Abaixo do Céu Estrelado Agarro-me Apenas à Sua Voz

Abaixo do Céu Estrelado, Agarro-me Apenas à Sua Voz – Cap. 01 – Eina

Parte 1

Meu celular vibrou em cima da mesa. Dei uma olhada e a frase “Você tem uma nova mensagem” aparecia na tela. Era uma mensagem de texto de um aplicativo de rede social. Cliquei nela e a abri.

Eina: 4 de setembro. O tempo está bom. Derramei um pouco de suco e manchei o carpete. Droga, preciso esconder isso… 

Parecia ter sido enviada por uma tal de “Eina”. Eu não sabia quem era. Era possível usar o nome que preferisse, porém, eu não tinha nenhum conhecido que usaria um refinado como esse.

— Uma mensagem de spam, será? — murmurei para mim mesmo. Isso até era incomum. Normalmente, uma mensagem de spam seria algo como: “Você ganhou dez bilhões de ienes! Pode acessar o prêmio clicando aqui →” e balançam dinheiro na sua frente. Ou poderia ser uma conta de mulher enviando alguma coisa com a mensagem “Me diverti no karaokê ontem”, tentando fazer com que você responda, para logo depois persuadi-lo e fazê-lo se inscrever em um site de encontros e pagar taxas de registro ridículas.

Mas o que era esse “4 de setembro. O tempo está bom”? Isso não era algo que se colocava em um diário?

Bzzzz.

Uma segunda mensagem chegou enquanto eu conferia.

Eina: Encobrido com sucesso! A Onee-chan não notou, yahoo!

De novo, era como se fosse um diário. O que diabos queriam de mim?

Eina: Achei uma técnica de remoção de manchas na internet! Vou tentar isso amanhã ♪. Hora de dormir, zzZZ.

Uma terceira mensagem chegou, a qual marcava o final do dia. Decidi que também devia ir para a cama, afinal, tinha aula amanhã.

 

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No dia seguinte, depois da escola, como já era de costume, eu estava na sala do clube de literatura. A porta estava aberta, para que qualquer possível candidato ou visitantes pudessem entrar facilmente. Mas não parecia que alguém viria.

Eu não tinha nada para fazer.

Mas, de repente, me lembrei da mensagem spam de ontem. Olhei para o meu celular. Havia mais mensagens vindas da mesma conta. Eram três no total, todas durante a noite.

Eina: Japonês, tive uma prova sobre kanjis, moleza

Eina: Tivemos que correr na Educação Física. Não sei por que eles precisam fazer uma classificação para isso. Não podem simplesmente deixar as pessoas que completam o percurso felizes por terem chegado ao fim?

Eina: Vi uma briga de grupinhos de algumas garotas na entrada. Não faço parte de nenhum grupo, por isso só continuei andando. Não queria ser envolvida naquilo. 

Eu até conseguia imaginar que tipo de pessoa estava mandando essas mensagens. Primeiro, era uma garota. Seu avatar era um sapatinho de cristal, igual ao de Cinderela, e o nome Eina também parecia feminino. Provavelmente tinha a idade de alguém do fundamental ou ensino médio.

Era boa em Japonês, mas horrível em Educação Física. Também não fazia parte de nenhum grupo, talvez não fosse do tipo social.

Em minha mente, comecei a formar uma vaga imagem da garota chamada Eina.

Ao mesmo tempo, considerei o que não sabia.

Qual sua altura? Qual o comprimento de seu cabelo? Tinha monólidos ou pálpebras duplas?

Eu queria ver sua reação se respondesse, mas também havia uma parte de mim que pensava calmamente que não poderia o fazer. Para começar, ainda não sabia se era mesmo uma menina. Podia ser um marmanjo fingindo. É comum ouvir sobre esses velhotes agindo como mulheres atenciosas com os homens.

Só que nunca ouvi falar de um spam como esse, por isso não conseguia evitar a curiosidade.

Se eu respondesse, me pergunto o que aconteceria dali em diante…

— Clube de Literatura, estou entrando.

Olhei para cima quando ouvi aquilo. Alguém que eu não esperava estava entrando, era uma garota do mesmo ano que eu.

Tinha pele clara, nariz delicado e um cabelo longo e lustroso. Sua figura também era soberba. Sua aparência era boa o bastante para ofuscar a própria palavra “beleza”.

Seu nome era Minekawa Yukino, a presidente do Conselho Estudantil da nossa escola.

— Presidente? Que raro, não me diga que temos alguém interessado?

Acho que minha voz estava muito animada. Mas não era nem um pouco porque a presidente era bonita. O Clube de Literatura estava recrutando novos membros no momento. Era setembro agora, então o recrutamento estava fora de época, mas nosso clube não havia conseguido nenhum membro novo desde abril, por isso ainda estávamos recrutando.

Eu era o único do segundo ano no momento, e nosso futuro estava em risco por causa disso. Logo precisaria me focar nas provas da universidade, por isso teria que sair também. Mas decidi que, caso não conseguíssemos nenhum membro novo esse ano, continuaria tentando atrair mais pessoas no próximo. Entretanto, ficaria muito grato se conseguíssemos o quanto antes.

— Claro que não, ninguém do segundo ano se juntaria a um clube nessa época do ano. Acabariam saindo logo depois de se juntarem.

No entanto, as belas sobrancelhas da presidente formaram uma carranca, e ela me refutou com frieza. Sempre que abria a boca, mostrava seu lado demoníaco. Tinha um modo franco de falar que fazia qualquer um sentir como se conversasse com um veterano ou professor.

— Eu não importaria se fosse alguém do segundo ano, sabe? Estou aceitando qualquer um agora. — Tentei perseverar, um sorriso apareceu em meu rosto. Ela não estava sendo abusiva nem nada do tipo, apenas falando a verdade sem rodeios. O meio ano que passamos como colegas me mostrou bem isso. — Você gosta de livros também, não gosta? Nossas atividades seriam perf—

— Não tenho tempo para uma conversa sem sentido, então irei direto ao ponto. — Ela me interrompeu friamente. Depois, disse algo impensável e incompreensível. — Reúna suas coisas e dê o fora.

— Hein?

— Como resultado de nossa última reunião do Conselho Estudantil, foi decidido que vamos revogar a sala do Clube de Literatura.

— Isso é muito repentino!

— Há muitas outras coisas que seriam melhores em salas. Ao invés de as entregarmos a clubes como o seu, que não fazem nada, acreditamos que seria melhor entregá-las a clubes que têm muitos membros e que realmente vão fazer algo. Seu conselheiro também aprovou.

— Ei, espere um minuto, nós estamos fazendo algo. Estou recrutando neste exato instante.

— Você só está sentado aí.

— Bem, ninguém veio visitar hoje.

Tentei fazer parecer que apenas hoje ninguém tinha visitado. Sendo franco, ninguém veio desde o fim das férias de verão, mas pensei que um blefe era minha melhor opção. Se perdêssemos nossa sala, considerando a baixa sorte que temos quando se trata de recrutamento, seria o nosso fim.

— Hmm. Mas parece que você não tem o livro para dar as boas-vindas aos novos participantes, não é mesmo?

— Ah, isso…

Isso foi doloroso. Todo ano o Clube de Literatura publica uma antologia chamada “Edição de Saudação ao Novo Membro”, mas não fizemos esse ano. Não houve manuscrito algum.

A razão para isso era simples.

Eu não consegui escrever.

Os membros do terceiro ano foram embora e ninguém do primeiro se juntou, sendo assim, fui o único que continuou com as atividades. E, pelo fato de eu não conseguir escrever nenhum manuscrito, não tivemos como publicar o livro.

— Você também não publicou nada antes das férias, ainda consegue dizer que estão fazendo atividades de clube?

Eu não tinha como responder. Agora ficou claro por que estava ali. Ela veio porque compreendia toda a situação. Nossa cova já estava cavada.

— Junte suas coisas agora. Se deixar o que não quiser levar, o Conselho Estudantil vai dar um jeito.

Ela deu sua declaração sem nem mesmo mover uma sobrancelha. Eu estava em um dilema, mas ainda tinha um pouco de coragem. Essa sala significa muito para mim. Venho aqui todos os dias desde abril do primeiro ano.

Além disso, meus veteranos e os formados tinham memórias que preenchiam esse lugar também…

Eu não poderia simplesmente deixar que acabassem com nós.

— Fazer isso assim, de imediato, não faz sentido. — Tentei resistir o máximo que podia. — Há coisas que os veteranos deixaram aqui, então não tem como sabermos o que jogar fora, eu gostaria que nos desse um pouco mais de tempo.

— Bem, suponho que seja verdade. — assentiu ela.

Sentindo-me triunfante, levantei meus punhos mentais.

Minha estratégia era a seguinte: teria um festival cultural no começo de outubro. Era uma tradição fazermos uma publicação nessa data, eu também poderia conseguir alguns membros. Meu plano era fazer o pessoal do terceiro ano, que saiu do clube, voltar para o final de suas vidas de estudante. Se eu conseguisse publicar um livro, não poderiam dizer que não estávamos fazendo nada.

— Muito bem, consegue fazer isso em duas semanas? Se conseguirmos limpar a sala antes que os preparativos para o festival cultural comecem para valer, não teria problema.

— Hã…

Fiquei sem saber o que dizer. Era a pior data para mim. Será que ela estava fazendo isso de propósito…? No entanto, sua expressão estava séria enquanto me perguntava, não havia sorriso desagradável. Ela era rigorosa, mas não do tipo que fazia os outros sofrerem.

— Duas semanas não é muito pouco?

— É? Se você começar a entrar em contato com eles ainda hoje, acho que conseguirá conseguir a tempo. Pode simplesmente mandar tudo pelo correio.

— Ah, mas, é…

— Ah, não se preocupe com as taxas de envio, vamos dar uma parte do orçamento. A sala está sendo retirada de você, então, pelo menos, podemos ir ajudando até onde conseguirmos.

Não consegui fazer nada além de fechar a boca diante daquela declaração eloquente. Aquilo foi apenas por boa vontade. A presidente era uma pessoa genuína, assim como eu imaginei.

— Bem, é assim que vai ser, então, já pode começar.

Após terminar de me contar sobre as partes importantes, a presidente virou-se e deixou a sala alegremente. Com suas costas eretas, seus passos eram leves, e tudo o que pude fazer foi me debruçar sobre a mesa.

Parte 2

Tentei escrever meus próprios romances. Foi por isso que me juntei ao clube para começo de conversa. Passei tanto tempo lendo e gostando de romances que acabei querendo escrever um.

Entretanto, toda vez que decidia escrever algo e me sentava em frente a uma página em branco ou tela de computador, não conseguia escrever nem uma única palavra. Então, comecei a ler dezenas de livros como Como Escrever um Romance! Mas não adiantou muito. Tentei seguir as dicas dos livros, mas nenhuma delas funcionou. Algumas pessoas podem querer perguntar por que alguém como eu entraria em um clube, sendo que não conseguem nem escrever. Na verdade, muitos dos meus colegas perguntaram isso.

A grosso modo, meu trabalho seria qualquer coisa, menos escrever. Por exemplo: leria os manuscritos enviados e apontaria problemas com a linguagem e enredo, e, dependendo das circunstâncias, também consideraria como melhorar as coisas com o autor e ajudaria a buscar material.

Resumindo, meu trabalho era criar um local para que os criadores pudessem brilhar ao máximo.

Soa maneiro falando assim, mas sem manuscritos, não há nada que eu possa fazer.

No fim, o dia terminou da mesma forma que sempre, sem candidatos aparecendo e comigo sem escrever uma palavra sequer. Abri um caderno e tentei pensar em algo, mas foi tudo em vão.

Meu telefone vibrou no meu bolso enquanto eu ia para casa com minha frustração.

Eina: Tenho uma arma contra manchas. A vitória será minha! 

— Ela parece estar se divertindo. — suspirei. Porém, quando vi a mensagem seguinte, meu coração se apertou.

Eina: Já chega. Quero morrer. 

Fiquei chocado com a clara falta de euforia e alegria que estavam presentes até agora.

Morrer?

Por quê?

As mensagens pararam ali. Cheguei em casa, jantei e fui para o meu quarto, mas ainda não tinha nenhuma mensagem nova.

Não devia ser estranho uma garota em sua adolescência, assim como ela, mandar uma mensagem dessas.

Ela ficou brava por eu não ter respondido?

Ou ela realmente me odeia?

Ou, talvez… esteja se preparando para… 

Shuu: Não morra. 

Eu não queria fazer isso.

Respondi e também percebi que esse podia ser um método que um trapaceiro usaria. Enviam várias mensagens alegres, então, repentinamente, mudam para algo mais pesado…

O alvo se perguntaria sobre o que aconteceu e, naturalmente, responderia…

Mas era muito tarde agora.

Aceitarei o meu destino.

Tentei mandar outra mensagem.

Shuu: Você não pode morrer. Algo aconteceu? Vou te dar um conselho. 

Eu já havia respondido uma vez, mas estava indo ainda mais fundo nisso. Pode-se dizer que isso seguia o ditado “Termine o que começou”, eu acho. Além disso, fiquei o tempo todo imaginando que tipo de spam era esse, então pode ser que isso funcione.

Eina: É…, quem é? 

Ela respondeu logo em seguida. Agora para aplicar o golpe.

Eina: Não devia haver comentários nesse aplicativo de diário. 

Não entendi mesmo o que ela quis dizer com isso.

Shuu: Diário? É um aplicativo de conversa, não?

Eina: Estive usando como um diário, no entanto… não era? Hmm, você esteve recebendo essas mensagens o tempo todo?

Shunn: Bem, sim.

Eina: Me, me, me desculpe por incomodá-lo! 

Era como se eu conseguisse ver uma garota curvando a cabeça freneticamente para se desculpar. Ela parecia ser uma boa atriz.

Shuu: Hm, tudo bem. Então, por que quer morrer? 

Decidi continuar conversando com a garota que queria se suicidar, ou que estava só encenando. Então, esperei por uma resposta, certo de que seria algo besta, como receber um não depois da confissão.

Mas, então…

Eina: Não consigo encontrar uma razão para viver. 

Uma razão… para viver…?

Era um spam terrivelmente filosófico.

Eina: Viver é doloroso, não há razões positivas para continuar, por isso pensei que devia simplesmente morrer.

Shuu: Mas ainda deve ter coisas boas, certo?

Eina: Não é como se não tivesse nada. É um pouco divertido ficar lendo, eu acho…, mas há muito mais dor.

Shuu: Mas se você morresse, as pessoas ficariam tristes, tipo os seus amigos e família…

Eina: Não, eles não iriam, nem um pouco. 

A respiração ficou presa em minha garganta.

Eu conseguia sentir a solidão vinda daquelas palavras.

Pode ser que tenha tocado na ferida. Eu não conhecia a garota que se chamava Eina, nem sua situação, por isso não deveria falar com tanto descuido.

Pensei nisso e sorri firmemente. Acho que já tinha ficado bem claro para mim que ela era mesmo uma garota.

Ouça, Shuu, é só mais um truque deles. A parte calma da minha mente me avisava. Mas e se, em um milhão de chances, isso fosse verdade e realmente tivesse uma garota considerando suicídio? Eu devia fazer algo?

Não importa se estou sendo enganado.

Se não for verdade, que seja. Se for uma piada, que seja também. Pode rir de mim se quiser.

De qualquer forma, decidi continuar como se Eina fosse uma garota normal com risco de cometer suicídio.

Shuu: Se morrer e mudar de ideia, não vai mais poder voltar, tem certeza?

Mas o que sugeri foi tão patético que cheguei a me sentir levemente triste. Duvidava que essas palavras superficiais iriam parar alguém que pensava em se matar.

Eina: Eu não mudaria de ideia se já estivesse morta. Seria apenas um corpo. 

Foi como pensei, e sua resposta mostrou bem isso.

Sozinho, cruzei os braços e pensei. Como se para alguém que quer cometer suicídio? Ela não tinha motivos para viver, ninguém se importaria e ela não se arrependeria depois…

Gostava de ler, mas havia muita dor em continuar viven—

Se ela conseguisse encontrar uma razão para viver, já seria o suficiente, mas seria difícil pensar em algo com tão pouco temp—

— Espere um pouco…

Ela gostava de ler?

É uma boa ideia.

Se não tinha uma razão para viver, eu criaria uma.

Shuu: Vou mudar de assunto. Você já sentiu vontade de escrever um livro?

Eina: Não é uma mudança grande demais?

Shuu: É importante. Meu Clube de Literatura não tem autores o suficiente, por isso não conseguimos publicar nada. Estou buscando alguém que possa escrever para nós. Está interessada? Você gosta de ler, não gosta?

Eina: Uh, sim, só que eu nunca escrevi um romance antes. 

Ótimo, ela estava seguindo a ideia. Enviei mensagens para pressionar.

Shuu: Até agora você esteve escrevendo bem, tenho certeza que dará tudo certo. Se tentar e não conseguir, não tem problema.

Eina: Mas não tem problema se eu escrever? Não sou um membro e nem vou à sua escola.

Shuu: Tecnicamente, pode ser, mas farei algo sobre isso. Não acho que usar um pseudônimo seria um problema. Vou pensar em alguma desculpa, dizer que um membro escreveu isso anonimamente e tal. Além disso, também é um caso de vida ou morte para mim. Se eu não conseguir publicar nada dentro de duas semanas, o Conselho Estudantil irá retirar a sala de nós.

Eina: Isso é terrível! Tudo bem! Vou tentar! 

Ela parecia estar completamente a fim. O fato de acabar perdendo a sala do clube foi efetivo? Ela tinha um coração muito gentil. De qualquer forma, parecia ter esquecido o suicídio.

E se eu conseguir o manuscrito e publicar um livro, posso conseguir defender a sala do clube. Vão ser dois coelhos com uma cajadada só.

Eina: Hmm, há algum requisito?

Shuu: Na verdade, não. Escreva o que mais gostar. Ou os requisitos tornariam o trabalho mais fácil?

Eina: Com certeza! É minha primeira vez, afinal!

Shuu: Então pode ser algo com uma garota do ensino médio como protagonista. O conteúdo não será questionado.

Eina: Entendido!

Parte 3

No dia seguinte, havia uma mensagem de Eina com um arquivo de texto em anexo. Pensei que fosse o enredo ou a construção geral, abri-o e fiquei surpreso.

Era um manuscrito. Não pude deixar de murmurar com choque.

— Ei, é sério?

Eram cerca de cinco mil palavras, perfeito para uma história curta.

Shuu: Obrigado pelo manuscrito! Isso é incrível! Você escreveu tudo isso ontem à noite? 

Mandei uma mensagem para ela, ainda usando meus pijamas. Logo depois, sua resposta chegou.

Eina: Fiquei acordada a noite toda.

Shuu: Você não tinha escrito nada antes, né? Isso é incrível.

Eina: Ehehe.

Shuu: Vou ler o mais rápido que puder e dizer a você o que achei. Vou conferir os erros de digitação e omissões, além de dar uma olhada no enredo e tal.

Eina: Conto com você! 

Enquanto eu ia para a escola, fiquei me perguntando quem era ela. Ser capaz de conseguir escrever tudo aquilo em uma única noite… Pensei que estivesse no ensino fundamental ou no médio, mas será que é uma universitária? Ou quem sabe uma trabalhadora? Acho que eu deveria perguntar…

Conforme esperava na sala do clube, como de costume, comecei a ler o manuscrito de Eina no meu celular.

Era um romance juvenil.

O resumo era mais ou menos assim:

Uma jovem do ensino médio encontra o fantasma de uma garota no terraço de sua escola. O fantasma morreu em um acidente de trânsito e pediu o corpo da protagonista emprestado por um único dia, porque havia alguém que ela queria encontrar e dizer o que sentia. Essa pessoa era o garoto que a protagonista gostava…

A protagonista passou por uma experiência fora do corpo, acompanhando o encontro do fantasma e do garoto enquanto flutuava no ar. Ao ver a alegria dos dois, optou livremente por desaparecer e deixar o amor deles acontecer.

Era uma história muito triste, mas também era tão bem escrita que tocou o meu coração. Foi muito melhor do que eu esperava.

— Certo, essa parte está um pouco difícil de entender, então eu devia revisar… Quero saber mais sobre as motivações dela também, em certas partes não há como saber o que ela está pensando…

Anotava meus pensamentos enquanto murmurava sozinho. Eu poderia estar dizendo isso pela honra dela, mas acredito que essa seja uma escrita maravilhosa. Se me perguntar por que estou escrevendo formas para melhorá-la, mesmo que esse seja o caso, eu diria que é porque tenho certeza que pode ser ainda mais incrível.

Era difícil escrever um manuscrito completo de uma só vez, todos os autores diziam isso. Por exemplo, mesmo quando um autor acha que tudo o que foi escrito faz sentido, pode não fazer sentido para as pessoas que leem isso e pode haver erros inesperados em expressões. Ter alguém para conferir tudo era muito efetivo para polir o trabalho.

Porém, ao mesmo tempo, precisava de um toque delicado. Quando o autor entregava o manuscrito, estava entregando o melhor que pôde fazer, e ter alguém dando conselhos sobre como melhorar não era uma sensação agradável. Além disso, eu não era um editor profissional, era simplesmente um fã de romances que era parte do Clube de Literatura de uma escola. Eu também poderia cometer erros.

Será que eu seria capaz de dar minhas opiniões sem machucar a autora e fazer com que ela as conferisse cuidadosamente…?

Até hoje, falei com autores na sala do clube, porém…, no caso de Eina, não podíamos nos encontrar.

Ainda não tinha certeza se ela fazia parte de algum esquema de golpe, nem mesmo sabia sua idade ou se era de fato ela. Podia ser alguém perigoso. Além disso, não tinha ideia de onde vivia. Eu vivia em Chiba, se ela morasse em Hokkaido ou Okinawa, não poderíamos nos encontrar com facilidade.

— …

Ao pensar nisso, olhei para o manuscrito na tela do meu telefone mais uma vez. Lá estava eu, pensando que não poderíamos nos encontrar, mas, ao mesmo tempo, do fundo do meu coração, essa era minha vontade. Só queria encontrar e conversar com a pessoa que escreveu algo tão maravilhoso.

— Não, acho que não rola.

Murmurei para mim mesmo, deixando esse desejo de lado. Quando pensei nisso com mais calma, não havia como eu encontrá-la. Mas, se não o fizer, como darei minhas dicas…?

Vou colocar o máximo de correções possíveis no arquivo.

Peguei um dos notebooks do clube e conectei o meu celular para passar o arquivo.

— Hmm, esse aqui?

Não entendi por que me senti desconfortável, mas logo percebi que a data do arquivo era estranha.

A data do arquivo que Eina me enviou era 09/xx/2013. Entretanto, estávamos em 2018 agora, eram exatos cinco anos de diferença. Será que ela mentiu sobre ter ficado a noite inteira acordada e enviou algo que tinha escrito antes?

Então realmente estava tentando me enganar?

Mas o que ganharia com isso? Além do mais, o resultado final foi muito bom…

Suas configurações estavam erradas, talvez? Embora eu não tenha certeza de como é possível cometer esse tipo de engano.

Comecei a escrever os comentários no arquivo.

 

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Depois que cheguei em casa e comi alguma coisa, enviei uma mensagem para Eina.

Shuu: Li o manuscrito. Estava bom. 

Uma resposta chegou rapidamente.

Eina: Sério?

Shuu: Sim. Me senti tão triste quando terminei de ler, mas não foi desagradável. Acho que é um romance muito bom.

Eina: Você está me elogiando demais. 

Parece que ela é tímida.

Shuu: Destaquei alguns erros de digitação e probleminhas, mas…

Eina: Ah, tudo bem.

Shuu: Adicionei comentários no arquivo, você poderia conferi-los? 

Anexei e enviei o arquivo para Eina.

Eina: Chegou.

Shuu: Conseguiu acessá-lo?

Eina: Sim. Ahhhhhh.

Shuu: O que foi?

Eina: Sinto muito! Sinto muito mesmo!

Ela continuou se desculpando.

Droga. Talvez tenha exagerado nas correções. Tentei ser o mais cuidadoso possível com eles, mas acho que tiveram um impacto grande em seu primeiro trabalho.

Shuu: Não precisa se desculpar. Esse tipo de coisa é normal.

Eina: Mas, mas… eu tomei o seu tempo e… 

Nada bom, não estava funcionando pelas mensagens. Nada seria resolvido assim.

— O que eu faço? Hmm?

Percebi algo na minha tela. O aplicativo tinha chamadas de voz gratuitas. Cliquei no botão quase que por reflexo.

Coloquei o telefone no ouvido e ouvi o toque de discagem.

E então… conectou.

<Alô?>

O soprano do meu celular me deixou sem ar. A voz dela era linda. Era um pouco mais aguda do que eu imaginava enquanto conversávamos e era um som claro.

— Alô, é o Shuu. É… prazer em conhecê-la.

<Prazer em conhecê-lo também.>

Parecia que ela estava tão perto que eu conseguia ouvir sua respiração.

— …

< … >

— Então. <Hmm.>

Nós dois paramos de conversar, mas começamos ao mesmo tempo.

<Vá em frente.>

— Me desculpe. Sobre o manuscrito.

<S-Shim…>

Mesmo pelo celular, eu conseguia ver que ela estava bem nervosa. Talvez tivesse pensando que eu estava bravo?

Por causa disso, tentei falar o mais gentil possível.

— Estava muito bom mesmo.

<Hã? Mas tem tantas correções…>

— As correções estão lá porque estava bom. Eu tinha certeza que poderia ser ainda melhor. Me desculpe, pode ser que tenha sido um pouco duro, mas não queria falar mal dele.

<Eu que deveria me desculpar. É que… está por toda parte.>

— É recém a sua primeira vez. Se não quiser revisá-lo, pode só conferir os erros de digitação e imprimi-lo. Não encontrei nada grave.

<Não! Você se esforçou tanto na edição, o revisarei com afinco!>

Sua voz estava muito mais energética do que antes, por isso fiquei mais calmo. Realmente, conversar era importante.

<Umm, então, posso fazer algumas perguntas?>

— Mas é claro!

<O que você quis dizer no primeiro comentário… quando disse que quer uma imagem maior sobre o estado psicológico da protagonista…?>

— Ah, isso. Pensei que poderia ser melhor se contasse mais sobre o porquê de ela deixar o fantasma usar o corpo dela. Ganharia mais empatia dessa forma, não acha?

<Entendi! Depois, na próxima página—>

E, dessa forma, a conversa continuou pacificamente até que terminássemos.

— Está tudo certo? Não tem mais dúvidas?

<Sim!>

— Eu também posso ter cometido erros, por isso peço que, por favor, me diga quais são.>

<Não acho que tenha algum!>

Então continuamos relendo o manuscrito várias vezes durante o final de semana até que seu romance estivesse finalizado.

Parte 4

— Shuu-kun, de onde saiu esse manuscrito? — perguntou Ruka-senpai enquanto terminava de ler o formato impresso.

Era segunda-feira e estávamos na sala do clube.

Ela era uma aluna do terceiro ano que estava no Clube de Literatura. Era uma mulher de longos cabelos ondulados e um sorriso gentil e atraente. Era calma e falava baixinho, por isso era bastante tranquilo estar perto dela.

— Consegui com um conhecido. — respondi, recebendo um olhar interrogativo de Ruka-senpai.

— Um conhecido? Queeemmm?

— É segredo. Ele prefere permanecer anônimo.

— Ahhh.

 

Ruka-senpai queria muito saber quem era o autor, mas eu não poderia simplesmente dizer “Consegui de alguém que encontrei em um aplicativo de conversa”. Não queria que ela se preocupasse comigo, temendo que eu estivesse sofrendo um golpe.

— Sei que é repentino, mas você pode fazer as ilustrações da capa e preparar para isso?

Ela também não escrevia. Ao invés disso, fazia ilustrações e design de capas. Obviamente, gostava de livros, mas não era do tipo que queria escrevê-los, preferia fazer as ilustrações. Era a pessoa certa na hora certa.

Tinha outros dois membros do terceiro ano que escreviam. Porém, saíram do clube para se focarem nas provas.

— Sim, para sexta, pode ser?

Ruka-senpai sorriu para mim e assentiu.

— Sem problema. Muito obrigado por fazer isso enquanto está ocupada estudando.

— Não esquenta. Eu também ficaria triste se perdesse a sala e quero apoiá-lo.

Fiquei comovido pela sua gentileza.

A capa foi encomendada. Eu a pegaria na sexta e a imprimiria no sábado, então, publicaria na segunda. Entretanto, ainda precisaria pedir a sala de impressão emprestada ao Conselho Estudantil. Isso era um pouco deprimente. A Presidente Minekawa estaria lá, e eu realmente não queria vê-la.

Mas era necessário, então me despedi da Ruka-senpai e fui em direção ao escritório deles.

— Com licença.

Bati na porta e entrei na sala. Todos os membros estavam trabalhando em suas próprias mesas. Todos pareciam ocupados, por isso ninguém veio para conversar comigo. Na verdade, eu não estava com pressa, então continuei esperando tranquilamente à porta.

— Entendi. Irei conversar com o Clube de Baseball e…

A presidente estava trabalhando em uma mesa interna. Não pude evitar de olhar para onde ela estava.

Parecia que estava lidando com os clubes de esporte. Tinha um sorriso refinado no rosto e se parecia um pouco com uma das pinturas ocidentais de santos. Ela era realmente fotogênica.

— Clube de Literatura?

Me notou e olhou na minha direção, suas sobrancelhas fizeram uma carranca. Ela sempre parecia irritada comigo.

Coloquei um sorriso tenso no rosto.

— Precisa de alguma coisa? Estamos bem ocupados no momento. — disse enquanto se levantava e caminhava até mim.

— Eu gostaria de usar a sala de impressão no sábado, ela está livre?

— Sim. — Girou sobre os calcanhares e pegou um caderno da estante. — Coloque o nome do seu clube aqui e quando vai usá-la.

Escrevi como me foi dito.

— Mas o que vai imprimir?

— O livro para os novos alunos.

— Você escreveu algo.

— Eu não. — Aproveitando que já estava conversando com ela, decidi perguntar sobre a sala do clube. — Ei, Presidente, se estivermos fazendo alguma atividade, não seremos despejados da sala, né?

— Não posso decidir isso sozinha, mas, caso se mantenha publicando, posso trazer isso de volta para o plano.

— Prometo que vamos continuar.

— Tudo bem. Comentarei sobre isso na reunião de amanhã. Mas ainda tem mais uma condição.

— Condição?

— Me dê um dos livros também.

— Você sabe que nós os entregamos de graça, né?

Sempre os colocamos dentro de caixas em cada um dos andares, ao lado dos quadros de aviso com um “Pode pegar um” escrito na caixa.

— Traga um para mim.

— Por quê?

— Não faz mal se esforçar um pouco, faz? Eu vou estar tentando cancelar algo que já tinha sido decidido, não é mesmo?

Pensei que estava colocando mais um fardo sobre nós ao dizer isso, mas, se seguir essa condição permitirá que defendamos nossa sala, eu poderia responder no mesmo instante.

Quando terminamos, voltou à sua mesa sem nem mesmo um “adeus”, por causa disso, não consegui agradecê-la. Ela sempre foi tão contundente. Eu sabia que ela era uma pessoa prática, mas ainda parecia tão amarga comigo.

— Acho que me odeia mesmo…

Murmurei enquanto caminhava pelos corredores. Não pude evitar de lembrar do dia em que a conheci.

Era o primeiro dia de aula. Eu era um autoproclamado bibliófilo e curioso sobre que tipos de livros haviam na escola que entrei, por isso fui até a biblioteca quando a aula terminou. Eu gostava de salas de leitura e bibliotecas, davam uma boa impressão quando estavam cheias de livros. O cheiro de poeira dos livros mais velhos fazia parecer que eu estava coberto por eles, esse era um charme diferente quando comparado ao das livrarias.

Olhei pelas estantes, começando pelo canto.

— Oh!

Encontrei um dos meus favoritos de Ficção Científica e, inconscientemente, estendi a mão para pegá-lo.

Era um livro que tratava sobre viagem no tempo, chamado The Door Into Summer. Porém, outra mão estendia-se para pegá-lo, então parei.

— Pode pegar.

Recuei a minha mão.

— Tem certeza?

— Sim, já o li… antes.

Quando vi a dona da mão, fiquei sem palavras.

Ela era tão linda que precisei engolir em seco.

Aquela era a Presidente Demônio, Minekawa Yukino.

— Você é Shuu Yagi-kun da turma A, certo?

— Sim. — Consegui responder quando ela falou meu nome.

Como ela sabia? Eu havia acabado de entrar nessa escola…

— Me chamo Minekawa Yukino, da turma B. Prazer em conhecê-lo.

— O… prazer é meu.

— Então, você gosta de livros?

— Sim, e você?

— Também.

— Então está no Clube de Literatura?

— Ainda estou meio perdida. Tem muita coisa que quero fazer…

— Entendo, eu vou me juntar a eles, então dê uma passada lá, caso queira.

— Vou pensar nisso…

Ainda não me esqueci daquele sorriso gentil e amigável. Ela não se juntou ao Clube de Literatura no final, e eu acabei não a encontrando mais. Pode-se dizer que aquele dia, no primeiro ano, foi a nossa primeira e última ligação.

Depois, quando nos encontramos novamente na mesma turma durante o segundo ano, ela parecia me tratar de forma dura. Mal conversamos, então eu não sabia o que a fez me odiar assim, do nada. A vida era mesmo cheia de mistérios.

Parte 5

Imprimi cem panfletos.

Embora fossem distribuídos gratuitamente, havia um limite para quantos alunos gostavam de livros, por isso era uma quantia justa. Mas, quando se trabalhava sozinho, a quantia se tornava bem grande.

Era sábado e eu conseguia ouvir os membros dos clubes de esporte do lado de fora. Terminei o trabalho na sala de impressão e levei o material, agora impresso, até a sala do clube e comecei a uni-los.

O trabalho em si era fácil. Eu dobrava cada Folha B4 ao meio, as empilhava, então as grampeava. O simples fato de carregar tudo aquilo até o clube já era exaustivo, pois não dormi o suficiente durante a noite.

Ruka-senpai enviou as ilustrações na sexta de manhã, e eu fiz toda a tipografia depois da escola, terminando só hoje de manhã. O texto estava completo, mas tive que trabalhar até de manhã.

Tirei um cochilo e, em seguida, fui até a sala de impressão, o que demorou até o meio dia. Comi antes da hora o almoço que comprei na loja e comecei a trabalhar a sério.

Eu dobrava o papel em silêncio enquanto música tocava no meu celular.

As impressoras mais modernas liam os dados e transformavam em livros automaticamente, mas minha escola não tinha algo tão caro assim. Por causa disso, tínhamos que fazer à mão…, mas eu era o único membro ativo.

— Preciso fazer isso. — eu disse, propositalmente pomposo para me motivar, a exata imagem de um herói trágico.

Valeu a pena ficar acordado até tarde.

E, então:

Bzz bzz.

Meu celular vibrou.

Eina: Olá, como está?

Shuu: Tudo bem.

Eina: O que está fazendo hoje?

Shuu: Encadernando os livros.

Eina: Você tinha clube hoje?

Shuu: Bem, estou sozinho.

Eina: Ninguém está ajudando você!? Isso é terrível!

Shuu:  Os alunos do terceiro ano já se retiraram, por isso sou o único ativo.

Eina: Entendo… então você está os encadernando sozinho? Quantos?

Shuu: Cem.

Eina: Eita, é bastante. Eu… não posso ajudá-lo, sinto muito.

Shuu: Tudo bem. O simples fato de ter alguém para conversar já torna tudo mais fácil.

Eina: Então, se não for um incômodo, vou ligar. 

A ligação veio praticamente no mesmo momento em que terminei de ler a mensagem e rapidamente coloquei no ouvido.

<Alô, Shuu-san?>

— E aí.

<Boa sorte. Estou torcendo por você.>

— Valeu.

<…>

— …

<Não consigo pensar em nenhum assunto para conversarmos.>

— Nós não sabemos nada um do outro. Vamos nos apresentar. Que tipo de livros você gosta, Eina?

<Hmm… Eu gosto de coisas sobre fantasia. Tipo conto de fadas. Romance também. E você?>

— Meio que de tudo, mas Ficção Científica é meu favorito.

<O que você gosta de comer?>

Eina fez a pergunta desta vez.

— Lamen, katsudon, coisas do tipo.

<Típico de um garoto.>

— E você, Eina?

<Gosto de tudo que é doce! Bolo, choux cream, dorayaki, anmitsu…>

Achei que fazia sentido uma garota listar coisas doces.

<Próxima pergunta! Você tem uma namorada?>

— Não.

<Alguém que você gosta, quem sabe?>

De repente, o rosto da presidente apareceu em minha mente, e um sorriso irônico apareceu rapidamente.

Ela era mesmo bonita, mas estava em outro nível. Eu só poderia admirá-la de longe. Se possível, eu preferia não ter que conversar com ela. É difícil vê-la agir como se me odiasse quando conversamos cara a cara.

— Acho que tem alguém que eu admiro.

<Eh, eh. Como é essa pessoa?

— Como? Hmm… Não sei dizer, não sei muito sobre ela.

<Ah, então é platônico.>

— Acho que é. Mas e quanto a você? Tem um namorado?

<Você achou mesmo que eu teria?>

Pensei que provavelmente não, então perguntei.

— Alguém que você gosta?

<Hmmm. Tem alguém que eu admiro.> Parecia que queria evitar a pergunta. <e, provavelmente, também é platônico.>

Ela soou solitária, e isso fez com que meu coração doesse. Um amor platônico… complicado.

— Se precisar de alguém, eu posso tentar ajudar, sabe?

<Obrigada. Estou bem por enquanto, mas conto com você, caso acabe precisando.>

Continuamos com nossa conversa sinuosa, o tempo parecia voar enquanto eu conversava com Eina, e o sol se pôs antes mesmo de eu perceber. Os livros já estavam encadernados.

Parte 6

Era segunda-feira, os livros estavam em segurança ao lado dos quadros de aviso. Fui direto até a sala do Conselho Estudantil assim que todos foram organizados.

A presidente estava sentada, trabalhando sozinha.

— Presidente, aqui está, como foi prometido.

— Obrigada. Como eu prometi também, não vamos retirar sua sala.

— Ae! Te devo uma.

— Em troca, pode parecer chato, mas faça suas atividades, pode ser?

— Entendido.

Saí da sala, sentindo-me triunfante.

 

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O livreto dos novos estudantes, ainda que estivesse atrasado, causou um leve alvoroço na escola. Nosso Clube de Literatura tinha a tradição de publicar coisas sob o nome verdadeiro, mas “Eina” era, obviamente, um pseudônimo. Além disso, não havia muitas pessoas que escreviam histórias como as de Eina.

Todo mundo estava curioso sobre quem havia escrito aquilo, também parecia que mais pessoas estavam lendo do que o normal. Por exemplo, quando eu estava almoçando na quarta-feira, o craque do clube de jornalismo, Keisuke Sakai, apareceu.

Ele estava na mesma turma que eu desde o primeiro ano, e nós dois fizemos muita coisa juntos, mas ele nunca apareceu no clube antes.

— Quem é Eina? Um novo membro? Um pseudônimo de algum veterano? Ou você mesmo?

Parecia não se incomodar em levantar os óculos que haviam escorregados e me bombardeou com perguntas.

— Não vou te contar.

Além disso, mesmo que quisesse, não poderia. Eu não sabia muito sobre ela também.

— Por favor, somos amigos, não somos? Meu chefe me ameaçou para vir aqui e perguntar quem era! — Estava de joelhos, me implorando. Era um pouco triste, mas se eu não podia, nada poderia ser feito.

— Sinto muito, não posso.

— Você não tem coração.

— Tenho meus próprios motivos, assim como Eina.

— Ahhhhh, vou ser demitidoooooo!

Foi difícil fazer com que Sakai parasse de chorar, mas me senti feliz pela obra ter ficado famosa. Eu queria contar isso para Eina o quanto antes. Fiz Sakai ir embora e enviei uma mensagem para ela.

Shuu: Todos gostaram da sua história! 

A resposta veio quando cheguei em casa.

Eina: Sério!? 

Normalmente, eu não recebia suas mensagens quando estava na escola. Era provável que ela enviasse quando chegava em casa. Talvez a escola que frequentava proibisse celulares.

Shuu: Sério! O Clube de Jornalismo queria uma entrevista. Eles querem saber quem a escreveu! Mas consegui driblá-los.

Eina: Está indo tão bem assim!? 

Eu conseguia sentir sua alegria através da tela.

Mas, então, me lembrei de algo importante.

Shuu: Ah, sim, já ia me esquecendo. O que devo fazer com o livro finalizado? Quer que eu te envie?

Eina: Enviar… pode ser um pouco problemático.

Shuu: Acho que você não iria querer dar seu endereço. 

Claro que não iria querer. Até porque eu era só uma pessoa qualquer.

Eina: Não, não me importaria… mas minha família pode não gostar de alguém que não conhecem me envie algo…

Shuu: Entendo.

Eina: Hmm… quem sabe… você poderia… me entregá-lo pessoalmente? 

Meu coração saltou assim que vi a mensagem. Eu encontraria Eina.

Eina: Ah! Me desculpe! Não perguntei onde você mora.

Ela enviou outra mensagem enquanto eu ainda não conseguia decidir o que responder.

Eina: Moro em Chiba, então eu acho que perto de Kanto pode dar certo. 

— O quê!?

Não pude deixar de gritar com surpresa. Eina também morava em Chiba!? Coincidências como essa realmente existiam? Por alguma razão, meu coração estava acelerado.

Eina: Shuu-san, onde você mora?

Shuu: Em Chiba também, na Cidade C. 

Acabou com uma série de mensagens de Eina, por isso me apressei em responder onde eu morava.

Eina: Então, o que acha de nos encontrarmos na Estação C?

Shuu: Pode ser.

Eina: Tudo bem, obrigada. Até sábado então!

Parte 7

A estação estava cheia de pessoas, possivelmente porque era sábado. O local estava limpo e arrumado desde que foi reformado há dois anos, e era perfeito para encontrar pessoas.

Cheguei no local de compra dos bilhetes dez minutos antes do horário que combinamos.

Shuu: Cheguei um pouco mais cedo. Estou na frente do pilar, usando um casaco preto e jeans, sou um adolescente.

Eina: Eu também. Pilar…? Hmm, onde?

Shuu: Em frente aos portões. Á direita de quem sai.

Eina: Direita… Pode levantar a mão? 

Levantei a mão como ela pediu.

Shuu: Ergui.

Eina: Hã, onde?

Shuu: O que você está usando?

Eina: Uma camisa de malha leve, corsário e sandálias. Meu cabelo está solto e também sou adolescente. 

Olhei ao redor. Vi muitas adolescentes, mas nenhuma parecia estar procurando alguém.

Shuu: Que estranho. Não é a estação privada, certo?

Eina: Não.

Shuu: Quer saber, vá até a máquina de bilhetes, vou para lá também.

Eina: Tudo bem, estou aqui. 

Não vi ninguém lá.

Eina: É difícil achar alguém quando está sendo reformado. 

Franzi a testa.

Shuu: Reformado? Mas já terminaram, não?

Eina: Hein? Disseram que vai levar mais uns três anos, não é?

Shuu: …

Eina: … 

Provavelmente estava brincando comigo, ou era outro lugar com o mesmo nome. No entanto, existia apenas uma Estação C em Chiba. Então, me lembrei da data no arquivo dela, 09/xx/2013. Era 2018 agora, exatamente cinco anos.

As reformas terminaram dois anos atrás, então a data batia com Eina dizendo que levaria “mais três anos”.

Shuu: Pode me enviar uma foto da frente da estação?

Eina: Aham. 

Meu celular tocou quando a foto chegou. Estava coberta por barreiras de construção, no meio delas, a estação estava sendo reformada.

Estou sendo enganado.

Era fácil falsificar esse tipo de coisa. Por exemplo, se usar as mensagens iniciais como “uma garota que vive em 2013”, seria simples seguir a partir disso. Porém, por alguma razão, eu não conseguia duvidar dela. Será que ela realmente mentiria assim?

Então—

Shuu: Eina, em que ano estamos?

Eina: Hein? Por quê? 

Ela respondeu à pergunta óbvia.

Shuu: Explicarei depois, só me responda.

Eina: 2013… 

Li 2013 várias vezes. Não havia engano. Podia ser uma mentira, mas eu queria acreditar nela, por isso falei com honestidade.

Shuu: Não fique surpresa, mas, para mim, é 2018.

Não teve resposta por um tempo.

Eina: Eu… não consigo acreditar.

Shuu: Nem eu.

Parte 8

Fui até uma praça próxima, sentei-me em um banco e liguei para Eina. Estava ficando estressante conversar por mensagem.

<Alô, é a Eina.>

Ela atendeu na mesma hora.

— Sou eu, Shuu. Você está mesmo em 2013? Não está me enganando, está? — perguntei logo de cara.

<O que eu ganharia mentindo?>

Ela parecia aborrecida. Eu conseguia imaginar uma menina do ensino médio fazendo beiço para mim.

— Talvez você precisasse fazer alguma pegadinha comigo por causa de alguma punição em um jogo.

<Você está pensando demais. Além disso, eu já teria gritado “peguei o bobo” e os outros já teriam aparecido agora, não? Eu não precisaria continuar, não acha?>

Fazia sentido.

<Pensei que você pudesse estar me pregando uma peça também, mas não consegui pensar em nenhum motivo para isso, então decidi aceitar como sendo verdade.>

— Mas é possível conversar com alguém cinco anos no passado?

<Se é ou não, só sei que não podemos nos ver para conversar.>

Peguei o livro da minha mochila e fiquei olhando para ele. Eu não conseguiria entregá-lo então. Que pena… Talvez eu pudesse transformar em PDF e enviar? Pode não ser como ter a versão física, mas era melhor do que nada.

Conforme esses pensamentos passavam pela minha mente, percebi algo.

—Não, nós podemos nos encontrar.

<Hã, mas nós não vivemos em anos diferentes?>

— Posso te encontrar cinco anos depois. Claro, você vai ter que esperar por isso, foi mal.

Não era como se fossem cem ou duzentos anos, apenas cinco. Claro, em cinco anos, um adolescente como eu já seria um adulto, então ainda era bastante tempo, mas não tanto para que precisássemos desistir de nosso encontro. Ou era isso o que deveria acontecer, entretanto, Eina, por alguma razão, permaneceu em silencio.

— Eina?

Depois de um tempo, ela falou baixinho.

<Se eu… pedir para você parar, vai me odiar?>

— Hein, claro que não…

<Me desculpe, estou sendo egoísta.>

Ela parecia ter ficado triste. Entrei em pânico com a mudança de sua atitude alegre.

— Você não fez nada de errado, me desculpe por sugerir isso.

<Não, eu que estou errada. Quero muito encontrar você.>

Meu coração acelerou quando ela disse aquilo.

<Mas tenho medo. Medo de saber sobre o meu futuro. Quero dizer…>

Sua voz ficou mais baixa, ela sussurrou:

<E se eu estiver morta daqui a cinco anos?>

Parecia que eu fui apunhalado por suas palavras silenciosas.

Eina… morta?

— Você está… doente?

<Hã? Não, não estou. Só estou falando hipoteticamente. Se eu morrer, tudo bem. Pode ser que eu tenha me deparado com um destino horrível. Há muitas coisas piores do que morte.>

Ela disse hipoteticamente.

Não estava errada, a vida de qualquer pessoa podia mudar drasticamente da noite para o dia. Mas a maioria das pessoas viviam com uma vaga sensação de que ainda estariam aqui no dia seguinte, e no dia depois desse… e até mesmo depois de cinco ou dez anos.

As pessoas conseguiam viver uma vida normal porque não duvidavam disso. Mas Eina disse que poderia morrer.

Por quê?

O que a fez dizer uma coisa dessas…?

<Tenho certeza de que se algo terrível aconteceu comigo no futuro, você esconderia isso. Mas eu posso ser capaz de saber pela sua voz, e tenho medo disso. Sinto muito.>

Não perguntei qual era sua situação, ou por que era tão pessimista. Ela até pensava em suicídio na primeira vez que conversamos. Provavelmente tinha alguma relação, mas eu não poderia perguntar, ainda havia uma distância muito grande entre nós. Eu não sabia se poderia fazer uma pergunta dessas para alguém que nunca vi antes.

— Tudo bem, vamos continuar conversando então, Eina.

<Aham! Vamos!>

Falei com o máximo de euforia que podia e, possivelmente por causa disso, a voz dela ficou energética mais uma vez.

Suspirei.

Parte 9

Enquanto estava em meu quarto naquela noite, já deitado, Eina me mandou uma mensagem.

Eina: Posso ligar para você agora?

Shuu: Claro. 

Logo recebi a ligação.

— Alô.

<Alô, Shuu-san? Sou eu, Eina. Me desculpe por ligar tão tarde.>

Não disse isso apena por educação, era o seu jeito mesmo.

— Não se preocupe, amanhã é feriado. Então, o que foi?

<Eu estava pensando. Acho que devemos ter mais regras, já que estou cinco anos no passado.>

— Regras? — franzi a testa.

<Sim, regras para evitar a influência do passado. Acho que a melhor coisa a se fazer é evitar mudar o passado o máximo possível. Isso aparece bastante em Ficção Científica, certo?>

— Verdade. Então, conversar comigo assim não contaria?

<Por isso que eu falei o máximo possível. Um pequeno impacto não deve ter problema, mas algo grande pode fazer o universo todo explodir.>

Eu já tinha ouvido esse tipo de coisa antes.

<Primeiro, de forma alguma, me fale muito sobre o futuro.>

Bem, isso era o básico.

Hmm? Espere um pouco.

— Se eu disser quais empresas fizeram sucesso, você pode ficar rica, não pode? Daí você pode dividir comigo depois…

<Shuu-san! Essa é a pior coisa que você poderia ter dito!>

— Estou brincando.

<Hump!>

Ri, mas parecia que ela estava fazendo beiço do outro lado do telefone.

— Me desculpe.

<Não tem graça. Precisamos tomar cuidado com coisas relacionadas a dinheiro. Eu gostaria que você não me dissesse que produtos estão na moda daqui a cinco anos.>

— Entendido.

<Além disso… é melhor não falarmos muito sobre mim.>

— Por quê?

<Se você souber de coisas relacionadas a mim, pode mudar a futura eu de alguma forma, não é?>

— Verdade. Vou evitar ao máximo fazer perguntas.

<Agora que penso sobre isso, parece que só eu estou falando para você ter cuidado, sinto muito.>

— Não tem como evitar, sou eu quem está no futuro.

<Eu posso te falar sobre o passado, então, se tiver algo que queira saber, só perguntar.>

— Tipo o quê?

<Hmm, tipo, como Chiba era cinco anos atrás?>

— Duvido que mudou tanto em cinco anos.

<Pois é.>

Ela parecia um pouco desanimada.

— Não se preocupe. Estou no futuro, então você não pode mudar isso.

<Você é gentil, obriga—>

Beeeep.

De repente, a ligação caiu.

— Eina? — liguei de volta, mas ninguém atendeu. Depois de dez minutos, ela me ligou.

<Me desculpe, Shuu-san.>

— Tudo bem, o que aconteceu?

<Meu telefone não parece estar funcionando direito…>

Ela disse de forma estranha, se não houvesse um problema com o sinal, devia ser o telefone, mas Eina não parecia querer falar sobre isso, por isso fechei a boca.

<Acho que por hoje era isso então.>

— Tudo bem, boa noite.

A ligação caiu abruptamente de novo.

O que aconteceu?

Enquanto pensava sobre isso, percebi algo. Eu não queria saber sobre o passado, ele não importava. Só queria saber mais sobre Eina.

 


Tradução: Taiyo

Revisão: Taiyo

 

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