeito ao ouvi-la dizer isso.

— Que maravilha! Existem muitas coisas que gostaríamos de saber sobre a nossa cidade na água. Ela, sabe, afundou no lago muito, muito antes de qualquer um de nós nascer.

O chefe parecia estar tranquilo em não saber absolutamente nada sobre os restos da cidade a seus pés, mas não se importaria em saber um pouco sobre isso.

Atolie cooperou com a pesquisa, lançando um feitiço que impediria que ela se molhasse ao entrar na água e até mesmo mergulhando junto. Ela podia ter gostado de Viola.

Vários dias depois, desperdiçando o tempo livre entre os mergulhos com Atolie, Viola fez um movimento em cima de outra garota, depois foi mergulhar, depois brincou com outra garota, depois foi mergulhar, e brincou com outra garota, e outra, e outra. Eventualmente, chegou ao ponto em que conduzir sua pesquisa na Cidade Submersa era algo menor se comparado à sua ocupação principal, que era se divertir com as outras garotas. Esta mulher era uma verdadeira imprestável. Se fosse um homem, acho que já teria morrido pelo menos umas cem vezes.

Além disso, como não estava fazendo nada além de cometer essas mancadas, acabou caindo em completa desgraça. A garota começou a tratá-la com desprezo e tudo que lhe dava em todas as refeições era salada. Bem feito pra ela.

Apesar do seu comportamento, Atolie ainda acompanhava Viola em suas viagens de pesquisa subaquática.

Isso só serve para mostrar a qualidade da sua educação. Sua conversação, entretanto, é outro assunto.

De qualquer forma, depois de passar vários dias pesquisando, Viola chegou a uma única conclusão:

— Não restam dúvidas de que esta cidade foi submersa há vários séculos por mãos humanas. — Viola falou ao chefe. — Se eu fosse desenhar a estrutura da cidade subaquática em um diagrama simples, você veria que esta área originalmente possuía a forma de um vaso fundo. Em outras palavras, as pessoas cavaram o chão da floresta e construíram a cidade; era assim que o lugar costumava ser.

— Hmm… Então o que você está dizendo é que a água coletada no vale graças a uma enorme chuva ou coisa do tipo afundou a cidade?

Viola então balançou a cabeça.

— Não. Isso não seria suficiente para submergir a cidade. Deve ter sido feito com magia. Um mago conjurou uma enorme quantidade de água para afundar a cidade. Não sei o motivo pelo qual fizeram tal coisa, mas…

— Entendo… — O chefe estava acenando com a cabeça.

Viola rapidamente encerrou o seu relatório.

— Estarei partindo amanhã. Estou indo para a Capital Ancestral, Lolia. Há uma série de coisas que eu gostaria de confirmar. Posso passar mais uma noite aqui?

O chefe também fez um aceno de cabeça para este pedido.

— É claro. Atolie gostou muito de você. Tanto que eu gostaria que você ficasse para sempre.

Oh ho ho! — riu Viola. — Ora, ora…

Atrás de seu sorriso havia um turbilhão de emoções complicadas.

Porque durante suas muitas sessões de pesquisa subaquática com Atolie, tinha visto uma coisa que não era um bom presságio.

Havia algo escrito na parede de uma casa em particular dos tempos antigos: Este país afundou por causa de uma bruxa da Capital Ancestral, Lolia.

Viola achava que Atolie não tinha conseguido ler, mas ela entendeu claramente as palavras.

Era uma mensagem deixada para quem viesse depois.

Viola teve uma sensação desagradável desde o começo. Por que havia pessoas morando em uma região proibida? Aliás, por que a região foi proibida? Por que Lolia despachou uma forasteira como Viola? Por que apareceram discrepâncias entre o testemunho de Atolie e aquilo que o rei havia dito?

Era possível que, quando o rei deu a tarefa a Viola, já soubesse de tudo.

E era possível que Lolia tivesse algum motivo oculto para proibir as pessoas de entrar na floresta e encontrar a cidade.

Ela sentiu um vago ar de preocupação ao seu redor.

Essa foi a sua história.

Hein? Como é?

— Só um momento, por favor. Por que você foi presa?

Oh ho ho! — Viola riu. — Isso… Bem, estou aqui porque ontem à noite invadi o quarto de Atolie.

— …

Que traste, pensei comigo mesma.

Depois de passar um pouco mais de tempo na prisão, fomos finalmente convocadas pelo chefe e descemos as escadas.

Como ele era alguém que tinha a capacidade de entender o que eu dizia, contei-lhe as minhas circunstâncias.

Ele balançou a cabeça.

— Hmm… — Ele ordenou a Atolie: — Então não há problema. Solte-a.

Que fácil…

Esta tribo era tão misericordiosa quanto a corda que foi frouxamente enrolada em minhas mãos um momento atrás.

— Soldados de um país vizinho têm se intrometido violentamente em nosso território, sabe. Você pode entender as nossas suspeitas. Não tenho o costume de prender e interrogar as pessoas de forma imprudente — disse o chefe.

Ele parecia ser o único presente com a cabeça no lugar. Apesar da sua aparência.

— Atolie me contou a maior parte da sua conversa na prisão. Parece que você é uma maga viajante.

— Sim…

Lancei um olhar rápido em direção de Atolie, e ela logo desviou o rosto. Suponho que ela escutou o tempo todo, hein… Devia estar com muito tempo para desperdiçar…

— Tive que recolher seus pratos do almoço, e aí fiquei vigiando. Só ouvi em partes — explicou Atolie rapidamente.

— Permita-me chegar ao cerne da questão. Como você soube pelo que a arqueóloga lhe disse, nosso território está atualmente sob ataque de um país próximo. Se a situação persistir, existe uma possibilidade real de que sejamos destruídos. Aquele bando gosta de vir aqui nos ameaçar sem qualquer aviso. Não temos como saber quando podem lançar um ataque com força total.

Não importa quantos magos como Atolie estivessem presentes, o inimigo era uma nação moderna com um esmagador poderio militar. Não seriam capazes de bater de frente, mesmo com todos os seus esforços.

Isso era algo que o chefe parecia entender muito bem.

— Eu tenho um pedido a fazer a vocês duas. Quero que conduzam negociações para uma reconciliação com aquelas pessoas.

— Negociações para reconciliação, você diz…

O chefe balançou a cabeça para mim.

— Para ser franco, não sei nem como devemos resolver esse problema. Não consigo pensar em uma solução, não importa o quanto tente. O inimigo está atrás de comida. Mas os peixes também são um recurso precioso para todos nós. Não temos como simplesmente entregá-los. Entretanto, se recusarmos, o mais provável é que seremos destruídos… Não existem esperanças.

— E você quer confiar esse problema desesperador a nós duas.

— Mm…

Isso é um absurdo.

Era possível que recebêssemos melhores condições do outro país do que deste. Eu, entretanto, não achava que era a pessoa certa para uma tarefa tão importante, principalmente porque, se falhássemos, isso poderia significar que todas as pessoas desta cidade correriam risco de aniquilação.

O fardo era pesado demais para eu suportar.

— Entendo. — Viola estava ao meu lado, indiferente como sempre.

De sua parte, mantinha as aparências com um sorriso superficial, mas eu tinha certeza de que por dentro estava se sentindo da mesma forma que eu.

Afinal, ela conhecia a história da Capital Ancestral, Lolia, aquela que ainda não havia revelado ao chefe e Atolie.

Estava claro que as coisas começaram a ficar desesperadoras.

Ela não tinha nada mais a acrescentar, e, no máximo, provavelmente estaria em perigo se voltasse de mãos abanando para Lolia.

Não havia nada a fazer a não ser recusar.

— Posso confiar em você?

Em resposta à pergunta do chefe, Viola acenou com a cabeça como isso fosse algo natural…

— Deixe conosco!

Ela assentiu afirmativamente…

Como é que é…?

Indiferente ao meu choque, ela parecia tão desapaixonada quanto sempre.

— Entretanto, tenho um pedido.

Com uma voz insinuante, pediu apenas uma coisa ao chefe.

O barquinho balançava sob o céu azul.

Estava flutuando sobre a água azul-profunda, frágil o suficiente para parecer capaz de virar de repente caso alguém colocasse a mão em um lado e empurrasse com suficiente força.

Grandes pilares se erguiam da água, e vários barquinhos iguais estavam espalhados acima da Cidade Submersa, entre as casas flutuantes de todos os residentes.

— Então, o que planeja fazer com os peixes que pegar…?

Ao meu lado, a mulher jogou a linha atada a sua vara de pescar na água e me encarou, confusa.

— Hmm? O que eu vou fazer? Vou levá-los como presente, é claro!

— Então, o que planeja fazer com eles depois de levá-los como presente…?

— Fazê-los comer, não…?

— …

Supondo que não houvesse tanta falsidade no que ela disse, as pessoas de quem estava falando já haviam destruído este país uma vez. Que significado poderia haver em pagar tributo com peixes?

Isso não era pura extorsão?

— Há alguma razão para isso?

— Bem, mais ou menos. Deixe isso comigo, certo? — A mulher me entregou uma vara de pescar. Ela provavelmente estava tentando me dizer para parar de falar e me apressar a pegar alguns peixes.

— …

Não entendi nem o significado nem o propósito, mas me forcei a aceitar que ela devia ter algo em mente, e prendi uma isca no anzol e joguei minha linha na água.

A água formou ondas suaves e engoliu minha isca sem qualquer ondulação.

Em pouco tempo, o peixe apareceu para morder a linha de Viola. Quando sentiu o puxão, ela puxou a vara arqueada com força e deixou um único peixe, um dos grandes, cair no convés do barquinho.

O peixe era vermelho brilhante, parecia até queimado de sol.

— Este peixe parece ser equivalente a um alimento básico por aqui — disse Viola enquanto jogava o peixe em um balde. — Dizem que esses caras formam filas nas mesas de jantar de todas as casas do país. Ouvi dizer que são deliciosos, não importa o modo de preparo, sejam cozidos, grelhados, secos ou frescos.

Você “ouviu”?

— Você nunca comeu um?

— Estou sempre comendo salada.

Uma flauta estridente soou. Quando me virei para olhar naquela direção, lá estava Atolie em um barquinho pouco à nossa frente, suspendendo uma enorme rede no ar com magia, apontando o polegar para baixo e fazendo um aceno perto do peito.

— O que é que ela está fazendo…?

Isso é uma provocação? Um convite? Hmm?

Enquanto eu pensava, ela ergueu o dedo indicador e começou a agitá-lo bem diante do rosto. Não entendi o que a garota queria dizer.

— Aqueles são sinais de mão. Ela está dizendo que lá está ruim de peixe, então vamos embora — respondeu Viola enquanto começava a remar o barquinho.

Ao mesmo tempo, piscou para Atolie e mandou um beijinho.

— O que é que foi aquele sinal de mão de agora…?

— Significa “Eu te amo”!

— …

Em resposta, Atolie quase caiu da lateral de seu barco. Acho que devia ser um sinal de “O quê? Ew.

Após isso, as garotas deixaram que os sinais voassem entre elas.

Atolie colocou dois dedos na própria garganta, o que Viola se conteve a explicar como:

— Com aquele lá, está dizendo “Está com sede? Está tudo bem?” — e, em seguida, retornou o sinal de “Posso dormir com você esta noite?

Não entendo…

Atolie ficou com raiva e sinalizou: “Nojenta. Espero que você morra”, e Viola dançou euforicamente e sinalizou: “Ah, vamos! Você fica fofa quando fica envergonhada!

Você está balançando o barco. Pode, por favor, parar?

Em seus momentos livres entre a pesca, enquanto manipulava sua rede usando magia, Atolie corajosamente respondia a todos os sinais de Viola, até mesmo às coisas que poderia ter ignorado.

Ela está séria?

A partir daí, a batalha dos sinais de mão continuou até que nosso balde ficou cheio de peixes.

“Vamos lá, Atolie, eu te amo! Vamos nos casar.”

“Eu sei que você diz a mesma coisa para todas as outras garotas.”

“Quando devemos realizar a cerimônia? Vamos fazer o nosso bolo de casamento sabor peixe.”

“Parece nojento.”

“Quantos filhos você quer?”

“Nenhum.”

“Bem! Quer dizer que quer ter todo o meu amor só para você pelo resto de nossas vidas? Yay! Meu docinho é egoísta!”

“Não exatamente.”

“Onde será a nossa lua de mel? Um resort? Uma pousada? Ou um hotel? O que você acha de ser um hotel?”

“As montanhas seriam boas.”

“Ah, o selvagerismo, hein?”

“Mm.”

“A propósito, posso ir ao seu quarto esta noite?”

“Você quer ser jogada na prisão de novo?”

“O único lugar que eu quero ir é para a sua cama…”

“Nojenta. Espero que você morra.”

“Não se preocupe! Eu apenas dormiria! Junto com você! Não vou tentar nenhuma gracinha! Sério! Apesar da minha aparência, sou uma verdadeira dama! Não sou nada parecida com essas outras garotas!”

“Uma dama não diria que quer dormir com outra garota.”

“Mulheres que não tentam dormir com garotas bonitas não são damas.”

“Então o que é você?”

“Tenho tão pouco interesse nos prazeres da carne que sou praticamente vegana… eu acho…”

“Você não parece tão certa disso, para alguém que não come nada além de salada.”

“Mas você nunca me deu outras coisas para comer, não é…?”

Hm, poderiam pescar sem flertar?

Com a rede agora repleta de peixes, partimos para a Capital Ancestral, Lolia.

Como ficava relativamente longe, tínhamos que nos apressar para que o peixe chegasse fresco. Então, claro, estávamos voando em nossas vassouras.

Atolie estava voando na rede com magia, enquanto eu dava uma carona para Viola na minha garupa. Nossas vassouras pairavam sobre a floresta. As folhas das árvores abaixo de nós ondulavam, parecia até que ainda estávamos flutuando na água.

— Ah… eu queria estar com a doce Atolie… — Atrás de mim, sentada de lado na vassoura, Viola parecia desanimada.

Quando olhei de longe, pude ver o semblante de Atolie com a rede, flutuando logo atrás. Ela estava fazendo algum tipo de sinal de mão em nossa direção, assim como já tinha se tornado o costume.

— O que ela está falando…? — perguntei.

— Ela está dizendo: — respondeu Viola — “Deveríamos ter comprado lembrancinhas para todos? É a minha primeira vez visitando outra cidade!”

— …

Originalmente, eu e Viola planejávamos ir sozinhas, mas, antes de sairmos, Atolie começou a resmungar: “Esperem. Vocês não podem ir sem eu acompanhar com a rede. É perigoso demais para só vocês duas.”

Mesmo quando a repreendi, dizendo que ficaríamos bem, já que eu seguraria a rede, ela continuou resmungando. “Isso vai ser pesado demais para você.”

Como não havia qualquer motivo para recusar, acabamos aceitando a sua ajuda. A garota aparentemente tinha muito interesse pelo que estava além da sua cidade.

— …

Viola mandou algum tipo de sinal para Atolie, mas não disse nada.

— O que você disse?

— Eu disse a ela que a amo.

— …

Quando olhei para Atolie voando atrás de nós, vi que ela estava limpando o nariz e jogando aquela coisa na floresta abaixo.

Quando chegamos à Capital Ancestral e contamos as circunstâncias ao guarda do portão, ele se apressou a nos cumprimentar, dizendo:

— Entendido! Nesse caso, por favor, venham por aqui. — Ele nos acompanhou até o palácio.

Atolie devia se lembrar da única vez em que se encontrou com os soldados deste país, já que esteve rosnando até que Viola pôs as mãos em suas bochechas e forçou um sorriso em seus lábios. Ela parecia a dona de um animal de estimação destreinado.

Chegamos ao palácio, onde os soldados soltaram gritos de exclamação.

— Uau, uma maga!

— Duas delas!

— Que assustador!

Nos saudaram, um depois do outro. Nós os imitamos e fizemos os mesmos gestos em retorno.

Uma das magas do nosso lado era claramente hostil. Ela tinha esse tipo de energia, era como se pudesse pular ou morder as mãos dos soldados que a saudavam.

Viola parecia perdida como sempre.

Acha que poderia segurar a coleira dela mais apertada?

— Sou o rei deste país.

No outro extremo da sala que nos foi apresentada, do outro lado de um tapete vermelho, estava um velho sentado em um trono extravagante. Como ele disse em sua apresentação, era o rei. Em sua cabeça grisalha estava uma coroa robusta.

— E aí.

— Bom dia.

— Morra.

Cada uma de nós seguiu em fila e apresentou suas respectivas saudações. Uma delas foi meio questionável.

— Eu poderia jurar que acabei de ouvir aquela maga ali me dizer para morrer, mas… de qualquer forma, o que há nessa rede? — O olhar do rei estava concentrado em Atolie.

— Eu te odeio. Morra. — Mesmo em um lugar como este, ela exibia seu senso de honestidade totalmente rude e estúpido.

Viola se apressou a esclarecer as coisas ao rei carrancudo.

— Vossa Alteza, o idioma dela é diferente. O que ela disse não significa o que parece.

— Hmm, é mesmo?

— Sim. Aqui está o que ela estava dizendo: “A Cidade Submersa é o ninho de amor meu e de Viola, então gostaríamos que você mantivesse a distância de nossa vida pacífica e de nossos planos para criar nossos filhos.”

— Eu não disse isso. — Atolie cutucou Viola de lado, de forma ameaçadora.

— Ela disse que não disse aquilo.

— Aqui está o que ela quis dizer com isso: “O quê? Vossa Alteza, está com ciúmes por eu passar todos os dias com uma pessoa tão linda…”

— Eu não disse isso.

— O que vocês querem? — Suspirando, o rei pela primeira vez olhou para mim.

Era como se ele estivesse implorando pela minha ajuda.

— Hm… — Eu estava meio perdida, mas decidi abandonar as duas garotas que estavam flertando ao meu lado e prosseguir sozinha com a conversa.

Eu disse que a Cidade Submersa era uma cidade habitada. Que os moradores não queriam conflitos e que queriam prosseguir, se possível, com negociações pacíficas. Que expulsaram os soldados deste país fazendo uso de magia por um equívoco. Que desta vez trazíamos peixes como pedido de desculpas pelo incidente.

Certo, não falei tudo certinho, mas que seja, acho que serve.

— Uhum…

Depois de ouvir tudo o que eu tinha a dizer, o rei suspirou solenemente.

— Em outras palavras, gostariam de se desculpar pela grosseria de antes. Bom, tudo bem. Então, seguindo adiante… o que você pretende fazer?

Ele parecia não se incomodar com o que aconteceu antes.

Foi Viola quem respondeu na mesma hora.

— Acho que estaria tudo bem se você fizesse o que quiser. Se quiser ir pescar, pode ir. Não nos importaremos, mesmo se pescarem até que a Cidade Submersa seque e morra, caso queiram. — Ela disse isso com todo descuido do mundo, mas sua atitude foi diferente.

— O qu…?! O que você está dizendo?! — demandou saber Atolie, chocada com as palavras inadequadas de Viola, que iam totalmente contra a intenção das negociações para reconciliação. — Você! Vai nos apunhalar pelas costas?!

O colarinho de Viola a enforcou quando Atolie a puxou para trás com força e a encarou com um olhar penetrante.

A garota continuou olhando para o rei, como se não se importasse nada com o comportamento de Atolie.

— Vossa Alteza. Entretanto, eu gostaria que nos fizesse uma promessa. Se aceitar as nossas condições, distribua o peixe que trouxemos hoje a todos os seus cidadãos e comam, por favor. E então jure nunca mais erguer a mão contra o povo da Cidade Submersa.

— Hmm…

O rei parecia preocupado. Durante a conversa, Atolie violentamente sacudia Viola pelo colarinho.

— Por que… eu… deveria…!

Passaram-se alguns momentos.

— Tudo bem.

Como se fosse normal, o rei aceitou as condições.

Não houve discussão alguma. Tínhamos acabado de dar campos de pesca ao povo. Não havia motivo para ele rejeitar a proposta.

Prendi os braços de Atolie atrás das suas costas enquanto ela indignadamente tentava atacar Viola e observei com meus próprios olhos enquanto a outra garota e o rei trocavam promessas escritas.

— Por que você está atrapalhando?! Vocês duas estão planejando vender a minha casa?!

— Não é isso. Não é isso que estamos fazendo — sussurrei perto de seu ouvido para que o rei não pudesse ouvir.

Para começar, esse nunca foi o plano.

As ações de Viola faziam parte de nosso incrível esquema. O esquema possuía certo aspecto que ainda tínhamos que contar ao rei e Atolie.

— Mas está tudo certo com esse peixe…? Não tem veneno nem nada assim dentro, não é? — A preocupação do rei era natural, já que conversas tranquilas costumavam ser acompanhadas de motivos ocultos.

— Por favor, fique tranquilo. Não injetamos qualquer veneno. Como prova, que tal pedirmos para a nativa provar um pouco?

— Hein? Pois bem, vou pedir para que os funcionários do castelo preparem tudo.

O rei fez um sinal e os soldados pegaram a rede cheia de peixes e saíram do cômodo.

— Vocês só podem estar brincando! — lamentou Atolie. — Vocês são demônias! — Ela continuou e continuou, gritando coisas tristes até que se cansou. — Eu não posso…! Estou voltando para casa…! — gemeu, mal-humorada, até que um soldado voltou com um prato.

Uma boa parte do prato estava com molho ou algo do tipo, aproveitando bem mal o espaço. Era uma simples moqueca parecendo um prato chique.

Viola cravou o garfo no peixe, espetando um pedaço do tamanho ideal para uma mordida, e o moveu em direção à boca de Atolie.

— Certo, abra bem!

— Sem chances! Provavelmente está envenenado!

— Não está!

— Sem! Chances!

— Você é tão teimosa!

Suspirei e Atolie olhou para mim, silenciosamente pedindo por ajuda.

Não havia como evitar.

Soltei os pulsos de Atolie e deslizei as minhas mãos para os lados. Seus ombros se curvaram com a surpresa, e no momento que teve uma vaga ideia do que eu faria, a apertei.

— Gah! — Atolie abriu a boca com a surpresa.

— Aqui. — Viola enfiou o peixe na boca dela.

A princípio, Atolie franziu a testa e enormes lágrimas foram se formando nos cantos de seus olhos, mas sua expressão foi aos poucos mudando e ela mastigou a comida e engoliu obedientemente.

Depois de comer a moqueca, ela só ficou em silêncio.

Com a cabeça baixa, o corpo todo relaxado, ficou imóvel, atordoada.

E então, enquanto todos no palácio observavam com atenção, Atolie relutantemente deixou escapar uma única frase:

— Estou indo…

— Maravilha. — Viola riu e colocou as mãos nas bochechas de Atolie.

Os peixes não estavam, de fato, envenenados.

Era algo muito menos engenhoso do que isso.

Para simplificar, apenas Atolie e o seu povo podiam comer os peixes.

Eu tinha ouvido a verdade enquanto estávamos no barco.

Enquanto flertava com Atolie por meio de sinais de mão, Viola de repente me disse algo que parecia ter acabado de lembrar.

— Esses peixes não são comestíveis, sabe.

— Hein?

— Eles têm um veneno natural para protegê-los de predadores, entende? Sejam cozidos, grelhados, secos ou crus, quando alguém os comer, vai ficar com dor de estômago na mesma hora.

— Agora, um minutinho… Todos os presentes começaram a comer. Você disse que eles formam filas nas mesas de jantar, certo?

— Sim. Eles formam, na Cidade Submersa.

— …

Ela estava sorrindo, mas logo depois que disse isso, seu olhar endureceu.

— Meu palpite é que este país costumava ser fraco. Provavelmente foram incapazes de fazer qualquer coisa quando foram conquistados pela Capital Ancestral, Lolia. Quando Lolia começou a passar fome, provavelmente trancaram a floresta para que pudessem desenvolver a terra, mas… mesmo quando esta cidade foi inundada, isso não tomou a vida dos moradores. Esquecidos pelo tempo, nunca deixaram este lugar e começaram a viver em harmonia com a água.

Tinham passado de uma cidade com um canal para um sob a água. As pessoas, entretanto, fizeram o possível para se adaptar às mudanças do ambiente. A floresta tornou-se uma zona proibida, e sem qualquer forasteiro pisando em seu território, as pessoas passaram por sua própria evolução.

— Esses peixes nem sempre foram comestíveis. Eles são muito venenosos. Entretanto, com o passar dos anos, os corpos das pessoas devem ter se adaptado ao veneno. Foi assim que conseguiram sobreviver.

— E é por causa disso que você ficou esse tempo todo sem comer peixe…?

Aqueles que cometiam erros por descuido só podiam comer salada, assim como aqueles que eram jogados na prisão. E parecia ser isso que ela estava comendo, sem nada de peixe até o momento.

— Isso mesmo. Porque se eu comesse, isso acabaria destruindo o meu estômago.

— …

— Bem, há também a razão de que o assédio sexual à doce Atolie acabou sendo mais divertido do que imaginei que seria.

— Você não é só um velho tarado disfarçado?

O que há com essa maneira de pensar?

— Bem, enfim. — Ela olhou para mim, mesmo enquanto tentava enviar sinais assediadores com as mãos. — É por isso que estou levando este peixe para a Capital Ancestral, Lolia. Se eu fizer isso, também irão perceber. Devem perceber que não podem meter o nariz na Cidade Submersa. Não poderão comer os peixes, mesmo se puserem as mãos neles.

— É isso que está acontecendo…?

— É isso que está acontecendo!

Oh ho ho! — Ela soltou uma risada enquanto me dizia conspiratoriamente: — Com o passar de muitos anos, o povo da Cidade Submersa desenvolveu um veneno para protegê-los de seus inimigos.

— Por que você só está me contando sobre isso agora?

Parecendo ainda indignada, Atolie fez sinais de mão para nós logo após contarmos sobre a situação, já no caminho para o retorno. Viola explicou o significado para mim.

Aquilo foi… Er… O que acontece é que… eu queria ver a sua cara de surpresa.” Viola enviou uma enxurrada de sinais com as mãos.

“Não mexa comigo. Não me importo. Vou contar o que fez para o Pops.”

O que foi isso?

— Bem, bem, está tudo bem. A Cidade Submersa agora estará em paz.

Enquanto trocavam promessas escritas, Viola secretamente entregou uma carta ao rei e sussurrou em um tom dócil: “Por favor, abra isto depois de comerem todos os peixes, certo?”

Dentro dela estava a verdade sobre a Cidade Submersa.

Ela provavelmente estava tentando evitar que Lolia usasse o incidente como desculpa para continuar com as hostilidades. Porque mesmo que houvesse peixe de sobra por lá, eles não eram comestíveis.

— Mas tem uma coisa que não faz sentido… — falei, como se apenas para mim mesma. — Afinal, por que a Atolie e o soldados brigaram? Se aquilo não tivesse acontecido, você não teria que passar por uma situação tão complicada, não é?

Afinal, o povo da Cidade Submersa entendia o idioma comum. Se tivessem se dado ao trabalho de conversar desde o começo, não haveria necessidade para fazermos essa viagem para entregar alguns peixes.

— A Atolie é tão fofa! Eu quero abraçá-la!

Ignorando a minha pergunta, Viola estava dando pulinhos na vassoura, enquanto Atolie parecia realmente farta disso, enviando outro sinal.

Era um sinal de mão beeem estranho.

Ela esticou os dedos e levou a palma da mão aberta à testa.

Parecia uma espécie de saudação.

— Desculpa, mas qual é o significado daquilo…? — Puxei Viola de volta à realidade.

— Ah, aquilo é… — Ela hesitou. — Significa “Vou esmagar a sua cabeça.”

— Ah, claro. — É isso, hein.

— Significa, basicamente, que ela quer me matar.

— …

— Acho que deve ter sido essa a origem de tudo, mesmo quando ela conversou com o soldado.

— …

Isso foi uma piada?

— Bem, de qualquer forma, agora acabou. Vamos esquecer o passado. Eles aceitaram o nosso pedido de desculpas e tal.

A Cidade Submersa continuaria seguindo o seu próprio caminho e viveria em seu isolamento silencioso. A Capital Ancestral também deveria conseguir suportar, mesmo com a escassez de alimentos.

Igual um peixe venenoso nadando em silêncio pelo oceano, e como um peixe maior que prefere fingir que não o vê, cada um seguiria a vida sem olhar para o outro.

Suas histórias acabariam desaparecendo e em algum momento se adaptariam a essa realidade.

 


 

Tradução: Sahad

 

Revisão: Kana

 


 

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