86: Oitenta e Seis

86: Oitenta e Seis – Vol. 01 – Cap. 04 – Sou Legião, pois somos muitos

 

Lena acordou ao ouvir uma notificação de mensagem no seu PDA, sentou-se na cama e esticou o corpo. O PDA continuava ativo, a tela holográfica exibia uma imagem estática da câmera do canhão e as fotos dos relatórios das batalhas formavam um mar de papel.

Sua janela ficava na direção leste, a luz do sol brilhava através das cortinas, iluminando o quarto. Ela pegou um robe fino que estava em cima do cobertor feito de um material quase transparente, colocou-o, penteou o cabelo com a mão e saiu da cama.

Abriu as mensagens, e descobriu que era da Arnett.

No próximo mês tem o aniversário da revolução. Vamos escolher um vestido de festa no nosso próximo intervalo.

Depois de uma pequena pausa, ela respondeu:

Desculpe. Estou um pouco ocupada recentemente. Por favor, vamos na próxima.

Arnett respondeu rapidamente.

Sabe, Lena, você não tem aparecido com frequência.

E então Arnett mandou outra mensagem,

Mesmo que você trabalhe duro com os Oitenta e Seis, você não ganha nada com isso, sabia né?

Lena virou a cabeça e olhou para trás.

Ela estava analisando os registros de batalha do esquadrão Ponta de Lança até que caiu no sono. Os relatórios das batalhas eram concisos e explicativos. A destreza e a inteligência do autor eram claramente transmitidas pelos relatórios, que eram enviados junto com os arquivos de dados do gravador das missões do “Juggernaut”. Embora os relatórios de patrulha estivessem vazios como sempre, o material obtido das batalhas era um tesouro. Tesouro de inteligência que podia usar usado nas batalhas contra a “Legião”.

Certamente eles não mandavam essas informações sem receber nenhum benefício.

Essas informações definitivamente eram importantes para que todos conseguissem voltar vivos.

Desculpe.

— …Está tudo bem em participar desse evento, não é?

Shin polia o rifle que normalmente ficava no cockpit do seu “Juggernaut” enquanto respondia diretamente a pessoa do outro lado do Para-RAID. Além de seu contato diário e seus relatórios, eles se falavam de vez em quando. No relatório essa devia ser a hora da patrulha.

Era de tarde, e estava no beliche do quartel. O gatinho foi jogado para o lado de fora do quarto, pois ele podia tocar nas partes da arma que estavam na sala, então estava lá arranhando a porta.

— Mas e se eles atacarem bem nessa hora?

Lena fez um beicinho em resposta. Era preciso imaginar se ela era muito séria ou se era muito inflexível.

— Nós vamos conseguir dar um jeito neles de qualquer forma.

— Além disso, não é uma coisa boa fazer uma festa enquanto tem uma guerra acontecendo.

— Provavelmente vai ter alguma área em meio a uma batalha. Mas nada dentro da <Grand Mur> vai afetar o fronte de batalha de qualquer forma.

Ele empurrou o pino da câmera para baixo, removeu o ferrolho do grupo do transportador e o colocou em cima de um pano. Um fuzil quase não causaria nenhum dano a uma unidade da “Legião”, mas certamente isso não significava que fosse algo inútil. Seria a única coisa em que se poderia confiar como último recurso e, portanto, a manutenção diária era necessária.

— Eu acho que não tem nada de errado em você participar. Mesmo que esteja grato que você consiga nos ajudar analisando os inimigos, isso não é algo que valha a pena para desperdiçar o seu tempo livre.

Lena de repente ficou em silêncio quando ele falou isso,

— Estou fazendo algo desnecessário…?

— Não, você tem sido de grande ajuda.

Ele estava falando de verdade. Não perderia seu tempo falando com um Controlador inútil só para se satisfazer.

— Além disso, nós conhecemos o fronte de batalha, é só isso. É muito bom ter uma oficial que foi treinada militarmente para analisar as coisas de um escopo maior.

— …Obrigada Senhor

— Mas não tem necessidade de dedicar todo o seu tempo nisso.

Shin podia praticamente ver Lena mordendo os lábios de infelicidade, tirou o pino extrator e depois de fazer isso, respondeu honestamente:

— Se você se envolver demais com o campo de batalha, você vai acabar como nós.

Lena suspirou com as palavras de Shin, sem saber se estava brincando ou falando a verdade. Ela não tinha a intenção de ser engraçada.

— Você gosta de fazer piadinhas de tempos em tempos, capitão Nouzen… entendido. Eu vou tentar aproveitar essa festa chata, ou a dor que é usar salto alto e um vestido.

Ela respondeu de forma jocosa e parece que Shin soltou uma risada.

— O festival do aniversário da revolução, não é? Eu me lembro disso.

— Você lembra?

Shin fez uma pausa.

— …Eu lembro que tem fogos de artifício, certo? No jardim com uma fonte, bem em frente ao palácio.

Lena levantou a cabeça.

— Sim. No palácio presidencial de Lune na primeira área legislada… você morou na primeira área antes?

A primeira área continha as elegantes áreas residenciais que existiam desde a era imperial e a maioria dos moradores de lá descendia de famílias que moravam naquela época… os Albas, que costumavam ser membros da realeza, ocupavam a maior parte do local e até mesmo antes de nove anos atrás, era difícil ver um Colorata por lá.

Eu podia ter conhecido ele antes, ela pensou, e havia uma tristeza emergindo de seu coração.

— Eu realmente não me lembro, mas acho que sim. Eu acho que fui com a minha família… na época, meu irmão segurava minha mão.

Lena encolheu os ombros. Ela estragou tudo de novo.

— Me desculpe.

— … Por que está se desculpando?

— Eu realmente sou muito insensível. Naquela hora também… eu mencionei seu irmão e seus pais…

— Ahh.

Lena estava deprimida e o tom de voz de Shin era tão indiferente e apático como sempre.

— Está tudo bem. Eu já me esqueci de bastante coisa sobre eles.

— Eh?

— Eu realmente não me lembro muito da minha família. Lembro-me de umas coisas aqui e ali, mas me esqueci principalmente da aparência deles e das vozes.

— …

Lena não achou que Shin estivesse sendo insensível.

Ele provavelmente era muito jovem quando se separou de sua família. Depois disso passou cinco anos lutando pela sua vida no caótico campo de batalha, é de se esperar que ele esqueça esses tipos de memórias.

Naquele momento, parecia que ela estava vendo uma criança solitária parada no meio de um campo de batalha em ruínas, sem saber para onde voltar.

Ele disse que precisava voltar vivo, precisava voltar e te encontrar.

Lena tentou transmitir essas palavras com a maior precisão possível, lembrando-se do que Ray disse naquela hora.

O Para-RAID transferiu a voz e as emoções de uma conversa cara a cara pela consciência compartilhada.

Ela queria transmitir seus sentimentos para ele. Ray pode ter sumido das memórias de Shin, mas Lena ainda se lembrava dele. Ela ainda conseguia ver ele, ouvir suas palavras e seu bom coração.

— Obviamente ele sente sua falta, dizendo que “Você provavelmente desistiu”. Eu consigo sentir que ele realmente te considerava um familiar importante. Seu irmão realmente queria te encontrar.

— …Esperamos que sim.

Ele respondeu depois de um longo silêncio, deu uma vacilada de leve. Parecia que enquanto não tinha respondido, tinha entendido totalmente que esse desejo não podia mais ser realizado.

— Capitão…?

Shin não respondeu. Lena percebeu que esse era um assunto que não devia tocar, então não falou mais nada. O toque suave no metal era a única coisa que podia ser ouvida de tempos em tempos nesse silêncio.

E quando ouviu esse estranho som, mais alto, Lena inclinou a cabeça. Aquilo era…

— Capitão, você está limpando um rifle agora?

Shin fez uma pausa.

— …Sim.

— Não devia estar patrulhando nesse momento, hein?

Ele não respondeu.

Não é de se admirar que não tenha nada de importante nos relatórios de patrulha. Então Lena suspirou.

Mesmo assim, as operações do esquadrão Ponta de Lança eram muito rápidas e as pessoas se perguntavam se eles conseguiam detectar a “Legião” sem usar um radar. Ela ainda tinha que perguntar sobre isso.

— Desde que você determinou que não tinha muita necessidade de fazer isso, eu pensei que não tivesse o porquê fazer… e quanto ao rifle…

Oficialmente, Oitenta e Seis não podiam ter rifles.

— Você acha que pode ter um momento onde isso seja útil. Não vou dizer nada sobre isso, mas, por favor, continue fazendo as manutenções necessárias então.

— …Me desculpe.

Lena sentiu uma confusão na voz, e piscou os olhos.

— Hã, eu disse alguma coisa estranha?

— Não…eu pensei que você estava com raiva.

Ele ficou surpreso com isso então. Lena ficou surpresa nesse momento.

Desde o momento que ela assumiu o comando, exigiu que ele apresentasse relatórios detalhados e pontuais, muitas vezes reclama por seus colegas no quartel-general nacional serem muito frouxos e indisciplinados.

— Eu… não serei tão rígida com as regras e regulamentos idiotas. Repito, vou respeitar sua decisão, se você decidiu que isso vai ser benéfico em combate.

Além disso, eu não sou uma pessoa que luta. Não tenho direito de falar nada.

Ela teve esses pensamentos pesados e então balançou a cabeça, desviando-se do assunto.

— É necessário manter cuidadosamente as armas por perto no campo de batalha. Para nós aqui, nós achamos esses rifles manufaturados pela república muito pesados e ninguém atualmente usa eles, nem mesmo para treinamento aqui no exército.

O exército republicano exigia balas de grandes calibres por causa do poder de fogo necessário para lutar contra as unidades blindadas. Então todos os modelos de armas eram pesados, feitos com metais resistentes.

No entanto, Shin ficou surpreso.

— Pesado? Você acha essa arma pesada?

Lena no início se surpreendeu com a voz perplexa de Shin, mas então entendeu.

Sim, ele é um garoto. Esse peso não deve ser nada para ele…

E no momento em que entendeu isso, se sentiu muito confusa.

Falando nisso, ela nunca tinha falado com um garoto da mesma idade dela por tanto tempo.

— …Major?

O Para-RAID conseguia transmitir as emoções de uma conversa cara a cara. Shin provavelmente conseguiu sentir que Lena estava corando.

— N-não foi nada. Hum…

De repente, o clima do outro lado do Para-RAID tinha mudado.

Não tinha som, mas Lena conseguia sentir. Shin estava de pé, olhando para longe.

— …Capitão Nouzen?

— Por favor, prepare-se para o trabalho.

Ela olhou para o terminal de informação e não tinha nenhum alerta nele. No entanto, Shin parecia ter certeza.

— A “Legião” está vindo.

Shin já estava sincronizado com Lena, então participou da reunião do esquadrão.

Quando ela ouviu as explicações sobre todas as coisas, incluindo o número de inimigos, a formação, e por onde eles atacariam, eles criaram uma estratégia com tanta informação assim? Ela ficou perplexa, ao mesmo tempo, propôs uma estratégia para essa operação. Quando a estratégia foi definida, a reunião terminou e a operação começou.

— A força principal do inimigo é composto apenas por Lobos Cinzentos.

Todas as unidades estavam em uma emboscada. Lena comparou as informações que tinha obtido com os batedores do fronte de batalha, dos sinais de radar e dos registros de batalha; ela fez uma dedução com relação a vaga composição do inimigo.

— Considerando as taxas de produção e manutenção, os Leões destruídos na última batalha ainda não devem ter sido reconstruídos. Então é difícil de imaginar que o líder inimigo seja um Touro.

O Touro não tinha mobilidade e praticamente não tinha armadura. Era uma unidade tipicamente usada em emboscadas. Devido à semelhança com os Leões, eles eram confundidos, quando foram introduzidos pela primeira vez e os humanos conseguiram lidar com eles.

— Embora as granadas do “Juggernaut” não tenham efeito contra os Leões, a armadura leve dos Lobos Cinzentos significa que os tiros de apoio dos Escorpiões não serão tão eficazes. Acho que, se eliminarmos primeiro a Formiga, eles não devem ser uma ameaça.

— Lobisomem para todas as unidades. Confirmando. Exatamente como a Major tinha previsto.

Quem falou isso foi Raiden, que saiu para fazer o reconhecimento. Ele parecia impressionado e atordoado.

— Mas sério… você estava falando sobre as taxas de produção e manutenção? Você dorme direito?

Shin de repente falou.

— Major, por favor, desligue o Para-RAID dessa vez.

— Hm?

— Essa vai ser uma batalha caótica, isso é inevitável, especialmente porque vamos lutar contra Lobo Cinzento. Tem muitas Ovelhas Negras… será perigoso permanecer sincronizada comigo.

Mesmo Shin falando fluentemente a língua da república, Lena não compreendeu. O que ele acabou de falar?

Muitas Ovelhas Negras?

— Se você quiser uma explicação, eu explicarei para você quando a luta terminar. Por favor, desligue agora.

A matança estava prestes a começar então era compreensível que ele não tivesse tempo para explicar. No entanto, Lena não estava nem um pouco contente com isso.

— Você não se desconectou com os outros do esquadrão, não é? E as Efemeridas ainda estão por aí então as comunicações sem fio podem falhar. Eu não vou desligar.

Ela se recusou a desligar. Shin provavelmente iria falar algumas coisas, mas engoliu suas palavras quando viu a “Legião” se aproximando.

— …Eu te avisei.

Depois de falar essa frase sombria, o “Cangalheiro” se levantou.

Como Shin disse, o campo de batalha estava caótico, os pontos que indicavam os aliados e inimigos se fundiam no radar que mal funcionava por causa da interferência. Lena ficou olhando para o monitor, cobrindo uma orelha com a mão. Por alguma razão, o barulho estava muito estridente. Ou era um som vindo de dentro da sala dela, ou eram os sons que o Shin e os outros ouviam no campo de batalha. O que era aquele barulho?

Os pontos vermelhos indicavam os inimigos, eles estavam se aproximando dos pontos azuis que indicavam os aliados, incluindo o “Cangalheiro”, a unidade de Shin. Ambos os lados estavam se aproximando um do outro no meio do campo de batalha, em uma luta a curta distância. As duas cores de pontos se chocaram, e naquele momento…

Uma voz desconhecida ecoou estridente nos ouvidos.

— …Mamãe.

Aquela voz era oca e efêmera, o murmurar das últimas palavras de uma pessoa morrendo.

Lena parou, ela congelou. A voz continuou a ecoar, as lembranças e sentimentos remanescentes que despareceriam em uma nuvem de fumaça antes da morte, quando a voz vazia murmurou.

— Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe…

— Oi…?

Ela sentiu seu cabelo se levantar. Cobriu as orelhas com as duas mãos, mas isso não fazia sentido, pois a voz vinha do Para-RAID. A criança moribunda chamando por sua mãe entrou em seus ouvidos como uma onda. O grito inteligível invadiu sua consciência como uma avalanche e ficava se repetindo várias vezes. A grande explosão cortou a voz que ficava chamando pela mãe e então, vozes semelhantes ecoavam rapidamente.

— Me salve, me salve, me salve, me salve, me salve, me salve, me salve, me salve, me salve.

— Está quente, está quente, está quente, está quente, está quente, está quente, está quente, está quente, está quente.

— Não… não… não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não.

— Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe. Mamãe.

— Eu não quero morrer. Eu não quero morrer. Eu não quero morrer. Eu não quero morrer. Eu não quero morrer. Eu não quero morrer. Eu não quero morrer. Eu não quero morrer. Eu não quero morrer.

— N-não… Nãooooo…!

Muitas vozes agonizantes rodopiavam como um vórtice, devorando silenciosamente todos os fragmentos restantes de racionalidade e pensamento coeso. Entre eles, a voz de Shin ressoou.

— Major! Desconecte agora! Major Millize!

O garoto que normalmente era calmo mostrou um leve tom de ansiedade quando chamou por ela, mas ele não conseguiu alcançar os ouvidos da apavorada Lena. Ela tapou os ouvidos com dor, encolheu-se com uma grande vontade de fugir e soltou um grito rouco. Desse jeito, ela estava perdendo seu último pingo de sanidade em meio às ondas intermináveis de gritos agonizantes…

— Tch!

Shin estalou a língua e desligou. As vozes agonizantes desapareceram.

— ………Ah…..

Ela levantou a cabeça totalmente rígida e abriu lentamente as mãos… Ela não conseguia ouvir nada. Ela se desconectou de todos os “processadores”.

Com medo e respirando freneticamente, ela lentamente arregalou os olhos, olhou para a sala de controle, e se viu criança, caída no chão.

…O que, o que é isso…?

Não eram as vozes dos “processadores” sincronizados. Nenhuma daquelas vozes pertencia a eles, e eram muitas vozes.

E entre os gemidos sem fim, ela conseguiu identificar um.

—Eu não quero morrer.

— …Flor de Cerejeira… Kaie…?

Shin se desconectou de Lena e estava lutando contra um grande rebanho de “Ovelhas Negras”. Ele estreitou os olhos enquanto as vozes agonizantes sussurravam em seus ouvidos. A maior parte dos inimigos eram Lobos Cinzentos e as lâminas de alta frequência que possuíam podiam destruir a armadura do “Juggernaut” facilmente. Então, demorou para desconectar, pois precisava se concentrar nas lâminas dos inimigos.

Gritos, suspiros, gemidos e rugidos. Todos os tipos de vozes ecoavam, era ensurdecedor quando chegava perto, ensurdecia tanto para quem estava perto, tanto par quem estava conectado com ele. Seo conseguiu ouvir uma voz que conhecia pelo seu Para-RAID, e bufou:

— Droga…! Essa era a Kaie…!

Shin conseguiu ouvir alguns suspiros assustados. O comunicador estava cheio de comoção.

— Kaie…!? Ela foi levada…!?

— Droga… A Angel devia ter lidado com isso…!

Ele ignorou os gritos furiosos de seus companheiros de esquadrão e identificou onde estava a “Kaie”. Ao contrário dos outros que só ouviam pelo Para-RAID, só Shin conseguia fazer isso.

Ele conseguiria identificar facilmente onde ela estava sem ter que focar sua audição. A precisão da sua audição era sobre-humana, era capaz de encontrar uma agulha num palheiro, se isso fosse possível com a audição.

E o mais próximo dela era… Krena.

— Pistoleira, às duas horas, distância de oitocentos metros. Líder do esquadrão com quinze unidades, o segundo Lobo Cinzento da direita.

— …Entendido.

Depois de um tiro de canhão, a voz de uma alma que tinha permanecido nesse mundo mesmo após a morte, a voz desesperada de Kaie implorando pela sua vida finalmente desapareceu, com a destruição, sua alma que não podia seguir em frente, seguiu.

Shin ficou parado em meio ao mar de gritos esmagadores e de ressentimentos, ele suspirou por pena.

— Uma batalha para lamentar os mortos, hein.

As almas dos mortos nunca teriam seu descanso merecido até serem destruídas.

Elas pareciam ansiar a destruição para enfim poderem descansar.

A Controladora provavelmente nunca mais vai nos contatar novamente… Shin momentaneamente sentiu um pouco de arrependimento e franziu a testa.

No momento em que ela conseguiu reunir coragem para se sincronizar novamente, o sol já havia se posto.

Sempre que tentava sincronizar, o coração dela se enchia de medo, ao ponto de ficar enjoada. Ela era obrigada a fazer uma pausa, se acalmar e então tentar novamente, repetindo isso várias vezes. Somente quando a noite chegou, quando as luzes da linha de frente se apagaram, finalmente tentou se conectar.

Eu vou incomodar se eu tentar sincronizar tão tarde assim? Pensou, se esforçou para tentar afastar esses pensamentos. Se deixasse para amanhã, poderia hesitar novamente dando a mesma desculpa, até que chegasse o momento em que nunca mais tivesse coragem de se sincronizar novamente.

Respirou fundo tentando conter sua respiração frenética e então ativou o Para-RAID. Felizmente, ele não estava dormindo então conseguiu se conectar. Havia apenas uma pessoa do outro lado.

Foi ele quem disse para desconectar, avisou para ela não continuar sincronizada. Naturalmente, era para ele que ela tinha que perguntar.

— …Capitão Nouzen.

Ela sentiu Shin arregalar os olhos.

— Aqui é a Millize. Podemos conversar agora?

Teve uma breve pausa.

E por algum motivo, ela conseguia ouvir o barulho de água ao fundo, como se estivesse chovendo.

— …Estou tomando banho.

— Eh?!

Foi a primeira vez que Lena se ouviu dando um grito de tanta surpresa.

Suas orelhas estavam completamente vermelhas e mesmo ela querendo responder, não conseguia responder, pois estava perdida em pensamentos. Ela ficou aterrorizada, de uma forma diferente do terror dessa manhã. E então finalmente falou alguma coisa.

— Me-me desculpe, hã, está tarde não é… eu vou desconectar imediatamente.

— Não.

A voz de Shin estava calma como sempre, e isso irritava um pouco Lena.

— Eu não me importo, na verdade, eu vou dormir assim que terminar o banho. Então se quiser perguntar alguma coisa, por favor, pergunte agora. Além disso, não se importe comigo.

— Sério… mesmo? Então…

Mesmo que ele falasse, o pai de Lena morreu quando ela era muito nova e ela não tinha irmãos, nem namorado. Essa situação era meio estimulante para ela. Falou sentido que seu rosto ainda estava vermelho igual um tomate.

— Ah…sim, então, como foi a batalha? Teve uma baixa? Ou algum KIA…?

— Não teve nada disso… era só isso que queria perguntar?

— Porque…

Não importa o quão forte eles fossem, não tinha nenhuma garantia de que conseguissem sempre retornar depois de uma luta contra a “Legião”.

Além disso, lutaram ouvindo os ecos dos gritos, ela estava totalmente aterrorizada pensando que o esquadrão tivesse sido totalmente eliminado e que ninguém iria se conectar quando ela tentasse sincronizar.

— Capitão… a voz que ouvi hoje durante a batalha foi…

Quando ela disse isso, um calafrio percorreu todo o seu corpo.

Houve algum tipo de ruído no fundo da transmissão, como sempre. Soava como o farfalhar de uma grande e densa floresta, ou sussurros ao longe.

E naquele momento, os sussurros ao longe pareciam cada vez mais com uma coletiva de incontáveis vozes dos mortos.

Ela finalmente entendeu porquê Shin era chamado de “Cangalheiro”, e porquê os Controladores anteriores ficaram totalmente aterrorizados com ele.

O motivo era essas vozes.

— O que, aquelas coisas…?

— …

Apenas o som da água ecoava no meio dessa pausa.

— No passado, eu morri.

Do nada, ela começou a sentir uma dor enorme vindo de seu pescoço, como se estivesse sendo estrangulada brutalmente.

A dor não vinha dos sentidos de Lena, a dor vinha do Para-RAID… em outras palavras, vinha de Shin.

— Em vez disso, vou dizer que morri uma vez no passado. Desde então eu posso ouvir as vozes das almas que morreram e ainda não saíram desse mundo… porque eu sou igual a essas almas.

— …Fantasmas.

De repente, ela se lembrou do acidente que aconteceu com o pai da Arnett.

Ele aumentou a taxa de ativação nervosa do Para-RAID para o valor teórico máximo e então caiu na consciência do próprio mundo e não conseguiu voltar.

Se for assim, se todos os mortos tivessem que retornar ao profundo mundo sem fim.

Então aqueles que estão à beira da morte, aqueles que quase caíram nesse abismo… podem ser capaz de entrar em contato com as coisas que estão dentro desse abismo, facilmente usando o Para-RAID. Por exemplo, os fantasmas que não perecem pela eternidade, aqueles que tinham caído no fundo do abismo depois da morte e que ainda estavam nos corpos lutando para sair.

Mas isso…

— A “Legião”… não são fantasmas, não é?

Ela ouviu os mortos quando os Lobos Cinzentos estavam na frente de Shin. Então ele disse:

— Eles, a “Legião”, são fantasmas. Eles perderam seu propósito como armas quando o império foi destruído, não tinham mais missões e não tinham necessidade de cumprir suas obrigações, mas ainda tinham que continuar nesse mundo… são os fantasmas dos militares de um país destruído.

— …Espera, então a razão pela qual você consegue saber quando a “Legião” está próxima…

— Sim, eu posso ouvir suas vozes. Enquanto se aproximam, eu posso ouvi-los, mesmo quando estou dormindo.

— Por favor, espera…!

Lena murmurou. Ele tinha acabado de mencionar algo que ela não podia deixar passar em branco.

Ele podia ouvi-los se aproximando? Mesmo que a base inimiga mais próxima esteja a quilômetros dele? Ele consegue dizer quantas unidades da “Legião” estão vindo dessa distância?!

As vozes dos mortos eram como passos distantes, ou como o farfalhar das folhas.

Como o Para-RAID estava ajustado no mínimo, ela só conseguia ouvir a voz da pessoa que estava sincronizada com ela, os sons dentro de um braço de distância da pessoa e sons altos.

Para Lena, sempre que sincronizava com Shin, tinha um ruído de fundo, que não conseguia entender muito bem… mas como esse ruído parecia para o Shin?

— Quantas vozes você consegue ouvir agora, Shin? Quão grande é o alcance e quanto…

— Eu não consigo saber a distância exata, mas eu consigo ouvir todas as unidades da “Legião” dentro das antigas terras da república… eu consigo ouvir algumas vozes ainda mais distantes, mas eu não consigo entender direito todas elas.

Esse mundo estava além da imaginação.

Mesmo que uma única voz fosse um murmúrio, se for contar o número total de unidades da “Legião”.

Ele as escutava o tempo todo, mesmo dormindo.

— Você não… se incomoda com isso?

— Me acostumei com isso. Já faz algum tempo.

— Quando isso começou…?

Ele não respondeu, então Lena fez a próxima pergunta,

— Eu ouvi a voz da Tenente Kaie Tanya. Eu consegui ouvir… por que ela também se tornou um fantasma?

Ela falava aquilo com uma perplexidade em suas palavras. Isso era muito surreal para si.

Houve uma breve pausa. O som da água parou e parecia que ele estava enxugando a água de seus cabelos.

— O governo da república acha que essa guerra vai terminar daqui no máximo dois anos, certo?

— Ah, sim… como você sabe disso?

Lena ficou meio perturbada com a mudança súbita no tópico da conversa, mas concordou mesmo assim. O governo não revelou isso, para que os processadores não comecem a ter esperanças.

— Ouvi de Seo. Ele ouviu isso do antigo capitão dele… a CPU da legião foi projetada para ter uma vida útil limitada, e tem apenas dois anos sobrando. Estou certo?

— Sim.

O sistema nervoso central da “Legião” era feito de nano máquinas líquidas que imitavam o sistema nervoso de um mamífero, assim, isso garantia a eles uma capacidade de pensamento semelhante à de um grande mamífero. No entanto, no projeto de manutenção dessas estruturas, tinha um limite de tempo e também havia um processo de autodestruição que começaria depois que esse limite fosse atingido, não podendo ser removido.

— Quando ouvi a explicação de Seo, entendi. A “Legião” falava de um jeito mecânico, sem ritmo nem tom. Então, um dia, vozes humanas começaram a aparecer. Eu posso adivinhar o que aconteceu, mas eu não sei o porquê eles fizeram isso.

Então ela ouviu o som de cabelo sendo seco de uma maneira bruta, um jeito que uma mulher nunca usaria, esse som foi seguido pelo som suave de tecido sendo esfregado. Era óbvio que as roupas deles eram de péssima qualidade, ásperas e duras.

— Se os diagramas do sistema nervoso central se forem, eles podem simplesmente substituir… e a coisa que eles podem usar para substituir isso está bem na frente deles.

— …é isso?

— Sim. Por um sistema nervoso central, que é muito avançado, até mesmo entre os mamíferos. O cérebro humano.

Apenas parando para pensar um pouco fez com que Lena ficasse revoltada. Isso era algo muito além do que se pode considerar como grotesco; era uma completa profanação da dignidade humana. Em contraste a ela, Shin continuou calmo como sempre.

— Meu palpite é que seja uma réplica de um cérebro humano. O cérebro de uma pessoa morta apodrece muito rápido e não tem muitos cadáveres tão bem preservados assim para que possam ser usados, muito menos aqueles sem nenhum dano no cérebro. Na verdade, já encontramos unidades da “Legião” com as mesmas vozes mais de uma vez. Então eu acho que a Kaie está em outro lugar.

A garota não estava mais viva, mas suas últimas palavras continuavam seladas em uma máquina, que repetia isso como uma caixa de música quebrada.

— Então, quando digo que eles são fantasmas, eles são diferentes do normal. Eu diria que na verdade são um tipo de resíduo. Não têm a vontade dos humanos e nem a intenção de se comunicar. O que replicam é o cérebro dos mortos, nos seus últimos momentos. O que falam é apenas o que pensaram nos seus últimos momentos, então assim se tornam fantasmas dentro da “Legião”.

— …Ovelhas Negras…

— Sim, as Ovelhas Negras, são as mutantes que possuem os fantasmas, elas estão misturadas entre as “Ovelhas Brancas” dentro da “Legião”. Mas nesse momento, as “Ovelhas Negras” já superaram em muito o número de “Ovelhas Brancas”.

Mesmo que o cérebro comece a apodrecer no exato momento da morte, o cérebro dos humanos continua o mais avançado entre os mamíferos. O sistema nervoso central da “Legião” começou a imitar o dos humanos, porque certamente a capacidade é bem maior. Mesmo que tenham falhado várias vezes, as incessantes vozes dos mortos mostram que as “Ovelhas Negras” estavam se multiplicando rapidamente.

Ela tinha a sensação que Shin estava com pena da “Legião”, pois tinham perdido sua terra natal, a razão para continuar lutando e a sua razão de existir, eram nada mais que fantasmas mecânicos, revirando cadáveres, sempre lutando conforme foram programados.

— …Eu de alguma forma consigo entender a razão deles continuarem a atacar a república.

— Hm?

— Eles são fantasmas. Deveriam ter ido embora, mas continuam aqui até serem exterminados. Eu acho que querem voltar e é por isso que continuam atacando aqueles em sua frente que também são fantasmas, querendo levar eles também.

— Fantasmas…

A quem ele está se referindo?

Ele está se referindo aos Oitenta e Seis que ainda continuam vivos, mas eles não eram considerados humanos, então não eram diferentes dos mortos perante a sociedade?

— A república morreu há nove anos, certo… em algum lugar você consegue achar agora, o espírito da bandeira de cinco cores que formou a base desse país?

As calmas palavras de Shin continham farpas enormes que conseguiam quase chegar até Lena.

Liberdade, igualdade, fraternidade, justiça e pureza. Por nenhum motivo plausível, eles dividiram as pessoas em classes e não tiveram a menor vergonha ou piedade de jogar milhões de vidas no lixo… esse país perdeu todo o direito de dizer que ainda segue seus valores fundadores.

A república se matou. Ela morreu completamente nove anos atrás, no momento em que algumas pessoas perseguiram grupos que eram diferentes delas.

Talvez Shin conseguisse ouvir a voz daquilo que já tinha morrido, mas que ainda continuava existindo, a voz do gigante fantasma da república.

Lena não conseguia dizer nada. Depois dessa breve pausa, Shin de repente falou, sua voz era calma como sempre, ele narrava algo que parecia ser um futuro já definido.

— Major, vocês vão perder essa guerra.

Ele não disse “Nós”

— O que você quer dizer com isso?

— Estou falando que a “Legião” não vai ser destruída enquanto o sistema nervoso central não for desativado. Na verdade, eu consigo sentir que o número deles não está diminuindo, mas sim aumentando… então, e quanto aos Oitenta e Seis? Quantos ainda restam?

Lena não conseguiu responder. Ela não sabia. A república nunca contou.

— Eu acho que restam apenas dois ou três anos ainda para nós. Já que desde que os Oitenta e Seis foram para o campo de concentração, nunca se reproduziram, e a metade dos bebês que nasceram naquela época morreu.

Os Oitenta e Seis adultos que foram presos naquela época já tinham sido praticamente eliminados dois anos depois do começo da guerra. Nenhum soldado recrutado morreu e os que tiveram que construir a <Grand Mur> foram obrigados a trabalhar em situações horríveis, sendo obrigados a fazer trabalho manual pesado sem parar e então pereceram aos poucos. Os idosos e os doentes, que não tinham nenhuma utilidade, faleceram ao longo desses nove anos sem tratamento.

— … Por que os bebês também…?

— Você está mesmo perguntando sobre as altas taxas de mortalidade dos bebês, em um ambiente desprovido de médicos?… No campo de concentração onde eu estava, nenhum bebê sobreviveu ao primeiro inverno e acho que foi o mesmo em todos os outros campos de concentração. E dos bebês que sobreviveram, metade deles foram vendidos.

— Vendidos?

— Sim, por alguns soldados e Oitenta e Seis por dinheiro. Eu não sei se eles vendiam inteiros ou em partes.

Demorou um pouco para Lena entender o que ele estava dizendo. Ela sentiu seu rosto ficando pálido.

Em outras palavras, nessa república, tinha pessoas que chamavam os Oitenta e Seis de porcos e então eles faziam o que quisessem com os filhos desses porcos, usando até seus órgãos para prolongar suas vidas.

Todos os Oitenta e Seis que restavam eram pré-adolescentes e eles eram mandados para campos de batalha até que não conseguissem mais lutar.

— A “Legião” não está diminuindo em números, mas os Oitenta e Seis estão morrendo. Desse jeito, vocês vão conseguir lutar? Vocês não sabem lutar, não entendem de formações para batalhas. Sem nem pensar duas vezes, vocês recrutaram os Oitenta e Seis e pagaram pelos gastos militares. Acha mesmo que vocês vão conseguir se armar e lutar?

Provavelmente não, ele zombou.

Ele não estava zombando daqueles que faziam os outros sofrerem e que depois riam sobre a mesma coisa; ele estava zombando daqueles que só se importavam com o que estava bem na frente deles, ignorando a realidade, se protegendo na sua pequena muralha e maltratando “criaturas” atrasadas que não conseguiam se proteger.

— Se ninguém estiver disposto a se voluntariar, o recrutamento forçado é a única saída. Do jeito que a república é, vocês farão isso só no último momento, quando o perigo for iminente. Mas nesse momento, será tarde demais… uma falha no sistema dessa república moderna é que as decisões não são tomadas a menos que seja uma questão de vida ou morte.

Lena começou a imaginar uma brilhante e realista imagem da derrota igual como Shin descrevera, e então balançou freneticamente a cabeça tentando se livrar desse pensamento, tentando negar. Não porque ela não tinha argumentos para refutar, mas sim porque não conseguia aceitar a possibilidade súbita e inimaginável de que seu país será totalmente dizimado daqui alguns anos.

— M-mas, detectamos que a “Legião” está diminuindo em números! Já tem menos da metade se for comparar com antigamente…

— Esse é o número que vocês conseguem detectar dentro do alcance, certo? Devido ao bloqueio eletromagnético das Efemeridas, vocês não conseguem detectar tudo que existe na área já dominada pela “Legião” até o fim do território dela… é realmente verdade que os números no fronte de batalha estão diminuindo, mas isso é porque eles não estão enviando mais que o número necessário para cá. De um lado continuando lutando frente a frente conosco, enquanto do outro lado, continuam aumentam a reserva de unidades deles.

Havia apenas um objetivo nisso.

Preservar força, acabar com a guerra de atrito que estava desgastando-os e então depois lançar um ataque gigantesco, acabando com as defesas da república de uma só vez.

— Mas a “Legião” não tem inteligência suficiente para tomar tais decisões.

— Não tem. Esse é outro motivo que fará vocês perderem.

Ao contrário da resposta patética de Lena que tentava negar o obvio, a voz de Shin continuava calma e indiferente,

— Existem apenas poucos cadáveres que não tinham danos cerebrais, mas nesse campo de batalha, existem milhões de cadáveres que não foram retirados de lá, então é muito fácil encontrar uma cabeça humana sem danos, ou com o mínimo de dano lá… para humanos, é fácil fazer essa estratégia de reunir forças para depois lançar um ataque massivo para derrotar um inimigo muito resistente. Então se você assumir que agora existem unidades da “Legião” que tem a inteligência de um humano, o que será que acontece?

— …!

“Ovelhas Negras”. A “Legião” que recriou a estrutura de um cérebro humano. Mesmo depois de apodrecer, eles conseguiriam melhorar muito a capacidade do sistema nervoso central deles.

Mas, e se eles encontrassem um jeito de serem imortais e se encontrassem o cérebro de um humano que ainda não apodreceu?

— Chamamos essas unidades da “Legião” de <Pastores>. A “Legião” são os soldados encarregados de lutar, mas os <Pastores> São os comandantes que tem as almas dos mortos. Até agora, já lutamos contra alguns esquadrões inimigos liderados por <Pastores> e a “Legião” fica muito mais cruel e inteligente com eles no comando do que sem. Não tem nem como comparar.

— Espera. Você quer dizer que essas unidades não são suposições suas, elas realmente existem? Você pode…

— Eu consigo ouvi-las. As vozes dos comandantes vêm bem de longe e eu consigo distingui-las facilmente, mesmo entre as muitas unidades inimigas. Existem dúzias de comandantes ao longo de todos os campos de batalha e no nosso fronte de batalha… existe um.

Nesse momento, a voz de Shin ficou muito fria, como uma lâmina refletindo a luz do luar, emitindo uma aura psicótica e perigosa, parecia com a voz de quando ele falou sobre seu falecido irmão.

Ela estava apavorada.

A república vai ser extinta, por causa de sua incompetência e burrice, porque milhões foram enviados ao campo de batalha e morreram, porque eles seriam puxados para a extinção pelas almas do Oitenta e Seis que eles tiveram preguiça de enterrar.

— M-mas…

De repente, Lena falou, como se tivesse pensado em algo.

— Mas isso vai acontecer… só se todos vocês morrerem, certo?

Shin piscou.

— Sim.

— Então, se conseguirmos vencer a “Legião” antes disso, o extermínio não vai acontecer; Se forem vocês… o esquadrão Ponta de Lança, se conseguirem descobrir onde a “Legião” está se escondendo e atacando, isso não é algo impossível, certo?

Se forem eles, que conseguem lutar contra as duras investidas da “Legião”.

— Com mão de obra, equipamento e tempo suficiente, talvez tenha alguma chance. Todas as estratégias de guerra necessitam de condições minimamente boas para serem planejadas.”

— Então, vamos vencê-los. Eu também…

Ela estava prestes a dizer que lutaria, mas se corrigiu quando percebeu que falar isso seria arrogante da parte dela.

— Eu darei o meu melhor. Seja para analisar o inimigo ou formulando estratégia ou qualquer outra coisa que eu consiga ajudar, eu devo… Isso deve ser feito também nos outros frontes de batalha.

Certamente, se ela conseguisse obter informações detalhadas do inimigo e assim planejasse contramedidas básicas, isso seria benéfico para toda a república. Seguindo essa linha de raciocínio, compartilhar essas informações com os outros não seria uma tarefa difícil de fazer.

— Capitão Nouzen, o seu serviço obrigatório termina esse ano, certo? Vamos juntos… viver até lá.

Shin deu um sorriso irônico, sua voz tinha um pouco de bondade.

— … Acho que sim.

Depois de se desconectar de Lena, Shin voltou ao seu quarto no quartel, então apagou as luzes e tudo ficou em silêncio.

Ele entrou em seu quarto escuro, a janela de vidro refletia sua silhueta sob a luz da lua cheia.

O lenço azul continuava em seu pescoço, em todas as batalhas, mas tirava quando ia dormir. Ele pretendia dormir depois que terminasse de tomar banho, e assim, no colarinho das suas roupas militares, que fora colocado às pressas em cima de sua camiseta, o familiar lenço azul não estava lá.

Tendo vivido a vida inteira lutando, sempre passando por momentos de vida ou morte, seu esbelto corpo era tão forte e rápido quanto o de um leopardo. No pescoço, havia uma marca de um anel vermelho-escuro.

A grande cicatriz não era uma linha reta, mas ela era irregular. Era como se a cabeça dele tivesse sido cortada e depois tivesse sido costurada novamente.

Ele levantou a mão, e gentilmente acariciou a cicatriz em seu pescoço.

 


 

Tradução: Shintaro

Revisão: Hiroshi

QC: Bravo

 

💖 Agradecimentos 💖

Agradecemos a todos que leram diretamente aqui no site da Tsun e em especial nossos apoiadores:

 

  • decio
  • Merovíngio
  • S_Eaker#1065
  • abemiltonfilho
  • brunosantos2784
  • gilsonvasconcelos
  • kicksl#7406
  • lighizin
  • luisricardo0155
  • MackTron#0978
  • MaltataxD#4284
  • nyckdarkbr
  • ryan_vulgo_rn
  • themaster9551
  • Tsunaga
  • Enrig#0423
  • mateus6870
  • licaesar

 

📃 Outras Informações 📃

Apoie a scan para que ela continue lançando conteúdo, comente, divulgue, acesse e leia as obras diretamente em nosso site.

Acessem nosso Discord, receberemos vocês de braços abertos.

Que tal conhecer um pouco mais da staff da Tsun? Clique aqui e tenha acesso às informações da equipe!

 

 

Bravo

Recent Posts

Mushoku Tensei: Reencarnação do Desempregado – Vol. 24 – Cap. 07 – O Gênio

  Primeiro, Cliff apressou-se para os leitos dos enfermos. — Observar a condição do paciente…

3 dias ago

How To Bet Upon Mostbet A Step-by-step Guide

I keep having to be able to authenticate MID ROUNDED and I was not able…

4 dias ago

Mostbet Review 2024 Are You Able To Trust This Gambling App?

Once this kind of has been entered, push place wager, to verify the bet. The…

4 dias ago

Игорный дом Абсент официальный веб-журнал Вербовое вдобавок регистрация

Зарегистрированные пользователи зарабатывают пропуск буква эксклюзивным бонусам а водка 22 казино также акционным предложениям, что…

4 dias ago

Cheltenham Gold Pot Predictions, Betting Guidelines & Latest Odds

The most recent double winners have been Kauto Star (2007 and 2009) plus Al Boum…

6 dias ago